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Universidade Estadual de Campinas

Instituto de Matemática, Estatística e Computação Científica


Departamento de Matemática

Monografia
MM427 - Álgebra Comutativa

Professor: Fernando Torres

Decomposição Primária em Ideais

Daniel Ferreira Machado RA: 193002


Daniel Pires Araujo Lima RA: 192288
Leandro Afonso da Silva RA: 192293
Luan Vinicio de Mattos Ferreira Silva RA: 192297
Marcelo Sousa de Miranda Junior RA: 192298
Mayara Duarte de Araujo Caldas RA: 147422
Ricardo Martins Mendes Guimarães RA: 192301
Thaylon Souza de Oliveira RA: 192945

2019
Sumário

Introdução 3

1 Preliminares 4

2 Decomposição Primária 6
2.1 Decomposição Primária em Ideais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
2.2 Aplicações da Decomposição Primária em Anéis Noetherianos . . . . . . . . 13

2
Introdução

A decomposição de determinados objetos matemáticos se faz presente em diversas


subáreas da Álgebra, principalmente na Teoria dos Números, através do Teorema Fundamen-
tal da Aritmética. Por meio deste teorema, é garantida a decomposição de qualquer número
inteiro (diferente de −1, 0 ou 1) em um produto finito de números primos. Tais considera-
ções nos permitem estabelecer um paralelo entre o Teorema Fundamental da Aritmética e a
decomposição primária de um ideal de um anel, sendo este último tópico abordado nesta mo-
nografia. Podemos, intuitivamente, entender a decomposição primária de ideais como uma
generalização do Teorema Fundamental da Aritmética, através de correspondências entre
ideais e números e da determinação de novos conceitos que nos proporcionam uma aproxi-
mação entre as características destes dois objetos a serem exploradas. Nesta monografia,
além de relembrar algumas definições básicas e resultados importantes na seção Prelimina-
res, apresentamos a teoria necessária para se estudar a decomposição (quando existente) de
um ideal I em ideais primários. Além do mais, verificamos que em um anel noetheriano
todo ideal próprio admite uma decomposição primária. É válido lembrar que esta teoria,
que nesta monografia está sendo esmiuçada sob a ótica de ideais, possui generalização para
módulos: todo submódulo de um A-módulo M pode ser escrito como interseção finita de
submódulos primários. A principal referência para esta monografia é constituída pelas no-
tas de aula da professora Maria Eugênia Martin (veja [3]); além disso, algumas referências
importantes para este trabalho são [2] e [1].

3
Capítulo 1

Preliminares

Apresentamos, aqui, algumas definições e resultados clássicos que serão utilizados


ao longo desta monografia. Consideramos A como sendo um anel comutativo e com unidade.

Definição 1.1. Um elemento a ∈ A é nilpotente se an = 0 para algum n > 0. Já o


nilradical de A é o conjunto (pode-se verificar que é um ideal) N ill(A) de todos os elementos
nilpotentes de A.

Definição 1.2. O radical de Jacobson R de A é o ideal obtido pela interseção de todos


os ideais maximais de A.

Proposição 1.3. O nilradical de A é a interseção de todos os ideais primos de A.

Proposição 1.4. Valem as seguintes afirmações:


n
[
a) Sejam p1 , · · · , pn ideais primos e seja I um ideal tal que I ⊆ pi . Então, temos que
i=1
I ⊆ pi para algum i.
n
\
b) Considere I1 , · · · , In ideais e p um ideal primo tal que Ii . Então, vale que p ⊇ Ii
i=1
n
\
para algum i. Caso p = Ii , então p = Ii para algum i.
i=1

Definição 1.5. Definimos o ideal quociente dos ideais I e J de A como sendo o ideal
(I : J) = {a ∈ A | a · J ⊆ I}.

Em particular (0 : J) é chamado de aniquilador de J. Denotaremos tal quociente


por Ann(J), que consiste nos elementos a ∈ A tais que a · J = 0.
Recordamos, também, a definição de um anel artiniano, que será amplamente
explorado na parte final deste trabalho.

4
Definição 1.6. A é um anel artiniano se satisfaz alguma das seguintes condições (que são
equivalentes):

1. Se S é um conjunto de ideais de A, então S possui um elemento minimal.

2. Toda cadeia descendente de ideais de A é estacionária.

3. Todo ideal de A é finitamente gerado.

Proposição 1.7. Um anel artiniano A não-nulo tem somente um número finito de ideais
maximais.

Proposição 1.8. Em um anel noetheriano A o nilradical N ill(A) (que, neste caso, coincide
com o radical de Jacobson R) é nilpotente.

5
Capítulo 2

Decomposição Primária

Em Álgebra Comutativa são essencialmente estudados anéis comutativos, módu-


los, entre outros. As ferramentas utilizadas ao longo do desenvolvimento de um curso da
área são altamente utilizadas tanto em Geometria Algébrica quanto em Teoria Algébrica dos
Números. Um tema muito importante no estudo de Álgebra Comutativa é o Teorema da
Decomposição Primária, que será o principal assunto desta monografia.
Podemos interpretar a decomposição primária de um ideal como a generalização
da fatoração de um inteiro como produto de potências de números primos, bem como po-
demos visualizar um ideal primo de um anel A como a generalização de um número primo.
A correspondente generalização de uma potência de um número primo é denominada ideal
primário. Estudaremos alguns requisitos básicos para tal entendimento nas próximas pági-
nas.

Definição 2.1. Dizemos que um ideal q em um anel A é primário se q 6= A e se dados


ab ∈ q então ou a ∈ q ou bn ∈ q para algum n > 0.

Decorre diretamente da definição que todo ideal primo é primário. Além disso,
uma caracterização para ideias primários é dada pela proposição a seguir.

Proposição 2.2. Um ideal q ⊂ A é primário se, e somente se, A/q 6= 0 e todo divisor de
zero em A/q é nilpotente.

Proposição 2.3. Seja q um ideal primário em um anel A. Então q é o menor ideal primo
de A contendo q.


Demonstração. Por hipótese, q é a interseção de todos ideais primos de A que contêm q;
√ √
desta maneira, é suficiente provar que q é primo. Sejam ab ∈ q; então, existe m > 0 tal
que (ab)m ∈ q. Como q é primário, ou am ∈ q ou bmn ∈ q para algum n > 0, ou seja, ou
√ √
a ∈ q ou b ∈ q.

6
√ √
Se q é primário e, além disso, p = q, então dizemos que q é p-primário.

Exemplo 2.4. Os ideais primários de Z são (0) e (pn ), sendo p um número primo.

Exemplo 2.5. Seja A = K[x, y, z]/(xy − z 2 ), em que K é corpo. Seja P := (x, z) ideal de A,
em que x e z denotam classes de equivalência em A. Sabemos que existe a seguinte bijeção

{ideais primos de K[x, y, z] que contém (xy − z 2 )} ←→ { ideais primos de A}.

Assim, como A/(x, z) ' K[x, y, z]/(x, z, xy − z 2 ) ' K[y] é um domínio de integridade (pois
K é corpo), temos que (x, z) é ideal primo contendo (xy − z 2 ). Logo, P é um ideal primo de
/ P 2 = (x2 , xz, z 2 ) e
A. Desta forma, P é primário. Entretanto, P 2 não é primário, pois x ∈
/ P 2 e xy = z 2 ∈ P 2 .
y∈

Exemplo 2.6. Sejam A = K[x, y] e q = (x, y 2 ). Então, A/q ' K[y]/(y 2 ). Neste anel os
divisores de zero são os múltiplos de y e, logo, são nilpotentes. Segue que q é primário e
seu radical p é (x, y). Temos, então, que p2 ( q ( p; portanto, um ideal primário não é
necessariamente uma potência de um primo.

Proposição 2.7. Se I é maximal, então I é primário. Em particular, as potências de um
ideal maximal M são m-primárias.

Demonstração. Seja m = I. Se π : A −→ A/I é o homomorfismo projetor, então segue

que m = I = π −1 (RA/I ), ou seja, a imagem de m em A/I é um nilradical de A/I. Daí,
teremos que RA/I ⊆ p, o que implica que RA/I = p. Desta forma, o anel A/I tem somente
um ideal primo. Então, todo elemento de A/I ou é uma unidade ou é nilpotente e, assim,
segue que todo divisor de zero de A/I é nilpotente. Isto implica que I é primário. Por outro

lado, se m é maximal e ,portanto, ideal primo, temos que m = mn para n > 0; logo, mn é
m-primário para todo n > 0.

Por outro lado, as potências de um ideal primo não necessariamente são primárias:
basta observar o Exemplo 2.5.

Exemplo 2.8. Considere o ideal I = (y 2 , xy) ⊂ K[x, y]. Observe que I = (y), ou seja,

/ I e xn ∈
I é primo. No entanto, xy ∈ I, mas y ∈ / I para todo n. Logo, I não é primário.

Com isso concluímos que se I for somente primo não necessariamente I será primário.

No que se segue, mostraremos algumas considerações sobre um ideal como a


interseção de ideais primários. Mas antes, exibiremos alguns lemas técnicos.

7
Tn
Lema 2.9. Se qi , sendo 1 ≤ i ≤ n, são p-primários, então q = i=1 qi é ideal p-primário.
v
un n
√ u\ \ √
Demonstração. Sabemos que q = t qi = qi = p. Seja xy ∈ q e suponha que y ∈
/ q;
i=1 i=1
√ √
então, para cada i temos que xy ∈ qi e y ∈
/ qi . Desta forma, x ∈ p = qi = q, pois qi é
p-primário. Concluímos que q é p-primário.

Lema 2.10. Seja q um ideal p-primário e seja a um elemento de A. Então, vale que:

a) Se a ∈ q, então (q : a) = A.

b) Se a ∈
/ q, então (q : a) é p-primário.

c) Se a ∈
/ p, então (q : a) = q.

Demonstração. Por definição temos que (q : a) := {b ∈ A; ab ∈ q}. Assim, o primeiro item


decorre diretamente da definição. Afim de mostrar o segundo, suponhamos que b ∈ (q : a);
então, ab ∈ q assim como a ∈
/ q temos que b ∈ p. Logo, teremos que q ⊆ (q : a) ⊆ p.
p
Tomando radicais, temos que (q : a) = p. Seja agora bc ∈ (q : a) e suponha que b ∈
/ p.
Desta maneira, abc ∈ q; daí, segue que ac ∈ q, o que implica em c ∈ (q : a). Portanto, (q : a)
é p-primário. No terceiro item, como a ∈
/ p, então se b ∈ (q : a), ab ∈ q. Consequentemente,
obtemos b ∈ q.

2.1 Decomposição Primária em Ideais

Definição 2.11. Uma decomposição primária de um ideal I de A é uma expressão de I


n
\
como interseção finita de ideais primários; ou seja, podemos escrever I como sendo I = qi .
i=1

Observe que, em geral, a decomposição primária não precisa existir. Assim,


diremos que um ideal I é decomponível se I admite uma decomposição primária.

Exemplo 2.12. Considere o anel Z e I = (12) um ideal de Z. Observe que I admite uma
decomposição primária finita, ou seja, I é decomponível. De fato, vejamos que

I = (22 ) ∩ (3),

com (22 ) e (3) ideais primários. Tome, a ∈ I, logo a = 12x, para algum x ∈ Z. Contudo,
a = 12x = 22 · (3x) = 3 · (22 x), ou seja, a ∈ (22 ) ∩ (3). Por outro lado, se a ∈ (22 ) ∩ (3) ,
temos que a = 22 x e a = 3y, com x, y ∈ Z. Contudo, o mínimo múltiplo comum de 22 e 3
é 12, ou seja, a é um múltiplo de 12, isto é, a ∈ (12). Portanto, I = (12) é um ideal que
admite uma decomposição primária, e tal decomposição é precisamente I = (22 ) ∩ (3).

8
Definição 2.13. Se um ideal I for decomponível e satisfaz as condições dadas por

a) todos os qi são distintos, e
\
b) qj * qi para 1 ≤ i ≤ n,
j6=i

dizemos que a decomposição primária é uma decomposição minimal.

A seguir, veremos um exemplo de uma decomposição primária de um ideal no


espaço K[x, y, z].

Exemplo 2.14. Seja I = (xy, yz, zx) um ideal em K[x, y, z]. Vamos encontrar a decompo-
sição primária de I. Para demonstrarmos este fato, iremos utilizar a propriedade de que se
A, B e C ∈ K[x, y, z], são polinômios mônicos, então vale a igualdade
p p p
(A, BC) = (A, B) ∩ (A, C).

Então, com este fato, concluímos que


p
(xy, yz, zx) = (xy, yz, zx)
p p
= (xy, yz, z) ∩ (xy, yz, x)
p p
= (xy, z) ∩ (yz, x)
p p p p
= (x, z) ∩ (y, z) ∩ (y, x) ∩ (z, x)
= (x, z) ∩ (y, z) ∩ (y, x).

Como os ideais (x, z), (y, z) e (y, x) são primos, concluímos que são ideais pri-
mários. Obtemos, assim, a decomposição primária do ideal I.

Do Lema 2.9, podemos obter a interseção de todos os ideais p-primários para,


assim, obter um novo ideal p-primário satisfazendo a condição a) sem mudar a decomposição
de I. Feito isso, podemos omitir qualquer termo desnecessário para obter a condição b) da
\ \
seguinte forma: suponhamos que qj ⊆ qj = qj = I; daí, segue que podemos tirar qi .
j6=i j
Portanto, toda decomposição primária pode ser vista como uma decomposição minimal.
\n
Teorema 2.15 (1o Teorema de unicidade). Seja I um ideal decomponível e seja I = qi
√ i=1
uma decomposição primária minimal de I. Defina pi := qi , para cada 1 ≤ i ≤ n. Então,
p
os pi ’s são precisamente os ideais primos do conjunto { (I : a) | a ∈ A}.

Demonstração. Para cada a ∈ A temos que


n
! n
\ \
(I : a) = qi : a = (qi : a).
i=1 i=1

9
Dessa forma, vemos que
n
\ \
p p
(I : a) = (qi : a) = pj .
i=1 a∈q
/ j

\n
p
Suponha que (I : a) seja primo; então, segue da Proposição 29 (lembrando que se p = Ii ,
p i=1
então p = Ii para algum 1 ≤ i ≤ n) que (I : a) = pj para algum 1 ≤ j ≤ n. Logo, todo
p
ideal primo da forma (I : a) é um dos pj .
\
Reciprocamente, para cada 1 ≤ i ≤ n, existe ai ∈ / q i e ai ∈ qj pois a
a∈q
/ j
p
decomposição é minimal; logo, temos que (I : ai ) = pi .

Como consequência desse teorema, vemos que os pi ’s não dependem de uma


decomposição particular de I.
Note que não é verdade que todas as componentes primárias são independentes da
decomposição. Por exemplo, (x2 , xy) = (x) ∩ (x2 , y) = (x) ∩ (x, y 2 ) são duas decomposições
primárias minimais distintas.
Segue da parte final da demonstração do teorema anterior que para cada 1 ≤ i ≤
\
n, existe ai ∈ A tal que ai ∈
/ qi e ai ∈ qj . Assim, (I : ai ) = ∩nj=1 (qj : ai ) = (qi : ai ), pois,
a∈q
/ j
pelo lema anterior (qj : ai ) = A para todo j 6= i e logo (também pelo lema anterior) (I : ai )
é pi -primário.
Os ideais primos pi do 1o Teorema de Unicidade são chamados de associados a
I, e os denotaremos por Assoc(I) = {p1 , · · · , pn }. Segue que um ideal I é primário se, e
somente se, ele tem um único ideal primo associado.
Dizemos que os elementos minimais do conjunto Assoc(I) são isolados de I, i.e.,
p ∈ Assoc(I) é isolado se sempre que existir p0 ∈ Assoc(I) tal que p0 ⊂ p, então p0 = p.
Se p ∈ Assoc(I) não é isolado, então dizemos que p é embutido. Assim, p ∈ Assoc(I) é
embutido se existe p0 ∈ Assoc(I) tal que p0 ( p. Segue do fato de Assoc(I) ser finito que
todo ideal embutido contém um ideal isolado.

Proposição 2.16. Seja I um ideal decomponível. Então, todo ideal primo p ∈ I contém um
ideal primo isolado associado a I. Logo, os ideais primos isolados de I são precisamente os
elementos minimais do conjunto V (I).
n n n
\ √ \ √ \
Demonstração. Se p ⊃ I = qi , então p = p⊃ qi = pi . Logo, temos que p ⊃ pi
i=1 i=1 i=1
para algum i e, portanto, p contém um ideal primo isolado de I. Por outro lado temos que,
n n
\ √ \
como I = qi , então I ⊂ I = pi ⊂ pi para todo 1 ≤ i ≤ n. Logo, pi ∈ V (I) para
i=1 i=1

10
todo 1 ≤ i ≤ n, ou seja, Assoc(I) ⊂ V (I). Vejamos que os isolados de I são os elementos
minimais de V (I): seja pi ideal isolado de I e suponha que existe em V (I) um ideal primo p
de A tal que p ⊂ pi . Pela primeira parte desta proposição existe um ideal isolado pj tal que
pj ⊂ p ⊂ pi , mas como pi é isolado, temos que pj = pi e, portanto, p = pi . Concluímos que
pi é um elemento minimal de V (I). Seja agora p um elemento minimal de V (I). Novamente
existe um ideal primo isolado pi tal que pi ⊂ p, mas pi ∈ V (I). Logo, pela minimalidade de
p, devemos ter p = pi .
C[x,y]
Exemplo 2.17. Calcularemos agora os ideais primos minimais de A = (x2 ,xy)
. Pelo TCI
os ideais primos minimais de A correspondem aos ideais primos minimais de C[x, y] que
contém (x2 , xy), i.e., correspondem aos elementos minimais do conjunto V (x2 , xy). Segue
da proposição anterior que estes elementos são os ideais isolados de (x2 , xy). Seja (x2 , xy) =
(x)∩(x, y)2 uma decomposição primária minimal qualquer de (x2 , xy), então os ideais primos
associados são:
p
a) (x) = (x), pois (x) é ideal primo de C[x, y].
p
b) (x, y)2 = (x, y) pois (x, y) é um ideal maximal de C[x, y] e toda potência de um maximal
m é m-primário.

Logo, Assoc(x2 , xy) = {(x), (x, y)}. Como (x) ( (x, y), temos que o único ideal
isolado de (x2 , xy) é (x). Daí, teremos que (x̄) é o único ideal primo minimal de C[x,y]
(x2 ,xy)
.
n
\
Proposição 2.18. Sejam I um ideal decomponível e I = qi uma decomposição minimal
√ i=1
com qi = pi . Então,
[n
pi = {a ∈ A|(I : a) 6= I}.
i=1

Em particular, se o ideal nulo 0 é decomponível, então o conjunto D dos divisores do zero


de A é a união de todos os ideais primos pertencentes a Assoc(0).
n
\
A
Demonstração. Se I é decomponível em A, então 0 é decomponível em I
. Assim, 0 = q̄i ,
i=1
A
em que q̄i é a imagem de qi em I
pela projeção canônica, que é primária. Logo, para
demonstrar essa proposição, é suficiente mostrar apenas que se 0 é decomponível, então o
conjunto D dos divisores do zero de A é a união de todos os ideais primos pertencentes a
Assoc(0).

Dessa forma, seja 0 = ∩ni=1 qi , com qi = pi . Note que podemos escrever D como
\p
D= (0 : a).
a6=0

11
p
Note, também, que (0 : a) = ∩a∈q
/ j pj ⊂ pj para algum j. Dessa forma, vemos que D ⊂
p
∪ni=1 pi . Como cada pi é da forma (0 : a), para algum a ∈ A, segue que D ⊃ ∪ni=1 pi .
Portanto, D = ∪ni=1 pi .

Definição 2.19. Um subconjunto Σ ⊆ Assoc(I) do conjunto dos ideais primos associados


a I é dito isolado se satisfaz a seguinte condição: se p0 ∈ Assoc(I) e p0 ⊆ p para algum
p ∈ Σ, então p0 ∈ Σ.
[
Observação 2.20. Considere S = A − p um conjunto multiplicativo, sendo Σ um con-
p∈Σ
junto isolado de ideais primos associados a I. Para qualquer ideal primo p0 ∈ Assoc(I)
[
temos que, se p0 ∈ Σ, então p0 ∩ S = ∅. Agora, se p0 ∈
/ Σ, obtemos que p0 * p; caso
p∈Σ
contrário, teríamos p0 ⊆ p para algum p ∈ Σ, o que implicaria que p0 ∈ Σ. Contradição.
Assim, p0 ∩ S 6= ∅.

Teorema 2.21 (Segundo Teorema de Unicidade). Sejam I um ideal decomponível de um


n
\
anel A, I = qi uma decomposição primária minimal de I e Σ = {pi1 , . . . , pin } um conjunto
i=1
isolado de ideais primos associados a I. Então, qi1 ∩· · ·∩qim é independente da decomposição.

Demonstração. Considere S um conjunto multiplicativo.

Afirmação 1: Seja J um ideal de A; então,


[
ρ−1 (S −1 J) = (J : s).
s∈S

De fato, a ∈ ρ−1 (S −1 J) ⇔ ρ(a) = a


1
∈ S −1 J ⇔ 1
a
= x
s
para algum x ∈ J e s ∈ S
[
⇔ (as − x)t = 0 para algum t ∈ S ⇔ ast ∈ J ⇔ a ∈ (J : s).
s∈S

Afirmação 2: Se q é um ideal p−primário e S ∩ p = ∅ então ρ−1 (S −1 q) = q.


De fato, pela afirmação 1 temos que
[
ρ−1 (S −1 q) = (q : s);
s∈S

assim, se s ∈ S então s ∈
/ p, pois S ∩ p = ∅. Logo pelo Lema 2.10 temos que (q : s) = q,
para todo s ∈ S. Portanto, ρ−1 (S −1 J) = q.

Afirmação 3: Considerando as hipóteses do teorema, suponha que os qi ’s são numera-


dos de tal forma que S intercepta pm+1 , . . . , pn , mas não intercepta p1 , . . . , pm . Então
m
\
ρ−1 (S −1 I) = qi .
i=1

12
De fato, podemos verificar que
m
! m
\ \
−1 −1 −1 −1
ρ (S I) = ρ S qi = ρ−1 (S −1 qi ).
i=1 i=1

Desta forma, pela Afirmação 2, temos ρ−1 (S −1 qi ) = qi , para todo i − 1, . . . , m.

[
Para finalizar a demonstração, tome S = A − p; então, segue da Observação 2.20 que S
p∈Σ
intercepta os p ∈ Assoc(I)−Σ e não intercepta os p ∈ Σ. Desta maneira, segue da Afirmação
3 que
m
\
−1 −1
ρ (S I) = qij ;
j=1

então, a interseção dos qij depende somente de I pois, pelo Primeiro Teorema de Unicidade,
os pi ’s dependem somente do ideal I e não da decomposição primária específica de I.

Corolário 2.22. As componentes primárias isoladas (i.e., as componentes primárias qi


correspondentes aos ideais primos isolados pi ) são univocamente determinadas por I.

Demonstração. Usando o teorema anterior e aplicando ao conjunto isolado Σ = {p}, sendo


p é um ideal isolado de I, temos que a componente primária q correspondente ao ideal primo
isolado p satisfaz q = ρ−1 (Ip ) (aqui S = A − p).

2.2 Aplicações da Decomposição Primária em Anéis No-


etherianos

Nessa seção mostraremos que todo ideal próprio de um anel noetheriano admite
decomposição primária. Para isso, apresentaremos dois lemas e, em seguida, apresentaremos
o resultado principal. Logo depois, apresentaremos algumas proposições que acarretam num
importante teorema, no qual verificamos que um anel é artiniano se, e somente se, este anel
é noetheriano e a sua dimensão é 0.

Definição 2.23. Dizemos que um ideal I é irredutível se toda vez que I = J ∩ K obtemos
ou I = J ou I = K.

Lema 2.24. Em um anel noetheriano A todo ideal é uma interseção finita de ideais irredu-
tíveis.

Demonstração. Considere U , o conjunto dos ideais do anel A que não são interseções finitas
de ideais irredutíveis. Suponha que U 6= ∅; logo, U possui elemento maximal I. Como I é
redutível, segue que I = J ∩ K, no qual I ⊂ I e J ⊂ K. Pela maximalidade de I temos

13
que J * U e K * U , ou seja, J e K são interseções finitas de ideias irredutíveis, assim I é
interseção finita de ideais irredutíveis, o que aponta uma contradição. Portanto, U = ∅.

Lema 2.25. Em um anel noetheriano todo ideal irredutível é primário.

Demonstração. Passando ao anel quociente, é suficiente verificar que, se o ideal nulo é irre-
dutível então tal anel é primário. Seja xy ∈ (0), com y 6= 0, e considere a cadeia de ideais
Ann(x) ⊆ Ann(x2 ) ⊆ · · · ⊆. Pela condição da cadeia ascendente, esta cadeia é estacionária,
ou seja, existe n > 0 tal que Ann(xn ) = Ann(xn+1 ) = · · · . Segue que (xn ) ∩ (y) = (0) pois,
se a ∈ (y) então ax = a0 yx = 0 e se a ∈ (xn ) então a = bxn ; logo, ax = bxn+1 = 0 o que
implica que b ∈ Ann(xn+1 ) = Ann(xn ). Assim bxn = 0, i.e., a = 0. Como (0) é irredutível e
(y) 6= 0 então devemos ter xn = 0, e portanto temos que (0) é primário.

Teorema 2.26. Em um anel noetheriano A todo ideal admite uma decomposição primária.

Demonstração. A prova do teorema segue imediatamente dos dois lemas anteriores., uma vez
que todo ideal noetheriano é interseção finita de ideais irredutíveis e todo ideal irredutível é
primário.

Proposição 2.27. Seja A um anel noetheriano. Então:

a) Todo ideal I contém uma potência do seu radical.

b) O nilradical de A é nilpotente.

Demonstração. a) Seja I um ideal de A e considere J = rad(I). Como A é noetheriano,


então J é finitamente gerado, digamos por {x1 , x2 , ..., xt } ⊂ A. Assim, existem inteiros
positivos
ni ∈ N tais que xni i ∈ I.

Seja N = max{ni }. Vamos mostrar que se m > (N − 1)t, então J m ⊆ I. Primeiramente,


observe que XiN ∈ I para todo i = 1, · · · , n. Note que J m é gerado por

{xi11 · · · xitt , com ij ≥ 0 e i1 + · · · it = m}.

Afirmamos que existe j ∈ {1, ..., t} tal que ij ≤ N , implicando que J m ⊂ I. De fato, se para
todo j tivéssemos ij ≤ N1 , então somando essa desigualdade para j = 1, ..., t, concluiríamos
que m ≥ (N − 1)t, o que é absurdo, pois m > (N − 1)t.
b) Sabemos que em um anel noetheriano A, o nillradical de A, que denotaremos
por nill(A), é dado por
\ p
nill(A) = m= (0),
m∈Specmax (A)

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concluindo então que nill(A) é o radical do ideal (0). Então, pelo item a), concluímos que
(0) contém uma potência do seu radical, isto é, existe k ∈ N, tal que

nill(A)k = 0.

Segue o resultado desejado.

Proposição 2.28. Seja I um ideal próprio de um anel Noetheriano A. Então os ideais


primos associados a I são precisamente os ideais primos que ocorrem no conjunto de ideais
(I : a) com a ∈ A.

Demonstração. Pelo Primeiro Teorema de Unicidade temos que os ideais primos associados
p
a I são os ideais primos que ocorrem no conjunto de ideais (I : a) com a ∈ A. Logo se
p
(I : a) é um ideia primo p de A então (I : a) = (I : a) = p e portanto (I : a) é um ideal
primo associado a I.
\n
Reciprocamente, seja I = qi uma decomposição primária minimal de I e seja
i=1
√ \
pi = qi . Denote por Ii = qj 6= I. Pelo desenvolvimento da demonstração do Primeiro
j6=i
p
Teorema de Unicidade, temos que pi = (I : a) para qualquer a ∈ Ii e a ∈
/ qi , então
(I : a) ⊆ pi . Desta maneira, como qi é pi -primário no anel Noetheriano A, segue da
proposição anterior que existe m ∈ N tal que pm
i ⊆ qi , com isto

Ii pm m
i ⊆ Ii ∩ pi ⊆ Ii ∩ qi .

m−1
Seja m ≥ 1 o menor natural tal que pm
i ⊆ qi e seja b ∈ Ii pi ⊆ Ii ∩ pm−1
i tal que b ∈
/ I.
Então bpi ⊆ I, logo para esse b temos (I : b) ⊇ pi , além disso, como b ∈ Ii e b ∈
/ I segue que
b∈
/ qi , assim (I : b) ⊆ pi .
Portanto, os ideais primos associados a I são exatamente os ideais primos da
forma (I : a) com a ∈ A.

Sabemos, da teoria de espaços noetherianos, que se R é um espaço artiniano,


então R é noetheriano. Nesse sentido, podemos nos perguntar: quando vale a reciprocidade?
Veremos, nesta seção, utilizando a decomposição primária de um ideal que, se o anel R é
noetheriano e possui dimensão 0, então R è artiniano. Para demonstrarmos este resultado
precisaremos de uma proposição e uma observação que veremos a seguir.

Observação 2.29. Quando consideremos um módulo sobre um corpo K, este módulo se


torna um espaço vetorial. Então, para módulos sobre o corpo K são equivalentes as condições:
V tem dimensão finita ⇐⇒ V é noetheriano ⇐⇒ V é artiniano.

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Proposição 2.30. Sejam A um anel e m1 , m2 , ..., mn ideias maximais tais que m1 · · · mn =
0. Então, R é noetheriano se e somente se é artiniano.

Demonstração. Considere a cadeia de ideais

A ⊇ m1 ⊇ m1 m2 ⊇ · · · ⊇ m1 m2 · · · mn = 0. (2.1)

Defina
Mi = m1 m2 · · · mi .

Assim, podemos rescrever a cadeia em (2.1) como

A ⊇ M1 ⊇ · · · ⊇ Mn = 0. (2.2)

Observe que cada módulo quociente Mi−1 /Mi é um A/mi -módulo, pois está bem definida a
aplicação

Mi−1 /Mi × A/mi −→ Mi−1 /Mi


(mMi , ami ) 7−→ maMi .

Além disso, como mi é maximal, então A/mi é um corpo. Concluímos, daí, que Mi−1 /Mi
é um espaço vetorial sobre o corpo A/mi . Logo, pela Observação 2.29, concluímos que
Mi−1 /Mi é um A/mi -módulo artiniano, se e somente se, é um A/mi -módulo noetheriano.
Além disso, note que como mi é maximal, então seus A/mi -submódulos são exatamente
os mesmos que seus A-submódulos. Desta forma, obtemos que Mi−1 /Mi é um A-módulo
artiniano se, e somente se, é um A-módulo noetheriano.
Como obtemos uma equivalência de artiniano e noetheriano para os espaços quo-
cientes Mi−1 /Mi , é natural considerarmos as sequências exatas curtas:
i π
0 → M1 ,→ A  A/Mi → 0
i π
0 → M2 ,→ M1  M1 /M2 → 0
..
.
i π
0 → Mi ,→ Mi−1  Mi−1 /Mi → 0
..
.
i π
0 → Mn−1 ,→ Mn−2  Mn−2 /Mn−1 → 0
i π
0 → Mn ,→ Mn−1  Mn−1 /Mn → 0. (2.3)

Suponha que A seja A-módulo noetheriano; então, M1 e A/M1 são noetherianos


e, assim, M2 e M1 /M2 são A-módulos noetherianos. Continuando esse procedimento nas
sequências exatas curtas definidas acima, concluímos que Mi−1 /Mi são A-módulos noethe-
rianos, para todo i = 1, · · · , n. Utilizando novamente a observação 2.29, obtemos que os

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quocientes Mi−1 /Mi são A-módulos artinianos para todo i = 1, ..., n. Em particular, para
i = n, isto é, Mn−1 /Mn é A-módulo artiniano; no entanto, Mn = m1 · · · mn = 0, o que ga-
rante que Mn−1 é A-módulo artiniano. Usando a sequência exata curta em (2.3), concluímos
que e Mn−2 /Mn−1 é A-módulo artiniano, o que implica que Mn−2 é A-módulo artiniano.
Aplicando esse processo sucessivamente nas cadeias em (2.3), concluímos que A é A-módulo
artiniano.
De modo análogo, supondo A artiniano e refazendo os mesmos argumentos apre-
sentados anteriormente, concluímos que A é noetheriano.

Por fim, demonstraremos o teorema que fornecerá uma equivalência entre anéis
noetherianos e anéis artinianos.

Teorema 2.31. Seja A um anel. Então, são equivalentes:

a) A é artiniano

b) A é noetheriano e dim A = 0.

Demonstração. A ideia principal desta demonstração será encontrar ideais maximais que
satisfaçam a Proposição 2.30.
Inicialmente, suponha que A seja artiniano. Então dim A = 0 e A possui uma
quantidade finita de ideais maximais. Considere, daí, m1 , m2 , ..., mn os ideais maximais de
A. Seja R o anel radical de Jacobson de A, isto é,
\ n
\
R = m = mi .
m∈Specmax (A) i=1

Como o anel de Jacobson é nilpotente, existe k ∈ N tal que Rk = 0. Então, obtemos


n
Y n
\ k
mki ⊆ mi = Rk = 0,
i=1 i=1

ou seja, concluímos que o ideal 0 é escrito como um produto de ideais maximais; desta
maneira, aplicando a Proposição 2.30, concluímos que A é noetheriano.
Reciprocamente, suponha que A seja um anel noetheriano e dim A = 0. Como
dim A = 0, concluímos que todo ideal primo de A é um ideal maximal (Spec(A) = Specmax (A)).
Também podemos concluir que todo ideal primo é também um ideal primo minimal de A.
Como A é noetheriano, todo ideal tem uma decomposição primária (via Teorema 2.26), em
particular o ideal nulo; logo, os ideais primos associados a (0) (que são os elementos minimais
de Spec(A)) são os ideais primos minimais de A. Como todo ideal primo é maximal, segue

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que os ideais minimais são também maximais, concluindo então que A possui um número
finito de ideais maximais m1 , ..., mn . Assim, podemos escrever o anel de Jacobson como
\ n
\
R= m = mi .
m∈Specmax (A) i=1

Por outro lado, como todo ideal primo é maximal, então o anel de Jacobson coincide com o
ideal nilradical de A (que é a interseção de todos os ideais primos). Como A é noetheriano,
o ideal nilradical de A é nilpotente, isto é, existe k ∈ N tal que
n
Y n
\ k
mki ⊆ mi = Rk = 0.
i=1 i=1

Assim, aplicando a Proposição 2.30, concluímos que A é Artiniano.

Corolário 2.32. Em um anel artiniano A todo ideal admite uma decomposição primária.

Demonstração. Como todo anel artiniano A é noetheriano, e em espaços noetherianos vale


a decomposição primária, obtemos o desejado.

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Referências Bibliográficas

[1] Atiyah, M. F., and Macdonald, I. G. Introduction to commutative algebra, eco-


nomy ed. Addison-Wesley Series in Mathematics. Westview Press, Boulder, CO, 2016.

[2] Eisenbud, D. Commutative algebra, vol. 150 of Graduate Texts in Mathematics.


Springer-Verlag, New York, 1995.

[3] Martin, M. E. Álgebra comutativa. Notas de aula (2014).

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