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A

GRAMÁTICA
LINGUÍSTICA

J. Bento

Limoeiro do Norte/CE – novembro/2023


2

SUMÁRIO

* ASPECTOS DA SINTAXE TRADICIONAL 004


* DIMENSÕES SINTÁTICAS DA LÍNGUA 023
* ESTRUTURA SINTÁTICA BÁSICA CONFORME A GRAMÁTICA TRADICIONAL 025
* PROPOSTA DE MODELO DE DESCRIÇÃO SINTÁTICA 026
* PROGRAMA DE ANÁLISE SINTÁTICA 038
* O MECANISMO BÁSICO DA SINTAXE: COMPLEMENTAÇÃO E ADJUNÇÃO 041
* MODELOS ESTRUTURAIS DE ORAÇÃO 043
* MODELO DE APRESENTAÇÃO DA ANÁLISE SINTÁTICA 047
* FATIAMENTO SINTÁTICO 052
* MODELO CLÁSSICO DE DESCRIÇÃO SINTÁTICA 056
* DOIS ASPECTOS ELEMENTARES DA SINTAXE 059
* ANÁLISE SINTÁTICA DA ORAÇÃO COM BASE NO SIGNIFICADO DO VERBO – A COMPLEMENTAÇÃO 062
* FOCOS DE PROBLEMAS NA ANÁLISE SINTÁTICA TRADICIONAL 065
* PERSPECTIVA DE FUNDO PARA O PROCEDIMENTO DE ANÁLISE SINTÁTICA 067
* FUNÇÃO, POSIÇÃO E CLASSE EM GRAMÁTICA 069
* REALIDADE, COSMOVISÃO, INTERPRETAÇÃO E SINTAXE 071
* PERÍODO E ORAÇÃO 072
* ORAÇÃO NO TEXTO 073
* ISOLAMENTO DE PERÍODOS E ORAÇÕES SOB O TEXTO 075
* CLASSIFICAÇÃO DO SUJEITO 078
* INDETERMINAÇÃO DO SUJEITO EM NORMA PADRÃO E VARIANTE COLOQUIAL 079
* INDETERMINAÇÃO DO SUJEITO EM PORTUGUÊS 081
* INTERPRETAÇÕES AVENTADAS SOBRE PASSAGEM DO TEXTO “CÍRCULO VICIOSO” 083
* DESLOCAMENTO DO ADJETIVO NO SINTAGMA NOMINAL 087
* CONECTIVOS INTRASSINTÁTICOS 088
* SINTAXE DE PROPOSIÇÃO COM PRONOME OBLÍQUO ÁTONO INTERCALADO ENTRE VERBOS 089
* ADJUNTO ADNOMINAL vs. COMPLEMENTO NOMINAL [estratégia semântica de identificação] 090
* ADJUNTO ADNOMINAL, APOSTO E PREDICATIVO DO OBJETO 093
* ESTRUTURA TÍPICA PARA CONFUSÃO ENTRE ADJUNTO ADNOMINAL E COMPLEMENTO NOMINAL 096
* FORMA ADJETIVAL EM FINAL DE ORAÇÃO SVO 098
* A MORFOLOGIA NO CONTEXTO DA ESTRUTURA DA LÍNGUA 099
* SISTEMA FLEXIONAL DO PORTUGUÊS E OS CONCEITOS DE SISTEMA – NORMA – FALA 102
* MODELO INTEGRAL DE ANÁLISE MÓRFICA 103
* A CLASSE DA PALAVRA PELA FUNÇÃO SINTÁTICA 104
* CLASSIFICAÇÃO DOS MORFEMAS DO PORTUGUÊS 109
* CLASSES DE PALAVRAS E SUAS AFIXAÇÕES 114
* ESTRUTURA MÓRFICA DO PORTUGUÊS 116
* ESTRUTURA MORFOLÓGICA DO PORTUGUÊS 117
* ESTRUTURA MORFOSSINTÁTICA DO PORTUGUÊS 118
* FLEXÃO NOMINAL 122
* FLEXÃO VERBAL 123
* FLEXÃO VERBAL[dmt’s e vt’s em distribuição complementar] 129
* SISTEMA FLEXIONAL DO VERBO NO PORTUGUÊS PADRÃO ESCRITO 133
* COMPLEXO FLEXIONAL DO VERBO NO PORTUGUÊS PADRÃO 136
* ESTRUTURAS FLEXIONAIS DO VERBO NO PORTUGUÊS PADRÃO ESCRITO 140
* ALTERNÂNCIA DE GÊNERO E SUAS LEITURAS MÓRFICO-SEMÂNTICAS 201
* FLEXÃO DE GÊNERO EM PORTUGUÊS E O CASO POMBO/POMBA 202
* GÊNERO NEUTRO EM PORTUGUÊS 203
* DEFINIÇÃO DE GÊNERO GRAMATICAL 205
* GÊNERO GRAMATICAL EM PORTUGUÊS E SEXUALIDADE HUMANA 206
* GÊNERO NEUTRO, IDEOLOGIA DE GÊNERO E FEMISMO 209
* “LINGUAGEM NEUTRA”? – NÃO, MESMO! 211
* CATEGORIA IDEOLÓGICA DO GÊNERO NEUTRO 214
* MORFEMA ZERO & MORFEMA DELTA 215
* RESTRIÇÕES MÓRFICO-FLEXIONAIS EM PORTUGUÊS 216
* NEUTRALIDADE EM MORFOLOGIA E O GÊNERO NEUTRO 217
* PRONOMES PESSOAIS DO CASO RETO 219
* CATEGORIZAÇÃO GRAMATICAL DOS NOMES EM PORTUGUÊS 222
* GÊNERO GRAMATICAL DOS PRONOMES PESSOAIS NO PORTUGUÊS PADRÃO 224
* UM EXEMPLO DE CACHORRADA NA LÍNGUA PORTUGUESA 225
* “VOCÊ/SENHOR”, SEGUNDA PESSOA/TERCEIRA PESSOA 226
* AFIXOS COMUNS DO PORTUGUÊS COLOQUIAL 227
* AFIXAÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DOS VOCÁBULOS 232
* MORFOLOGIA DOS NUMERAIS CARDINAIS 234
* O PROCESSO DA DERIVAÇÃO MORFOLÓGICA 237
* VOCÁBULO FORMAL 238
* VOCÁBULO MÓRFICO EM PORTUGUÊS 240
* CLASSIFICAÇÃO DOS VOCÁBULOS [breve resenha] 248
* CLASSIFICAÇÃO DOS VOCÁBULOS EM VISÃO TRADICIONAL MELHORADA 259
* CLASSIFICAÇÃO DOS VOCÁBULOS 261
* CLASSIFICAÇÃO MORFOLÓGICA DOS VOCÁBULOS 265
* APÊNDICE 268
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3

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ASPECTOS DA SINTAXE TRADICIONAL

J. Bento

1.Objeto da sintaxe

O objeto de estudo da sintaxe comporta dois níveis de análise:

A – Nível oracional – tem como núcleo (postulado) o verbo;


B – Nível sintagmático – tem como núcleo (postulado) o nome (ou pronome).

Numa investigação sintática, podem ser observadas (embora não necessariamente nesta
sequência):

a)A ordem dos termos – o lugar que compete a cada um dos elementos linguísticos que compõem a
estrutura, seja em nível oracional, seja em nível sintagmático. Assim, por exemplo, é aceitável a
construção –

*A casa da esquina

– da mesma forma que se rejeita algo do tipo –

*Casa a esquina da

b)A concordância dos termos – as diretrizes flexionais exigidas para a construção linguística, em
termos da harmonização morfemática. Assim, em português, se tivermos um núcleo nominal na
forma masculina/plural, seus especificadores se adequam a esta formalização: o núcleo “casas”
[feminino/plural], por exemplo, induzirá seus especificadores a se comportarem com o caráter de
[feminino/plural]:

*casas
*estas casas
*casas amarelas

c)A interligação dos termos – construções há cujos elementos fundamentais se conectam a outros
elementos através de partículas linguísticas existentes com esta função. Para se adjungirem “casa” e
“praia” no sintagma, deve ser observada a inserção de um item conectivo, chamado de preposição:

*casa + praia = casa de praia

d)A especificação de sentido (ou função sintática) – os núcleos sintáticos (das orações e sintagmas)
costumam vir adjungidos de elementos linguísticos capazes de especificar-lhes as noções, naqueles
inscritas. Estes especificadores podem ser de natureza obrigatória (estruturais), como em –

*comer

– que, na formulação oracional, reclama o que tradicionalmente se chama de sujeito:


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*João come.

– ou facultativa (adestruturais, ou meramente comunicativas), como em –

*boneca de pano

– na qual se percebe a dispensabilidade de “de pano”, estipulada como informação meramente


adicional ao construto “boneca”.
e)A compatibilização semântica – as restrições de sentido que concorrem para a aceitação/rejeição
de adjunções entre elementos linguísticos na construção. Enquanto se aceita –

*casa amarela –

tende-se a rejeitar algo do tipo –

*casa pontiaguda

Considerações sobre a compatibilidade semântica esbarram, comumente, nas potencialidades


expressivas, ou evocativas, da língua em uso, que alargam vertiginosamente o fenômeno da restrição
aqui referido, chegando ao ponto de não se dispor de restrição alguma. Esta é uma questão a ser
resolvida na Estilística.
Resumidamente, e seguindo a exposição acima, esboçamos:

SINTAXE

de de de de de
colocação concordância regência especificação adequação
semântica
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2.Estrutura sintática geral

a)Predicado verbal

Voc S P Atit

mod V CV1,2 AGP ADV


Existente ênfase Intransitivo algo/ {agente} modo
Inexistente intensidade Transitivo alguém lugar
negação Passivo lugar tempo
dúvida assunto função/
finalidade
causa
meio/
instrumento
companhia
comparação
conformação
contrariedade
condição
consequência
assunto
proporção
valor

Osub Osub Osub Osub


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b)Predicado nominal

Voc S P Atit

mod V PRED ADV


Existente ênfase {Ligação} atributo modo
Inexistente intensidade modo lugar
negação tempo tempo
dúvida função/
finalidade
causa
meio/
instrumento
companhia
comparação
conformação
contrariedade
condição
consequência
assunto
proporção
valor

Osub Osub Osub


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c)Predicado verbo-nominal

Voc S P Atit

mod V CV1,2 PRED ADV


Existente ênfase Intransitivo algo/ atributo modo
Inexistente intensidade Transitivo alguém modo lugar
negação lugar tempo tempo
dúvida assunto função/
finalidade
causa
meio/
instrumento
companhia
comparação
conformação
contrariedade
condição
consequência
assunto
proporção
valor

Osub Osub Osub Osub


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d)Classificação do Sujeito e Predicado

*Sujeito

SUJEITO

TIPO SUBTIPO CARACTERIZAÇÃO

EXPRESSO presente linguisticamente em forma de


sintagma e toda desinência número-pessoal,
com referenciação semântica específica:
“João roubou a bola.”

DESINENCIAL presente linguisticamente apenas em forma


EXISTENTE de desinência número-pessoal, com
referenciação semântica específica:
“Roubamos a bola” {nós}

INDETERMINADO presente linguisticamente em forma de 3ª


pessoa-plural ou partícula “se”, com
referenciação semântica inespecífica:
“Roubaram a bola.” {quem?}

INEXISTENTE presente linguisticamente em forma de 3ª


pessoa-singular/plural, sem referenciação
semântica:
“Choveu ontem.” {quem ou o que choveu?}

*Predicado

PREDICADO

TIPO VERBAL PREDICAÇÃO EXEMPLIFICAÇÃO

Intransitivo Verbal “João não trabalha.verbo em si”

Intransitivocom predicativo Verbo-nominal “João não trabalhaverbo feliz.predicativo”

Transitivo Verbal “João roubou a bola.compl. verbal”

Transitivocom predicativo Verbo-nominal “João achou a bolacompl. verbal bonita.predicativo”

De ligação Nominal “João é ladrão.predicativo”

Apassivado Verbal “A bola foi roubada por João.agente da passiva”


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3.Transitividade/intransitividade verbal

1]Princípio teórico

S P

SISTEMA

Verbo Adjunto

variante variante variante


sintático- sintático- sintático-
* semântica1 semântica2 semântican... *

NORMA
VALENCIAL

FALA
2]Correntes de pensamento

TRANSITIVIDADE

UNA MÚLTIPLA
↓ ↓
*Norma valencial variante *Sistema variante
*um só verbo *mais de um verbo
[transitividade fixa] [transitividade flexível]
*Facultatividade *Obrigatoriedade
[+/- alteração de sentido s/ alteração sintática] [+ alteração de sentido c/ alteração sintática]
*Elipse: Ø *Elipse: Δ

A corrente “una” de pensamento propõe que há um só verbo cuja transitividade é estabelecida


pela norma valencial, definindo-se como elipse de termos as construções sintáticas que não
contemplam toda a norma valencial. Tem, ao que parece, dificuldade em explicar os casos de
elementos que não estão previstos na norma valencial, mas que depois passam a ser tidos como
componentes da transitividade, como no exemplo –

João trabalha.

– cuja norma valencial é de intransitividade, que concorre com sentenças em que o verbo “trabalhar”
adquire complementação –
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João trabalha o projeto.

– a menos que identifique como norma valencial do verbo “trabalhar” o que se passa na segunda
oração, ficando a notação de intransitividade em “trabalhar”, da primeira oração, como variante
elíptica.
A corrente “múltipla” de pensamento admite, no sistema, a possibilidade de mais de um verbo
com a mesma natureza significante (homonímia), de acordo com as distinções de transitividade, que
estão em correlação com a alteração de sentido. Ou seja, se tomarmos um determinado verbo, por
exemplo, “fumar”, e supondo-se que este se revela com sentidos diferentes, a depender da atualização
ou não atualização de determinado item sintático, estaremos diante de verbos homônimos, e não de
um único verbo com variação da norma valencial:

João fuma. → fuma1 [ser fumante]


João fuma cigarros. → fuma2 [fuma determinado tipo de fumígeno]

Nestas circunstâncias, um verbo do tipo “comer”, em paralelo com as duas correntes de


pensamento sobre a transitividade, e supondo-se diferença de sentido entre si, deveria ser assim
descrito:

João come. [João é comedor]


João come melancia. [João degusta algo (= melancia)]

a)Corrente UNA
SISTEMA

“comer x”

NORMA VARIANTE
↓ ↓
“comer x” “comer Ø”

FALA
“comer x” ou “comer Ø”

b)Corrente MÚLTIPLA
SISTEMA

“comer x” “comer”

NORMA NORMA
↓ ↓
“comer x” “comer Δ”

FALA FALA
↓ ↓
“comer x” “comer Δ”
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4.Estruturas sintáticas específicas

a)Verbo “passivo”

(Voc) S P (Atit)

(mod) V (+/- PRED) AGP (ADV)


{passivo}

b)Verbo de ligação

(Voc) S P (Atit)

(mod) V PRED (ADV)


{ligação}
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c)Verbo intransitivo

(Voc) S P (Atit)

(mod) V (PRED) (ADV)


{intransitivo}

d)Verbo transitivo

(Voc) S P (Atit)

(mod) V CV1,2 (+/-PRED) (ADV)


{transitivo}
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5.Estrutura dos termos sintáticos

a)Estrutura nominal geral

SINTAGMA NOMINAL
[S/CV/PRED/AGP/ADV]

(+/-prep) ADN mod N ADN CN AP


{especificação} ênfase substantivo {especificação} {complemento} {explicitação}
intensidade pronome
negação adjetivo
dúvida advérbio

Osub Osub Osub

b)Estruturas nominais específicas

b1)Núcleo substantival

ESTRUTURA NOMINAL
[núcleo: substantivo]

(ADN)
(CN)
(+/-prep) (mod) (ADN) SUBS (AP)

b2)Núcleo pronominal

ESTRUTURA NOMINAL
[núcleo: pronome]

(ADN)
(+/-prep) (mod) PRO (AP)
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b3)Núcleo adjetivo-advérbial

ESTRUTURA NOMINAL
[núcleo: adjetivo/advérbio]

(CN)
(mod) ADJ/ADV (AP)

6.Tipificação geral da locução verbal

CONSTRUÇÃO

Verbo auxiliar + Verbo principal



ser
ter
haver
poder
ir
etc.

infinitivo gerúndio particípio

sujeito sujeito leitura leitura


[+ alternância] [- alternância] [verbal] [adverbial/adjetival]
↓ ↓ ↓
complemento modo atributo

LOCUÇÃO VERBAL

Na condição de auxiliares, os verbos listáveis costumam encerrar uma carga semântica


peculiar. Por exemplo, em –

*Vou andando pela rua.


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– se “andando” tiver leitura verbal, “ir” (auxiliar) tem sentido equivalente a [estar]: “estar
andando”; se “andando” tiver leitura adverbial-modal, “ir” (verbo nuclear), tem sentido de
[deslocamento]: “ir a algum lugar, andando”.
Entende-se a notação [+/- alternância], relativamente ao sujeito, através da possibilidade (ou
impossibilidade) de sua diferenciação referencial, no tocante aos verbos auxiliar e principal da
construção. Em –

*João quer [Ø] comprar o carro. (= João quer que ele mesmo {João} compre o carro)

– os sujeitos de “querer” e “comprar” são correferenciais, mas não há obrigação estrutural para isto.
A despeito de rearranjos flexionais, podemos substituir o sujeito de “comprar” por outro, diferente
do sujeito de “querer”:

*João quer que Maria compre o carro.

Esta situação, que pode nos revelar a existência de duas orações contíguas (portanto, sem a
incidência de locução verbal), opõe-se, por exemplo, à construção com “ir” + infinitivo, pois neste
caso não há possibilidade estrutural de adjungir sujeitos referencialmente diferentes para os itens
verbais atualizados –

*João vai [Ø] comprar o carro.


*?João vai que Maria compre o carro.

– levando-nos a categorizar a expressão “ir” + infinitivo como locução verbal. A locução verbal, por
conseguinte, necessariamente impõe a correferencialidade do sujeito entre os itens verbais.

7.Adjunto adnominal vs. complemento nominal

NÚCLEO PÓS-NÚCLEO

+adjetivação
+posse
ADN sujeito
agente
-necessário
de (relacional)
DE
-adjetivação
-posse
CN objeto
paciente
+necessário
+preposição de (em relação a)

A/EM/PARA/POR/CONTRA CN
SOBRE
ABSTRATO COM ADN/CN

SEM ADN
SUBSTANTIVO
-preposição ADN

CONCRETO ADN

ADJETIVO + preposição CN

ADVÉRBIO + preposição CN
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Lendo:

- O núcleo do sintagma nominal pode ser de três tipos: substantivo, adjetivo, advérbio. Se o núcleo for
adjetivo/advérbio (e a expressão pós-núcleo vier preposicionada) → complemento nominal; se o núcleo
for substantivo, toca a análise pra frente.
- O núcleo substantivo pode ser concreto ou abstrato. Se for concreto → adjunto adnominal; se for
abstrato, toca a análise pra frente.
- A expressão pós-núcleo do substantivo pode ser preposicionada ou não-preposicionada. Se for não-
preposicionada → adjunto adnominal; se for preposicionada, toca a análise pra frente.
- As preposições podem ser “a”, “em”, “para”, “por”, “contra”, “com”, “sem”, “de”. Se forem “a”,
“em”, “para”, “por”, “contra” → complemento nominal; se for “sem” → adjunto adnominal; se for
“com” e a expressão puder ser transformável em adjetivo simples → adjunto adnominal (cf. “amor
com açúcar/amor açucarado”); se for “com” e a expressão não puder ser transformada em adjetivo
simples → complemento nominal (cf. “A viagem com o carro foi boa/*a viagem carrada foi boa”); se
for “de”, toca a análise para o último passo.
- Se a expressão pós-núcleo tiver, de acordo com o esquema a seguir, a preponderância dos traços
[+adjetivação, +posse, sujeito, agente, - necessário, de (= relacional)] → adjunto adnominal; se tiver a
preponderância dos traços [-adjetivação, -posse, objeto, paciente, +necessário, de (= em relação a)] →
complemento nominal.

a)Adjunto adnominal vs. complemento nominal – leitura de traços

ADN CN EXPLICAÇÃO

[+adjetivação] [-adjetivação] possibilidade de substituição por um


adjetivo simples

[+posse] [-posse] indicação semântica de [posse] com


relação ao substantivo núcleo

[sujeito] [objeto] o adn é uma espécie de sujeito do nome a


que se liga; o cn, pelo contrário, é uma
espécie de objeto direto do nome a que se
liga – se estabelecermos um paralelo com a
estrutura oracional

[agente] [paciente] o adn corresponde a uma espécie de agente do


processo nominal; o cn, pelo contrário, é uma
espécie de paciente (alvo) do processo nominal

[-necessário] [+necessário] o adn é uma informação facultativa,


adicional, de caráter eminentemente
especificadora no processo de comunicação;
o cn é uma informação exigida pela semântica
do núcleo a que se une, e tende a ser omitido
apenas quando evidenciado pelo contexto
(linguístico ou extralinguístico) ou quando a
ideia é tomar o sentido do nome nuclear em
seu sentido absoluto, e não relativo a algo em
particular (cf. uma coisa é alguém ter medo, no
sentido de ser medroso; outra coisa é alguém
ter medo de alguma coisa em especial)

[DE = relacional] [DE = em relação a] a partícula “de” é meramente conectivo no


adn, sem nenhuma carga semântica relevante;
no cn, o “de” pode usualmente ser substituído
por “em relação a”
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Observação: os traços SUJEITO/OBJETO e AGENTE/PACIENTE parecem se aplicar de


maneira otimizada apenas nos casos em que o núcleo sintagmático pode ser equiparado a um verbo
(assim, em: “produção de energia” = “produzir energia”; mas não em “medo de fantasmas”, em que
“medo” não tem contraparte verbal regular).

b)Distinção adn, cn, ap

TERMO ADN CN AP

Natureza morfossintática adjetivo substantivo substantivo

Item conectivo de, com, sem a, de, em, para sem conectivo
ou com, contra, por
sem conectivo sobre

Pontuação nunca nunca substancialmente

Núcleo subordinante substantivo substantivo substantivo


(concreto) (abstrato), ou expressão
adjetivo e substantiva
advérbio

Natureza semântica especificador, complementador, explicitador,


agente do paciente do retomada
evento evento do evento

Notas:

1)O traço natureza adjetival do ADN, em contraposição ao traço natureza substantiva do CN e do AP,
só causa problemas, evidentemente, nos casos em que o termo considerado não se apresentar
formalmente como adjetivo, mas como uma expressão preposicionada, por exemplo. Em outras
palavras, se o termo considerado já é um adjetivo, não há o que analisar, pois será sempre ADN.
Assim, em –

Uma casa amarela

– “amarela” será sempre ADN, e nunca poderá causar confusões interpretativas com respeito ao CN
ou AP. Agora, se a expressão for –

Uma casa de barro

– pode ser conveniente atentar para outro(s) traço(s) que confirmem a suspeita de “de barro” ser um
ADN, notadamente quanto à hesitação em torno de este termo poder também ser classificado como
CN. Veja-se, de passagem, que, embora o termo “de barro” não possa ser transformável em um
adjetivo simples (“casa *embarrada) – este que seria um dos possíveis testes para comprovar a
natureza adjetival da expressão, como no exemplo “noite de lua” = “noite enluarada” – ele pode
estruturalmente tomar o mesmo lugar (teste da permuta) de “amarela” no sintagma “casa amarela”:

amarela

uma casa

de barro

em que “amarela” e “de barro” caracterizam “uma casa”.


19

2)O traço item conectivo enseja duas observações pertinentes do ponto de vista da simplificação na
atividade do analista:

a – Observe que a lista de preposições relativas ao ADN e ao CN é bastante diversa, e, no geral, as


únicas preposições em comum são “de” e “com”. Disto se infere que só poderá haver, em princípio,
possibilidade de confusão entre o ADN e o CN nos casos que envolvem as preposições “de” e “com”.
Se somarmos a este dado o fato de que há matizes semânticos específicos contidos nas construções
das quais estas preposições fazem parte, quando engendram ADN ou CN, pode-se reduzir em muito
a possibilidade de incerteza. Assim,

* “de” engendrará ADN, se a natureza semântica da construção permitir a


anteposição do termo “feito(a)” ou algo equivalente à referida preposição:

Casa de barro → casa (feita) de barro

“de” engendrará CN, se a natureza semântica da construção permitir a


substituição da referida preposição pela expressão “com relação a” ou
algo equivalente:

Medo de fantasmas → medo (com relação a) fantasmas

* “com” engendrará ADN, se a natureza semântica da construção permitir


a posposição da expressão “a adição de” ou algo equivalente à referida
preposição:

Café com açúcar → café com (a adição de) açúcar

“com” engendrará CN, se a natureza semântica da construção permitir a


a substituição da referida preposição por alguma outra da série de
preposições que contemplam CN ou algo equivalente:

Esperança com a vida → esperança na vida

b – Observe que, ao contrário do ADN, CN nunca vem sem conectivo preposicional, o que, de
qualquer forma, não deixa de ser um traço diferenciador entre os dois termos. Já com relação ao AP,
tem-se, através do quadro acima, que este é desprovido de conectivo preposicional. No entanto, esta
é apenas a postulação geral, pois há casos de AP preposicionado (especificamente com o item “de”),
como em:

A cidade de São Paulo

Duas táticas complementares podem ser aplicadas para determinar se se trata de AP:

*a possibilidade de retirada da preposição, substituindo-a por vírgula:

A cidade, São Paulo,...

*a possibilidade de eliminar o termo antecedente:

A cidade de São Paulo é grande.


(A cidade de) São Paulo é grande. → São Paulo é grande.

3)O traço pontuação diz que ADN e CN nunca ocorrem com pontuação, enquanto para o AP a
pontuação (geralmente, o AP vem entre vírgulas ou separado por dois pontos) é o padrão substancial.
Há exceção à regra, como ficou evidente no exemplo de “a cidade de São Paulo”, em que o termo
“São Paulo”, aposto, não vem entre vírgulas, mas conectado por intermédio da preposição “de”. Além
de exemplos desse tipo, temos os casos em que não ocorre o elemento prepositivo, nem a pontuação:

O garoto João.
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A explicação, no entanto, equivale pari passu à que foi dada com relação à “a cidade de São Paulo”:
possibilidade de inserir o termo consequente entre vírgulas –

O garoto, João,...

e possibilidade de eliminar o termo antecedente:

O garoto João fez boa prova.


(O garoto) João fez boa prova. → João fez boa prova.

Não obstante, o que fundamentalmente caracteriza o AP é a pontuação. Na verdade, é preciso


admitir que inclusive termos como o ADN e o CN, quando colocados entre vírgulas (mais
comumente), tornam-se AP. É o que se pode ver nos exemplos a seguir:

A casa amarela me pertence. → “amarela” = ADN


A casa, amarela, me pertence. → “amarela” = AP

A compreensão dos amigos me satisfaz. → “dos amigos” = CN


A compreensão, dos amigos, me satisfaz. → “dos amigos” = AP

É simples assim: o AP se define primordialmente pela condição de isolamento através da pontuação


(na língua escrita) e, por isso, é capaz de tomar o lugar de termos, em princípio, referidos como ADN
ou mesmo CN.

4)O traço núcleo subordinante concorre para a facilitação na identificação dos termos pelo fato de se
esclarecer que o CN é o único a ser antecedido por adjetivo e advérbio nucleares. Em –

João estava convencido da verdade.


João deixou o bar posteriormente ao acidente.

– concebe-se que “da verdade” e “ao acidente” só podem ser CN em razão de o núcleo sintagmático
ser, respectivamente, adjetivo (“convencido”) e advérbio (“posteriormente”).
Além disso, outro traço a ser usado, particularmente na diferenciação entre ADN e CN, é a
natureza concreta do núcleo subordinante no primeiro caso, em contraposição à natureza abstrata do
núcleo subordinante no segundo:

Produto de qualidade → “produto” (concreto) leva “de qualidade” a ADN


Produção de arroz → “produção” (abstrato) leva “de arroz” a CN

(embora nem sempre um substantivo abstrato leve à determinação de CN, como veremos adiante).

5)O traço natureza semântica vai exigir perspicácia do analista principalmente no sentido de ser capaz
de perceber a diferença entre especificar, complementar, e explicar, no contexto da construção
lingüística. Em suma, o ADN especifica, o CN complementa e o AP explica o núcleo subordinante de
acordo com o seguinte entendimento:

*Especificar → indicar uma característica de;


*Complementar → preencher uma lacuna (de sentido);
*Explicar → repetir, dizer a mesma coisa de outro modo, com outra expressão.

Uma dica que pode se fazer útil é, uma vez diante da expressão sob análise, pesar os três matizes
semânticos e ver do qual mais o termo se aproxima. Assim, por exemplo, em –

João tem medo de fantasmas.

– a pergunta que deve ser feita é: “de fantasmas” indica uma característica de “medo”, preenche
uma lacuna de sentido reclamada por “medo” (quem tem medo, tem medo de algo) ou simplesmente
repete, reproduz a noção veiculada por “medo”?
Bem, “de fantasmas”, pelo menos na frase de ilustração, não pode ser uma característica de
“medo” (características de “medo” são, por exemplo, “medo brutal, de arrepiar, sem razão etc.);
21

também muito menos pode ser, em nenhuma hipótese, a simples repetição de “medo” (basta ver que
“João tem medo de fantasmas” não é a mesma coisa que “João tem fantasmas”; se “de fantasmas”
apenas repetisse “medo”, essa relação poderia ser postulada). Então, “de fantasmas” só deve ser um
preenchimento de lacuna, exigida, no contexto, por “medo”: há a necessidade de se reportar ao tipo
ou motivo do medo de “João”. E assim por diante.
Outro aspecto sugerido pelo traço natureza semântica que pode ser utilizado para facilitar a
análise sintática é a condição de agente do ADN, em contraste com a condição de paciente (alvo) do
CN, especificamente nos casos que envolvem núcleo substantivo abstrato. Assim, em –

Produção do engenheiro

– “do engenheiro” deve ser classificado como ADN, porque equivale ao agente do processo ditado
por “produção”: “o engenheiro produz”. Agora, em –

Produção de energia

– “de energia” se classifica como CN, por que consiste no paciente do processo nominal: “a energia é
produzida”.
Só mais duas breves informações, para terminar o assunto dos componentes internos do
sintagma: a)com relação a esse problema de identificação do termo à direita do núcleo nominal (ADN,
CN ou AP), queremos dizer o seguinte: a resposta definitiva, pelo menos nos pontos cruciais, precisa
passar por uma reflexão em torno de cada um dos pontos arrolados acima. Se não funcionar... usar
o bom senso (!); b)é preciso, adicionalmente a tudo que foi dito, considerar a possibilidade de os
termos à direita do núcleo terem estrutura oracional, ou seja, ADN oracional, CN oracional e AP
oracional, mas nada que venha a contradizer o que se quis afirmar (ou se afirmou) no início desta
exposição: quando um termo, qualquer que seja ele, tem estrutura oracional não passa a ser outra
coisa (como às vezes deixa sugerir a abordagem das gramáticas), mas continua sendo a mesma coisa
(um CV oracional é um CV, um PRED oracional é um PRED, um ADN oracional é um ADN etc.
etc.), apenas (evidentemente) com alguns adendos estruturais a mais e, a rigor, sem necessidade de
modificação da linha de raciocínio que se segue quando se analisa uma frase de composição simples.

8.Vocativo, atitudinal e modificador

a)Vocativo

- Vem sempre separado por vírgula e pode aparecer em qualquer lugar da frase;
- É um termo de chamamento e invocação, por isso se refere a pessoas, animais ou algo personificado;
- Confunde-se geralmente com o sujeito;
- Para identificá-lo, pode-se usar o recurso da anteposição da partícula interjectiva “Ó!”;
- Exemplo: João, o café está esfriando! → em que “João” é o vocativo.

b)Atitudinal

- Vem geralmente separado por vírgula e pode aparecer em qualquer lugar da frase;
- Confunde-se geralmente com o ADV, pois encerra as mesmas características morfossintáticas deste;
- Difere do ADV porque representa a reação/comportamento do sujeito falante (quem propalou a
frase) a respeito do que é dito;
- Exemplo: Infelizmente, João não foi aprovado no concurso.

c)Modificador:

c1)Enfatizador
- Vem sempre junto a um verbo, enfatizando a noção nele contida;
- A gramática escolar chama-o, comumente, de partícula de realce;
- É representado por vocábulos da língua de uma lista restrita de itens, embora possa às vezes ser
realizado por expressões linguísticas algo complexas;
- Exemplo: João só trabalha.
22

c2)Intensificador
- Vem sempre junto a um verbo, adjetivo ou advérbio, intensificando a noção neles contida;
- A gramática escolar confunde-o com um ADV intensidade;
- É representado por vocábulos da língua de uma lista restrita de itens, embora possa às vezes ser
realizado por expressões linguísticas algo complexas;
- Exemplo: João é muito estudioso.
c3)Negador
- Vem sempre junto a um verbo, recusando a informação veiculada por este;
- A gramática escolar classifica-o como um ADV de negação;
- É representado por vocábulos da língua de uma lista muito restrita de itens, embora possa às vezes
ser realizado por expressões linguísticas algo complexas;
- Exemplo: João não é muito estudioso.
c4)Dubitador
- Vem sempre junto a um verbo, intensificando a noção nele contida;
- A gramática escolar chama-o de ADV de dúvida;
- É representado por vocábulos da língua de uma lista restrita de itens, embora possa às vezes ser
realizado por expressões linguísticas algo complexas;
- Exemplo: João talvez seja estudioso.

9.Elipse, ordem dos termos e ambiguidade sintática

ASPECTOS ESPECIAIS DA ANÁLISE SINTÁTICA

ELIPSE ORDEM DOS TERMOS AMBIGUIDADE

Propriedade Propriedade Propriedade


que consiste que consiste que consiste
em ocultar em deslocar em se obter
um termo um termo mais de uma
sintático de sua posição interpretação
logicamente canônica de sentido
previsto estipulada na construção

PROCEDIMENTO PROCEDIMENTO PROCEDIMENTO


↓ ↓ ↓
Repor Realocar Explicitar
o termo o termo as leituras
oculto considerado sintático-semânticas
possíveis

fim
23

DIMENSÕES SINTÁTICAS DA LÍNGUA


[sistema do português]

J. Bento

ESTRUTURA SINTÁTICA

FUNÇÃO

núcleo subordinado(s)

nominal e verbal obrigatório e/ou facultativo

COLOCAÇÃO

pré-nuclear e/ou pós-nuclear

REGÊNCIA

com conectivo ou sem conectivo

CONCORDÂNCIA

com concordância e sem concordância

nominal e verbal
[gênero/número] [pessoa/número]

Do enredo acima, podemos deduzir que a Sintaxe, enquanto disciplina, encerra uma
classificação, do ponto de vista do objeto focalizado:
24

SINTAXE

de funções de colocação de regência de concordância

a)Sintaxe de funções – estudo dos elementos subordinados aos núcleos (nominal ou verbal), em
termos de sua natureza obrigatória ou facultativa, bem como seu papel sintático-semântico na
integralidade do construto oracional (basicamente, sujeito, complemento e adjunto);

b)Sintaxe de colocação – estudo do lugar que ocupa os elementos subordinados aos núcleos em
relação a seus respectivos núcleos (nominal ou verbal), assim como as possibilidades de variação,
ditadas pelo sistema linguístico;

c)Sintaxe de regência – estudo da natureza da conexão que se dá entre núcleo (nominal ou verbal) e
seus subordinados, em termos da ocorrência/não-ocorrência explícita de elos coesivos (chamados de
preposições ou conjunções). Obs.: a análise tradicional limita o estudo da regência às preposições.

d)Sintaxe de concordância – estudo da harmonização flexional que se dá entre o núcleo e seus


subordinados, a qual, nos núcleos nominais, refere-se às categorias gramaticais de gênero/número
entre o nome e seus determinantes, ao passo que, nos núcleos verbais, às categorias de pessoa/número
entre o verbo e o chamado sujeito da oração.

fim
25

ESTRUTURA SINTÁTICA BÁSICA CONFORME A GRAMÁTICA TRADICIONAL

J. Bento

Esquema sinóptico:

ORAÇÃO

sujeito predicado

VERBO compl. verbal ag. da passiva predicativo adj. adverbial

xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx

SINTAGMA

adj. adnominal SUBSTANTIVO adj. adnominal compl. nominal aposto

... PRONOME adj. adnominal ... aposto

... ADJETIVO/ ... compl. nominal aposto


ADVÉRBIO

Nota:

1.Cada um dos elementos oracionais – sujeito, complemento verbal, agente da passiva, predicativo e
ajunto adverbial – constituem o que se chama de sintagma (nominal).
2.Fora do escopo oracional, podem-se encontrar o vocativo (“João, venha cá.”) e/ou o atitudinal
(“Felizmente, João vem.’).
3.Internamente à oração, mormente sobre os núcleos, oracional e sintagmático, pode haver
modificadores (intensidade, ênfase, negação, dúvida – estes últimos, no geral, privativos do verbo).
4.O sintagma, ao contrário da oração (que só se utiliza do verbo), pode ter seu núcleo preenchido por
categorias léxico-gramaticais distintas – substantivo, pronome, adjetivo ou advérbio –, demandando
estruturas gramaticais também distintas, como se vê através do esquema.

fim
26

PROPOSTA DE MODELO DE DESCRIÇÃO SINTÁTICA

J. Bento

1.Oração
O

Esp-esq Esp-dir

Estrutural Mod V Estrutural Adestrutural

Δ Δ Ø

expl.(des.)/indet. expl. expl./indet.


[+] [+/-] [+/-] [+]
↓ ↓ ↓ ↓
algo neg. algo valor
alguém duv. alguém função
. enf. atributo finalidade
intens. modo causa
lugar meio
tempo instrumento
assunto companhia
comparação
conformação
contrariedade
condição
consequência
proporção
Núcleo

Notação:
Esp-esq. → especificador (estrutural) esquerdo
Esp-dir. → especificador (estrutural/adestrutural) direito
Mod. → modificador
V → verbo
Expl. → especificador (estrutural/adestrutural) explícito
Des. → especificador (estrutural) explícito por desinência verbal
Indet. → especificador (estrutural/adestrutural) indeterminado
Δ → índice de impedimento estrutural de ocorrência/não-ocorrência, pelos fatores:
a]alteração de sentido
b]gramaticalidade
c]alteração de sintaxe (determinação/indeterminação do sujeito)
Ø → ausência de especificador (estrutural) direito
[+] → ser especificador estrutural/adestrutural
[+/-] → ter/não-ter modificador; ser/não-ser especificador estrutural
Neg. → negação
Duv. → dúvida
Ênf. → ênfase
Intens. → intensidade
N → núcleo oracional

2.Rede de especificadores e parâmetro estrutural

Especificador é o nome que se dá a cada um dos elementos lógico-semântico-discursivos que


servirá para complementar o construto oracional, ladeando o núcleo verbal. Sua lista inclui os
seguintes:
27

ESPECIFICADOR

algo
alguém
atributo/
modo
lugar
tempo
assunto
valor
função/
finalidade
causa
meio/
instrumento
companhia
comparação
conformação
contrariedade
condição
consequência
proporção

Nota: A colocação de barrinhas entre determinados especificadores visa chamar a atenção para certas dificuldades em relação
à distinção semântica dos respectivos especificadores.

Cada verbo, ou categoria verbal, em particular, devido à sua natureza lógico-semântica, aceita,
resiste a ou rejeita membros da rede de especificação. É por essa razão que um especificador como
{valor}, por exemplo, é praticamente privativo de verbos como [comprar], [vender] etc., e
normalmente proibitivo em verbos como [amanhecer], [sonhar] etc.:

*?João sonhou por 10 reais.

Faz sentido, por conseguinte, que estabeleçamos uma classificação dos verbos, com base nos
especificadores, em aceitos/resistentes a/rejeitados, em que “resistentes a” possa representar uma faixa
limítrofe entre aceitar totalmente e rejeitar totalmente, até quanto isto seja uma realidade efetiva a
nível do sistema linguístico considerado.
Do ponto de vista sintático-semântico, também podemos classificar os especificadores em três
categorias. Levando em consideração a estrutura sintática de línguas como o português, dividimos a
tabela de especificadores em:

Especificador-esquerdo Verbo Especificador-direito

algo ESTRUTURAL algo


alguém alguém
atributo/
modo
lugar
ESTRUTURAL/ tempo
ADESTRUTURAL assunto

valor
função/
finalidade
ADESTRUTURAL causa
meio/
instrumento
companhia
comparação
conformação
contrariedade
condição
consequência
proporção
28

Como se percebe, os especificadores podem ser essencialmente estruturais –

algo
alguém

– os quais correspondem necessariamente à esquerda verbal, ou posição de sujeito; costumeiramente


estruturais (estrutural ou adestrutural) –

algo
alguém
atributo/
modo
lugar
tempo
assunto

– que, à direita do verbo, dependem da auscultação direta sobre a caracterização sintático-semântica


do item verbal analisado; e essencialmente adestruturais –

valor
função/
finalidade
causa
meio/
instrumento
companhia
comparação
conformação
contrariedade
condição
consequência
proporção

– os quais, à direita do verbo, se atualizam de maneira sempre facultativa, independentemente do


caráter sintático-semântico do verbo. Nesta última circunstância, a única ingerência sobre a
especificação diz respeito às condições lógico-semântico-discursivas, em termos de haver aceitação,
resistência a ou rejeição do elemento especificador.
Podemos caracterizar sintático-semanticamente os verbos, ainda quando isolados, ou
independentes de sua inserção no construto oracional. Tomemos, como exemplo, o verbo “estar” e
façamos a sua descrição sintático-semântica prévia. Advertimos que esta é uma descrição provisória,
improvisada, servindo à mera ilustração do raciocínio que se pretende imprimir aqui:
{algo-alguém/Δ}
ESTAR{algo/atributo/modo/lugar/tempo/Δ}

Com base no esquema principal esboçado anteriormente, dizemos o delta (Δ), correspondente
ao índice de impedimento estrutural, é, na realidade, o fator determinante da caracterização do
especificador como estrutural (em contraposição às especificações adestruturais), pois que a sua
alternância ausência/presença redundaria, principalmente, em –

a)alteração do sentido verbal;

ou

b)agramaticalidade.

– além da ativação do princípio –

c)determinação/indeterminação do especificador estrutural esquerdo (alteração sintática,


relacionada aos mecanismos da 3ª pessoa do plural ou uso da partícula de indeterminação “se”).
29

Considerado de outra maneira, podemos dizer que o índice de impedimento estrutural funciona
em duas frentes, conforme a situação sintática em conta:

a)Se há um especificador estrutural explícito, este é, de fato, um especificador estrutural impedido de


apagamento da estrutura sintática avaliada, devido à alteração de sentido, agramaticalidade ou
alteração sintática (no caso do especificador estrutural direito);
b)Se há um especificador estrutural implícito, este é, de fato, quando não um especificador estrutural
requerido (para obtenção da gramaticalidade), um especificador estrutural impedido de explicitação
na estrutura sintática avaliada, devido à alteração de sentido ou alteração sintática (no caso do
especificador estrutural direito como índice de indeterminação do sujeito).

Assim é que podemos estipular um modelo geral de descrição dos itens verbais da língua, na
perspectiva da especificação estrutural:

{especificador-esquerdo/Δ}
VERBO{especificador-direito/Δ}

Ou, concebendo de outra forma:

Δ Δ
VERBO
X Y

em que X/Y:

1]Se ocorrem na construção, estão impedidos de não-ocorrer

[agramaticalidade/alteração de sentido/indeterminação do sujeito]

2]Se não ocorrem na construção, estão –

*impedidos de não-ocorrer

[agramaticalidade/alteração de sentido/indeterminação do sujeito]

*impedidos de ocorrer

[alteração de sentido/determinação do sujeito]

Observações adicionais sobre esta proposta descritiva do verbo “estar”, implicam em:

a)O verbo “estar”, quando exige a presença de especificador esquerdo, não admite a sua ausência,
por agramaticalidade; concomitantemente, proíbe o especificador direito de se referir a tempo:

*João está doente.


*?Ø está doente.
*?João está tarde.

b)O verbo “estar”, quando exige a ausência de especificador esquerdo, não admite a sua presença,
por agramaticalidade; ao mesmo tempo, obriga o especificador direito a se referir a tempo:

*Ø está tarde.
*?algo/alguém está tarde.
30

c)O verbo “estar”, quando acionado um dos especificadores estruturais direitos, torna os demais
especificadores estruturais previstos, adestruturais; quando não acionado nenhum especificador
direito, agramaticaliza-se a oração:

*João está um homem.


*João está doente.
*João está em Teresina.
*?João está.

De acordo com a primeira informação da letra ‘c’, vejamos:

*João está feliz em Teresina.

Percebe-se que basta a atualização de um dos especificadores direitos para dispensar a atualização
do outro como especificação estrutural. É o caso típico de um especificador estrutural que se
adestruturaliza em função da concorrência de outro especificador estrutural já fixado no construto
oracional. Se se optar por –

*João está feliz.

– “em Teresina”, de especificador estrutural potencial, passa a especificador adestrutural, por ser
dispensável. O contrário também é possível: se for –

*João está em Teresina.

– “feliz” é que se tornaria especificador adestrutural.

Em outras palavras, o verbo “estar” só precisa de um, e apenas de um especificador estrutural


direito. Desde que se satisfaça o preenchimento deste espaço sintático-semântico, toda a especificação
aparente ou subjacente é adestrutural. Logo, o verbo “estar” deverá ser melhor descrito como segue

ESTAR

1 2

algo
{Δ}
ESTAR{tempo} {algo-alguém}
ESTAR atributo/modo
lugar

– em que a seleção de uma das especificações à direita dispensa as outras especificações, rebaixando-
as à categoria de especificação adestrutural.
Além disto, é conveniente verificar construções do tipo –

*Está frio. (em que “frio”, para todos os efeitos, toma a função de [tempo])
*O tempo está frio.

As duas construções são gramaticais, e se faz necessário explicar suas ocorrências em razão da análise
sintática ora proposta. Penso que se trata de variantes sintáticas livres, ou seja, são estruturações
sintáticas abonadas pelo sistema para representar o mesmo ordenamento semântico. Podemos
arriscar que a segunda construção decorre exatamente da intuição linguística do falante a respeito
do modelo de alocação quase absoluta do sujeito em sentenças do português. Situações como esta se
parecem, mais ou menos, com o que atestamos em sentenças com o verbo “haver” impessoal, que a
gramática tradicional insiste em configura-lo como impessoal (sujeito inexistente), enquanto o uso
efetivo costuma trata-lo de maneira oposta: inserindo um sujeito na estrutura.
31

Talvez contribua para tal direcionamento o fato de se ter usado um adjetivo no espaço
reservado a [tempo] – “frio” –, pois seria difícil não haver estranhamento se a oração se desse nestes
termos:

*Está tarde.
*?O tempo está tarde.

Façamos o mesmo com o verbo “comer”, relativamente a alimento:


{algo-alguém/Δ}
COMER{algo/Δ}

Observações adicionais quanto à descrição sintático-semântica do verbo “comer” indicam:

a)O verbo “comer” exige a presença de especificador esquerdo, não admitindo a sua ausência, por
agramaticalidade:

*João comeu a melancia.


*?Comeu a melancia.

b)O verbo “comer”, quando exige a presença de especificador direito, não admite a sua ausência, por
alteração de sentido, e vice-versa – quando exige a ausência do especificador direito, não admite a
sua presença, por alteração de sentido:

*João comeu a melancia. → deglutir


*João comeu. → alimentar-se

Em português, portanto, o falante é constrangido a optar por uma das formulações, de acordo com
a proposta discursiva:

COMER

1 2

{algo-alguém}
COMER{algo} {algo-alguém}
COMER{Δ}

Naturalmente, as leituras sintático-semânticas podem variar sociolinguisticamente, de maneira


que nada obsta uma leitura alternativa, em que “comer” será descrito como agramatical na hipótese
da ausência do especificador direito:

*João comeu a melancia. → deglutir


*?João comeu.

E assim, reformulemos o diagrama proposto, de compreensão única para verbos do tipo “comer”:

COMER

{algo-alguém}
COMER{algo}

Finalmente, elaboremos a descrição sintático-semântica do verbo “considerar”:


{algo-alguém/Δ}
CONSIDERAR{algo-alguém/atributo/Δ}

a)O verbo “considerar” exige a presença de especificador esquerdo, não admitindo a sua ausência,
por agramaticalidade:
32

*João considera Paulo intransigente.


*?Considera Paulo intransigente.

b)O verbo “considerar”, quando exige a presença de especificador direito {atributo}, aplicado ao
especificador direito {algo/alguém}, não admite sua ausência, por alteração de sentido, e vice-versa –
quando exige a ausência do especificador direito {atributo}, não admite sua presença, por alteração
de sentido:

*João considera Paulo intransigente. → julgar


*João considera Paulo. → respeitar

c)O verbo “considerar”, quando exige a presença do especificador direito {algo/alguém}, não admite
a sua ausência, por alteração de sentido, e vice-versa – quando exige a ausência de especificador
direito {algo/alguém}, não admite a sua presença, por alteração de sentido:

*João considera Paulo. → respeitar


*João considera. → refletir

O verbo “considerar”, quando exige a presença do especificador direito {atributo}, aplicado ao


especificador direito {algo/alguém}, logicamente não admite a ausência do especificador direito {algo-
alguém}; quando exige a ausência do especificador direito {atributo}, exigirá a presença ou ausência
do especificador direito {algo-alguém}, conforme a proposta de sentido do verbo.
Esquematizando, vejamos o que se pode obter da descrição de um verbo como “considerar”:

{algo-alguém}
1. CONSIDERAR{algo-alguém/atributo}
{algo-alguém}
CONSIDERAR 2. CONSIDERAR{algo-alguém}

3. {algo-alguém}
CONSIDERAR{Δ}

3.Enredo simplificado das estruturas sintáticas

COMPONENTE

explícito implícito

ESTRUTURAL
* “apaga” o sentido
[agramaticalidade]

* altera a sintaxe

altera o sentido

explícito implícito

ADESTRUTURAL

não altera o sentido


33

A presença da indicação em X, no componente estrutural, significa que o explícito não pode ser
implicitado e vice-versa, o implícito não pode ser explicitado, sem consequências sintático-semânticas
para o verbo ou meramente sintáticas para a oração (rearranjo sintático proveniente da
determinação/indeterminação do chamado sujeito). Nada destas implicações estão presentes nos
componentes adestruturais; daí, a liberdade de trânsito entre os termos explícito/implícito.

3.1.Princípios de condução da análise sintática

1]Se o que está explícito, não pode ser omitido sem alteração do sentido verbal ou agramaticalidade:
componente estrutural explícito

2]Se o que está explícito, pode ser omitido, sem alteração do sentido verbal ou agramaticalidade:
componente adestrutural explícito

3]Se o que se sabe implícito, não pode ser explicitado sem alteração do sentido verbal:
componente estrutural impedido

4]Se o que se sabe implícito, não pode ser explicitado sem alteração da organização sintática:
componente estrutural indeterminado

5]Se o que se sabe implícito, pode ser explicitado sem alteração do sentido verbal:

componente adestrutural indeterminado

6]Se o que se sabe implícito, deveria ter sido explicitado, para suportar algum sentido verbal:
componente estrutural requerido
[agramaticalidade]

Em outras palavras, podemos elaborar os princípios de análise sintática da seguinte maneira:

1 – O que está explícito, se implicita-lo, deverá:

*alterar o sentido do verbo

*agramaticalizar a oração Comp. estruturalexplícito

*destituir informação com rearranjo sintático

*apenas destituir informação Comp. adestruturalexplícito

2 – O que está implícito, se explicita-lo, deverá:

*alterar o sentido do verbo Comp. estruturalimpedido

*gramaticalizar a oração Comp. estruturalrequerido

*instituir informação com rearranjo sintático Comp. estruturalindeterminado

*apenas instituir informação Comp. adestruturalindeterminado

3.2.Indeterminação estrutural e indeterminação adestrutural

É possível a indeterminação dos especificadores. Os especificadores adestruturais, privativos


da esquerda verbal, já são, por natureza, indetermináveis, visto que a sua atualização/não-
atualização não decorre de imposições do sistema sintático-semântico, mas de ingerências meramente
comunicativas. Neste caso, o único mecanismo a ser acionado é seu apagamento, ou omissão, na
estrutura oracional.
Com relação ao especificador estrutural, a indeterminação só é possível para o especificador
esquerdo, na posição de sujeito, e há necessidade de proceder a alterações na estrutura sintática
(rearranjo sintático), com o fim de prover o efeito de indeterminação.
34

Podemos afirmar, em síntese, que a indeterminação estrutural, privativa do especificador


esquerdo, vem a se dar linguisticamente, como sugere a obrigatoriedade do rearranjo estrutural
incidindo sobre o uso da partícula “se” ou do verbo na terceira pessoa do plural. Ao contrário, a
indeterminação adestrutural, concernente ao especificador direito, é basicamente discursiva: sua
incidência/não-incidência se deixa enredar apenas pelos propósitos comunicativos do ato de fala. Em
outras palavras, o falante não precisa dispor de outra providência linguística, além de pura e
simplesmente omitir a especificação.

3.3.Diferenças entre especificador estrutural esquerdo e direito

ESP-ESTR-ESQUERDO ESP-ESTR-DIREITO

*ocorrência absoluta *ocorrência relativa


[todos os verbos exigem] [há, teoricamente, verbos que não exigem]

*possibilidade de omissão/elipse *impossibilidade de omissão/elipse


[sujeito desinencial]

*possibilidade de indeterminação *impossibilidade de indeterminação


[3ª pessoa-plural / partícula “se”]

Sobre a questão da “ocorrência relativa” do especificador direito, queremos dizer que há


verbos que não pressupõem nenhuma especificação obrigatória à sua direita. Podemos citar como
exemplo o verbo “cantarolar”, que seria:
{alguém/Δ}
CANTAROLAR

Observemos que todas as especificações lógico-discursivas circunstancialmente adicionadas à direita


são de natureza adestrutural (facultativa) – algo, modo, tempo etc.:

*João cantarola uma linda canção.


*João cantarola bem.
*João cantarola todas as noites.
*Etc.

Logo, não há como falar de impedimento estrutural (Δ) para este espaço sintático-semântico e, por
conseguinte, de especificação estrutural.
3.4.Demonstração do fato sintático-semântico estrutural

Surpreendamos o verbo “falar” dentro das seguintes construções:

*João fala.
*João fala um monte de besteiras.
*João fala inglês.
*João fala sobre a situação política do país.

Talvez seja fácil perceber que o verbo “falar” altera sua semanticidade à medida que passemos
de uma frase para outra, semanticidade esta que pode ser descrita mais ou menos como segue:

*João fala. → [domina uma língua]


ou
[pratica atividade discursiva]
*João fala um monte de besteiras. → [é falastrão]
*João fala inglês. → [tem habilidade em]
*João fala sobre a situação política do país. → [aborda o assunto x]
35

Tal constatação, se estiver adequadamente analisada, nos sugere que o sentido do verbo “falar”
depende da construção em que está inserido, na perspectiva de sua direita linguística. Não é possível,
digamos assim, atribuir a leitura –

[domina uma língua]

ou

[pratica atividade discursiva]

ou algo parecido com isto

– fora da situação em que “falar” esteja sem uma especificação equivalente a algo do tipo –

*inglês (ou outra língua qualquer)

ou

*um monte besteiras (ou algo assim)

ou

*sobre a situação política do país (ou outro assunto qualquer).

Estamos deduzindo destas observações que um verbo como “falar” consiste de uma homonímia
que inscreve, no mínimo, quatro itens lexicais, conforme a natureza do preenchimento sintático-
semântico direito, e que, por conseguinte, estes preenchedores são componentes estruturais do verbo
“falar”, que o modelam para o estabelecimento de estruturações sintático-semânticas distintas.
Em outras palavras, o verbo “falar” compreende a seguinte dimensão sintático-semântica:
alguém/Δ
FALARΔ/algo/assunto

Assim sendo, todas as vezes em que a especificação direita do verbo projeta leituras semânticas
alternantes sobre o verbo, é sinal de que estamos diante de uma especificação estrutural, visto que o
verbo só se configura com determinado sentido em razão da especificação (ou ausência de
especificação) no construto oracional considerado. Esse é o fator determinante típico da postulação
do caráter estrutural ou adestrutural da especificação. Há, portanto, especificações cujo
comportamento sintático-semântico não é interferente na semanticidade do verbo. Numa frase do
tipo –

*João fala sobre política, hoje, no auditório da escola.

– “hoje” e “no auditório da escola” podem ser removidos da oração, sem que isto implique em
alteração semântica do verbo:

[abordar um assunto].

O que especificações do naipe de {tempo} ou {lugar} assumem relativamente aos núcleos verbais do
modelo de “falar” é serem compatíveis/incompatíveis com os mesmos, do ponto de vista lógico-
discursivo. Se, por exemplo, a intenção comunicativa é declarar que João é falante do inglês, soará
estranho fazer tal declaração enunciando {lugar}. Em –

*João fala inglês em Nova Iorque.

– a leitura mais aparente que se deve conceber é aquela segundo a qual –

[João profere uma palestra em Nova Iorque fazendo uso do inglês] –

e não que –
36

[João é competente em inglês em Nova Iorque]

– visto que fica difícil imaginar uma pessoa que só domina o inglês se for em determinado lugar, ou
seja, o domínio competente de uma língua independe do espaço geográfico de fala.
A propósito, retrocedamos um pouco: não seria “em Nova Iorque”, no exemplo –

*João fala inglês em Nova Iorque.

um especificador estrutural, já que adotamos o princípio de que a característica básica do


especificador estrutural é alterar o sentido do verbo, através da alternância entre sua
ausência/presença? Nada obsta que tal interpretação seja válida ou corroborada, ou que pelo menos
para certas leituras de “falar”, o especificador {lugar} se apresenta como estruturalmente pertinente:

*João fala inglês. → [tem habilidade em]

profere uma palestra/


*João fala inglês em Nova Iorque. → discurso/
ato comunicativo em x

Concretizemos, mais detidamente, estas considerações gerais, utilizando-nos do verbo “comer”


em sua estrutura sintático-semântica básica:

Esp-esq Esp-dir
[estrutural] V [estrutural]

1– {alguém}Δ {alimentar-se} {algo}Δ

2– {algo/alguém}Δ {deglutir/consumir} {algo}Δ

No esboço aqui sugerido –

1)Δ [esp-esq] significa que a não-ocorrência redunda em agramaticalidade;


2)Δ [esp-dir] significa que a não-ocorrência redunda no significado verbal {alimentar-se}; a
ocorrência redunda no significado verbal {deglutir/consumir}.

É conveniente lembrar que uma leitura do verbo “comer” que não leva em conta uma distinção
relevante entre {alimentar-se} e {deglutir/consumir} reconfigura a interpretação do verbo “comer”
para intransitivo (na nomenclatura tradicional), tornando adestrutural o especificador direito que
está, nesta análise, sendo posto como estrutural: {algo}. Por consequência, o verbo “comer” se
mostraria nulo com respeito à especificação estrutural direita:

Esp-esq Esp-dir
[estrutural] V [estrutural]

{algo/alguém}Δ {alimentar-se/deglutir/consumir} Ø
37

4.Sintagma

SN

Esp-esq Esp-dir

Estrutural Mod N Estrutural Adestrutural

Δ Δ Ø

expl./indet. [+/-] expl. expl./indet.



neg.
duv.
. enf.
intens.

Núcleo

Há formas específicas no sistema linguístico que indeterminam o especificador estrutural


esquerdo – “Comprei uma casa”. Trata-se, portanto, de um especificador estrutural explícito, apesar
de semanticamente indeterminado.
A estruturalidade no sintagma, do ponto de vista semântico, se dá basicamente pela alternância
entre sentido absoluto vs. sentido relativo: “amor” tanto pode ser lido como [amor por alguém/algo]
– sentido relativo –, como por [sentimento que se opõe a ódio] – sentido absoluto.
Enquanto o especificador estrutural esquerdo é obrigatório, o mesmo não ocorre com o
especificador estrutural direito: há formas nominais que dispensam estruturalidade à direita, como
os substantivos concretos, de uma maneira geral.

fim
38

PROGRAMA DE ANÁLISE SINTÁTICA

J. Bento

NÚCLEO PERIFÉRICOS DENOMINAÇÃO


[tradicional]

VERBO {você} → vocativo



modificadores {com tal juízo...} → atitudinal

{eu/alguém/algo/Δ} → sujeito

{(a/para)eu/alguém/algo/Δ} → complemento verbal


neutro
negação {com o atributo tal/Δ} → predicativosujeito/objeto
ênfase
intensidade {por eu/alguém/algo/Δ} → agente da passiva
dúvida
{em/de/para lugar tal}
{em tempo tal}
{de modo tal}
{sobre assunto tal}
{por causa/motivo tal}
{com finalidade/função de tal}
{por meio/instrumento (de) tal}
{acompanhado de talcompanhia} adjunto adverbial
{pelo valor tal}
{como talcomparação }
{conforme tal}
{apesar de tal}
{com a condição tal}
{com a consequência tal}
{à proporção tal}

Notas adicionais:

1.Os periféricos se classificam em:

a)Essenciais, indicados pelas setas pontilhadas, e existem ou não existem (Δ) de acordo com a
natureza semântica do verbo; no caso do agente da passiva, a existência/inexistência se relaciona à
estrutura ativa/passiva do verbo (estrutura passiva: ser + particípio + preposição).
b)Circunstanciais, subdivididos em:
b1 - dialogais, que pertencem à alçada das interações comunicativas interpessoais: vocativos e
atitudinais;
b2 - informacionais, que se referem ao conteúdo discursivo propriamente dito, enredado pelo sentido
do verbo: os demais circunstanciais, incluindo os modificadores verbais.

2.Os periféricos –

- {(a/para)eu/alguém/algo/Δ} → complemento verbal


- {em/de/para lugar tal}

– podem ser duplicados, no sentido de haver mais de um na construção, do acordo com a natureza
semântica do verbo:

*João deu um relógio para a namorada.


*João correu da praça à sua casa.
39

No que concerne a –

- {(a/para)eu/alguém/algo/Δ} → complemento verbal

– a análise sintática tradicional prevê a distinção entre objeto direto (complemento verbal1) e objeto
indireto (complemento verbal2).

3.De uma maneira geral, a grande questão envolvendo os periféricos essenciais –

- {eu/alguém/algo/Δ} → sujeito
- {(a/para)eu/alguém/algo/Δ} → complemento verbal
- {com o atributo tal/Δ} → predicativosujeito/objeto
- {por eu/alguém/algo/Δ} → agente da passiva

– particularmente –

- {(a/para)eu/alguém/algo/Δ} → complemento verbal


- {com o atributo tal/Δ} → predicativosujeito/objeto

– e em especial –

- {(a/para)eu/alguém/algo/Δ} → complemento verbal

– é saber se, quando estão ausentes na construção, mas são teoricamente aceitos pelo verbo, deverão
ser interpretados como inexistentes ou elípticos. Uma solução é verificar a alteração semântica do
verbo com a inclusão de um elemento hipotético na referida função: se houver uma alteração
significativa, inexistência (Δ); caso contrário, elipse (Ø). Em –

*João considera Pedro.

– há inexistência do predicativo, pois a alocação de uma hipótese muda a semântica do verbo:

*João considera Pedro. = respeita


*João considera Pedro [inteligente] = julga

Da mesma forma com:

*João comeu. = alimentou-se


*João comeu uma melancia. = ingeriu

Como é possível estipular que a regra geral é de que a ausência/presença altera a significação
do verbo, devemos aplicar este princípio à análise sintática, considerando a ausência como
inexistência. Esta regra geral, não obstante, é sistematicamente quebrada nos casos que envolvem os
chamados objeto indiretos. Com efeito, aqui se passa o contrário, pois os objetos indiretos tendem a
poder ser apagados quando se adjungem a objetos diretos na mesma construção. O exemplo –

*João deu um relógio para a namorada.

– é ilustrativo nesta direção. Sob a oração –

*João deu um relógio.

– pode-se argumentar que o objeto indireto está apenas elíptico (Ø). Afinal de contas, “dar”, no
sentido aplicado à oração, não prescinde do “receptor do relógio”, ou a quem foi dado, não se
alterando, portanto, a sua configuração semântica.
Lembremos, de passagem, que estamos tratando de elipse linguística, e não de elipse discursiva,
que pode atingir qualquer elemento da construção, inclusive o verbo. A elipse discursiva é recuperada
pelo contexto de fala, linguístico ou extralinguístico; já na elipse linguística, recorre-se à estrutura da
língua em si. Nesta perspectiva, o verbo “comer”, por exemplo, deve ser linguisticamente –

alguém comer algo


40

– razão pela qual nada obsta que haja uma interpretação única de um verbo que exige complemento
verbal, a despeito da ausência ocorrida em –

*João comeu.

– que será sempre analisada, por elipse, como –

*João comeu [algo].

– ainda que não se saiba – digamos – “o que foi comido”, por não se ter a informação contextual
devida.
A menos que se adote o argumento de que em “considerar” há uma alteração significativa, em
contraste com “comer”, cuja alteração não se mostraria tão relevante, podemos manter que, em
ambos os casos, há alteração semântica no verbo que justifica o posicionamento de item inexistente
(Δ), e não de item inexistente para “considerar” e item elíptico para “comer”.

4.Os periféricos circunstanciais informacionais encerram algumas peculiaridades:

a)Um ou mais deles podem exercer a função de periférico essencial, quando é reclamado pelo sentido
do verbo; o caso mais notável é {em/de/para lugar tal}, como na oração –

*João mora em Fortaleza.

– em que o verbo “morar” não dispensa o locativo.

b)Alguns deles se atualizam preponderantemente em forma oracional subordinada:

- {como talcomparação }
- {apesar de tal}
- {com a condição tal}
- {com a consequência tal}
- {à proporção tal}

c)O periférico {pelo valor tal} é específico de verbos cuja significação envolve transação monetária
ou equivalente: “comprar”, “vender” etc.

d)O periférico {sobre assunto tal} é específico dos chamados verbos dicendi: “dizer”, “falar”,
“perguntar” etc.

e)Verbos há que podem rejeitar ou dificultar este ou aquele periférico circunstancial; na construção

*Joao é inteligente em companhia de Pedro.

– “em companhia de Pedro” deve ser interpretado mais como condição ou tempo, do que mesmo
companhia, que se revelaria numa frase como –

*João foi ao teatro com Maria.

f)Os periféricos –

- {em/de/para lugar tal}


- {em tempo tal}
- {de modo tal}

– podem ser tidos como universais, por se adequarem, praticamente, a todo e qualquer verbo da
língua.

g)Por mais que venham a ser aceitos isoladamente por determinado verbo, nenhuma construção pode
ser composta integrando todos os periféricos. A frase se torna, quando não agramatical, inaceitável
por razões pragmáticas, psicolinguísticas (memória) ou adjacentes. fim
41

O MECANISMO BÁSICO DA SINTAXE: COMPLEMENTAÇÃO E ADJUNÇÃO

J. Bento

ESTRUTURA SINTÁTICA
ou
ESTRUTURA MORFOSSINTÁTICA

signoX signoY/Z/W
↓ ↓
núcleo periferia
determinado determinante

obrigatório obrigatório facultativo

complemento ∆ adjunto Ø

vocabular
nominal
verbal

Nota:
a)A diferença essencial entre complemento e adjunto é que o complemento é uma exigência estrutural (pertencente ao sistema
linguístico stricto sensu), enquanto o adjunto é indicação comunicativa (conforme a situação de fala).
b)O complemento, como termo obrigatório, age sob duas vias antagônicas:
*obriga à atualização física → X;
*obriga à não-atualização física → ∆.
O adjunto, como termo facultativo, deve ser entendido como:
*explícito → X [enunciado];
*implícito → Ø [compreensível]

O nível vocabular (ou morfológico) assim se faz, em tese:

ESTRUTURA SINTÁTICA
ou
ESTRUTURA MORFOSSINTÁTICA

signoX signoY/Z/W
↓ ↓
núcleo periferia
determinado determinante

obrigatório obrigatório facultativo

complemento ∆ adjunto Ø

vocabular

Raiz morfema flexional morfema derivacional


42

O nível nominal (ou sintagmático) assim se faz, em tese:

ESTRUTURA SINTÁTICA
ou
ESTRUTURA MORFOSSINTÁTICA

signoX signoY/Z/W
↓ ↓
núcleo periferia
determinado determinante

obrigatório obrigatório facultativo

complemento ∆ adjunto Ø

Nominal

Nome complemento nominal adjunto adnominal/


aposto

O nível verbal (ou oracional) assim se faz, em tese:

ESTRUTURA SINTÁTICA
ou
ESTRUTURA MORFOSSINTÁTICA

signoX signoY/Z/W
↓ ↓
núcleo periferia
determinado determinante

obrigatório obrigatório facultativo

complemento ∆ adjunto Ø

Verbal

Verbo complemento verbal adjunto adverbial


sujeito
predicativo
agente da passiva

fim
43

MODELOS ESTRUTURAIS DE ORAÇÃO

J. Bento

*GRAMÁTICA TRADICIONAL

Voc S P Atit

mod V CV1,2 PRED AGP ADV


Existente ênfase Intransitivo algo/ atributo {agente} modo
Inexistente intensidade Transitivo alguém modo lugar
negação Ligação lugar tempo tempo
dúvida Passivo assunto função/
finalidade
causa
meio/
instrumento
companhia
comparação
conformação
contrariedade
condição
consequência
assunto
proporção
valor

classificação
dependente da
proposta de
sentido
(acepção)
inscrita na oração

Osub Osub Osub Osub Osub


44

*BENTO

Esp-esq Esp-dir

Estrutural Mod V Estrutural Adestrutural

Δ Δ Ø

expl.(des.)/indet. expl. expl./indet.


[+] [+/-] [+/-] [+]
↓ ↓ ↓ ↓
algo neg. algo valor
alguém duv. alguém função
. enf. atributo finalidade
intens. modo causa
lugar meio
tempo instrumento
assunto companhia
comparação
conformação
contrariedade
condição
consequência
proporção
N

TÉCNICA GERAL DE DESCRIÇÃO

Δ Δ
VERBO
X Y

em que X/Y:

a]Se ocorrem na construção, estão impedidos de não-ocorrer


[agramaticalidade/alteração de sentido/indeterminação do sujeito]
b]Se não ocorrem na construção, estão –
*impedidos de não-ocorrer
[agramaticalidade/alteração de sentido/indeterminação do sujeito]
*impedidos de ocorrer
[alteração de sentido/determinação do sujeito]
45

*PERINI (ver: Apêndice)

Pred Voc

Suj NV Aux NdP OD CP Pv Atr AA AO AC


↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓
+CV ... -CV -CV -CV -CV -CV -CV -CV
... ... +Ant +Ant -Ant +Ant -Ant +Ant +Ant
... ... +Q +Q +Q -Q -Q -Q -Q
... ... -CN +CN +CN +CN -CN -CN -CN
... +pNdP -pNdP -pNdP -pNdP -pNdP -pNdP -pNdP -pNdP
... ... +Cl +Cl +Cl +Cl +Cl -Cl +Cl
... ... -PA -PA -PA +PA -PA +PA -PA

*ROCHA LIMA (ver: Apêndice)

S P Voc

* V Od Oi Cr Cc Agp Pred (Adv)


46

*KOCH (ver: Apêndice)

SN SV (SPA)

V intr (intens) (SPA)

trans (intens) SN (SPA)


SPC
SN + SPC
SPC + SPC

Cóp SA
SN
SP

*BACK (ver: Apêndice)

Suj Predicado Obj Dat Gen Nom Acus Abl Lim

D E L P R T F V M I C A

fim
47

MODELO DE APRESENTAÇÃO DA ANÁLISE SINTÁTICA


[base tradicional]

J. Bento

Eis o esquema geral que, aplicado a construções linguísticas reais, deverá sofrer adaptações
(nem todos os elementos se atualizam na frase) e/ou provocar adaptações nas respectivas construções
(os elementos podem se deslocar nos atos de fala):

Voc S P Atit

int.
neg.
enf.
duv. Cv/Pred/Agp/Adv
↓ ↓
* * * V * *

adn N adn/cn/ap adn N adn/cn/ap

SN SN

Por curiosidade, uma analogia entre os dois níveis sintáticos – oracional e sintagmático –, em
sua configuração básica, nos daria:

O
(SN)

S Cv/Pred/Agp/Adv/ -
(adn) (cn - - adn/ap)

V
(N)

A direita verbal – Cv/Pred/Agp/Adv/ –, e a direita nominal – cn/adn/ap –, até poderiam ser pensados
nesses termos, pelo menos em alguma medida:
48

O
(SN)

Cv/Pred/Agp/Adv/

cn adn/ap

V
(N)

Ou seja: Cv/Agp, por um lado, e cn, por outro, assim como Pred/Adv, por um lado, e adn/ap, por
outro, se correspondem estruturalmente, ou parecem ter relativas semelhanças de comportamento
sintático-semântico entre si. O mesmo se dá com S, por um lado, e adn [esquerdo], por outro;
observemos, de passagem, o caráter de onipresença do adn [esquerdo] nas construções linguísticas,
que nos faz lembrar a onipresença quase absoluta de S no nível oracional.
Dado o aparente comparativo (e, de praxe, só se compara o que se assemelha), seria o nível
sintagmático uma espécie de repetição do nível oracional em escala nominal? Em outras palavras,
poderia se dar isto, no esquema abaixo –

SN

Adn Cn/Adn/Ap

– numa alusão a isto, abaixo?

S Cv/Pred/Agp/Adv

V
49

Sendo ou não assim, poderíamos, também, substituir o modelo inicial –

Voc S P Atit

int.
neg.
enf.
duv. Cv/Pred/Agp/Adv
↓ ↓
* * * V * *

adn N adn/cn/ap adn N adn/cn/ap

SN SN

– por este –

Voc S P Atit

int.
neg.
enf.
duv. Cv/Pred/Agp/Adv

SN SN

adn N adn/cn/ap V adn N adn/cn/ap


↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓
* * * * * * * * * *

– que nos conduz à leitura segundo a qual o nível sintático superior prepara o espaço sintático-
semântico para a alocação dos componentes do nível sintático inferior, estando estes categorizados
como suborações, ou algo equivalente.
Obteríamos a seguinte análise para a construção –

Ela abafava a boca da criança.


50

Voc S P Atit

int.
neg.
enf.
duv. Cv/Pred/Agp/Adv

SN SN

adn N adn/cn/ap V adn N adn/cn/ap


↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓
∆ Ø ela Ø ∆ abafava a boca da criança ∆

– ou, talvez melhor dizendo:

Ela abafava a boca da criança.

S P

Cv

SN SN

N V adn N adn
↓ ↓ ↓ ↓ ↓
ela abafava a boca da criança

O adn direito, do Cv, também merece análise:

Cv

SN

adn

SN

adn N con adn N


↓ ↓ ↓ ↓ ↓
a boca de a criança
51

A análise sintática, tradicional ou mais moderna, tem sérios problemas a resolver em – pelo
menos – dois pontos cruciais da estrutura sintática. Demonstraremos no esquema:

Voc S P Atit

int. problema1
neg.
enf.
duv. Cv/Pred/Agp/Adv

SN SN

problema2

adn N adn/cn/ap V adn N adn/cn/ap


↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓
* * * * * * * * * *

Ambos os problemas dizem respeito, em suma, ao caráter obrigatório ou facultativo, dos termos,
considerando-se que Cv/cn devem ser obrigatórios, enquanto Adv/adn, se definiriam como
facultativos, dispensáveis à estruturação oracional (embora não necessariamente dispensáveis ao ato
de fala, que se tende a guiar pelas circunstâncias comunicativas, circunstâncias tais que provocam,
por outro lado, a dispensabilidade de termos considerados obrigatórios). E haja dificuldade para
equacionar este fenômeno, que parece existir, mas que teima em não se deixar apreender.

Notação:
O = oração Voc = vocativo
S = sujeito P = predicado
Atit = atitudinal int. = intensificador
neg. = negação enf. = enfatizador
duv. = dúvida Cv = complemento verbla
Pred = predicativo Agp = agente da passiva
Adv = adjunto adverbial V = verbo
adn = adjunto adnominal N = nome
cn = complemento nominal ap = aposto
SN = sintagma nominal ∆ = inexistente
Ø = espaço vazio, não preenchido con = conectivo

fim
52

FATIAMENTO SINTÁTICO

J. Bento

Fatiamento sintático é, na perspectiva da análise sintática, tanto quanto – supõe-se – na


atividade linguística dos falantes, a operação psicolinguística que consiste em definir/delimitar os
termos, ou funções sintáticas, de uma oração. Costumeiramente, tende-se a utilizar parâmetros do
senso comum, ou experiência de mundo. No exemplo –

*O chefe vinha recolher os bilhetes de cigarro na boca.

– a proposta de análise mais plausível é destacar –

*“de cigarro na boca”

– como um adjunto adverbial, e isso tem por base as nossas vivências, as quais nos sugerem, com
relação à mencionada construção, quatro fatias de sentido sequenciadas:

*alguém
*recolher
*algo
*de um modo

Acontece, porém, que frequentemente as estruturas oracionais, para além de suas relações com o
pensamento e/ou o senso de realidade que carregamos, ensejam outras leituras adicionais possíveis
(as quais só esperam um contexto de uso adequado para virem à tona). Essas leituras podem não
estar, a princípio, muito de acordo com nossa experiência de vida, mas, a despeito disso, não deixam
de ser indicações inferidas sob a urdidura oracional tal como se nos apresenta.
Assim é que, para a oração –

*O chefe vinha recolher os bilhetes de cigarro na boca.

– poderiam muito bem ser factíveis, além da compreensão esperada, anteriormente estipulada –

*O chefe vinha recolher os bilhetes de cigarro na boca.

– as duas seguintes hipóteses:

*O chefe vinha recolher / os bilhetes de cigarro / na boca.


*O chefe vinha recolher os bilhetes / de cigarro / na boca.

Na primeira leitura destas duas, deve-se construir um mundo em que existam “bilhetes de
cigarro”, o que, devido ao inusitado da proposta, pode nos soar ininteligível num primeiro momento.
O que seriam, de fato, “bilhetes de cigarro”? Isso, no entanto, não é problema da sintaxe, mas da
pragmática, ou das realidades linguísticas em contato com as realidades do mundo, e vice-versa. A
sintaxe, em si, apenas fornece a estrutura, que, nos casos arrolados, são plenamente gramaticais,
deixando e elaboração do sentido para o nível ulterior do enredo linguístico-discursivo.
Evidentemente, ao se admitir, por acaso, a existência de –

*“bilhetes de cigarro”

– “na boca”, na mesma estrutura, passa a valer, sozinho, como um adjunto adverbial de lugar e, por
conseguinte, teríamos de imaginar um lugar que, evenutalmente, suporia uma parte a ser
denominada de “boca” etc., para se poder sustentar a razoabilidade do sentido a ser aplicado à
oração, ou na oração.
Na segunda leitura, o termo –

*“de cigarro”
53

– como se percebe, adquire, sozinho, a função de modo, ou seja, consistiria de um adjunto adverbial
de modo, como quando alguém pudesse falar que –

*As pessoas desta cidade só viajam de cigarro.

– mais ou menos como querendo dizer, aproximadamente, que –

levam consigo, para onde vão, uma carteira de cigarro

– ou coisa parecida. E, por seu lado –

*“na boca”

– manteria a sua condição de lugar, equivalente ao que se dá com a primeira das duas leituras.
Outrossim, não fosse o aparente empecilho da preposição “em” [= em + a > na], ou melhor, se
substituíssemos esse construto pelo equivalente paradigmático “de”, a construção –

*O chefe vinha recolher os bilhetes de cigarro na boca.

– arregimentaria outra leitura sintática –

*O chefe vinha recolher os bilhetes de cigarro de boca.

– em que –

*os bilhetes de cigarro de boca

– terminaria sendo um termo único, compreendendo todo o complemento verbal. Estranhamente, a


substituição da preposição –

*“em”

– por –

*“de”

– assim como foi feito, parece impedir qualquer uma das outras leituras anteriormente aventadas,
embora se pudesse imaginar pelo menos uma outra, diferente:

*O chefe vinha recolher /os bilhetes de cigarro / de boca.

– em que “de boca” passaria a funcionar como adjunto adverbial de modo, apesar de ser difícil
explicar que modo seria este:

alguém pode fazer algo de boca



adjunto adverbial de modo

O que se poderia pensar a respeito de “alguém fazer algo de boca”? Obviamente, esse modo só não
tem um sentido captável porque ainda não se fez constante em algum universo de discurso, e não
porque seria inviável uma maneira de agir que fosse representada pela expressão “de boca”. Ou,
quem sabe, na gíria até poderíamos nos deparar com uma leitura equivalente.
Finalmente, apondo-se à preposição “de” o artigo “a”, como –

*O chefe vinha recolher os bilhetes de cigarro da boca.

– “da boca” tanto poderia ser um adjunto adnominal como um adjunto adverbial de lugar, a
depender da compreensão que se impusesse:
54

*O chefe vinha recolher os bilhetes de cigarro da boca.



adjunto adnominal

*O chefe vinha recolher os bilhetes de cigarro / da boca.



adjunto adverbial de lugar

A atividade de análise sintática, não raro, está a depender destas elucubrações, o que confere
ao estudo da língua em si, de uma maneira geral – e não somente no que importa à sintaxe –, uma
constante necessidade de recorrer a dados extralinguísticos e coisas assim. Ou, melhor dizendo, a
análise linguística, mormente no que tange à sintaxe, deve se precaver da constatação de que, por
trás de uma estrutura de superfície, uniforme, a gerar o que se chama de ambiguidade, podem se
esconder múltiplas estruturas profundas:

ESTRUTURA DE SUPERFÍCIE

o chefe vinha recolher os bilhetes de cigarro na boca

ESTRUTURAS PROFUNDAS

o chefe / vinha recolher / os bilhetes / de cigarro na boca

o chefe / vinha recolher / os bilhetes de cigarro / na boca

o chefe / vinha recolher / os bilhetes / de cigarro / na boca

Algo parecido se dá, por exemplo, com o nível semântico-lexical, numa das interpretações
possíveis, na qual se faz um paralelo com a sintaxe, tal como descrita acima:

ESTRUTURA DE SUPERFÍCIE

[cavalo]

ESTRUTURAS PROFUNDAS

/cavalo/1 → animal

/cavalo/2 → indivíduo sem educação

/cavalo/3 → peça do xadrez


55

Só de passagem e a título de curiosidade, é interessante perceber, a propósito do nível


semântico-lexical, que a tendência é supor o inverso:

ESTRUTURA PROFUNDA

/cavalo/

ESTRUTURAS DE SUPERFÍCIE

[cavalo]1 → animal

[cavalo]2 → indivíduo sem educação

[cavalo]3 → peça do xadrez

Nesta circunstância, a estrutura profunda do nível semântico-lexical seria representada pelo


construto geral, esvaziado de significação, ou de significação fluida, inespecífica, imprecisa, ambígua

/cavalo/

– atribuindo-se às estruturas de superfície, atualizadas em seus respectivos contextos de uso, o


potencial de significar concretamente:

*[cavalo]1 → animal, num discurso sobre animais domésticos;


*[cavalo]2 → indivíduo sem educação, num discurso sobre pessoas rudes;
*[cavalo]3 → peça do xadrez, num discurso sobre jogo de xadrez;
*etc.

Poderíamos fazer o mesmo com a sintaxe, como fizemos com a semântica lexical?

ESTRUTURA PROFUNDA

o chefe vinha recolher os bilhetes de cigarro na boca

ESTRUTURAS DE SUPERFÍCIE

o chefe / vinha recolher / os bilhetes / de cigarro na boca

o chefe / vinha recolher / os bilhetes de cigarro / na boca

o chefe / vinha recolher / os bilhetes / de cigarro / na boca

Poder, pode... Agora será necessário ver as implicações teóricas da postulação...


fim
56

MODELO CLÁSSICO DE DESCRIÇÃO SINTÁTICA

J. Bento

a)Oração

Voc S P Atit

mod V CV1,2 PRED AGP ADV


Existente ênfase Intransitivo algo/ atributo {agente} modo
Inexistente intensidade Transitivo alguém modo lugar
negação Ligação lugar tempo tempo
dúvida Passivo assunto função/
finalidade
causa
meio/
instrumento
companhia
comparação
conformação
contrariedade
condição
consequência
assunto
proporção
valor

classificação
dependente da
proposta de
sentido
(acepção)
inscrita na oração

Osub Osub Osub Osub Osub

b)Orações coordenadas

Orações coordenadas são aquelas que não se encaixam uma(s) nas outra(s), à maneira das
subordinadas, embora, na perspectiva do período, possam ser interpretadas como pertencentes a uma
unidade oracional mais ampla, correspondente ao período em que se inscrevem.
Tradicionalmente, há uma classificação das orações coordenadas, que compreende as aditivas,
adversativas, alternativas, conclusivas e explicativas. Isto significa, por dedução, que em períodos cujas
orações não contemplam um desses tipos (e cujas orações também não sejam subordinadas,
naturalmente), tais orações passem a ser chamadas de justapostas ou intercaladas, e poderiam ter um
tratamento mais em função do discurso, do que propriamente do enredo sintático em si.
57

Oinicial Ocoordenada

S P S P

(Osub) V (Osub) (Osub) V (Osub)

ISTO mais AQUILO


[aditiva]

ISTO mas AQUILO


[adversativa]

ISTO ou AQUILO
[alternativa]

ISTO logo AQUILO


[conclusiva]

ISTO porque AQUILO


[explicativa]

Não confundir explicação (coordenação) com causa (subordinação):

*Aconteceu alguma coisa com o João, porque ele nunca chega atrasado.
[dado] [explicação]

É DITO O QUE É DITO [DADO] COM BASE NESTA INFORMAÇÃO [EXPLICAÇÃO]

*João chegou atrasado porque o ônibus quebrou no caminho.


[efeito] [causa]

O QUE É DITO [EFEITO] É PROVOCADO POR ESTE MOTIVO [CAUSA]

Observemos que a explicação – “nunca chegar atrasado” – não PROVOCA “alguma coisa que
supostamente deva ter acontecido a João”; ao contrário, “o ônibus quebrar” é um elemento
provocador de um “atraso” (no caso, “o atraso de João”). Então, assim fica clara a distinção entre
oração coordenada explicativa e oração subordinada causal.
58

c)Sintagma

SINTAGMA NOMINAL
[S/CV/PRED/AGP/ADV]

(+/-prep) ADN mod N ADN CN AP


{especificação} ênfase substantivo {especificação} {complemento} {explicitação}
intensidade pronome
negação adjetivo
dúvida advérbio

Osub Osub Osub

fim
59

DOIS ASPECTOS ELEMENTARES DA SINTAXE

J. Bento

1.Transitividade verbal

A transitividade verbal, no português, comporta três hipóteses não necessariamente


excludentes, a depender de uma tipologia de verbos sob o critério da respectiva hipótese:

VERBO

Hipótese1 Hipótese2 Hipótese3


↓ ↓ ↓
transitividade transitividade transitividade
variável invariável diversa

Na transitividade variável, o verbo não contemplaria, na sua estrutura profunda, ou sistema,


uma categorização definida. Ao contrário, na transitividade invariável, o verbo tem uma forte
tendência a manter-se numa categorização única, ainda que esta determinação não seja absoluta. A
transitividade diversa difere da transitividade variável pelo fato de se poder postular a ocorrência de
multiplicidade de elementos verbais: não seria apenas um verbo, mas tantos verbos quantas as
categorizações identificadas, através do processo homonímico. Nesta última condição, seria
necessário atestar a divergência semântica entre as unidades, como convém ao conceito de
homonímia.
Aplicando-se estas hipóteses, um verbo do tipo –

*comprar

– talvez fosse categorizado pela transitividade variável ou com uma parcela de transitividade variável
e outra parcela de transitividade invariável. Não seria adequado ao conceito de transitividade diversa
porque a variação da transitividade não parece modificar o significado do elemento. Desta forma se
postularmos, como fundamento para análise, três espaços sintáticos para “comprar” –

X comprar Y a Z por W

– (dispensemos, nesta discussão, a ideia de abranger o sujeito como um aspecto da transitividade


verbal), veremos que Z e W são perfeitamente elipsados, enquanto Y é bastante resistente à omissão:

*João comprou uma bola a Pedro por vinte reais.


*João comprou uma bola a Pedro.
*João comprou uma bola.
*?João comprou.

Já um verbo do tipo –

*querer

– deveria ser classificado como de transitividade invariável:

X querer Y

Com efeito, percebe-se uma forte resistência à omissão de Y:

*João quer a bola.


*?João quer.
60

“Comer”, “considerar” e “trabalhar”, por outro lado, deveriam ser classificados como de
transitividade diversa, pois que a variação na transitividade provoca diferenciação semântica:

X comer1 Y [= deglutir]
X comer2 [= alimentar-se]
João comeu1 a melancia.
João comeu2.

X trabalhar1 [= exercer uma função]


X trabalhar2 Y [= fazer com esmero]
João trabalha1.
João trabalha2 o projeto.

X considerar1 Y como Z [= julgar]


X considerar2 Y [= respeitar]
João considera1 Pedro inteligente.
João considera2 Pedro.

A propósito da diferenciação semântica, será útil assinalar que nem toda diferenciação semântica
resulta em diferenciação de transitividade, assim como, provavelmente, nem toda alteração de
transitividade resulta em diferenciação semântica.
A proposta de que verbos do tipo “comprar” têm (uma parcela de) transitividade variável só
faz sentido se mantivermos a posição de que Z e W são, de fato, funções sintáticas, e não apenas
funções semânticas.

2.Função sintática vs. Função semântica

Quando fazemos a análise sintática pela via tradicional, dificilmente nos perguntamos o que a
vem ser, exatamente, uma função sintática. Mas nós podemos entender este conceito através do
critério da imprescindibilidade, rigorosamente aplicado ao procedimento analítico. A
imprescindibilidade é um construto que visa discernir entre aqueles elementos da estrutura oracional
que contribuem para a sua efetiva organização, ou gramaticalidade – função sintática –, em
contraposição aos elementos, prescindíveis, que resultam do itinerário comunicativo, mas não de uma
exigência linguística stricto sensu – função semântica. Toda função sintática exerce, ainda que
indiretamente, uma função semântica, embora nem toda função semântica reclame uma função
sintática, nos termos em que estamos a compreender os fatos.
Vamos ilustrar este pensamento com a oração –

*João comprou uma bola a Pedro por vinte reais.

– colocando em sublinhados separados os elementos que se supõe estarem a compor o enunciado, do


ponto de vista linguístico e em certo nível estrutural.
Uma breve reflexão é suficiente para enxergarmos a dispensabilidade de certos elementos, bem
como a indispensabilidade de outros elementos, para a consecução da estrutura oracional. No fim das
contas, apenas “João”, “comprou” e “uma bola” dão conta, satisfatoriamente, da identificação do
enunciado como uma oração, além de serem a exigência para se tomar esta construção sintática como
uma oração:

*João comprou uma bola.

Os demais elementos – “a Pedro” e “por vinte reais” – realizam propósitos meramente


informacionais, no jogo discursivo.
Observemos que a condição sine qua non para que um elemento exerça função sintática, e não
simplesmente semântica, está posta pelo sistema linguístico como imposição, em que é vedado ao
falante o direito de inobservância à regra, linguística.
Agora, vejamos que, se o falante decidir evidenciar a informação a respeito do vendedor e do
valor do objeto comprado, deverá, por imposição do sistema, alocar uma preposição, especificamente
“a”, antes de “Pedro”, e outra preposição, “por”, antecedendo “vinte reais”. Logo, estas preposições,
sob certa perspectiva de análise, exercem função sintática na construção, e assim por diante.
61

O sistema da língua é, todo ele, substancialmente coercitivo e, por conseguinte, a sintaxe não
poderia fugir à regra. Quando alguém seleciona um verbo como “comprar”, por exemplo, a
morfossintaxe cuida para que o falante não se abstenha de enunciar, basicamente, o comprador, o
objeto comprado, o tempo em que foi comprado, além de coordenar a concordância e regência entre
os elementos, da maneira em que é cobrado.

2.1.Adjunto adverbial e adjunto adnominal como função semântica

O que se diz a respeito da diferença entre função sintática e função semântica tem implicações
mais ou menos profundas no procedimento da análise sintática tradicional. Em particular, os
chamados adjuntos adverbiais e adjuntos adnominais devem ser realocados como funções meramente
semânticas, uma vez que não são exigências da estrutura oracional. Numa frase do tipo –

*João comprou uma bola na semana passada, em Fortaleza.

– os elementos sublinhados, “na semana passada” e “em Fortaleza” – adjuntos adverbiais –, são
dados meramente discursivos e, portanto, exercem função restritamente semântico-informacional. É
certo que a construção linguística integral está em conformidade com o modelo sintático esperado e,
neste sentido, é uma construção gramatical, inclusive por haver exigências com relação ao contexto
de inserção e disposição sintagmática dos elementos, mas tal constatação talvez não seja suficiente
para sustentar que os referidos elementos compõem a estrutura sintática stricto sensu, pois que
podem ser excluídos sem prejuízo da gramaticalidade, que é o ponto a ser focado.
Este mesmo raciocínio pode ser aventado com relação a “de couro”, como em –

*João comprou uma bola de couro.

Apesar de, ao selecionar “couro” para caracterizar “bola” – adjunto adnominal –, o falante seja
obrigado a interpor a preposição “de” – um dado sintático, portanto – ao falante não é dada a
obrigação, linguística, de caracterizar “bola”.
Estamos, neste ínterim, alcançando o vislumbre de dois aspectos linguísticos complementares:

a)Em primeiro lugar, o falante domina um conjunto de entradas lexicais – o Léxico –, que será
acionado em concordância com o propósito comunicativo: “comprar”, “bola”, “couro” etc.;
b)Em segundo lugar, o falante organiza estas unidades lexicais num plano sintático que prevê
obrigações linguísticas – a Sintaxe –, mas, dentro destas obrigações, há um número mínimo de itens
a serem impreterivelmente realizados, em conformidade com o verbo e, a partir do verbo, os nomes
complementares.

Todas estas parcas considerações em torno da transitividade verbal, da função sintática e


correlatos são praticamente incipientes e insipientes, e devem ser julgadas apenas como hipóteses
pueris, carentes de um complexo processo de amadurecimento, com fortíssimas possibilidades de se
mostrarem inoperantes.

fim
62

ANÁLISE SINTÁTICA DA ORAÇÃO COM BASE NO SIGNIFICADO DO VERBO – A


COMPLEMENTAÇÃO
[alguns exemplos ilustrativos]

J. Bento

Listemos algumas pinceladas sobre a análise sintática de alguns verbos do português,


assumindo o procedimento de verificar a configuração de significado dos mesmos. Deve-se entender,
com esta visão, que a estruturação sintática da chamada oração, cujo núcleo sintático é o verbo,
depende criteriosamente da configuração semântica do item verbal, em termos de seus atributos
sêmicos. Em outras palavras, o desenvolvimento estrutural da oração consistiria, basicamente, em
preencher os espaços semânticos proformáticos, revelados no interior do significado dos verbos –
algo, alguém, assim etc.

*COMPRAR

significado mais corrente



(alguém)
adquirir
algo
a alguém
por um valor monetário

Observação:

Era de se esperar que, na estruturação sintática, houvesse o preenchimento (complementação) dos


elementos alguém, algo, a alguém e valor monetário, que são os espaços sintático-semânticos
requeridos pela noção veiculada pelo verbo:

X comprou Y a Z por W

Não obstante, a norma linguística mais corrente geralmente dispensa dois desses elementos – a
alguém e valor monetário –, o que enseja duas possibilidades de análise:

a)Estes elementos dispensáveis são meros adjuntos, dependentes de fatores comunicativos (ou seja,
necessidade ou não-necessidade de explicita-los no ato de fala). Portanto, o verbo é transitivo direto.

Ou

b)Estes elementos dispensáveis continuam como complementos, apenas não atualizáveis no uso
comum do verbo. Desta forma, o verbo deverá ser tido como transitivo direto e indireto, dentro de
uma espécie esdrúxula, ou seja, não prevista na teoria gramatical corrente, pois conteria três
complementos.

A análise gramatical tradicional, em regra, deverá considerar os elementos dispensáveis – a


alguém e valor monetário – como complementos (ou pelo menos a alguém como complemento, ficando
valor monetário como adjunto), por conta da sugestão veiculada pelo conceito de circunstância.
Assim, a alguém, em particular, aparentemente nunca poderia ser tomado na conta de circunstância;
logo, só poderia ser complemento (o chamado objeto indireto). O problema mais relevante na análise
tradicional parece ser a falta de consistência: o verbo será tomado como transitivo direto quando não
se explicita o termo a alguém; deverá ser tomado como transitivo direto e indireto quando ocorre a
explicitação. E como fica? O verbo “comprar” é transitivo direto ou transitivo direto e indireto?
63

*COMER

significados mais correntes



1
(alguém)
deglutir
algo (alimento)

2
(alguém)
alimentar-se

Observação:

Parece-nos evidente que o verbo “comer” encerra dois significados distintos dentro da norma
linguística, tais como previstos na descrição acima. No entanto, ainda é possível estabelecer duas
propostas de análise:

a)Considerar as duas opções de significado como reveladoras de verbos lexicalmente independentes,


em estado de homonímia. Nesta situação, teríamos verbo transitivo direto em um caso, e verbo
intransitivo no outro caso.

Ou

b)Considerar a persistência de um único verbo “comer” – transitivo direto – que tem uma formulação
variante na qual o complemento – objeto direto – não se atualiza, dando como resultado uma alteração
no significado.

*DAR

significado mais corrente, ou mais prontamente esperado



(alguém)
conceder
algo
a alguém

Este verbo, nesta acepção, é considerado transitivo direto e indireto, conforme sua configuração
semântica, mas a presença do termo a alguém tende a ser costumeiramente omitida, ficando muito a
cargo da situação de fala a necessidade de explicita-lo. Percebamos, de passagem, que a omissão do
termo algo, por seu lado, leva o verbo a conceber outro significado, quiçá um pouco alheio ao
anterior:

*DAR2

significado corrente alternativo



(alguém)
conceder (favores sexuais)
a alguém

Neste caso, o verbo deveria ser interpretado como transitivo indireto.


64

*CONSIDERAR

significados mais correntes



(alguém) 1
julgar
alguém
assim

(alguém) 2
respeitar
alguém

Observemos que, na primeira acepção, o verbo deveria ser tomado como transitivo direto e indireto,
ou algo parecido, mas não é isso que diz o ponto de vista tradicional. Na versão tradicional, o termo
assim, longe de ser um complemento verbal, é uma espécie de predicado “menor” no interior do
predicado “principal”; daí, o nome predicativo do objeto.
Na segunda acepção, tudo ocorre tal como previsto nos atributos do significado, inclusive sem
chance de omissão – do termo alguém – na perspectiva da língua.

fim
65

FOCOS DE PROBLEMAS NA ANÁLISE SINTÁTICA TRADICIONAL

J. Bento

Grosso modo, os focos geradores de problemas são estes, indicados pelas setas:

Vocativo

Sujeito

Predicado

Complemento verbal

Adjunto adverbial

Predicativo

Agente da Passiva

Complemento nominal

Adjunto adnominal

Aposto
66

Os casos típicos, em resumo:

a)vocativo/sujeito
*Quando vocativo e sujeito têm o mesmo referente.
Exemplo: João, compre-me um quilo de feijão.

b)sujeito/complemento verbal
*Quando o sujeito está posposto, ou seja, no espaço sintático reservado ao complemento verbal.
Exemplo: Compra-se carro usado.
Obs.: Apesar de, em norma coloquial, o sujeito ser indeterminado, em norma padrão, “carro usado”
é o sujeito.

c)complemento verbal/adjunto adverbial [crucial]


*Quando locativos e uma ou outra circunstância, que deveriam ser adjuntos adverbiais, se
comportam como complementos verbais, em função do critério da necessidade sintático-semântica,
exigida pelo verbo.
Exemplo: João mora em Fortaleza.

d)adjunto adverbial/predicativo [crucial]


*Quando se interpõe a dúvida sobre a direção do atributo (modal), se fazendo interligação sintático-
semântica com o verbo ou com a expressão nominal.
Exemplo: João trabalha feliz

e)predicativo/adjunto adnominal [crucial]


*Quando se interpõe a dúvida sobre a direção do atributo, se de natureza intrínseca ou extrínseca à
expressão nominal considerada.
Exemplo: João atiçou o cão raivoso.

f)agente da passiva/complemento nominal


*Quando o núcleo da construção corresponde a um particípio, que encerra dupla natureza, adjetival
e verbal.
Exemplo: Recomendado pela medicina, a prática de exercício é um fator de saúde.

g)complemento nominal/adjunto adnominal [crucial]


*Quando a estrutura a ser analisada corresponde a substantivo abstrato + de_____.
Exemplo: João desenhou a forma do projeto.
Obs.: O “projeto” já tinha forma antes – adjunto adnominal – ou o “projeto” ganhou forma após o
desenho de João – complemento nominal?

h)adjunto adnominal/aposto
*Quando o aposto não se registra separado por vírgula e se liga por preposição “de”.
Exemplo: João visitou a cidade de Fortaleza.

fim
67

PERSPECTIVA DE FUNDO PARA O PROCEDIMENTO DE ANÁLISE SINTÁTICA


[versão tradicional]

J. Bento

Na análise sintática (tradicional), há de se ter em conta, previamente, o panorama geral da


estrutura oracional, para que se possa ajuizar, com maior discernimento, a função sintática de cada
elemento que compõe, em concreto, a oração sob análise:

S P

V cv pred agp adv

adn adn adn adn adn


adn N cn adn N cn adn N cn adn N cn adn N cn
ap ap ap ap ap

Notação:

O → Oração
S → Sujeito
P → Predicado
V → Verbo
Cv → Complemento verbal [objeto direto / objetivo indireto]
Pred → Predicativo [do sujeito / do objeto]
Agp → Agente da passiva
Adv → Adjunto adverbial
N → Nome
Adn → Adjunto adnominal
Cn → Complemento nominal
Ap → Aposto
68

Não é, obviamente, que toda oração contemple todos esses elementos de uma vez. Na verdade,
muito certamente nenhuma oração real poderá fazê-lo. O esquema geral – reiteramos – funciona
como uma espécie de mapa sintático, que visa situar/guiar o analista no ambiente da estrutura
oracional.
Assim é que, por exemplo, uma oração como –

*Todo gato tem medo de cachorro.

– só atualiza, da estrutura integral, o seguinte enredo:

S P

V cv
3

adn N N cn
1 2 4 5

Lendo:

1 – todo
2 – gato
3 – tem
4 – medo
5 – de cachorro

Observação:

O [de], de [de cachorro], é um elemento meramente conectivo, e só o apomos no complemento nominal


porque esta é a maneira clássica de analisar. O complemento nominal, a rigor, é apenas [cachorro].

fim
69

FUNÇÃO, POSIÇÃO E CLASSE EM GRAMÁTICA

J. Bento

Em gramática – morfossintaxe –, pode-se dar o nome de função à relação existente entre um


elemento subordinante/determinante (núcleo) e seus elementos subordinados/determinados
(periféricos – complemento(s), obrigatórios, integrantes e/ou adjunto(s), facultativos, acessórios):

MOLÉCULA GRAMATICAL
[função]

subordinante subordinado
determinante determinado
núcleo periférico

complemento adjunto
obrigatório facultativo
integrante acessório

A posição, ou contexto, pode ser entendida como o “lugar” ocupado, na estrutura considerada,
do(s) elemento(s) subordinado(s) em relação ao elemento subordinante. Assim, numa estrutura como

X
[estrutura]

y z w
[núcleo] [subordinado1] [subordinado2]

– dizemos, por exemplo, que –

z [subordinado1]

– se posiciona no contexto direito imediato em relação ao núcleo; ou em –


X
[estrutura]

z y w
[subordinado1] [núcleo] [subordinado2]

– dizemos que o mesmo –


70

z [subordinado1]

– encontra-se no contexto esquerdo imediato em relação ao núcleo.


Função e posição, de uma maneira geral, selecionam traços formais e/ou semânticos que vão
gerir as possibilidades de inserção das unidades complexas e unidades elementares – a depender do
nível estrutural –, que preenchem os respectivos espaços morfossintático-semânticos.
É o que se pode chamar de classe, a partir da qual se pode afirmar que tal ou qual elemento
pertence ou não pertence a tal ou qual classe, ou, de qualquer jeito, é passível de pertencer a tal ou
qual classe. Desta maneira, por exemplo, “cantamos” se inscreve na classe dos verbos, em razão de
seus aspectos formais (flexão) e semânticos (designação de um ato) compatíveis com a prevista classe
dos verbos, ou núcleo oracional.
Existirão, porventura, elementos que, sistematicamente, ocupam determinada classe –
classificação fixa –, e elementos que alternam de uma classe para outra – classificação variável –, sem
modificações ou sem modificações relevantes do ponto de vista formal e/ou semântico. “Garoto”, por
exemplo, tem uma classificação fixa – substantivo –, enquanto “inteligente” costuma flutuar entre
substantivo e adjetivo, ou seja, é compatível com ambas as classes, substantivo e adjetivo.

MOLÉCULA GRAMATICAL COMPLETA


[função]

subordinante subordinado
determinante determinado
núcleo periférico

complemento adjunto
obrigatório facultativo
integrante acessório
↓ ↓
[posiçao1] [posição2]

[classe1] [classe2] [classe3]


↓ ↓ ↓
P R E E C H I M E N T O

fim
71

REALIDADE, COSMOVISÃO, INTERPRETAÇÃO E SINTAXE


J. Bento

Atribuindo-se à linguagem a incumbência da representação do mundo, mundo este construído através da


elaboração cognitiva humana, respaldada pelo acervo cultural acumulado, cabe analisar esta faculdade dentro
da função que exerce. Pelo menos, trata-se da proposta em conformidade com a tradição dos estudos linguísticos,
na qual se inclui a sintaxe, e que pode ser desenhada como segue:

seres/
REALIDADE → coisas/
[o que há] eventos

CULTURA → saberes/
[cosmovisão] procederes
lugar das premissas/postulados

lugar das conclusões/postulações

CONCEPÇÃO → interpretação
[entendimento]

SINTAXE → ordenamento
[linguagem] linguístico

É por esta linha de raciocínio que se considera, por exemplo, a sentença em português –

*Chove muito nesta cidade.

– como destituída de sujeito, não porque, sobre os fatos percebidos, não possa ser arregimentado, de alguma
forma, um agente para o evento, mas porque é assim que se compreenderia a realidade a partir do sistema de
linguagem a que denominamos de língua portuguesa, e que tende ou não a coincidir com outras universos
linguísticos, mais ou menos aparentados (francês, alemão, chinês...). Logo, realidade, de um lado, e
cultura/concepção/linguagem, de outro, não assumem um compromisso de fidelidade mútua, a despeito de se
poder, metodologicamente, construir-se este compromisso como base para a análise linguística, fazendo vistas
grossas para todos os senões que porventura se intrometam e obnubilem os caminhos traçados. Em outras
palavras, a Linguagem (incluindo-se aqui a cultura/concepção de mundo, pois que parecem ser, de fato,
indissociáveis entre si) representa a Realidade, mas fá-lo de maneira peculiar, a mercê da própria constituição
interna (estrutura), que lhe é inerente.
Observemos, outrossim, levando em conta o esquema ilustrativo acima, que mesmo os fatos de
cultura/concepção/linguagem não estabelecem, de todo, equivalências perfeitas entre si. Teoricamente, sempre
há espaço para distorções e incongruências, a ponto de podermos surpreender, com frequência, dados do
universo linguístico que não correspondem, ou não correspondem mais, à concepção/cultura dos falantes. Em –

*O sol nasce.

– pode estar um bom exemplo desta falta de sintonia entre linguagem e concepção/cultura, visto já termos
conhecimento acumulado suficiente, em nosso tempo, sobre a realidade factual que permeia aquele objeto
luminoso e quente, suspenso nos céus.
Assim, dizer, à maneira de retificação, que a linguagem representaria, não exatamente a realidade, mas o
que se pensa sobre a realidade, nos termos de cosmovisão subjacente, não melhora significativamente o ponto de
vista epistemológico que adota a linguagem como função representativa (de mundo).
Nada obsta, portanto, que a linguagem deva ter como função precípua, não a representação, mas a
ação/reação sobre os dados da realidade e/ou as circunstâncias discursivas que envolvem a interação entre
indivíduos dotados de interesses e perspectivas (ideológicas) de vida. Mas aqui começa outra estória...
De qualquer maneira, e voltando ao tema da linguagem como representação, uma análise linguística
(detidamente sintática) que afirma ser, por exemplo, o chamado objeto direto –

um termo da oração sobre o qual recai a significação verbal

– tende a estabelecer pressupostos que normalmente não condizem, nem com os dados da realidade, nem com o
nosso modo trivial de ver esta realidade. Será preciso, acima de tudo, reaprender noções (do tipo recair, por
exemplo), dentro do contexto específico da análise linguística proposta, a fim de tornar minimamente
compreensível a que se refere, exatamente, o conceito de objeto direto (assim, naturalmente, como todos os
demais termos acionados por esta visão linguística).
fim
72

PERÍODO E ORAÇÃO
J. Bento

De maneira simplória, período é uma construção sintática que engloba uma ou mais orações,
caraterizada pela enunciação completa de uma trajetória de pensamento. Oração é uma construção
sintática composta de sujeito e predicado. Assim, podemos dizer que todo período consiste, a rigor,
de uma oração, mas nem toda oração se define como período.
Por exemplo, em –

*A casa que João comprou é muito bonita.

– nós temos:
a)um período
a casa que João comprou é muito bonita
b)duas orações
a casa que João comprou é muito bonita
&
que João comprou

Observemos que –

*a casa que João comprou é muito bonita

– é, concomitantemente, período, pois que representa uma –

trajetória completa de pensamento

– e oração, pois que explicita:


1]sujeito: a casa que João comprou
2]predicado: é muito bonita

Já em –

*que João comprou

– temos uma oração –

1]sujeito: João
2]predicado: comprou que (= a casa)

– mas não temos o período –

trajetória completa de pensamento

– pelo menos quando a consideramos sob os aspectos em que se estrutura superficialmente:


que João comprou

Em tais circunstâncias, quem poderia, sequer, articular alguma modalidade de pensamento, ao


auscultar uma sentença como esta? Logicamente, se retiramos a referida oração do seu contexto
original e a recompomos em sua canonicidade –

que João comprou


=
João comprou a casa

– passamos a ter uma oração elevada à condição de período.


Por outras palavras, orações podem eventualmente não estar estruturadas como períodos, mas
sempre estão aptas a adquirem a condição de períodos quando as fazemos isoladas do contexto
sintático em que se inserem.
fim
73

ORAÇÃO NO TEXTO

J. Bento

A oração, que se define, estruturalmente, como a unidade sintática essencial da língua –


confiramos os paralelos:

UNIDADADES LINGUÍSTICAS ESSENCIAIS

SIGNIFICANTE SIGNIFICADO

Fonologia Morfologia Sintaxe

sílaba vocábulo oração


[composto fonêmico] [composto morfêmico] [composto sintagmático]

–, é uma estrutura que comporta a seguinte urdidura fundamental –

ORAÇÃO

sujeito verbo complemento(s) adjunto(s)



núcleo

– em que, de maneira geral:

a)o sujeito é relativamente obrigatório;


b)o(s) complemento(s) é(são) relativamente facultativo(s);
c)o(s) adjunto(s) é(são) meramente circunstancial(is)[= dependente(s) do ato comunicativo]

Mas acontece que, nos discursos realizados, consumados em textos (escritos/orais), os elementos
que configuram a oração nem sempre são devidamente explicitados (há elipses ou afins), ou
organizados sob a chamada forma canônica (há inversões, truncamentos ou afins), ou prontamente
isolados dos demais construtos oracionais que concorrem para a feitura textual (há intercalações,
conglomerações, implementos coesivos).
Poderíamos dizer, em síntese e em termos aproximadamente saussurianos ou algo parecido,
que uma coisa é ver a oração como estrutura da língua, outra coisa é experimentar a oração como
investidura da fala.
Dito de outra maneira (e considerando que isto se passa também, impreterivelmente, com os
demais constituintes linguísticos, de todos os níveis e de todas as naturezas), é como se tivéssemos a
correlação entre um elemento variável – a oração originária na perspectiva da língua –, que se produz
sob distintas variantes – as orações derivadas na perspectiva da fala –, conforme uma série bem
complexa de fatores discursivo-textuais:
74

VARIÁVEL
[língua]

ORAÇÃO

sujeito verbo complemento(s) adjunto(s)

ORAÇÃO1 ORAÇÃO2 ORAÇÃOn

sujeito verbo complemento(s) verbo sujeito adjunto(s) sujeito adjunto(s) verbo


[fala]
VARIANTES

(Só lembrando, de passagem, que a estrutura variável postulada no esquema acima termina sendo –
por óbvio – uma premissa restritamente teórica, com viés detidamente explanatório, pois que será
preciso distinguir, no estudo de um sistema linguístico particular e a depender do grau de abstração
assumido, as eventuais estruturas subjacentes, diversificadas, que compõem o organismo sintático do
respectivo sistema.)
De todo modo, o que vamos encontrar nos textos reais são, numa palavra, orações reais, e não
orações ideais, as quais emanam da análise linguística implementada, estando, por conseguinte,
atreladas ao mecanismo lógico-dedutivo aplicado, ou pela competência linguística do falante nativo,
ou pelo arcabouço teórico-metodológico do especialista em linguagem verbal. No que tange ao
conhecimento especializado, nada obsta que a diretriz seguida possa provir de esquemas equivalentes
ao já esboçado anteriormente (e agora retomado) –

ORAÇÃO

sujeito verbo complemento(s) adjunto(s)



núcleo

– no sentido de que o procedimento descritivo consistiria em identificar os construtos procurados e,


eventualmente, reconstituí-los com base nesse modelo projetado.

fim
75

ISOLAMENTO DE PERÍODOS E ORAÇÕES SOB O TEXTO

J. Bento

MAL SECRETO
Raimundo Correia

Se a cólera que espuma, a dor que mora


N´alma e destrói cada ilusão que nasce;
Tudo o que punge, tudo o que devora
O coração, no rosto se estampasse;

Se se pudesse o espírito que chora


Ver através da máscara da face,
Quanta gente talvez que inveja agora
Nos causa, então piedade nos causasse!

Quanta gente que ri, talvez consigo


Guarda um atroz, recôndito inimigo,
Como invisível chaga cancerosa!

Quanta gente que ri, talvez, existe


Cuja ventura única consiste
Em parecer aos outros venturosa!

ANÁLISE

Período1

Se a cólera que espuma se estampasse no rosto, talvez tanta gente que nos causa inveja agora, nos causasse
piedade.

O1

Se a cólera que espuma se estampasse no rosto, talvez tanta gente que nos causa inveja agora, nos causasse
piedade.

O2
Talvez tanta gente que nos causa inveja agora, nos causaria piedade.

O3

Que [= tanta gente] nos causa inveja agora.

O4

A cólera que espuma se estampa no rosto.

O5

Que [= a cólera] espuma.

Período2

Se a dor que mora na alma e destrói cada ilusão que nasce, se estampasse no rosto, talvez tanta gente que nos
causa inveja agora, nos causasse piedade.

O1

Se a dor que mora na alma e destrói cada ilusão que nasce, se estampasse no rosto, talvez tanta gente que nos
causa inveja agora, nos causasse piedade.

O2

Talvez tanta gente que nos causa inveja agora, nos causaria piedade.
76

O3

Que [= tanta gente] nos causa inveja agora.

O4

A dor que mora na alma e destrói cada ilusão que nasce se estampa no rosto.

O5

Que [= a dor] mora na alma.

O6

Que [= a dor] destrói cada ilusão que nasce.

O7

Que [= a ilusão] nasce.

Período3

Se tudo o que punge se estampasse no rosto, talvez tanta gente que nos causa inveja agora, nos causasse piedade.

O1

Se tudo o que punge se estampasse no rosto, talvez tanta gente que nos causa inveja agora, nos causasse piedade.

O2

Talvez tanta gente que nos causa inveja agora, nos causaria piedade.

O3

Que [= tanta gente] nos causa inveja agora.

O4

Tudo o que punge se estampa no rosto.

O5

Que [= o = aquilo] punge.

Período4

Se tudo o que devora o coração se estampasse no rosto, talvez tanta gente que nos causa inveja agora, nos
causasse piedade.

O1

Se tudo o que devora o coração se estampasse no rosto, talvez tanta gente que nos causa inveja agora, nos
causasse piedade.

O2

Talvez tanta gente que nos causa inveja agora, nos causaria piedade.

O3

Que [= tanta gente] nos causa inveja agora.

O4

Tudo o que devora o coração se estampa no rosto.


77

O5

Que [= o = aquilo] devora o coração.

Período5

Se se pudesse ver o espírito que chora através da máscara da face, talvez tanta gente que nos causa inveja agora,
nos causasse piedade.

O1

Se se pudesse ver o espírito que chora através da máscara da face, talvez tanta gente que nos causa inveja agora,
nos causasse piedade.

O2

Talvez tanta gente que nos causa inveja agora, nos causaria piedade.

O3

Que [= tanta gente] nos causa inveja agora.

O4

Pode-se ver o espírito que chora através da máscara da face.

O5

Que [= o espírito] chora.

Período6

Tanta gente que ri, talvez guarde consigo um atroz, recôndito inimigo, como invisível chaga cancerosa.

O1

Tanta gente que ri, talvez guarde consigo um atroz, recôndito inimigo, como invisível chaga cancerosa.

O2

Que [= tanta gente] ri.

Período7

Talvez exista tanta gente que ri, cuja única ventura consista em parecer venturosa aos outros.

O1

Talvez exista tanta gente que ri, cuja única ventura consista em parecer venturosa aos outros.

O2

Que [= tanta gente] ri.

O3

A única ventura cuja [= sua = de tanta gente] consiste em parecer venturosa aos outros.

O4

Tanta gente parece venturosa aos outros.

fim
78

CLASSIFICAÇÃO DO SUJEITO

J. Bento

SUJEITO

existente inexistente

determinado indeterminado

exposto imposto direcional ocasional

preenchido preenchível desinencial


[contextual]

Exemplos:

1.Preenchido – João comprou uma casa.


2.Contextual – Comprou uma casa.
(Quem assim fala, deduz que a situação de comunicação dá conta da identificação do sujeito.)
Obs.: O sujeito contextual é de domínio da fala, e não da língua, ou seja, são as circunstâncias de
discurso que fazem deliberar pela atenção ao contexto a fim de se determinar o sujeito da oração.)
3.Desinencial – Comprei/Compramos uma casa.
(Sujeito próprio das formas verbais de primeira pessoa singular/plural, em que o sujeito, conforme
imposição da língua, é, rigorosamente, quem fala, sem a necessidade de preenchimento ou contexto.)
4.Direcional – Compraram a casa de João.
(Alguém comprou, só não se sabe ou não se quer/pode/deve dizer quem.)
(Obs.: O sujeito indeterminado direcional pode ser representado por um sujeito determinado exposto,
pois o que conta é o sentido transmitido – Alguém comprou a casa de João.
5.Ocasional – Não entre sem convite.
(Qualquer um, quem quer que seja, que venha a ler o aviso.)
Obs.: O sujeito indeterminado ocasional pode ser representado por um sujeito determinado exposto,
pois o que conta é o sentido transmitido – Ninguém está autorizado a entrar.
6.Inexistente – Chove lá fora.
(Sujeito próprio a determinados verbos, particularmente os que veiculam noções relacionadas a
fenômenos meteorológicos e tempo cronológico; o verbo “haver”, no sentido de [existir], além de um
ou outro mais, está incluído nessa categoria.)

fim
79

INDETERMINAÇÃO DO SUJEITO EM NORMA PADRÃO E VARIANTE COLOQUIAL

J. Bento

Vejamos:

NORMA PADÃO VARIANTE COLOQUIAL


suj.indet.
PrecisamVTI de faxineira suj.indet.
PrecisamVTI de faxineiranota
suj.indet.
Precisa-seVTI de faxineira suj.indet.
Precisa-seVTI de faxineira
↓ ↓
índice índice
de de
indeterminação indeterminação
do do
sujeito sujeito
suj.indet.
ProcuramVTD faxineira suj.indet.
ProcuramVTD faxineiranota

Procura-seVTD faxineirasuj.expl. suj.indet.


Procura-seVTD faxineira
↓ ↓
partícula índice
apassivadora de
indeterminação
do
sujeito

Nota: Aparentemente muito comum no espanhol coloquial da América Latina, essas estruturas,
apesar de gramaticalmente abonadas, são praticamente não-usuais em português brasileiro.

Como há de se perceber, a diferença estrutural entre a norma padrão e a variante coloquial


reside na aplicação da partícula “se” em verbos transitivos diretos. Enquanto na norma padrão, essa
partícula ganha valor de apassivação, na variante coloquial a mesma partícula continua com o valor
de índice de indeterminação do sujeito, idêntica aos verbos transitivos indiretos.

Por consequência, pode-se afirmar que a variante coloquial do português brasileiro tem abolida
a forma sintética de apassivação (com a partícula “se”), mantendo-se apenas a forma analítica de
apassivação (verbo “ser” + particípio).
Um dado interessante é o seguinte: se se perguntar –

*Por que é assim?

– ou seja, por exemplo –


80

*Por que, em norma padrão, verbos transitivos diretos com a partícula “se” têm sujeito posposto, e não
sujeito indeterminado, à maneira do que ocorre com a variante coloquial, e vice-versa?

– como se deve responder? Resposta:

*Porque sim.

Pois é, em linguística stricto sensu e ciências afins – as chamadas ciências humanas, em contraposição
às ciências naturais –, não se responde às questões arguindo fatores externos ao objeto analisado – no
caso da linguística, a língua em si, como diria Saussure.
As ciências humanas são campos de conhecimento regidos por regras (mecanismos abstratos,
volúveis e intangíveis), e não por leis (mecanismos concretos, constantes e tangíveis). Nestas
circunstâncias, uma regra concernente a um sistema linguístico qualquer é apenas uma regra, à qual
não se atribui nenhuma força alheia à própria feitura da regra em si. A regra funciona
contingentemente, prende-se a um tempo e a um espaço (sócio-geográfico-cultural), e somente até
enquanto dura; a lei funciona necessariamente, é atemporal e inespacial, e age todas as vezes em que
as respectivas condições se apresentarem.
Outra pergunta interessante é a seguinte:

*Por que, enquanto falantes do português, não sentimos a noção de apassivação/sujeito posposto,
derivada da regra da norma padrão?

A resposta é, também, deveras simples:

*Porque não temos, internalizada, a gramática da norma padrão, pelo menos neste ponto específico de
sua estrutura.

Ou seja, é a mesma razão que nos leva a não saber utilizar, com desenvoltura, a partícula pronominal
“cujo” e assimiladas, por exemplo. O fato é que a norma padrão encerra um sistema de regras que
difere, em maior ou menor grau, do sistema linguístico que dominamos e do qual nos servimos.

fim
81

INDETERMINAÇÃO DO SUJEITO EM PORTUGUÊS

J. Bento

A indeterminação do sujeito em português, naquilo que se pode chamar de recurso gramatical


disponibilizado pelo sistema linguístico para dar a entender, basicamente e no âmbito do discurso, o
desconhecimento, a irrelevância, a indiferença ou a generalização sobre o elemento em jogo, se faz
por duas formas complementares:

a)Colocar o verbo na terceira pessoa do plural

VERBO3ª pessoa/plural

b)Adjungir ao verbo no singular a partícula “se”, chamada (por isso mesmo) de índice de
indeterminação do sujeito

VERBOsingular-se

Estes recursos devem ser interpretados conforme o contexto linguístico-discursivo, pois que nem
sempre as fórmulas –

VERBO3ª pessoa/plural

&

VERBOsingular-se

– reportam-se a uma indeterminação do sujeito; pode-se tratar de sujeito implícito, ou desinencial,


no primeiro caso, ou (conforme certa leitura) sujeito posposto no segundo caso.
No que concerne à leitura de sujeito posposto, é preciso relatar que o modelo linguístico
tradicional só aceita a fórmula –

VERBOsingular-se

– como indeterminação do sujeito quando se trata de verbos intransitivos ou verbos transitivos


indiretos. Em verbos transitivos diretos, o sujeito é, nesta linha de raciocínio, posposto (ou seja, é o
elemento sintático-semântico que vem adiante do verbo) e, além disso (ou por conta disso), haveria a
necessidade de aplicação da concordância verbal, sujeito/verbo.
Não obstante, na realidade linguística do português contemporâneo, parece fazer pouco sentido
a manutenção destes parâmetros, normativos, para a definição de sujeito indeterminado.
Correntemente, o que se percebe é a intuição de sujeito indeterminado em todas as ocorrências sob
a fórmula –

VERBOsingular-se
82

– incluindo-se, logicamente, a não observância da requerida concordância verbal. Soa-nos mais


“natural” a expressão –

*Aluga-se apartamentos

– em lugar de –

*Alugam-se apartamentos

– a qual já se nos afigura como registro afetado, pedante ou arcaico.

Fora das condições estritamente gramaticais, ora reveladas, a indeterminação do sujeito, que
absorve diretamente ingerências do nível semântico-pragmático-situacional, pode se pautar em
função de outros mecanismos:

a)Modalizar o verbo na forma infinitiva (ex., “não pisar na grama”);

b)Modalizar o verbo no imperativo (ex., “não pise na grama”);

c)Utilizar-se da segunda pessoa do singular/plural, como também da terceira pessoa do plural (ex.,
“você é responsável por seus atos” / “nós somos responsáveis por nossos atos” / “eles – os estrangeiros
– têm ressalvas quanto aos brasileiros”), ou expressões substantivas equivalentes.

Conforme o contexto discursivo, em sentenças como estas, apesar de estipularem sujeitos


gramaticais, inclusive até explícitos (como na letra “c”), a noção subjacente em si é de natureza tão
vaga e abstrata, que não deixam de representar indeterminação de sujeito. Quando se diz –

*Não pisar na grama.

– o sujeito é qualquer um que venha a tomar ciência desta informação, afixada a uma plaqueta, e não
apenas João, Maria, Antonieta... Naturalmente, será o contexto discursivo que, em todo caso, definirá
a análise: esta mesma sentença poderia estar direcionada a alguém em particular, a depender da
situação comunicativa.
Compreensão parecida talvez deva ser invocada quando o sujeito gramatical é representado
pelos chamados pronomes indefinidos (como “alguém”, “todos”...) ou expressões equivalentes (“um
homem”, “uma pessoa”, como em “uma pessoa esteve aqui procurando por você”, etc.). Enfim,
quando a concepção de indeterminação do sujeito transcende os limites estritamente gramaticais, a
complexidade analítica amplia-se vertiginosamente.

fim
83

INTERPRETAÇÕES AVENTADAS SOBRE PASSAGEM DO TEXTO “CÍRCULO VICIOSO”


(MACHADO DE ASSIS)

J. Bento

Nota: cinco destas posições foram


sugeridas por alunos de graduação
do Curso de Letras da Fafidam,
sob a Disciplina de Sintaxe.

TEXTO:

Círculo Vicioso
[Machado de Assis]

Bailando no ar, gemia inquieto vagalume:


“Quem me dera que fosse aquela loura estrela,
Que arde no eterno azul, como uma eterna vela!”
Mas a estrela, fitando a lua, com ciúme:

“Pudesse eu copiar-te o transparente lume,


Que, da grega coluna à gótica janela,
Contemplou, suspirosa, a fronte amada e bela!”
Mas a lua, fitando o sol, com azedume:

“Mísera! Tivesse eu aquela enorme, aquela


Claridade imortal, que toda a luz resume!”
Mas o sol, inclinando a rútila capela:

“Pesa-me esta brilhante auréola de nume…


Enfara-me esta azul e desmedida umbela…
Por que não nasci eu um simples vagalume?”

PASSAGEM:

A estrela falando para a lua:

“Pudesse eu copiar-te o transparente lume,


Que, da grega coluna à gótica janela,
Contemplou, suspirosa, a fronte amada e bela!”

INTERPRETAÇÕES AVENTADAS:

1.
Se eu pudesse copiar o teu lume transparente da grega coluna à gótica janela, contemplou a lua
suspirosa, a fronte amada e bela!
2.
Se eu pudesse copiar-te o transparente lume que a fronte amada e bela, da grega coluna à gótica
janela, contemplou suspirosa.
3.
Se eu pudesse copiar teu lume transparente que contemplou a fronte amada, bela e suspirosa, da
coluna grega à janela gótica.
4.
Se eu pudesse copiar o teu transparente lume que contemplou suspirosamente a fronte amada e bela
da grega coluna à gótica janela.
5.
Se eu pudesse copiar teu transparente lume que contemplou a suspirosa fronte, amada e bela, da
coluna grega à gótica janela.
6.
Se eu pudesse copiar teu lume transparente e suspirante que contemplou a fronte amada e bela da
coluna grega à janela gótica.
84

O propósito, aqui, consiste em verificar:

a)Se a construção interpretativa está de acordo com os padrões sintáticos da língua;


b)Uma vez conforme a sintaxe da língua, se a construção interpretativa está de acordo com o(s)
sentido(s) veiculado(s) no texto-fonte.

Para fins práticos de ajuizamento, as construções podem estar:

*agramaticais e, por conseguinte, assemânticas (ou com rigoroso prejuízo semântico);


*gramaticais, mas assemânticas (ou semanticamente destoantes do sentido textual);
*gramaticais e semânticas (ou semanticamente adequadas ao sentido textual).

1.
Se eu pudesse copiar o teu lume transparente da grega coluna à gótica janela, contemplou a lua
suspirosa, a fronte amada e bela!

Se... O

cv

S V
↓ ↓
eu pudesse copiar o teu lume transparente da grega coluna
à gótica janela, contemplou a lua
suspirosa, a fronte amada e bela

agramaticalidade/
assemanticidade

desprovido de sentido
palpável

2.
Se eu pudesse copiar-te o transparente lume que a fronte amada e bela, da grega coluna à gótica
janela, contemplou suspirosa.

Se... O

cv

S V
↓ ↓
eu pudesse copiar o teu transparente lume que a fronte
amada e bela, da grega coluna à gótica
janela, contemplou suspirosa.

gramaticalidade/
semanticidade

a fronte amada e bela (da coluna grega
à gótica janela) contemplou
suspirosa o teu lume transparente
85

3.
Se eu pudesse copiar teu lume transparente que contemplou a fronte amada, bela e suspirosa, da
coluna grega à janela gótica.

Se... O

cv

S V
↓ ↓
eu pudesse copiar teu lume transparente que contemplou
a fronte amada, bela e suspirosa,
da coluna grega à janela gótica

gramaticalidade/
assemanticidade

o teu lume transparente contemplou a fronte
amada, bela e suspirosa, da coluna grega
à janela gótica

4.
Se eu pudesse copiar o teu transparente lume que contemplou suspirosamente a fronte amada e
bela da grega coluna à gótica janela.

Se... O

cv

S V
↓ ↓
eu pudesse copiar o teu transparente lume que contemplou
suspirosamente a fronte amada e bela
da grega coluna à gótica janela

gramaticalidade/
assemanticidade

o teu transparente lume contemplou
suspirosamente a fronte amada e bela, da grega
coluna à gótica janela
86

5.
Se eu pudesse copiar teu transparente lume que contemplou a suspirosa fronte, amada e bela, da
coluna grega à gótica janela.

Se... O

cv
S V
↓ ↓
eu pudesse copiar teu transparente lume que contemplou
a suspirosa fronte, amada e bela, da
coluna grega à gótica janela

gramaticalidade/
assemanticidade

teu transparente lume contemplou
a suspirosa fronte, amada e bela,
da coluna grega à gótica janela

6.

Se eu pudesse copiar teu lume transparente e suspirante que contemplou a fronte amada e bela da
coluna grega à janela gótica.

Se... O

cv
S V
↓ ↓
eu pudesse copiar teu lume transparente e suspirante
que contemplou a lua suspirosa,
a fronte amada e bela da coluna
grega à janela gótica

gramaticalidade/
assemanticidade

teu lume transparente e suspirante
contemplou a lua suspirosa, a fronte
amada e bela, da coluna grega
à janela gótica

fim
87

DESLOCAMENTO DO ADJETIVO NO SINTAGMA NOMINAL


[os fatos]

J. Bento

PANORAMA GERAL

situação exemplo

sem alteração semântica “carro lindo/lindo carro”

sem alteração gramatical

com alteração semântica “carro novo/novo carro”

com alteração gramatical com alteração semântica “pedreiro ator/ator pedreiro”

sem permissão gramatical *** “carro preto/*preto carro”

fim
88

CONECTIVOS INTRASSINTÁTICOS
[pronomes relativos]

J. Bento

1.Consideração geral

CONECTIVOS

coordenativos subordinativos

conjunção conjunção preposição pronome relativo

2.Os relativos

PRONOMES RELATIVOS

que quem onde como o qual cujo quanto

Os pronomes relativos costumam unir-se, em sua devida circunstância, às preposições ou


locuções prepositivas, formando expressões locucionais:

QUE → A maneira com que se trata...


QUEM → A mulher para quem se destina...
ONDE → O lugar por onde caminharam...
COMO → ? [parece não haver possibilidade de preposição junto a “como” relativo]
O QUAL → A cerimônia na qual se deu o fato...
CUJO → O edifício sobre cuja fachada se aplicou...
QUANTO → O valor por quanto se dera a venda...

Estas preposições são reivindicadas pela regência do verbo da oração na qual o pronome
relativo exercerá uma função sintática. Assim, por exemplo, em “o lugar por onde caminharam...”,
“onde” deve ter a preposição “por” devido ao fato de o verbo “caminhar” o exigir: “caminhar por
onde [= o lugar referenciado na comunicação].
A técnica para identificar a função sintática do pronome relativo (e, por conseguinte, dominar
a sua execução) é muito simples:

a)analisa-se a estrutura oracional do verbo a que se adjunge o pronome relativo (este verbo está
sempre logo adiante);
b)discrimina-se o que falta na estrutura oracional (sujeito, complemento verbal ou adjunto
adverbial), pois esta lacuna é a função sintática do relativo. A partícula “cujo” é um caso à parte:
sempre funciona como adjunto adnominal e, por estratégia de análise, testa-se a sua substituição pelo
possessivo “seu/sua/seus/suas”, conforme sugere a estrutura nominal: “sobre cuja fachada” [= sobre
sua fachada].

fim
89

SINTAXE DE PROPOSIÇÃO COM PRONOME OBLÍQUO ÁTONO INTERCALADO ENTRE


VERBOS

J. Bento

Oração, ilustrativa, sob análise:

Estas ações fazem-nos pensar melhor.

a)Interpretação 1:

ORAÇÃO

sujeito predicado

VERBO compl. verbal

estas ações fazem nos pensar melhor

Nota:
*Neste caso – análise menos recomendada –, “nos pensar melhor” é oração subordinada objetiva
direta, cujo sujeito se faz com o pronome oblíquo átono; daí, a dificuldade de se abonar tal análise,
já que, via de regra, não existe, em língua padrão, sujeito atualizado com pronome oblíquo átono.

b)Intepretação 2:

ORAÇÃO

sujeito predicado

VERBO compl. verbal predicativo

estas ações fazem nos (nós) pensar melhor

Nota:
*Neste caso, “pensar melhor” é predicativo – veja o paralelo com um predicado verbo-nominal típico,
no exemplo “estas ações fazem-nos felizes” –

ORAÇÃO

sujeito predicado

VERBO compl. verbal predicativo

estas ações fazem nos felizes

– e o sujeito da oração subordinada (predicativa), “nós [pensar melhor]”, faz-se elíptico.


fim
90

ADJUNTO ADNOMINAL vs. COMPLEMENTO NOMINAL


[estratégia semântica de identificação]

J. Bento

A estrutura –

Substantivo abstrato + de ________________

– no que tange ao espaço final, sublinhado, encerra comumente dupla interpretação sintática. Tanto
pode se tratar de complemento nominal, como de adjunto adnominal, conforme sua natureza
semântica relativamente ao espaço inicial – substantivo abstrato + de.
Tentemos uma caracterização dessa diferença a partir do seguinte postulado:

adjunto adnominal
[possuidor, detentor do/dado intrínseco]

SUBSTANTIVOabstrato + de ___________________________________

[alvo, destinatário, direção do/dado extrínseco]


complemento nominal

Assim, por exemplo, em –

*A forma da Terra é arredondada.



adjunto adnominal

- a Terra possui (é detentora de) a forma arredondada;


- é, portanto, intrínseco à Terra ter a forma arredondada.

Mas em:

*O medo do fantasma fê-lo chorar.



complemento nominal

- o fantasma é o alvo, o destino, a direção do medo;


- é, portanto, extrínseco ao fantasma o sentimento do medo
(pois não é o fantasma que tem o medo)

No entanto, prestemos atenção que pode haver a concorrência do fator contexto/situação para
definir se é complemento nominal ou adjunto adnominal:

*O medo do fantasma era que João se pusesse a gritar, naquele momento.



adjunto adnominal

- o fantasma possui o medo;


- o medo, portanto, é intrínseco ao fantasma.
91

Ou seja, em “medo de fantasma”, há uma ambiguidade sintático-semântica, a qual somente será


dirimida, em última análise, após a auscultação do contexto linguístico-situacional. Talvez se dê o
caso de uma parcela significativa dessas construções linguísticas se pôr à deriva da ambiguidade. A
expressão –

forma + de _________________

– estipulada anteriormente como engendradora de adjunto adnominal, pode muito bem provocar
complementação nominal –

*Ontem, discutimos a forma do projeto.



complemento nominal

– se estiver a significar algo do tipo –

a forma para o projeto

Logicamente, se a discussão em torno do “projeto” tiver sido feita sobre a –

sua forma já existente

– e não, como na primeira situação –

a forma para o projeto, ainda não existente

– adjunto adnominal:

*Ontem, discutimos a forma do projeto.



adjunto adnominal

Será preciso, portanto, no procedimento de análise sintática, aplicar o senso aguçado de percepção e
discernimento.
Ao lado de tudo que dissemos, também podemos pensar a diferenciação ocorrente entre adjunto
adnominal e complemento nominal em termos de produto/especificação, para o primeiro conceito, e
processo/processado para o segundo conceito. Assim é que –

SUBSTANTIVOabstrato + de → adjunto adnominal


↓ ↓
ideia de produto especificação do produto

SUBSTANTIVOabstrato + de → complemento nominal


↓ ↓
ideia de processo resultante do processo
[processado]

– o que nos daria análise equivalente para os exemplos arrolados acima:

*A forma da Terra é arredondada.


↓ ↓
produto especificação
92

*O medo do fantasma fê-lo chorar.


↓ ↓
processo processado

*O medo do fantasma era que João se pusesse a gritar, naquele momento.


↓ ↓
produto especificação

*Ontem, discutimos a forma do projeto.


↓ ↓
produto especificação

ou

*Ontem, discutimos a forma do projeto.


↓ ↓
processo processado

Em –

*João estuda a vida dos indígenas.

– “dos indígenas” seria adjunto adnominal, ainda que “vida” pudesse ser interpretado como um
processo, e não como um produto. Por quê? Porque “dos indígenas” não é um processado, que consiste
numa exigência do conceito de complemento nominal. Então, concluímos:

Em não havendo uma relação processo/processado, adjunto adnominal.

Ocorre-nos, agora, lembrar o seguinte exemplo:

*João está construindo uma casa para os cães.

Descartando-se a possibilidade de interpretar “para os cães” como adjunto adverbial, ou até


mesmo um complemento verbal (quem sabe?), só nos restar definir esse termo como adjunto
adnominal ou complemento nominal.
Mas não seria complemento nominal por razão semelhante à que se atribui a “dos indígenas”,
na construção anterior: “casa”, substantivo concreto, não é um processo; e “os cães”, de igual modo,
não é o processado, pois que, de toda maneira, o processado teria que ser a própria “casa”, sendo
“para os cães” a destinação.
Por conseguinte, apesar de a preposição atualizada em “para os cães” não ser “de”, e apesar
de concebermos “para” como uma preposição típica de complementos nominais, não podemos fugir
à constatação de que “para os cães” terminaria sendo adjunto adnominal (na hipótese de “para os
cães” não ser classificado como adjunto adverbial ou complemento verbal).

fim
93

ADJUNTO ADNOMINAL, APOSTO E PREDICATIVO DO OBJETO


[o uso da vírgula]

J. Bento

Ilustração:

1)Composição simples

João achou os cachorros agressivos → adjunto adnominal



[encontrou]

João achou os cachorros agressivos → predicativo



[considerou]

João achou os cachorros, agressivos → aposto



[encontrou]

João achou os cachorros, agressivos → forma escrita imprópria



[considerou]

2)Composição composta com dois elementos adjetivais

2a)Sem vírgula

João achou os cachorros sardentos agressivos → forma escrita imprópria



[encontrou]

João achou os cachorros sardentos agressivos → adjunto adnominal/predicativo(ver nota)



[considerou]

2b)Com vírgula antes do primeiro elemento adjetival

João achou os cachorros, sardentos agressivos → forma escrita imprópria



[encontrou]

João achou os cachorros, sardentos agressivos → forma escrita imprópria



[considerou]

2c)Com vírgula antes do segundo elemento adjetival

João achou os cachorros sardentos, agressivos → adjunto adnominal/adjunto adnominal



[encontrou]

João achou os cachorros sardentos, agressivos → adjunto adnominal/predicativo



[considerou]
94

2d)Com duas vírgulas

João achou os cachorros, sardentos, agressivos → aposto/aposto



[encontrou]

João achou os cachorros, sardentos, agressivos → aposto/predicativo



[considerou]

Nota:

A formulação –

João achou os cachorros sardentos agressivos → adjunto adnominal/predicativo



[considerou]

– de ‘2a' é meio temerária, senão mesmo inadequada ou estranha à usualidade da escrita, preferindo-
se, talvez, a construção –

João achou os cachorros sardentos, agressivos → adjunto adnominal/predicativo



[considerou]

– inscrita em ‘2c’.

3)Composição composta com três elementos adjetivais

3a)Sem vírgula

João achou os cachorros sardentos agressivos famintos → forma escrita imprópria



[encontrou]

João achou os cachorros sardentos agressivos famintos → forma escrita imprópria



[considerou]

3b)Com vírgula antes do primeiro elemento adjetival

João achou os cachorros, sardentos agressivos famintos → forma escrita imprópria



[encontrou]

João achou os cachorros, sardentos agressivos famintos → forma escrita imprópria



[considerou]

3c)Com vírgula antes do segundo elemento adjetival

João achou os cachorros sardentos, agressivos famintos → forma escrita imprópria



[encontrou]

João achou os cachorros sardentos, agressivos famintos → forma escrita imprópria



[considerou]
95

3d)Com a vírgula antes do terceiro elemento adjetival

João achou os cachorros sardentos agressivos, famintos → forma escrita imprópria



[encontrou]

João achou os cachorros sardentos agressivos, famintos → adj.adn./pred./pred. (ver nota)



[considerou]

3e)Com a vírgula antes dos dois primeiros elementos

João achou os cachorros, sardentos, agressivos famintos → forma escrita imprópria



[encontrou]

João achou os cachorros, sardentos, agressivos famintos → forma escrita imprópria



[considerou]

3f)Com a vírgula antes dos dois últimos elementos

João achou os cachorros sardentos, agressivos, famintos → adj. adn./adj.adn./adj.adn.



[encontrou]

João achou os cachorros sardentos, agressivos, famintos → adj.adn./pred./pred.



[considerou]

3g)Com três vírgulas

João achou os cachorros, sardentos, agressivos, famintos → aposto/aposto/aposto



[encontrou]

João achou os cachorros, sardentos, agressivos, famintos → aposto/aposto/predicativo


↓ ou
[considerou] aposto/predicativo/predicativo

Nota:

A formulação –

João achou os cachorros sardentos agressivos, famintos → adj.adn./pred./pred.



[considerou]

– de ‘3d' é meio temerária, senão mesmo inadequada ou estranha à usualidade da escrita, preferindo-
se, talvez, a construção –

João achou os cachorros sardentos, agressivos, famintos → adj.adn./pred./pred.



[considerou]

– inscrita em ‘3f’.

fim
96

ESTRUTURA TÍPICA PARA CONFUSÃO ENTRE ADJUNTO ADNOMINAL E


COMPLEMENTO NOMINAL

J. Bento

O caso típico que gera confusão entre o adjunto adnominal e o complemento nominal reside na
estrutura –

SINTAGMA

ANTECEDENTE ‘de’ CONSEQUENTE


[núcleo sintagmático] [determinante]

termo sob análise

Substantivo
Abstrato

Processual Não-processual

substantivo substantivo
verbal não-verbal

– até mesmo pela dificuldade em se distinguir entre um substantivo processual e um substantivo não-
processual e, dentro desta categoria, estabelecer a distinção entre um substantivo verbal e um
substantivo não-verbal.
(Adendo: Diz-se que o substantivo é verbal quando mantém uma interrelação estreita com o seu correspondente verbal,
como nos pares “canto/cantar”, “aparição/aparecer” etc.; do contrário, na situação em que a interrelação substantivo/verbo
não é tão próxima, o substantivo deve ser caracterizado como não-verbal, cujos exemplos mais salientes se fazem em torno dos
substantivos concretos – ex.: “pedreiro/pedreirar*”.)
Quando o antecedente é um substantivo abstrato processual, a função sintática do consequente
deve ser anotada como de complemento nominal, a exemplo de –

*Produção de pão

– em que o consequente, “do pão”, é elemento passivo: o pão é produzido:

SINTAGMA

ANTECEDENTE ‘de’ CONSEQUENTE


[núcleo sintagmático] [determinante]

complemento nominal

Substantivo
Abstrato

Processual
97

Por outro lado, quando o antecedente é um substantivo abstrato não-processual, a função


sintática do consequente deverá ser de adjunto adnominal, tanto com relação ao exemplo –

*Produção do padeiro

– em que o consequente, “do padeiro”, é elemento ativo: o padeiro produz, quanto no exemplo –

*Partida de futebol

– em que o consequente, “de futebol”, não se enquadra na dicotomia ativo/passivo, em razão de o


antecedente, “partida”, neste sentido claramente previsto sob o sintagma, não se prestar a uma
leitura verbal, ou seja, não apresentar uma interrelação direta com uma unidade da classe verbal
correspondente:

SINTAGMA

ANTECEDENTE ‘de’ CONSEQUENTE


[núcleo sintagmático] [determinante]

adjunto adnominal

Substantivo
Abstrato

Não-processual

Em suma, é o caráter passivo do consequente que, em última análise, definirá toda a questão,
pois que identificará o termo como complemento nominal. Não havendo passividade – função
semântica de paciente –, senão que atividade – função semântica de agente – ou “neutralidade” sob
esta dicotomia ativo/passivo, trata-se de adjunto adnominal.
Enfim:

ANTECEDENTE ‘de’ CONSEQUENTE

Processual Complemento Nominal

Substantivo
Verbal
Não-processual Adjunto Adnominal
Não-verbal

fim
98

FORMA ADJETIVAL EM FINAL DE ORAÇÃO SVO

J. Bento

Quando há forma adjetival em final de oração SVO (sujeito/verbo/complemento), como no


exemplo –

*Raimundo encontrou o menino doente.

– a teoria gramatical clássica, em muitos casos, percebe nesse tipo de construção uma tríplice
ambiguidade sintático-semântica. A forma adjetival pode ser declarada:

a)predicativo do sujeito
b)predicativo do objeto
c)adjunto adnominal

Assim é como se dá em –

*Raimundo encontrou o menino doente.

– visto que, conforme a leitura apreendida de um eventual contexto –

“doente”

– vai se referir a –
“Raimundo”

– ou seja –

*Raimundo (era que) estava doente, quando encontrou o menino. → predicativo do sujeito

– ou vai se referir a –
“menino”

– em uma destas duas possibilidades, mais ou menos traduzidas como:

1 – O menino estava doente no momento em que Raimundo o encontrara. → predicativo do objeto


2 – O menino encontrado por Raimundo foi o doente (e não outro qualquer). → adjunto adnominal

Obviamente, também em muitos casos a ambiguidade se desvanece, não por conta da estrutura
sintática, mas em razão de certas informações semânticas alheias ao nível meramente sintático. É o
que mostra o exemplo –

*Raimundo comprou o carro feliz.

Dado que –
“feliz”

– não é, normalmente, um adjetivo atribuível a coisas inanimadas – do tipo “carro” –, a interpretação


sintático-semântica só pode ser a de predicativo do sujeito. Observemos que, se a sentença proferida
for –

*Raimundo comprou o carro velho.

– por incrível que possa nos parecer, termina vindo à tona a tríplice ambiguidade:

1 – Raimundo já era velho quando comprou o carro. → predicativo do sujeito


2 – Raimundo comprou o carro, quando este já estava velho. → predicativo do objeto
3 – Raimundo comprou o carro velho (e não outro qualquer). → adjunto adnominal
fim
99

A MORFOLOGIA NO CONTEXTO DA ESTRUTURA DA LÍNGUA

J. Bento

1.Organização fundamental condensada da estrutura linguística

Oração

esp. esp.

S I N T A X E

esp. Nome esp. Vverbo esp. Nome esp.

M O R F O L O G I A

esp. Raiz esp. esp. Raiz esp. esp. Raiz esp. esp. Raiz esp. esp. Raiz esp. esp. Raiz esp. esp. Raiz esp.
↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓↓
F O N O L O G I A
Consoante Vorgal Consoante Vorgal Consoante Vorgal Consoante Vorgal Consoante Vorgal Consoante Vorgal Consoante Vorgal

2.Caráter do especificador

a)Em sintaxe

ESPECIFICADOR

Estrutural Adestrutural

não-ter obrigado-não-ter obrigado-ter facultativo-ter


Ø Δ x +/-x

SINTAXE
100

Nota:
A diferença entre não-ter (simbolizado por Ø) e obrigado-não-ter (simbolizado por Δ), ambos não-
ocorrentes, é que este último é o contraponto de obrigado-ter, no sentido de que a não-atualização do
obrigado-não-ter se deve à oposição com obrigado-ter: se se põe o elemento x, uma leitura; se não se
põe o elemento x, outra leitura. Logo, a comutação de leituras faz com que haja necessidade de
escolha, o que não acontece com o não-ter, em que não há escolha. O especificador facultativo-ter é,
como o próprio termo sugere, decorrência da decisão do falante no ato comunicativo (do ponto de
vista estritamente linguístico, escolha livre).

b)Em morfologia flexional

ESPECIFICADOR

Estrutural Adestrutural

não-ter obrigado-não-ter obrigado-ter facultativo-ter


Ø Δ x +/-x

MORFOLOGIA
FLEXIONAL

Ou, mais propriamente:

ESPECIFICADOR

Estrutural

não-ter obrigado-ter
Δ x/Ø

MORFOLOGIA
FLEXIONAL
101

c)Em morfologia derivacional

ESPECIFICADOR

Estrutural Adestrutural

não-ter obrigado-não-ter obrigado-ter facultativo-ter


Ø Δ x +/-x

MORFOLOGIA
DERIVACIONAL

Ou, mais propriamente:

ESPECIFICADOR

Estrutural Adestrutural

não-ter facultativo-ter
Δ +/-x

MORFOLOGIA
DERIVACIONAL

Nota:
Em morfologia, devido à ausência da função estrutural obrigado-não-ter – aparentemente restrita ao
nível sintático –, faz-se mais adequado deslocar o símbolo delta (Δ) para a condição não-ter,
reservando-se o zero (Ø) para indicar morfema desprovido de forma fônica.

fim
102

SISTEMA FLEXIONAL DO PORTUGUÊS


E OS CONCEITOS DE SISTEMA – NORMA – FALA
[o caso da flexão nominal]

J. Bento

1. SISTEMA

Gênero Número

masculino feminino singular plural


↓ ↓ ↓ ↓
X / Y Z / W
↑ ↑
neutro neutro

2. NORMA

LINGUAGEM VERBAL
↓ Gênero Número
morfologia

flexão nominal

masculino feminino singular plural


↓ ↓ ↓ ↓
[ø] vs [a] [ø] vs [s]
↑ ↑
neutro neutro

3. FALA

Gênero Número

masculino feminino singular plural


↓ ↓ ↓ ↓
[ø] ou [a] [ø] ou [s]
↑ ↑
neutro neutro

Nota:
Sistema – nível abstrato das potencialidades = impositivo estrutural
Norma – nível abstrato das possibilidades = impositivo sociolinguístico
Fala – nível concreto das realidades = deliberativo circunstancial do ato de fala
Obs.: Em termos de norma, colocamos apenas os elementos funcionais básicos, a título de ilustração, mas sabemos que há
variações linguísticas (chamadas de alomorfias) no construto normatizado, ou seja, a norma costuma se compor de variantes,
dentre as quais se pode eleger o elemento de maior relevo como representante do todo.

fim
103

MODELO INTEGRAL DE ANÁLISE MÓRFICA

J. Bento

VOC

pre raiz suf vt ge/mt nu/np

Δ/Ø Ø Δ/Ø Δ/Ø Δ/Ø Δ/Ø


(...) (...) (...) (...) (...) (...)

Nota:
Δ → elemento inexistente, não-aplicável
Ø → vazio significativo/opositivo
(...) → elemento fisicamente atualizado

Por exemplificação, a análise mórfica de “este” “caderno”, “me” e “pertence” em –

*Este caderno me pertence.

– deverá ser:

VOC

pre raiz suf vt ge/mt nu/np

Δ est Δ e Ø Ø

Ø cadern Ø o Δ Ø

Δ me Δ Δ Δ Δ

Ø pertenc Ø e Ø Ø

Falando estritamente em morfossintaxe, nós podemos pensa-la, como uma de suas facetas, em termos da
ingerência núcleo-periferia, ou determinado-determinante, na atualização dos elementos mórficos que compõem
uma estrutura oracional. Assim, na oração-exemplo acima, destaquemos que o núcleo central é o verbo –
“pertence” –, pois coordena morfossintaticamente os sintagmas “este caderno” e “me”, que o acompanham. Já
o sintagma “este caderno”, visto ser composto de mais de uma unidade linguística (ao contrário do sintagma
“me”, monolinguístico), se deixa categorizar, também, em determinado-determinante, constando-se o
substantivo – “caderno” – como núcleo, e o pronome adjetival “este” como item sintaticamente periférico.
Esta relação determinado-determinante, em línguas como o português, é conduzida essencialmente pelo
chamado fenômeno da concordância, verbal ou nominal, em que os determinantes devem seguir, conforme sua
natureza mórfica, as flexões estipuladas sobre o determinado. Basicamente, dá-se isto:

*um verbo no singular leva o sujeito da oração para o singular;


*um verbo no plural leva o sujeito da oração para o plural;
*um substantivo no masculino-singular leva seus determinantes para o masculino-singular;
*um substantivo no masculino-plural leva seus determinantes para o masculino-plural;
*um substantivo no feminino-singular leva seus determinantes para o feminino-singular;
*um substantivo no feminino-plural leva seus determinantes para o feminino-plural.
fim
104

A CLASSE DA PALAVRA PELA FUNÇÃO SINTÁTICA


[critério sintático-funcional]

J. Bento

1.Princípios gerais de classificação

Toda classificação, em qualquer instância e circunstância, requer três fases interligadas para
demonstrar seu sucesso/insucesso:

a)Critério(s) de classificação – compreende, ou implica, os fundamentos teóricos ou os propósitos


estabelecidos que levam à classificação. Reponde à pergunta: Com base em quê o fenômeno será
classificado?
b)Classificação em si – compreende, ou implica, a distribuição conceitual do fenômeno em suas
respectivas categorias, conforme determinada pelos critério(s) posto(s) em jogo. Responde à
pergunta: Quais as classes em que pode ser dividido o fenômeno?
c)Aplicação das classes – compreende, ou implica, a realização, de fato, do processo classificatório
sobre o fenômeno específico em análise. Responde à pergunta: O que é, sob a perspectiva classificatória
definida, cada elemento distinguível?

Então:

MARCHA DA CLASSIFICAÇÃO

Teoria
ou critério(s)
Propósito

adequado inadequado

classificaçãoem si

adequado inadequado

aplicação

adequado inadequado
105

O ponto ideal de uma classificação é que ela seja julgada como –

Teoria
ou critério(s)
Propósito

adequado

classificaçãoem si

adequado

aplicação

adequado

– mas, naturalmente, sempre há variações nesse entorno:

A)critério inadequado

Teoria
ou critério(s)
Propósito

inadequado

classificaçãoem si

adequado

aplicação

adequado
106

B)classificação em si inadequada

Teoria
ou critério(s)
Propósito

adequado

classificaçãoem si

inadequado

aplicação

adequado

C)aplicação inadequada

MARCHA DA CLASSIFICAÇÃO

Teoria
ou critério(s)
Propósito

adequado

classificaçãoem si

adequado

aplicação

inadequado
107

Em outras palavras, o mecanismo da classificação, como qualquer outro aporte teórico-


metodológico, tende a sofrer a resistência do fenômeno observado, e quanto mais o fenômeno é
complexo, mais dificuldade em se pontuar um sistema de abordagem satisfatório.
Em se tratando de linguagem verbal, portanto, o estabelecimento de uma classificação das
unidades vocabulares, por exemplo, é algo bastante problemático e, muitas vezes, só se resolve às
custas de relevar aspectos menos cruciais do objeto.

2.Classificação das palavras pelo critério sintático-funcional

Partimos da premissa de que as palavras de uma língua, apesar de muitos senões, podem ser
classificadas pelo critério sintático-funcional, quando observamos uma tendência generalizada de as
palavras ocuparem funções sintáticas específicas, no âmbito da construção gramatical. Os desvios
ocorrentes nesta tendência, na maioria das vezes, podem ser explicados em função de fatores
adicionais, como a homonímia e a derivação imprópria (correlata à homonímia), além de um ou outro
mecanismo sintático presente na estrutura linguístico-gramatical.
Quando se diz que as palavras não devem ser classificadas pela função sintática porque muitas
delas mudam de função sintática, será conveniente argumentar que subjaz ao fenômeno linguístico o
fator homonímico, em que duas ou mais unidades gramaticais detêm o mesmo construto fonológico.
Portanto, cabe o contra-argumento de que não se trata de uma mesma unidade, mas duas ou mais
unidades com aspectos fonológicos indistintos – homonímia.
Quando se diz que as palavras não devem ser classificadas pela função sintática porque há
uma regra, chamada tradicionalmente de derivação imprópria, que transporta uma palavra de uma
classe para outra, cai-se no mesmo problema da homonímia, visto através do ângulo da derivação
imprópria. O que, de fato, ocorre é a postulação de outra unidade linguística, diferente da ordem
original, digamos assim. Desta maneira é que “azul”, em português, vem a ocupar as funções
sintáticas de substantivo e adjetivo, não porque são a mesma palavra com funções cambiantes, mas
duas palavras sob o princípio da homonímia, em derivação imprópria, segundo a terminologia
tradicional.
Por esta linha de raciocínio, sugiramos um esquema sinóptico que evidencie, a grosso modo,
as relações prováveis entre função sintática e classe morfológica do vocábulo. Perceba-se de passagem
que, no modelo requerido, conceitos como substantivo, pronome (ou proformas que, na construção,
tomam o lugar dos substantivos) adjetivo, verbo, advérbio (ou modificador verbal/adjetival), dêiticos
(sob os quais podemos inserir o artigo, pronomes adjetivos e numerais) e conectivos são, a um só tempo,
da alçada sintática e morfológica, o que significa, mais ou menos (e por exemplo) –

do ponto de vista sintático – substantivo

Tal elemento vocabular é

do ponto de vista morfológico – substantivo

– em que a função substantiva tende a ser preenchida, via de regra, por um espécime da classe dos
substantivos, e por aí vai.
108

SINTAXE
[função sintática]

substantivo pronome dêitico adjetivo advérbio verbo conectivo

substantivo pronome dêitico adjetivo advérbio verbo conectivo

[classe morfológica]
MORFOLOGIA

Só reiterando o que se disse, este quadro se sustenta na relação biunívoca entre a função
sintática do vocábulo e a classe morfológica a que o vocábulo pertence, mais ou menos na forma do
princípio de que, por exemplo, uma função substantiva será ocupada por um espécime substantivo,
ou da classe dos substantivos, e vice-versa, etc.

fim
109

CLASSIFICAÇÃO DOS MORFEMAS DO PORTUGUÊS

J. Bento

1.Critério semântico-gramatical

MORFEMA
[unidade significativa mínima]

lexical gramatical

raiz raiz afixo


produtiva improdutiva

temático flexional derivacional

sufixal sufixal prefixal sufixal

nominal verbal nominal verbal nominal verbal

gênero número modo/ número/


tempo pessoa

O mecanismo flexional (de gênero) pode ser preterido em favor da via meramente lexical –
supletiva –, como no exemplo [homem]/[mulher], [bode]/[cabra], em que a indicação de gênero
consiste em alternar os referidos itens lexicais.
As chamadas derivação regressiva e derivação imprópria se originam, respectivamente, da
comutação flexional nome-verbo e reclassificação da palavra (por ex.: substantivo se transformar em
adjetivo, e vice-versa), estando, portanto, ao lado da derivação propriamente dita como instrumento
de criação lexical.
A raiz é dita produtiva quando acolhe afixos derivacionais, criando outros itens lexicais na
língua; é improdutiva quando não é capaz de fazer inserir novas unidades lexicais, através dos afixos
derivacionais.
A chamada vogal temática – ou afixo temático –, em razão de sua total ausência de viés
significativo, talvez não devesse ganhar o atributo de morfema, mas de mero aporte fônico dos afixos
ou da raiz, compondo uma extensão dos mesmos.
110

Além da formulação geral – por adição –, podem-se identificar, no sistema do português,


variações morfológicas decorrentes de morfema Ø, alternância (vocálica) e subtração (vocálica),
complementares ao mecanismo da adição. Isto nos permite organizar uma classificação alternativa
dos morfemas com base no critério formal.

2.Critério formal

MORFEMA
[unidade significativa mínima]

Patente Latente
[+carregamento fonológico] [-carregamento fonológico]

aditivo subtrativo alternativo morfema zero

lexical gramatical

Ao contrário do que se coloca normalmente na literatura sobre o assunto, o mecanismo da


adição, feita através do morfema aditivo, não se restringe à afixação, pois que deve incluir os
morfemas radicais. Com efeito, a atualização de um vocábulo como [bolacha], por exemplo, deve
prever uma estrutura abstrata, potencial, semelhante a –

raiz + vogal + gênero + número


(lexical) (temática) (singular)

x y Δ Ø

– que, a posteriori, deverá ser preenchida, por adição, nos espaços estruturais indicados por x e y:

raiz + vogal + gênero + número


(lexical) (temática) (singular)

bolach a Δ Ø

Nota:
O símbolo Δ significa inexistência de elemento mórfico correspondente, e Ø, morfema sem
carregamento fonológico, ou morfema zero.
111

A junção do critério semântico-gramatical com o critério formal, nos daria a seguinte


distribuição:

MORFEMA
[unidade significativa mínima]

Patente Latente

aditivo subtrativo alternativo morfema zero

lexical gramatical

raiz raiz afixo


produtiva improdutiva

temático flexional derivacional

sufixal sufixal prefixal sufixal

nominal verbal nominal verbal nominal verbal

gênero número modo/ número/


tempo pessoa

Podemos, finalmente, tornar mais completa a classificação dos morfemas, adotando o critério
funcional, o qual consiste em observar o comportamento do morfema no discurso, e, de quebra,
enveredarmos em direção a uma classificação do signo linguístico com base na morfologia:
112

3.Critério funcional

MORFEMA
[unidade significativa mínima]

Patente Latente

aditivo subtrativo alternativo morfema zero

lexical gramatical

raiz raiz afixo


produtiva improdutiva

temático flexional derivacional

forma forma forma


livre dependente presa

palavra

vocábulo

signo linguístico

Do ponto de vista morfológico, palavra se define como –

*forma livre mínima, dotada de raiz lexical.


113

Vocábulo se define como –

*forma livre ou dependente mínima, dotada de raiz lexical ou gramatical.

E signo linguístico se define como –

*forma linguística mínima dotada de significante/significado.

Percebe-se uma relação de inclusão que se estabelece entre palavra, vocábulo e signo linguístico:

signo linguístico

vocábulo

palavra

A palavra, como elemento descritor/nominador do real, existente ou imaginário, concreto ou


abstrato, é, sem dúvida, o signo linguístico por excelência. Daí, a confusão que pode ser feita entre
signo linguístico e palavra, o que não é, de todo, um equívoco, pois faz parte da própria mentalidade
linguística geral, intuitivamente elaborada.
Em português, há vocábulos que são formas livres, embora não sejam palavras: grande parte
dos chamados pronomes, como os pessoais do caso reto, por exemplo.
A atualização das palavras, em português, não pode se dar, normalmente, sem a adjunção
necessária de uma forma presa de natureza flexional (ainda que esta forma seja latente). Logo, sob o
ponto de vista lexical, não existem formas livres puras na realidade linguística do português, ou seja,
as palavras são sempre unidades linguísticas complexas. Não obstante, sob a alçada gramatical, é
possível estipular formas livres puras: “nada”, “ninguém”, “eu”, “sim”, “não”, “jamais” etc.

fim
114

CLASSES DE PALAVRAS E SUAS AFIXAÇÕES


[visão geral]

J. Bento

Preâmbulo:

CLASSE MORFOLOGIA

Flexional Derivacional

Artigo simampla não(ampla)


Ø/x Δ

Substantivo simrestrita simampla


Ø/x–Δ Ø/x

Adjetivo simampla simampla


Ø/x Ø/x

Pronome simrestrita nãoampla


Ø/x–Δ Δ

Numeral não(ampla)-ver nota não(ampla)


[cardinal] Δ Δ

Verbo simampla simampla


Ø/x Ø/x

Advérbio não(ampla) simrestrita


Δ Δ

Preposição não(ampla) não(ampla)


Δ Δ

Conjunção não(ampla) não(ampla)


Δ Δ

Interjeição não(ampla) não(ampla)


Δ Δ

Algumas notas:

1)Contra esta visão geral, obviamente – como é de praxe nas línguas naturais, eivadas de irregularidades –, existem exceções,
as quais, às vezes, não são poucas. Por exemplo, de [hoje], advérbio, existe [hodierno], adjetivo (derivado do advérbio). Além
disso, devemos estar atentos às eventuais interpretações divergentes sobre o mesmo fato, bem como às também eventuais
interpretações múltiplas – mais de uma interpretação –, as quais, aparentemente não conflitam entre si.
2)Os numerais se mostram paupérrimos em flexão (de gênero) – [um-uma], [dois-duas], [duzentos(s)], [trezentos(as)] etc., e só
– e, por sua natureza semântica, não encerram flexão de número. A composição, e não a derivação, é o mecanismo mórfico por
excelência nos numerais (cf. [trezentos] = [três] + [cem], em que [cento] é alomorfe de [cem]), a despeito de também se poder
constatar derivação, com o sufixo /ze/, privativo dos numerais, e destes numerais, especificamente: [onze], [doze], [treze],
[catorze] e [quinze].
3)Cabe lembrar, outrossim, que nos fixamos, nesta oportunidade, apenas nos chamados numerais cardinais por considerarmos
os numerais por excelência, restando aos demais numerais a categorização, mais adequada, de adjetivos.
115

Detalhamento:

CLASSE MORFOLOGIA

nome verbo nome verbo

pre raiz suf vt ge / mt nu / np

Artigo Δ Ø Δ o Ø ... Ø ...


um Ø a s

Substantivo Ø /x/ Ø Δ Δ ... Δ


/x/ /x/ Ø Ø Ø
a a s
e sub
i alt
o
u

Adjetivo Ø /x/ Ø Ø Ø ... Ø ...


/x/ /x/ a a s
e
o

Pronome Δ /x/ Δ Δ Δ ... Δ ...


Ø Ø Ø
e a s
o

Numeral Δ /x/ Δ Δ Δ ... Δ ...


[cardinal] Ø Ø
a
alt

Verbo Ø /x/ Ø Ø ... Ø ... Δ


/x/ /x/ a va Ø
ã ve o
e a i
i e ou
o ra s
re ste
rá u
rã i + alt
ria Ø + alt
ríe mos
sse is
r stes
ndo des
do/to/o/e de
m

Advérbio Δ /x/ Δ Δ Δ ... Δ ...

Preposição Δ /x/ Δ Δ Δ ... Δ ...

Conjunção Δ /x/ Δ Δ Δ ... Δ ...

Interjeição Δ /x/ Δ Δ Δ ... Δ ...

fim
116

ESTRUTURA MÓRFICA DO PORTUGUÊS


[padrão escrito]

J. Bento

VOC

SUF

DES

RAIZ
V N

PRE LEX GRA BASE VT MT NP GE NU

Δ Ø Δ Δ Δ ∆ Δ Δ
Ø ↓ Ø Ø Ø Ø/o/i/ou Ø Ø
↓ ↓ a/ã/e/i/o va/ve/a/e s/ste/Ø a/Ø/sub/alt s/Ø
a/e/i/o/u Ø/ra Ø/u/o/i+alt/Ø+alt
ra/re mos
re/rá/rã is/stes/s/des/i/de
ria/ríe m/o
e/a
sse
r/re
Ø/e/a
r
ndo
do/to/o/e

Notação:
VOC → vocábulo
DES → desinência
RAIZ → raiz
V → verbo
N → nome
PRE → prefixo
LEX → lexical
GRA → gramatical
SUF → sufixo
VT → vogal temática
MT → desinência modo-temporal
NP → desinência número-pessoal
GE → gênero
NU → número
Δ → não existe ou não se aplica; indica a ocorrência de uma espécie de antimorfema.
Ø → vazio significativo/opositivo
↓ → número extenso mas limitado de itens
→ número potencialmente ilimitado de itens

SUB → morfe subtrativo, pela supressão da vogal temática


ALT → morfe alternativo, pela alternância entre vogal aberta e fechada no radical
Obs.: As VT’s se encontram em ordem mnemônica (a, e, i...), e não em ordem linguístico-alomórfica; o
antimorfema, simbolizado por Δ, significa a impossibilidade estrutural de ocorrência de determinado morfema
conforme contextualmente previsto no arcabouço geral do sistema linguístico.
fim
117

ESTRUTURA MORFOLÓGICA DO PORTUGUÊS

J. Bento

VOCÁBULO

Verbo Não-Verbo

Nome Não-Nome
[conectivo]

pre raiz suf vt dmt dnp pre raiz suf vt ge nu raiz


↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓
x x x x x x x x x x x x x
ø ø ø ø ø ø ø ø ø ø ø ø
Δ Δ Δ Δ Δ Δ

Notas:
a)simbologia:
x – elemento estrutural explícito, identificável pela forma fônica;
+/- – elemento adestrutural, facultativo
ø – elemento estrutural implícito, identificável pelo contraste [oposição];
Δ – elemento estrutural inexistente por impedimento estrutural, fonológica ou
semanticamente determinado.
b)Dá-se o nome de raiz à base dos conectivos para manter uma linha descritiva harmônica, pois que
o termo “raiz” deveria pressupor adjunção de elementos mórficos presos, ou afixos.
c)Prefixos e sufixos também podem ser interpretados como estruturais (e não adestruturais), caso
que envolveria a anulação da dicotomia primitivos e derivados, já que os chamados primitivos, de
fato, conteriam prefixação/sufixação zero:

VOCÁBULO

Verbo Não-Verbo

Nome

pre raiz suf vt dmt dnp pre raiz suf vt ge nu


↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓
x x x x x x x x x x x x
ø ø ø ø ø ø ø ø ø ø ø ø
Δ Δ Δ Δ Δ Δ

fim
118

ESTRUTURA MORFOSSINTÁTICA DO PORTUGUÊS


[considerações primárias]

J. Bento

A partir de –

“o garoto comprou uma bola”

– que, morfossintaticamente, assim pode ser representado, nesta ordem(ver nota) –

Prefixo - ∆
Raiz - ø
Sufixo - ∆
Vogal temática - o
Gênero - ø
Número - ø
Prefixo - ø
Raiz - garot
Sufixo - ø
Vogal temática - o
Gênero - ø
Número - ø
Prefixo - ø
Raiz - compr
Sufixo - ø
Vogal temática - o
DMT - ø
DNP - u
Prefixo - ∆
Raiz - um
Sufixo - ∆
Vogal temática - ø
Gênero - a
Número - ø
Prefixo - ø
Raiz - bol
Sufixo - ø
Vogal temática - a
Gênero - ∆
Número - ø

– pode-se comutar compr por qualquer um desses elementos –

arranj
ganh sem condicionantes morfossintático-semânticas
chut
...

– não se observando a mínima alteração morfossintática do quadro inicial, no qual se inclui compr:
119

Prefixo - ∆
Raiz - ø
Sufixo - ∆
Vogal temática - o
Gênero - ø
Número - ø
Prefixo - ø
Raiz - garot
Sufixo - ø
Vogal temática - o
Gênero - ø
Número - ø
Prefixo - ø
Raiz - arranj/ganh/chut
Sufixo - ø
Vogal temática - o
DMT - ø
DNP - u
Prefixo - ∆
Raiz - um
Sufixo - ∆
Vogal temática - ø
Gênero - a
Número - ø
Prefixo - ø
Raiz - bol
Sufixo - ø
Vogal temática - a
Gênero - ∆
Número - ø

Por outro lado, se ao invés disso, se proceder à comutação de compr por itens como –

vend[er]
consegu[ir] com condicionantes morfossintáticas
...

– surgem as primeiras implicações morfossintáticas, pois que temos de comutar, também, o o de


compr por e/i, respectivamente:

Prefixo - ∆
Raiz - ø
Sufixo - ∆
Vogal temática - o
Gênero - ø
Número - ø
Prefixo - ø
Raiz - garot
Sufixo - ø
Vogal temática - o
Gênero - ø
Número - ø
Prefixo - ø
Raiz - vend/consegu
Sufixo - ø
Vogal temática - e/i
DMT - ø
DNP - u
Prefixo - ∆
Raiz - um
Sufixo - ∆
Vogal temática - ø
Gênero - a
Número - ø
Prefixo - ø
Raiz - bol
Sufixo - ø
Vogal temática - a
Gênero - ∆
Número - ø
120

Indo um pouco mais além, se substituirmos compr por itens do tipo –

cant[ar]
assanh[ar] com condicionantes semânticas
cham[ar]

– embora não se dê nenhuma alteração morfossintática sobre o complexo oracional, incidem no


conglomerado restrições semânticas, ou perspectivas de sentido relativamente desabonadas pela
norma linguística:

Prefixo - ∆
Raiz - ø
Sufixo - ∆
Vogal temática - o
Gênero - ø
Número - ø
Prefixo - ø
Raiz - garot
Sufixo - ø
Vogal temática - o
Gênero - ø
Número - ø
Prefixo - ø
Raiz - cant/assanh/cham →?
Sufixo - ø
Vogal temática - o
DMT - ø
DNP - u
Prefixo - ∆
Raiz - um
Sufixo - ∆
Vogal temática - ø
Gênero - a
Número - ø
Prefixo - ø
Raiz - bol
Sufixo - ø
Vogal temática - a
Gênero - ∆
Número - ø

E, finalmente, se trocarmos compr por elementos da modalidade –

mor[ar]
rosn[ar] com condicionantes morfossintático-semânticas
lut[ar]

– acontecem, concomitantemente, problemas de natureza morfossintática e semântica:


121

Prefixo - ∆
Raiz - ø
Sufixo - ∆
Vogal temática - o
Gênero - ø
Número - ø
Prefixo - ø
Raiz - garot
Sufixo - ø
Vogal temática - o
Gênero - ø
Número - ø
Prefixo - ø
Raiz - mor/rosn/lut →?
Sufixo - ø
Vogal temática - o →?
DMT - ø
DNP - u
Prefixo - ∆
Raiz - um
Sufixo - ∆
Vogal temática - ø
Gênero - a
Número - ø
Prefixo - ø
Raiz - bol
Sufixo - ø
Vogal temática - a
Gênero - ∆
Número - ø

Em suma, dado um determinado construto oracional, cabe auferir os contextos que são
suscetíveis a comutação (na verdade, praticamente todos, com exceção dos indicados por [∆]),
distinguindo:

a)os elementos que podem substituir o elemento original referido, sem provocar alterações na
urdidura morfossintática e/ou implicações restritivas na cadeia semântica;
b)os elementos que, ao substituírem o elemento original referido, promovem alterações na urdidura
morfossintática e/ou implicações restritivas na cadeia semântica.

Nestas circunstâncias, cabe deduzir que a lista de elementos passíveis de comutação, em cada
contexto, sem a contrapartida de alterações em outros contextos do complexo oracional e/ou sem o
estabelecimento de restrições semânticas, pelo menos a nível de norma, será sempre relativamente
reduzida, ainda que estejam em consideração elementos da ordem lexical (sistema aberto).

Nota:
No texto, dispomos a organização sintagmática na vertical (e, por conseguinte, a organização
paradigmática na horizontal) em razão da comodidade proporcionada pelo espaço da página
(virtual/física). De fato, e conforme as diretrizes lógicas, o correto seria o inverso: relações
sintagmáticas, na horizontal; relações paradigmáticas, na vertical.

fim
122

FLEXÃO NOMINAL

J. Bento
VOC

SUF

RAIZ DES

PRE LEX GRA BASE VT GE NU

Δ Ø Δ Δ Δ Δ
Ø ↓ Ø Ø Ø Ø
↓ ↓ a/e/i/o/u a/Ø/sub/alt s/Ø

a)
VOGAL TEMÁTICA

é toda vogal átona, oral, em final de vocábulo, que não seja indicativa
de feminino dentro da oposição flexional masculino/feminino

b)
GÊNERO

MASCULINO FEMININO
↓ ↓
{Ø} A
Ø
subtração
alternância

c)
NÚMERO

SINGULAR PLURAL
↓ ↓
{Ø} S
Ø

NOTAS PONTUAIS:
1.O vocábulo pode SER do gênero/número X (isentando-se, pois, da flexão correspondente) ou ESTAR,
eventualmente, no gênero/número X (quando, então, alterna entre uma flexão e outra conforme o contexto
linguístico/extralinguístico).
2.Não há vogal temática em nomes não-flexionais (“nada”, “tudo” etc.) – terá a notação em delta (Δ) – e nomes
flexionais terminados em vogal tônica ou vogal nasal (“café”, “ímã” etc.) – terá a notação em zero (Ø). A vogal
temática também pode ser postulada como [Ø] nos casos em que ela aparece, segundo a flexão: em “animal”, a
vogal temática é [Ø] por contraposição a “animais”, que é [i].
3.SUB e ALT querem dizer, respectivamente, morfema subtrativo e morfema alternativo. São tipos morfemáticos
esdrúxulos no português: o primeiro consiste em subtrair a vogal temática sem apor a desinência de gênero,
feminino (cf. “órfão/órfã”); o segundo consiste em uma comutação de fonemas no interior da raiz: “avô/avó”
(em que /ɔ/, ao substituir /o/, torna-se o indicativo morfemático de feminino).
fim
123

FLEXÃO VERBAL

J. Bento

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø Ø ∆
↓ ↓ a/ã/e/i/o va/ve/a/e Ø/o/i/ou
Ø/ra s/ste/Ø
ra/re Ø/u/o/i+alt/Ø+alt
re/rá/rã mos
ria/ríe is/stes/s/des/i/de
e/a m/o
sse
r/re
Ø/e/a
r
ndo
do/to/o/e

VOGAL TEMÁTICA

Primeira Conjugação (CI)

a)Norma A

b)Alomorfia:

*P3PtP
Exceção: O
- dar/estar → [E]

*P1PtP
*dar/estar [PtP/ImpS/FtS/MqP] E

*dar/estar [P6PrI] Ã

*P1PrI/PrS/P346Ip Ø
*Particípio reduzido
124

VOGAL TEMÁTICA

Segunda Conjugação (CII)

a)Norma E

b)Alomorfia:

*P1PtP
Exceção:
- caber/saber/haver/trazer/poder → [E]
*ImpI
Exceção:
- ser/ter/-ter (conter, reter...)/pôr/-por (compor...) → [Ø] I
*Part
Exceção:
- formas reduzidas → [Ø]

*P1PrI/PrS
*P346Ip
*ser
Exceção:
- Part → [I]
*crer/ler
Exceção:
- P6PrI → [E]
- Part → [I]
*ver
Exceção: Ø
- P6PrI → [E]
*ter/-ter (conter, reter...)
Exceção:
- PtP/MqP/ImpS/FtS → [E]
- Part → [I]
*pôr/-por (compor...)
Exceção:
- P236PrI/P2456PtP/P2Ip/MqP/FtS → [E]
*dizer/fazer/trazer[P3PrI/FtI]
*haver[P236PrI]
*querer[P3PrI]
*Particípio reduzido
125

VOGAL TEMÁTICA

Terceira Conjugação (CIII)

a)Norma I

b)Alomorfia:

*P23PrI/P2Ip
Exceção:
- verbos -air (atrair, contrair...)/ir → [I] E
*P6PrI
Exceção:
- ir/vir → [Ø]
*vir[P2456PtP/MqP/ImpS/FtS]

*P346Ip
Exceção:
- verbos -air (atrair, contrair...) → [I]
*P1PrI/PrS
Exceção:
- verbos -air (atrair, contrair...) → [I] Ø
*vir
Exceção:
- P2456PtP/MqP/ImpS/FtS → [E]
*ir
Exceção:
- P23PrI/P2Ip → [I]

Quadro facilitador na identificação da VT verbal

a {norma}
o – P3PtP, exc. dar/estar: E
CI e – P1PtP;
dar/estar: PtP/ImpS/FtS/MqP
ã – dar/estar: P6PrI
Ø

e {norma}
VT: vogal que se segue à RAIZ* CII i – ImpI, exc. ser/ter/-ter/pôr/-por: Ø;
Part, exc. formas reduzidas: Ø
Ø

i {norma}
e – P23PrI/P2Ip, exc. -air (atrair ...)/ir: I;
CIII P6PrI, exc. ir/vir: Ø;
vir: P2456PtP/MqP/ImpS/FtS
Ø
126

NOTAÇÃO PARA O ESQUEMA ACIMA:

(,) → marcador de exceção aos casos arrolados para o espécime flexional imediatamente anterior (p.
ex., P3PtP, exc. = “exceção ao espécime P3PtP”).

(;) → cada um dos espécimes em série com distintas condições teóricas (p. ex., P1PtP e dar/estar têm
vogal temática E, mas dar/estar, diferentemente dos demais verbos, fazem a vogal temática E em
outras tantas condições, além de P1PtP).

(/) → cada um dos espécimes em série com igualdade de condições teóricas (p. ex., P6PrI, exc. ir/vir:
Ø, em que ir e vir são, igualmente, exceção a P6PrI).

(:) → condição teórica do elemento anterior (p. ex., ir/vir: Ø quer dizer que ir e vir fazem a vogal
temática com zero).

* → Didaticamente, pode-se identificar mais facilmente a RAIZ visualizando-se uma das formas
nominais do verbo, o infinitivo, por exemplo. Neste caso, é preciso apenas ter cuidado com os
seguintes itens verbais irregulares, da segunda conjugação – ser/crer/ler/ver/ter (e eventuais
derivados) –, cuja vogal “e”, apesar da aparência superficial, seria melhor analisada como
componente da raiz, e não vogal temática. Atente para sua dimensão teórica: “ser” → sedere > seer
> ser; “crer” → credere > creer > crer; “ler” → legere > leer > ler; “ver” → videre > veer > ver;
“ter” → tenere > teer > ter; em que a vogal temática, de fato, é a que “some” da estrutura, pelo
fenômeno da crase, numa perspectiva diacrônica. Assim, o “e” desses vocábulos deve ser analisado
apenas como componente da raiz, sendo Ø a vogal temática, de acordo com certa interpretação.

Síntese das vogais temáticas verbais

VT

CI CII CIII
↓ ↓ ↓
a e i
o i e
e Ø Ø
ã
Ø
127

DESINÊNCIA MODO-TEMPORAL

Presente do Indicativo (PrI)................................................................ Ø


Imperfeito do Indicativo (ImpI)
CI –
a)Norma................................................................................................ VA
b)Alomorfia:
*P5............................................................................. VE
CII/III –
a)Norma……………………………………………………………… A
b)Alomorfia:
*P5…………………………………………………. E
Pretérito Perfeito do Indicativo (PtP)
a)Norma................................................................................................. Ø
b)Alomorfia:
*P6............................................................................. RA
Pretérito Mais-Que-Perfeito (MqP)
a)Norma................................................................................................ RA
b)Alomorfia:
*P5............................................................................. RE
Futuro do Presente (FtPr)
a)Norma................................................................................................ RE
b)Alomorfia:
*P23........................................................................... RÁ
*P6............................................................................. RÃ
Futuro do Pretérito (FtPt)
a)Norma................................................................................................ RIA
b)Alomorfia:
*P5............................................................................. RÍE
Presente do Subjuntivo (PrS)
CI........................................................................................................... E
CII/III...................................................................................................... A
Imperfeito do Subjuntivo (ImpS)......................................................... SSE
Futuro do Subjuntivo (FtS)
a)Norma................................................................................................. R
b)Alomorfia:
*P26............................................................................. RE
p
Imperativo (I )
a)Norma................................................................................................. Ø
b)Alomorfia:
CI –
*P346........................................................................... E
C II/III

*P346.......................................................................... A
nf
Infinitivo (I )....................................................................................... R
Gerúndio (Ger)..................................................................................... NDO
Particípio (Part)
a)Norma............................................................................................... DO
b)Alomorfia:
*Formas reduzidas (feito, pago, entregue...)......... TO/O/E
128

DESINÊNCIA NÚMERO-PESSOAL

Primeira Pessoa do Singular (P1)

a)Norma................................................................................................... Ø
b)Alomorfia:
*PrI (exc. ser/estar/dar/ir/haver/saber)................................... O
*PtPCI/PtP[ser/ir]/FtPr/PrI[haver/saber].................................. I
*PrI[ser/estar/dar/ir]................................................................. OU

Segunda Pessoa do Singular (P2)


a)Norma................................................................................................... S
b)Alomorfia:
*PtP............................................................................................ STE
*Ip.............................................................................................. Ø

Terceira Pessoa do Singular (P3)


a)Norma.................................................................................................. Ø
b)Alomorfia:
*PtP (exc. vir/ser/ir/poder/estar/ter/-ter/pôr/-por)................ U
*PtP[vir].................................................................................... O
*PtP[ser/ir]............................................................................... I+ALT
*PtP[poder/estar/fazer/ter/-ter/pôr/-por].............................. Ø+ALT

Primeira Pessoa do Plural (P4)............................................................. MOS

Segunda Pessoa do Plural (P5)


a)Norma.................................................................................................. IS
b)Alomorfia:
*PtP.......................................................................................... STES
*PrICIII (exc. vir/ir/rir e derivados) ...................................... S
*PrI[ter/crer/ler/pôr/vir/ir/ver/rir e derivados]/FtS.............. DES
*Ip (exc. ser/ter/crer/ler/pôr/vir/ir/ver/rir e derivados)....... I
*Ip[ser/ter/crer/ler/pôr/vir/ir/ver/rir e derivados]................ DE

Terceira Pessoa do Plural (P6)


a)Norma................................................................................................. M
b)Alomorfia:
*FtPr/PrI[ser/estar/dar/ir/haver]............................................. O

Notação:
CI → primeira conjugação CII → segunda conjugação CIII → terceira conjugação
PrI → presente do indicativo
PtP → pretérito perfeito do indicativo
ImpI → imperfeito do indicativo
MqP → mais-que-perfeito do indicativo
FtPr → futuro do presente do indicativo
FtPt → futuro do pretérito do indicativo
PrS → presente do subjuntivo
ImpS → imperfeito do subjuntivo
FtS → futuro do subjuntivo e infinitivo flexionado (homonímia integral na terminação)
Ip → imperativo (afirmativo); imperativo negativo é homônimo a P rS
P art
→ particípio Ger → gerúndio Inf → infinitivo
P 1
→ 1ª pessoa do singular P2
→ 2ª pessoa do singular P3 → 3ª pessoa do singular
P4 → 1ª pessoa do plural P5 → 2ª pessoa do plural P6 → 3ª pessoa do plural
fim
129

FLEXÃO VERBAL
[dmt’s e vt’s em distribuição complementar]

J. Bento

Apesar de, na maneira clássica, se proceder à discriminação entre DMT´s (modos indicativo,
subjuntivo e imperativo tomados como morfemas per si) e VT´s (primeira, segunda e terceira
conjugações tomados como morfemas per si), o fato é que se pode fazer uma leitura distributiva entre
esses elementos, julgando-os sob o conceito de distribuição complementar, ou seja, por variação
contextual de um único elemento linguístico. Não teríamos, assim, morfemas distintos, mas um
mesmo morfema que se alomorfiza de acordo com o contexto linguístico.
A vogal temática, por exemplo, seria uma só – [a], correspondente ao que se chama de primeira
conjugação –, ficando as demais vogais temáticas (segunda e terceira conjugações) registradas como
alomorfia desta:

[a] → [e] > [i]

A desinência modo-temporal do presente seguiria destino semelhante. A partir de uma norma


– se revelariam os alomorfes –

e > a > r > re

– sem a efetiva preocupação com a classe a que pertencem, se modo indicativo ou subjuntivo. O modo
imperativo talvez pudesse ser incluído neste modelo descritivo, também, acrescentando-se, então, o

Ø/e/a/r

– de sua configuração, o que nos daria, na sua integralidade –

Ø → e > a > r > re

– como desenho geral dos elementos em distribuição complementar correspondente à noção de


presente.
130

1.DMT com leitura de variação contextual

DESINÊNCIA MODO-TEMPORAL

Presente
a)Norma................................................................................................ Ø
b)Alomorfia:
*PrSCI....................................................................... E
*PrSCII/III................................................................... A
*FtSP1345.................................................................... R
*FtSP26....................................................................... RE
Imperfeito
CI –
a)Norma................................................................................................. VA
b)Alomorfia:
*P5............................................................................. VE
*ImpS.......................................................................... SSE
CII/III –
a)Norma……………………………………………………………….. A
b)Alomorfia:
*P5…………………………………………………. E
*ImpS.......................................................................... SSE
Pretérito Perfeito
a)Norma................................................................................................. Ø
b)Alomorfia:
*P6............................................................................. RA
*ImpS.......................................................................... SSE
Pretérito Mais-Que-Perfeito
a)Norma................................................................................................. RA
b)Alomorfia:
*P5............................................................................. RE
*ImpS.......................................................................... SSE
Futuro do Presente
a)Norma................................................................................................. RE
b)Alomorfia:
*P23........................................................................... RÁ
*P6............................................................................. RÃ
*FtSP1345.................................................................... R
*FtSP26...................................................................... RE
Futuro do Pretérito
a)Norma................................................................................................. RIA
b)Alomorfia:
*P5............................................................................. RÍE
*ImpS.......................................................................... SSE
131

2.VT com leitura de variação contextual

VOGAL TEMÁTICA

a)Norma A

b)Alomorfia:
*P3PtP
Exceção: O
- dar/estar → [E]

*P1PtP
*dar/estar [PtP/ImpS/FtS/MqP]
*norma em CII
*variação em CIII:
a]P23PrI/P2Ip
Exceção:
- verbos -air (atrair, contrair...)/ir → [I] E
b]P6PrI
Exceção:
- ir/vir → [Ø]
c]vir[P2456PtP/MqP/ImpS/FtS]

*dar/estar [P6PrI] Ã

*variação em CII:
a]P1PtP
Exceção:
- caber/saber/haver/trazer/poder → [E]
b]ImpI
Exceção:
- ser/ter/-ter (conter, reter...)/pôr/-por (compor...) → [Ø] I
cPart
Exceção:
- formas reduzidas → [Ø]
*norma em CIII

*P1PrI/PrS/P346Ip
*variação em CII:
a]P1PrI/PrS
b]P346Ip
c]ser
Exceção:
- Part → [I] Ø
d]crer/ler
Exceção:
- P6PrI → [E]
- Part → [I]
e]ver
Exceção:
- P6PrI → [E]
f]ter/-ter (conter, reter...)
Exceção:
- PtP, MqP, ImpS, FtS → [E]
- Part → [I]
132

Continuação...

g]pôr/-por (compor...)
Exceção:
- P236PrI/P2456PtP/P2Ip/MqP/FtS → [E]
h]dizer/fazer/trazer[P3PrI/FtI]
i]haver[P236PrI]
j]querer[P3PrI]
l]Particípio reduzido
*variação em CIII:
a]P346Ip Ø
Exceção:
- verbos -air (atrair, contrair...) → [I]
b]P1PrI/PrS
Exceção:
- verbos -air (atrair, contrair...) → [I]
c]vir
Exceção:
- P2456PtP/MqP/ImpS/FtS → [E]
d]ir
Exceção:
- P23PrI/P2Ip → [I]

Notação:

CI → primeira conjugação
CII → segunda conjugação
CIII → terceira conjugação
PrI → presente do indicativo
PtP → pretérito perfeito do indicativo
ImpI → imperfeito do indicativo
MqP → mais-que-perfeito do indicativo
FtPr → futuro do presente do indicativo
FtPt → futuro do pretérito do indicativo
PrS → presente do subjuntivo
ImpS → imperfeito do subjuntivo
FtS → futuro do subjuntivo e infinitivo flexionado (homonímia integral na terminação)
FtI → futuro do indicativo
Ip → imperativo (afirmativo); imperativo negativo é homônimo a P rS
Part → particípio
Ger → gerúndio
Inf → infinitivo
P1 → primeira pessoa do singular
P2 → segunda pessoa do singular
P3 → terceira pessoa do singular
P4 → primeira pessoa do plural
P5 → segunda pessoa do plural
P6 → terceira pessoa do plural

fim
133

SISTEMA FLEXIONAL DO VERBO NO PORTUGUÊS PADRÃO ESCRITO

J. Bento

PRIMEIRA CONJUGAÇÃO

VT DMT DNP

PrI P1 P2 P3 P4 P5 P6
{ø} o {s} {ø} {mos} {is} m
ou o

PtP P1 P2 P3 P4 P5 P6
ø {i} {ste} u {mos} {stes} {m}
ra ø+alt

ImP P1 P2 P3 P4 P5 P6
va {ø} {s} {ø} {mos} {is} {m}
ve

MqP P1 P2 P3 P4 P5 P6
ra {ø} {s} {ø} {mos} {is} {m}
re

FtPr P1 P2 P3 P4 P5 P6
re {i} {s} {ø} {mos} {is} {o}

FtPt P1 P2 P3 P4 P5 P6
C1 ria {ø} {s} {ø} {mos} {is} {m}
a ríe
o
e PrS P1 P2 P3 P4 P5 P6
ã {e} {ø} {s} {ø} {mos} {is} {m}
ø
ImpS P1 P2 P3 P4 P5 P6
{sse} {ø} {s} {ø} {mos} {is} {m}

FtS P1 P2 P3 P4 P5 P6
r {ø} {s} {ø} {mos} {des} {m}
re

Ip P1 P2 P3 P4 P5 P6
ø {Δ} {ø} {ø} {mos} {i} {m}
e

Ipn P1 P2 P3 P4 P5 P6
{e} {Δ} {s} {ø} {mos} {is} {m}

InfP P1 P2 P3 P4 P5 P6
r {ø} {s} {ø} {mos} {des} {m}
re
134

SEGUNDA CONJUGAÇÃO

VT DMT DNP

PrI P1 P2 P3 P4 P5 P6
{ø} o {s} {ø} {mos} is m
ou des o
i

PtP P1 P2 P3 P4 P5 P6
ø ø {ste} u {mos} {stes} {m}
ra i ø+alt
i+alt

ImP P1 P2 P3 P4 P5 P6
a {ø} {s} {ø} {mos} {is} {m}
e

MqP P1 P2 P3 P4 P5 P6
ra {ø} {s} {ø} {mos} {is} {m}
re

FtPr P1 P2 P3 P4 P5 P6
re {i} {s} {ø} {mos} {is} {o}

FtPt P1 P2 P3 P4 P5 P6
C2 ria {ø} {s} {ø} {mos} {is} {m}
e ríe
i
ø PrS P1 P2 P3 P4 P5 P6
{a} {ø} {s} {ø} {mos} {is} {m}

ImpS P1 P2 P3 P4 P5 P6
{sse} {ø} {s} {ø} {mos} {is} {m}

FtS P1 P2 P3 P4 P5 P6
r {ø} {s} {ø} {mos} {des} {m}
re

Ip P1 P2 P3 P4 P5 P6
ø {Δ} {ø} {ø} {mos} i {m}
a de

Ipn P1 P2 P3 P4 P5 P6
{a} {Δ} {s} {ø} {mos} {is} {m}

InfP P1 P2 P3 P4 P5 P6
r {ø} {s} {ø} {mos} {des} {m}
re
135

TERCEIRA CONJUGAÇÃO

VT DMT DNP

PrI P1 P2 P3 P4 P5 P6
{ø} o {s} {ø} {mos} s m
ou des o

PtP P1 P2 P3 P4 P5 P6
ø ø {ste} u {mos} {stes} {m}
ra i o
i+alt

ImP P1 P2 P3 P4 P5 P6
a {ø} {s} {ø} {mos} {is} {m}
e

MqP P1 P2 P3 P4 P5 P6
ra {ø} {s} {ø} {mos} {is} {m}
re

FtPr P1 P2 P3 P4 P5 P6
re {i} {s} {ø} {mos} {is} {o}

FtPt P1 P2 P3 P4 P5 P6
C3 ria {ø} {s} {ø} {mos} {is} {m}
i ríe
e
ø PrS P1 P2 P3 P4 P5 P6
{a} {ø} {s} {ø} {mos} {is} {m}

ImpS P1 P2 P3 P4 P5 P6
{sse} {ø} {s} {ø} {mos} {is} {m}

FtS P1 P2 P3 P4 P5 P6
r {ø} {s} {ø} {mos} {des} {m}
re

Ip P1 P2 P3 P4 P5 P6
ø {Δ} {ø} {ø} {mos} i {m}
a de

Ipn P1 P2 P3 P4 P5 P6
{a} {Δ} {s} {ø} {mos} {is} {m}

InfP P1 P2 P3 P4 P5 P6
r {ø} {s} {ø} {mos} {des} {m}
re

fim
136

COMPLEXO FLEXIONAL DO VERBO NO PORTUGUÊS PADRÃO

J. Bento

Cada um destes compostos – P1PrIC1, P1PrIC2, P1PrIC3 etc. –, ou reclama, em termos de


significante (e, logicamente, em termos de significação), uma urdidura mórfica privativa ou, ao
contrário, faz paralelo homonímico com outro(s) composto(s), caracterizando-se a identidade de
significantes (embora, evidentemente, não de significação). Neste segundo caso, tal como se dá, via de
regra, com todo fenômeno homonímico, apenas o contexto linguístico (e, quiçá, também o
extralinguístico) serão capazes de nos fornecer a categorização morfológica correta do referido
composto. Assim é que, por exemplo, em “cantamos”, não se pode saber, antes da averiguação do
contexto, se se trata de P4PrIC1 ou P4PtPC1. E por aí vai, em uma relevante quantidade de
ocorrências...

*1ª pessoa do singular do presente do indicativo da 1ª conjugação – P1PrIC1


*1ª pessoa do singular do presente do indicativo da 2ª conjugação – P1PrIC2
*1ª pessoa do singular do presente do indicativo da 3ª conjugação – P1PrIC3
*1ª pessoa do plural do presente do indicativo da 1ª conjugação – P4PrIC1
*1ª pessoa do plural do presente do indicativo da 2ª conjugação – P4PrIC2
*1ª pessoa do plural do presente do indicativo da 3ª conjugação – P4PrIC3
*2ª pessoa do singular do presente do indicativo da 1ª conjugação – P2PrIC1
*2ª pessoa do singular do presente do indicativo da 2ª conjugação – P2PrIC2
*2ª pessoa do singular do presente do indicativo da 3ª conjugação – P2PrIC3
*2ª pessoa do plural do presente do indicativo da 1ª conjugação – P5PrIC1
*2ª pessoa do plural do presente do indicativo da 2ª conjugação – P5PrIC2
*2ª pessoa do plural do presente do indicativo da 3ª conjugação – P5PrIC3
*3ª pessoa do singular do presente do indicativo da 1ª conjugação – P3PrIC1
*3ª pessoa do singular do presente do indicativo da 2ª conjugação – P3PrIC2
*3ª pessoa do singular do presente do indicativo da 3ª conjugação – P3PrIC3
*3ª pessoa do plural do presente do indicativo da 1ª conjugação – P6PrIC1
*3ª pessoa do plural do presente do indicativo da 2ª conjugação – P6PrIC2
*3ª pessoa do plural do presente do indicativo da 3ª conjugação – P6PrIC3
*1ª pessoa do singular do pretéritoperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P1PtPC1
*1ª pessoa do singular do pretéritoperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P1PtPC2
*1ª pessoa do singular do pretéritoperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P1PtPC3
*1ª pessoa do plural do pretéritoperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P4PtPC1
*1ª pessoa do plural do pretéritoperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P4PtPC2
*1ª pessoa do plural do pretéritoperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P4PtPC3
*2ª pessoa do singular do pretéritoperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P2PtPC1
*2ª pessoa do singular do pretéritoperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P2PtPC2
*2ª pessoa do singular do pretéritoperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P2PtPC3
*2ª pessoa do plural do pretéritoperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P5PtPC1
*2ª pessoa do plural do pretéritoperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P5PtPC2
*2ª pessoa do plural do pretéritoperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P5PtPC3
*3ª pessoa do singular do pretéritoperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P3PtPC1
*3ª pessoa do singular do pretéritoperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P3PtPC2
*3ª pessoa do singular do pretéritoperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P3PtPC3
*3ª pessoa do plural do pretéritoperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P6PtPC1
*3ª pessoa do plural do pretéritoperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P6PtPC2
*3ª pessoa do plural do pretéritoperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P6PtPC3
*1ª pessoa do singular do pretéritoimperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P1ImpIC1
*1ª pessoa do singular do pretéritoimperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P1ImpIC2
*1ª pessoa do singular do pretéritoimperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P1ImpIC3
*1ª pessoa do plural do pretéritoimperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P4ImpIC1
*1ª pessoa do plural do pretéritoimperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P4ImpIC2
137

*1ª pessoa do plural do pretéritoimperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P4ImpIC3


*2ª pessoa do singular do pretéritoimperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P2ImpIC1
*2ª pessoa do singular do pretéritoimperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P2ImpIC2
*2ª pessoa do singular do pretéritoimperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P2ImpIC3
*2ª pessoa do plural do pretéritoimperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P5ImpIC1
*2ª pessoa do plural do pretéritoimperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P5ImpIC2
*2ª pessoa do plural do pretéritoimperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P5ImpIC3
*3ª pessoa do singular do pretéritoimperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P3ImpIC1
*3ª pessoa do singular do pretéritoimperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P3ImpIC2
*3ª pessoa do singular do pretéritoimperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P3ImpIC3
*3ª pessoa do plural do pretéritoimperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P6ImpIC1
*3ª pessoa do plural do pretéritoimperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P6ImpIC2
*3ª pessoa do plural do pretéritoimperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P6ImpIC3
*1ª pessoa do singular do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P1MqPC1
*1ª pessoa do singular do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P1MqPC2
*1ª pessoa do singular do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P1MqPC3
*1ª pessoa do plural do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P4MqPC1
*1ª pessoa do plural do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P4MqPC2
*1ª pessoa do plural do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P4MqPC3
*2ª pessoa do singular do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P2MqPC1
*2ª pessoa do singular do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P2MqPC2
*2ª pessoa do singular do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P2MqPC3
*2ª pessoa do plural do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P5MqPC1
*2ª pessoa do plural do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P5MqPC2
*2ª pessoa do plural do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P5MqPC3
*3ª pessoa do singular do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P3MqPC1
*3ª pessoa do singular do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P3MqPC2
*3ª pessoa do singular do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P3MqPC3
*3ª pessoa do plural do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P6MqPC1
*3ª pessoa do plural do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P6MqPC2
*3ª pessoa do plural do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P6MqPC3
*1ª pessoa do singular do futuropresente do indicativo da 1ª conjugação – P1FtPrC1
*1ª pessoa do singular do futuropresente do indicativo da 2ª conjugação – P1FtPrC2
*1ª pessoa do singular do futuropresente do indicativo da 3ª conjugação – P1FtPrC3
*1ª pessoa do plural do futuropresente do indicativo da 1ª conjugação – P4FtPrC1
*1ª pessoa do plural do futuropresente do indicativo da 2ª conjugação – P4FtPrC2
*1ª pessoa do plural do futuropresente do indicativo da 3ª conjugação – P4FtPrC3
*2ª pessoa do singular do futuropresente do indicativo da 1ª conjugação – P2FtPrC1
*2ª pessoa do singular do futuropresente do indicativo da 2ª conjugação – P2FtPrC2
*2ª pessoa do singular do futuropresente do indicativo da 3ª conjugação – P2FtPrC3
*2ª pessoa do plural do futuropresente do indicativo da 1ª conjugação – P5FtPrC1
*2ª pessoa do plural do futuropresente do indicativo da 2ª conjugação – P5FtPrC2
*2ª pessoa do plural do futuropresente do indicativo da 3ª conjugação – P5FtPrC3
*3ª pessoa do singular do futuropresente do indicativo da 1ª conjugação – P3FtPrC1
*3ª pessoa do singular do futuropresente do indicativo da 2ª conjugação – P3FtPrC2
*3ª pessoa do singular do futuropresente do indicativo da 3ª conjugação – P3FtPrC3
*3ª pessoa do plural do futuropresente do indicativo da 1ª conjugação – P6FtPrC1
*3ª pessoa do plural do futuropresente do indicativo da 2ª conjugação – P6FtPrC2
*3ª pessoa do plural do futuropresente do indicativo da 3ª conjugação – P6FtPrC3
*1ª pessoa do singular do futuropretérito do indicativo da 1ª conjugação – P1FtPtC1
*1ª pessoa do singular do futuropretérito do indicativo da 2ª conjugação – P1FtPtC2
*1ª pessoa do singular do futuropretérito do indicativo da 3ª conjugação – P1FtPtC3
*1ª pessoa do plural do futuropretérito do indicativo da 1ª conjugação – P4FtPtC1
*1ª pessoa do plural do futuropretérito do indicativo da 2ª conjugação – P4FtPtC2
*1ª pessoa do plural do futuropretérito do indicativo da 3ª conjugação – P4FtPtC3
*2ª pessoa do singular do futuropretérito do indicativo da 1ª conjugação – P2FtPtC1
*2ª pessoa do singular do futuropretérito do indicativo da 2ª conjugação – P2FtPtC2
*2ª pessoa do singular do futuropretérito do indicativo da 3ª conjugação – P2FtPtC3
*2ª pessoa do plural do futuropretérito do indicativo da 1ª conjugação – P5FtPtC1
*2ª pessoa do plural do futuropretérito do indicativo da 2ª conjugação – P5FtPtC2
138

*2ª pessoa do plural do futuropretérito do indicativo da 3ª conjugação – P5FtPtC3


*3ª pessoa do singular do futuropretérito do indicativo da 1ª conjugação – P3FtPtC1
*3ª pessoa do singular do futuropretérito do indicativo da 2ª conjugação – P3FtPtC2
*3ª pessoa do singular do futuropretérito do indicativo da 3ª conjugação – P3FtPtC3
*3ª pessoa do plural do futuropretérito do indicativo da 1ª conjugação – P6FtPtC1
*3ª pessoa do plural do futuropretérito do indicativo da 2ª conjugação – P6FtPtC2
*3ª pessoa do plural do futuropretérito do indicativo da 3ª conjugação – P6FtPtC3
*1ª pessoa do singular do presente do subjuntivo da 1ª conjugação – P1PrSC1
*1ª pessoa do singular do presente do subjuntivo da 2ª conjugação – P1PrSC2
*1ª pessoa do singular do presente do subjuntivo da 3ª conjugação – P1PrSC3
*1ª pessoa do plural do presente do subjuntivo da 1ª conjugação – P4PrSC1
*1ª pessoa do plural do presente do subjuntivo da 2ª conjugação – P4PrSC2
*1ª pessoa do plural do presente do subjuntivo da 3ª conjugação – P4PrSC3
*2ª pessoa do singular do presente do subjuntivo da 1ª conjugação – P2PrSC1
*2ª pessoa do singular do presente do subjuntivo da 2ª conjugação – P2PrSC2
*2ª pessoa do singular do presente do subjuntivo da 3ª conjugação – P2PrSC3
*2ª pessoa do plural do presente do subjuntivo da 1ª conjugação – P5PrSC1
*2ª pessoa do plural do presente do subjuntivo da 2ª conjugação – P5PrSC2
*2ª pessoa do plural do presente do subjuntivo da 3ª conjugação – P5PrSC3
*3ª pessoa do singular do presente do subjuntivo da 1ª conjugação – P3PrSC1
*3ª pessoa do singular do presente do subjuntivo da 2ª conjugação – P3PrSC2
*3ª pessoa do singular do presente do subjuntivo da 3ª conjugação – P3PrSC3
*3ª pessoa do plural do presente do subjuntivo da 1ª conjugação – P6PrSC1
*3ª pessoa do plural do presente do subjuntivo da 2ª conjugação – P6PrSC2
*3ª pessoa do plural do presente do subjuntivo da 3ª conjugação – P6PrSC3
*1ª pessoa do singular do imperfeito do subjuntivo da 1ª conjugação – P1ImpSC1
*1ª pessoa do singular do imperfeito do subjuntivo da 2ª conjugação – P1ImpSC2
*1ª pessoa do singular do imperfeito do subjuntivo da 3ª conjugação – P1ImpSC3
*1ª pessoa do plural do imperfeito do subjuntivo da 1ª conjugação – P4ImpSC1
*1ª pessoa do plural do imperfeito do subjuntivo da 2ª conjugação – P4ImpSC2
*1ª pessoa do plural do imperfeito do subjuntivo da 3ª conjugação – P4ImpSC3
*2ª pessoa do singular do imperfeito do subjuntivo da 1ª conjugação – P2ImpSC1
*2ª pessoa do singular do imperfeito do subjuntivo da 2ª conjugação – P2ImpSC2
*2ª pessoa do singular do imperfeito do subjuntivo da 3ª conjugação – P2ImpSC3
*2ª pessoa do plural do imperfeito do subjuntivo da 1ª conjugação – P5ImpSC1
*2ª pessoa do plural do imperfeito do subjuntivo da 2ª conjugação – P5ImpSC2
*2ª pessoa do plural do imperfeito do subjuntivo da 3ª conjugação – P5ImpSC3
*3ª pessoa do singular do imperfeito do subjuntivo da 1ª conjugação – P3ImpSC1
*3ª pessoa do singular do imperfeito do subjuntivo da 2ª conjugação – P3ImpSC2
*3ª pessoa do singular do imperfeito do subjuntivo da 3ª conjugação – P3ImpSC3
*3ª pessoa do plural do imperfeito do subjuntivo da 1ª conjugação – P6ImpSC1
*3ª pessoa do plural do imperfeito do subjuntivo da 2ª conjugação – P6ImpSC2
*3ª pessoa do plural do imperfeito do subjuntivo da 3ª conjugação – P6ImpSC3
*1ª pessoa do singular do futuro do subjuntivo da 1ª conjugação – P1FtSC1
*1ª pessoa do singular do futuro do subjuntivo da 2ª conjugação – P1FtSC2
*1ª pessoa do singular do futuro do subjuntivo da 3ª conjugação – P1FtSC3
*1ª pessoa do plural do futuro do subjuntivo da 1ª conjugação – P4FtSC1
*1ª pessoa do plural do futuro do subjuntivo da 2ª conjugação – P4FtSC2
*1ª pessoa do plural do futuro do subjuntivo da 3ª conjugação – P4FtSC3
*2ª pessoa do singular do futuro do subjuntivo da 1ª conjugação – P2FtSC1
*2ª pessoa do singular do futuro do subjuntivo da 2ª conjugação – P2FtSC2
*2ª pessoa do singular do futuro do subjuntivo da 3ª conjugação – P2FtSC3
*2ª pessoa do plural do futuro do subjuntivo da 1ª conjugação – P5FtSC1
*2ª pessoa do plural do futuro do subjuntivo da 2ª conjugação – P5FtSC2
*2ª pessoa do plural do futuro do subjuntivo da 3ª conjugação – P5FtSC3
*3ª pessoa do singular do futuro do subjuntivo da 1ª conjugação – P3FtSC1
*3ª pessoa do singular do futuro do subjuntivo da 2ª conjugação – P3FtSC2
*3ª pessoa do singular do futuro do subjuntivo da 3ª conjugação – P3FtSC3
*3ª pessoa do plural do futuro do subjuntivo da 1ª conjugação – P6FtSC1
*3ª pessoa do plural do futuro do subjuntivo da 2ª conjugação – P6FtSC2
139

*3ª pessoa do plural do futuro do subjuntivo da 3ª conjugação – P6FtSC3


*1ª pessoa do plural do imperativo [afirmativo] da 1ª conjugação – P4IpC1
*1ª pessoa do plural do imperativo [afirmativo] da 2ª conjugação – P4IpC2
*1ª pessoa do plural do imperativo [afirmativo] da 3ª conjugação – P4IpC3
*2ª pessoa do singular do imperativo [afirmativo] da 1ª conjugação – P2IpC1
*2ª pessoa do singular do imperativo [afirmativo] da 2ª conjugação – P2IpC2
*2ª pessoa do singular do imperativo [afirmativo] da 3ª conjugação – P2IpC3
*2ª pessoa do plural do imperativo [afirmativo] da 1ª conjugação – P5IpC1
*2ª pessoa do plural do imperativo [afirmativo] da 2ª conjugação – P5IpC2
*2ª pessoa do plural do imperativo [afirmativo] da 3ª conjugação – P5IpC3
*3ª pessoa do singular do imperativo [afirmativo] da 1ª conjugação – P3IpC1
*3ª pessoa do singular do imperativo [afirmativo] da 2ª conjugação – P3IpC2
*3ª pessoa do singular do imperativo [afirmativo] da 3ª conjugação – P3IpC3
*3ª pessoa do plural do imperativo [afirmativo] da 1ª conjugação – P6IpC1
*3ª pessoa do plural do imperativo [afirmativo] da 2ª conjugação – P6IpC2
*3ª pessoa do plural do imperativo [afirmativo] da 3ª conjugação – P6IpC3
*1ª pessoa do plural do imperativo [negativo] da 1ª conjugação – P4IpnC1
*1ª pessoa do plural do imperativo [negativo] da 2ª conjugação – P4IpnC2
*1ª pessoa do plural do imperativo [negativo] da 3ª conjugação – P4IpnC3
*2ª pessoa do singular do imperativo [negativo] da 1ª conjugação – P2IpnC1
*2ª pessoa do singular do imperativo [negativo] da 2ª conjugação – P2IpnC2
*2ª pessoa do singular do imperativo [negativo] da 3ª conjugação – P2IpnC3
*2ª pessoa do plural do imperativo [negativo] da 1ª conjugação – P5IpnC1
*2ª pessoa do plural do imperativo [negativo] da 2ª conjugação – P5IpnC2
*2ª pessoa do plural do imperativo [negativo] da 3ª conjugação – P5IpnC3
*3ª pessoa do singular do imperativo [negativo] da 1ª conjugação – P3IpnC1
*3ª pessoa do singular do imperativo [negativo] da 2ª conjugação – P3IpnC2
*3ª pessoa do singular do imperativo [negativo] da 3ª conjugação – P3IpnC3
*3ª pessoa do plural do imperativo [negativo] da 1ª conjugação – P6IpnC1
*3ª pessoa do plural do imperativo [negativo] da 2ª conjugação – P6IpnC2
*3ª pessoa do plural do imperativo [negativo] da 3ª conjugação – P6IpnC3
*1ª pessoa do singular do infinitivo [pessoal] da 1ª conjugação – P1InfPC1
*1ª pessoa do singular do infinitivo [pessoal] da 2ª conjugação – P1InfPC2
*1ª pessoa do singular do infinitivo [pessoal] da 3ª conjugação – P1InfPC3
*1ª pessoa do plural do infinitivo [pessoal] da 1ª conjugação – P4InfPC1
*1ª pessoa do plural do infinitivo [pessoal] da 2ª conjugação – P4InfPC2
*1ª pessoa do plural do infinitivo [pessoal] da 3ª conjugação – P4InfPC3
*2ª pessoa do singular do infinitivo [pessoal] da 1ª conjugação – P2InfPC1
*2ª pessoa do singular do infinitivo [pessoal] da 2ª conjugação – P2InfPC2
*2ª pessoa do singular do infinitivo [pessoal] da 3ª conjugação – P2InfPC3
*2ª pessoa do plural do infinitivo [pessoal] da 1ª conjugação – P5InfPC1
*2ª pessoa do plural do infinitivo [pessoal] da 2ª conjugação – P5InfPC2
*2ª pessoa do plural do infinitivo [pessoal] da 3ª conjugação – P5InfPC3
*3ª pessoa do singular do infinitivo [pessoal] da 1ª conjugação – P3InfPC1
*3ª pessoa do singular do infinitivo [pessoal] da 2ª conjugação – P3InfPC2
*3ª pessoa do singular do infinitivo [pessoal] da 3ª conjugação – P3InfPC3
*3ª pessoa do plural do infinitivo [pessoal] da 1ª conjugação – P6InfPC1
*3ª pessoa do plural do infinitivo [pessoal] da 2ª conjugação – P6InfPC2
*3ª pessoa do plural do infinitivo [pessoal] da 3ª conjugação – P6InfPC3

fim
140

ESTRUTURAS FLEXIONAIS DO VERBO NO PORTUGUÊS PADRÃO ESCRITO

J. Bento

1.Visão Geral

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø Ø ∆
↓ ↓ a/ã/e/i/o va/ve/a/e Ø/o/i/ou
Ø/ra s/ste/Ø
ra/re Ø/u/o/i+alt/Ø+alt
re/rá/rã mos
ria/ríe is/stes/s/des/i/de
e/a m/o
sse
r/re
Ø/e/a
r
ndo
do/to/o/e

2.Casos particulares

*1ª pessoa do singular do presente do indicativo da 1ª conjugação – P1PrIC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø Ø o/ou
↓ ↓
141

*1ª pessoa do singular do presente do indicativo da 2ª conjugação – P1PrIC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø Ø o/i/ou
↓ ↓

*1ª pessoa do singular do presente do indicativo da 3ª conjugação – P1PrIC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø/i Ø o/ou
↓ ↓

*1ª pessoa do plural do presente do indicativo da 1ª conjugação – P4PrIC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a Ø mos
↓ ↓
142

*1ª pessoa do plural do presente do indicativo da 2ª conjugação – P4PrIC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø Ø mos
↓ ↓

*1ª pessoa do plural do presente do indicativo da 3ª conjugação – P4PrIC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø Ø mos
↓ ↓

*2ª pessoa do singular do presente do indicativo da 1ª conjugação – P2PrIC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a Ø s
↓ ↓
143

*2ª pessoa do singular do presente do indicativo da 2ª conjugação – P2PrIC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø Ø s
↓ ↓

*2ª pessoa do singular do presente do indicativo da 3ª conjugação – P2PrIC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/e/Ø Ø s
↓ ↓

*2ª pessoa do plural do presente do indicativo da 1ª conjugação – P5PrIC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a Ø is
↓ ↓
144

*2ª pessoa do plural do presente do indicativo da 2ª conjugação – P5PrIC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø Ø is/des
↓ ↓

*2ª pessoa do plural do presente do indicativo da 3ª conjugação – P5PrIC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø Ø s/des
↓ ↓

*3ª pessoa do singular do presente do indicativo da 1ª conjugação – P3PrIC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a Ø Ø
↓ ↓
145

*3ª pessoa do singular do presente do indicativo da 2ª conjugação – P3PrIC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø Ø Ø
↓ ↓

*3ª pessoa do singular do presente do indicativo da 3ª conjugação – P3PrIC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/e/Ø Ø Ø
↓ ↓

*3ª pessoa do plural do presente do indicativo da 1ª conjugação – P6PrIC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/ã Ø m/o
↓ ↓
146

*3ª pessoa do plural do presente do indicativo da 2ª conjugação – P6PrIC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø Ø m/o
↓ ↓

*3ª pessoa do plural do presente do indicativo da 3ª conjugação – P6PrIC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø Ø m/o
↓ ↓

*1ª pessoa do singular do pretéritoperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P1PtPC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e Ø i
↓ ↓
147

*1ª pessoa do singular do pretéritoperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P1PtPC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/i/Ø Ø Ø
↓ ↓

*1ª pessoa do singular do pretéritoperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P1PtPC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø Ø Ø
↓ ↓

*1ª pessoa do plural do pretéritoperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P4PtPC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/e Ø mos
↓ ↓
148

*1ª pessoa do plural do pretéritoperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P4PtPC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø Ø mos
↓ ↓

*1ª pessoa do plural do pretéritoperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P4PtPC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/e/Ø Ø mos
↓ ↓

*2ª pessoa do singular do pretéritoperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P2PtPC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/e Ø ste
↓ ↓
149

*2ª pessoa do singular do pretéritoperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P2PtPC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø Ø ste
↓ ↓

*2ª pessoa do singular do pretéritoperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P2PtPC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/e Ø ste
↓ ↓

*2ª pessoa do plural do pretéritoperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P5PtPC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/e Ø stes
↓ ↓
150

*2ª pessoa do plural do pretéritoperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P5PtPC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø Ø stes
↓ ↓

*2ª pessoa do plural do pretéritoperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P5PtPC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/e Ø stes
↓ ↓

*3ª pessoa do singular do pretéritoperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P3PtPC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø o/e Ø u/Ø+alt
↓ ↓
151

*3ª pessoa do singular do pretéritoperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P3PtPC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø Ø u/i+alt/Ø+alt
↓ ↓

*3ª pessoa do singular do pretéritoperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P3PtPC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø Ø u/o/i+alt
↓ ↓

*3ª pessoa do plural do pretéritoperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P6PtPC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/e ra m
↓ ↓
152

*3ª pessoa do plural do pretéritoperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P6PtPC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø ra m
↓ ↓

*3ª pessoa do plural do pretéritoperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P6PtPC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/e/Ø ra m
↓ ↓

*1ª pessoa do singular do pretéritoimperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P1ImpIC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a va Ø
↓ ↓
153

*1ª pessoa do singular do pretéritoimperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P1ImpIC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø a Ø
↓ ↓

*1ª pessoa do singular do pretéritoimperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P1ImpIC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø a Ø
↓ ↓

*1ª pessoa do plural do pretéritoimperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P4ImpIC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a va mos
↓ ↓
154

*1ª pessoa do plural do pretéritoimperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P4ImpIC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø a mos
↓ ↓

*1ª pessoa do plural do pretéritoimperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P4ImpIC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø a mos
↓ ↓

*2ª pessoa do singular do pretéritoimperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P2ImpIC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a va s
↓ ↓
155

*2ª pessoa do singular do pretéritoimperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P2ImpIC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø a s
↓ ↓

*2ª pessoa do singular do pretéritoimperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P2ImpIC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø a s
↓ ↓

*2ª pessoa do plural do pretéritoimperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P5ImpIC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø á ve is
↓ ↓
156

*2ª pessoa do plural do pretéritoimperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P5ImpIC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø e is
↓ ↓

*2ª pessoa do plural do pretéritoimperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P5ImpIC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø í/Ø e is
↓ ↓

*3ª pessoa do singular do pretéritoimperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P3ImpIC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a va Ø
↓ ↓
157

*3ª pessoa do singular do pretéritoimperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P3ImpIC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø a Ø
↓ ↓

*3ª pessoa do singular do pretéritoimperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P3ImpIC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø a Ø
↓ ↓

*3ª pessoa do plural do pretéritoimperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P6ImpIC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a va m
↓ ↓
158

*3ª pessoa do plural do pretéritoimperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P6ImpIC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø í/Ø a m
↓ ↓

*3ª pessoa do plural do pretéritoimperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P6ImpIC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø í/Ø a m
↓ ↓

*1ª pessoa do singular do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P1MqPC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/e ra Ø
↓ ↓
159

*1ª pessoa do singular do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P1MqPC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø ra Ø
↓ ↓

*1ª pessoa do singular do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P1MqPC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/e/Ø ra Ø
↓ ↓

*1ª pessoa do plural do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P4MqPC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø á/é ra mos
↓ ↓
160

*1ª pessoa do plural do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P4MqPC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø ê/Ø ra mos
↓ ↓

*1ª pessoa do plural do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P4MqPC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø í/é/Ø ra mos
↓ ↓

*2ª pessoa do singular do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P2MqPC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/e ra s
↓ ↓
161

*2ª pessoa do singular do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P2MqPC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø ra s
↓ ↓

*2ª pessoa do singular do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P2MqPC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/e/Ø ra s
↓ ↓

*2ª pessoa do plural do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P5MqPC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø á/é re is
↓ ↓
162

*2ª pessoa do plural do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P5MqPC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø ê/Ø re is
↓ ↓

*2ª pessoa do plural do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P5MqPC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø í/é/Ø re is
↓ ↓

*3ª pessoa do singular do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P3MqPC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/e ra Ø
↓ ↓
163

*3ª pessoa do singular do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P3MqPC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø ra Ø
↓ ↓

*3ª pessoa do singular do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P3MqPC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/e/Ø ra Ø
↓ ↓

*3ª pessoa do plural do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 1ª conjugação – P6MqPC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/e ra m
↓ ↓
164

*3ª pessoa do plural do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 2ª conjugação – P6MqPC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø ra m
↓ ↓

*3ª pessoa do plural do pretéritomais-que-eperfeito do indicativo da 3ª conjugação – P6MqPC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/e/Ø ra m
↓ ↓

*1ª pessoa do singular do futuropresente do indicativo da 1ª conjugação – P1FtPrC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a re i
↓ ↓
165

*1ª pessoa do singular do futuropresente do indicativo da 2ª conjugação – P1FtPrC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø re i
↓ ↓

*1ª pessoa do singular do futuropresente do indicativo da 3ª conjugação – P1FtPrC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø re i
↓ ↓

*1ª pessoa do plural do futuropresente do indicativo da 1ª conjugação – P4FtPrC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a re mos
↓ ↓
166

*1ª pessoa do plural do futuropresente do indicativo da 2ª conjugação – P4FtPrC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø re mos
↓ ↓

*1ª pessoa do plural do futuropresente do indicativo da 3ª conjugação – P4FtPrC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø re mos
↓ ↓

*2ª pessoa do singular do futuropresente do indicativo da 1ª conjugação – P2FtPrC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a rá s
↓ ↓
167

*2ª pessoa do singular do futuropresente do indicativo da 2ª conjugação – P2FtPrC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø rá s
↓ ↓

*2ª pessoa do singular do futuropresente do indicativo da 3ª conjugação – P2FtPrC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø rá s
↓ ↓

*2ª pessoa do plural do futuropresente do indicativo da 1ª conjugação – P5FtPrC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a re is
↓ ↓
168

*2ª pessoa do plural do futuropresente do indicativo da 2ª conjugação – P5FtPrC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø re is
↓ ↓

*2ª pessoa do plural do futuropresente do indicativo da 3ª conjugação – P5FtPrC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø re is
↓ ↓

*3ª pessoa do singular do futuropresente do indicativo da 1ª conjugação – P3FtPrC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a rá Ø
↓ ↓
169

*3ª pessoa do singular do futuropresente do indicativo da 2ª conjugação – P3FtPrC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø rá Ø
↓ ↓

*3ª pessoa do singular do futuropresente do indicativo da 3ª conjugação – P3FtPrC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø rá Ø
↓ ↓

*3ª pessoa do plural do futuropresente do indicativo da 1ª conjugação – P6FtPrC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a rã o
↓ ↓
170

*3ª pessoa do plural do futuropresente do indicativo da 2ª conjugação – P6FtPrC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø rã o
↓ ↓

*3ª pessoa do plural do futuropresente do indicativo da 3ª conjugação – P6FtPrC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø rã o
↓ ↓

*1ª pessoa do singular do futuropretérito do indicativo da 1ª conjugação – P1FtPtC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a ria Ø
↓ ↓
171

*1ª pessoa do singular do futuropretérito do indicativo da 2ª conjugação – P1FtPtC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø ria Ø
↓ ↓

*1ª pessoa do singular do futuropretérito do indicativo da 3ª conjugação – P1FtPtC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø ria Ø
↓ ↓

*1ª pessoa do plural do futuropretérito do indicativo da 1ª conjugação – P4FtPtC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a ría mos
↓ ↓
172

*1ª pessoa do plural do futuropretérito do indicativo da 2ª conjugação – P4FtPtC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø ría mos


↓ ↓

*1ª pessoa do plural do futuropretérito do indicativo da 3ª conjugação – P4FtPtC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø ría mos


↓ ↓

*2ª pessoa do singular do futuropretérito do indicativo da 1ª conjugação – P2FtPtC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a ria s
↓ ↓
173

*2ª pessoa do singular do futuropretérito do indicativo da 2ª conjugação – P2FtPtC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø ria s
↓ ↓

*2ª pessoa do singular do futuropretérito do indicativo da 3ª conjugação – P2FtPtC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø ria s
↓ ↓

*2ª pessoa do plural do futuropretérito do indicativo da 1ª conjugação – P5FtPtC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a ríe is
↓ ↓
174

*2ª pessoa do plural do futuropretérito do indicativo da 2ª conjugação – P5FtPtC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø ríe is
↓ ↓

*2ª pessoa do plural do futuropretérito do indicativo da 3ª conjugação – P5FtPtC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø ríe is
↓ ↓

*3ª pessoa do singular do futuropretérito do indicativo da 1ª conjugação – P3FtPtC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a ria Ø
↓ ↓
175

*3ª pessoa do singular do futuropretérito do indicativo da 2ª conjugação – P3FtPtC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø ria Ø
↓ ↓

*3ª pessoa do singular do futuropretérito do indicativo da 3ª conjugação – P3FtPtC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø ria Ø
↓ ↓

*3ª pessoa do plural do futuropretérito do indicativo da 1ª conjugação – P6FtPtC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a ria m
↓ ↓
176

*3ª pessoa do plural do futuropretérito do indicativo da 2ª conjugação – P6FtPtC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø ria m
↓ ↓

*3ª pessoa do plural do futuropretérito do indicativo da 3ª conjugação – P6FtPtC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø ria m
↓ ↓

*1ª pessoa do singular do presente do subjuntivo da 1ª conjugação – P1PrSC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø e Ø
↓ ↓
177

*1ª pessoa do singular do presente do subjuntivo da 2ª conjugação – P1PrSC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø a Ø
↓ ↓

*1ª pessoa do singular do presente do subjuntivo da 3ª conjugação – P1PrSC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø/i a Ø
↓ ↓

*1ª pessoa do plural do presente do subjuntivo da 1ª conjugação – P4PrSC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø e mos
↓ ↓
178

*1ª pessoa do plural do presente do subjuntivo da 2ª conjugação – P4PrSC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø a mos
↓ ↓

*1ª pessoa do plural do presente do subjuntivo da 3ª conjugação – P4PrSC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø/i a mos
↓ ↓

*2ª pessoa do singular do presente do subjuntivo da 1ª conjugação – P2PrSC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø e s
↓ ↓
179

*2ª pessoa do singular do presente do subjuntivo da 2ª conjugação – P2PrSC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø a s
↓ ↓

*2ª pessoa do singular do presente do subjuntivo da 3ª conjugação – P2PrSC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø/i a s
↓ ↓

*2ª pessoa do plural do presente do subjuntivo da 1ª conjugação – P5PrSC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø e is
↓ ↓
180

*2ª pessoa do plural do presente do subjuntivo da 2ª conjugação – P5PrSC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø a is
↓ ↓

*2ª pessoa do plural do presente do subjuntivo da 3ª conjugação – P5PrSC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø/i a is
↓ ↓

*3ª pessoa do singular do presente do subjuntivo da 1ª conjugação – P3PrSC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø e Ø
↓ ↓
181

*3ª pessoa do singular do presente do subjuntivo da 2ª conjugação – P3PrSC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø a Ø
↓ ↓

*3ª pessoa do singular do presente do subjuntivo da 3ª conjugação – P3PrSC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø/i a Ø
↓ ↓

*3ª pessoa do plural do presente do subjuntivo da 1ª conjugação – P6PrSC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø e m
↓ ↓
182

*3ª pessoa do plural do presente do subjuntivo da 2ª conjugação – P6PrSC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø a m
↓ ↓

*3ª pessoa do plural do presente do subjuntivo da 3ª conjugação – P6PrSC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø/i a m
↓ ↓

*1ª pessoa do singular do imperfeito do subjuntivo da 1ª conjugação – P1ImpSC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/e sse Ø
↓ ↓
183

*1ª pessoa do singular do imperfeito do subjuntivo da 2ª conjugação – P1ImpSC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø sse Ø
↓ ↓

*1ª pessoa do singular do imperfeito do subjuntivo da 3ª conjugação – P1ImpSC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/e/Ø sse Ø
↓ ↓

*1ª pessoa do plural do imperfeito do subjuntivo da 1ª conjugação – P4ImpSC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/e sse mos


↓ ↓
184

*1ª pessoa do plural do imperfeito do subjuntivo da 2ª conjugação – P4ImpSC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø ê/Ø sse mos


↓ ↓

*1ª pessoa do plural do imperfeito do subjuntivo da 3ª conjugação – P4ImpSC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø í/é/Ø sse mos


↓ ↓

*2ª pessoa do singular do imperfeito do subjuntivo da 1ª conjugação – P2ImpSC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/e sse s
↓ ↓
185

*2ª pessoa do singular do imperfeito do subjuntivo da 2ª conjugação – P2ImpSC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø sse s
↓ ↓

*2ª pessoa do singular do imperfeito do subjuntivo da 3ª conjugação – P2ImpSC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/e/Ø sse s
↓ ↓

*2ª pessoa do plural do imperfeito do subjuntivo da 1ª conjugação – P5ImpSC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø á/é sse is
↓ ↓
186

*2ª pessoa do plural do imperfeito do subjuntivo da 2ª conjugação – P5ImpSC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø ê/Ø sse is
↓ ↓

*2ª pessoa do plural do imperfeito do subjuntivo da 3ª conjugação – P5ImpSC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø í/é/Ø sse is
↓ ↓

*3ª pessoa do singular do imperfeito do subjuntivo da 1ª conjugação – P3ImpSC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/e sse Ø
↓ ↓
187

*3ª pessoa do singular do imperfeito do subjuntivo da 2ª conjugação – P3ImpSC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø sse Ø
↓ ↓

*3ª pessoa do singular do imperfeito do subjuntivo da 3ª conjugação – P3ImpSC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/e/Ø sse Ø
↓ ↓

*3ª pessoa do plural do imperfeito do subjuntivo da 1ª conjugação – P6ImpSC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/e sse m
↓ ↓
188

*3ª pessoa do plural do imperfeito do subjuntivo da 2ª conjugação – P6ImpSC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø sse m
↓ ↓

*3ª pessoa do plural do imperfeito do subjuntivo da 3ª conjugação – P6ImpSC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/e/Ø sse m
↓ ↓

*1ª pessoa do singular do futuro do subjuntivo da 1ª conjugação – P1FtSC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/e r Ø
↓ ↓
189

*1ª pessoa do singular do futuro do subjuntivo da 2ª conjugação – P1FtSC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø r Ø
↓ ↓

*1ª pessoa do singular do futuro do subjuntivo da 3ª conjugação – P1FtSC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/e/Ø r Ø
↓ ↓

*1ª pessoa do plural do futuro do subjuntivo da 1ª conjugação – P4FtSC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/e r mos
↓ ↓
190

*1ª pessoa do plural do futuro do subjuntivo da 2ª conjugação – P4FtSC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø r mos
↓ ↓

*1ª pessoa do plural do futuro do subjuntivo da 3ª conjugação – P4FtSC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/e/Ø r mos
↓ ↓

*2ª pessoa do singular do futuro do subjuntivo da 1ª conjugação – P2FtSC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/e re s
↓ ↓
191

*2ª pessoa do singular do futuro do subjuntivo da 2ª conjugação – P2FtSC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø re s
↓ ↓

*2ª pessoa do singular do futuro do subjuntivo da 3ª conjugação – P2FtSC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/e/Ø re s
↓ ↓

*2ª pessoa do plural do futuro do subjuntivo da 1ª conjugação – P5FtSC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/e r des
↓ ↓
192

*2ª pessoa do plural do futuro do subjuntivo da 2ª conjugação – P5FtSC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø r des
↓ ↓

*2ª pessoa do plural do futuro do subjuntivo da 3ª conjugação – P5FtSC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/e/Ø r des
↓ ↓

*3ª pessoa do singular do futuro do subjuntivo da 1ª conjugação – P3FtSC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/e r Ø
↓ ↓
193

*3ª pessoa do singular do futuro do subjuntivo da 2ª conjugação – P3FtSC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø r Ø
↓ ↓

*3ª pessoa do singular do futuro do subjuntivo da 3ª conjugação – P3FtSC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/e/Ø r Ø
↓ ↓

*3ª pessoa do plural do futuro do subjuntivo da 1ª conjugação – P6FtSC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/e re m
↓ ↓
194

*3ª pessoa do plural do futuro do subjuntivo da 2ª conjugação – P6FtSC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø re m
↓ ↓

*3ª pessoa do plural do futuro do subjuntivo da 3ª conjugação – P6FtSC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/e/Ø re m
↓ ↓

*1ª pessoa do plural do imperativo [afirmativo] da 1ª conjugação – P4IpC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø e mos
↓ ↓
195

*1ª pessoa do plural do imperativo [afirmativo] da 2ª conjugação – P4IpC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø a mos
↓ ↓

*1ª pessoa do plural do imperativo [afirmativo] da 3ª conjugação – P4IpC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø a mos
↓ ↓

*2ª pessoa do singular do imperativo [afirmativo] da 1ª conjugação – P2IpC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a Ø Ø
↓ ↓
196

*2ª pessoa do singular do imperativo [afirmativo] da 2ª conjugação – P2IpC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e/Ø Ø Ø
↓ ↓

*2ª pessoa do singular do imperativo [afirmativo] da 3ª conjugação – P2IpC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/e/Ø Ø Ø
↓ ↓

*2ª pessoa do plural do imperativo [afirmativo] da 1ª conjugação – P5IpC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a Ø i
↓ ↓
197

*2ª pessoa do plural do imperativo [afirmativo] da 2ª conjugação – P5IpC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø e Ø i/de
↓ ↓

*2ª pessoa do plural do imperativo [afirmativo] da 3ª conjugação – P5IpC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø Ø i/de
↓ ↓

*3ª pessoa do singular do imperativo [afirmativo] da 1ª conjugação – P3IpC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø e Ø
↓ ↓
198

*3ª pessoa do singular do imperativo [afirmativo] da 2ª conjugação – P3IpC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø a Ø
↓ ↓

*3ª pessoa do singular do imperativo [afirmativo] da 3ª conjugação – P3IpC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø/i a Ø
↓ ↓

*3ª pessoa do plural do imperativo [afirmativo] da 1ª conjugação – P6IpC1

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø e m
↓ ↓
199

*3ª pessoa do plural do imperativo [afirmativo] da 2ª conjugação – P6IpC2

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø Ø a m
↓ ↓

*3ª pessoa do plural do imperativo [afirmativo] da 3ª conjugação – P6IpC3

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø i/Ø a m
↓ ↓

*Infinitivo – Inf

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a-e/Ø-i r Δ
↓ ↓
200

*Gerúndio – Ger

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a-e/Ø-i ndo Δ
↓ ↓

*Particípio – Part

VOC

SUF

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/Ø-i/Ø-i/Ø do/to/o/e Δ
↓ ↓

fim
201

ALTERNÂNCIA DE GÊNERO E SUAS LEITURAS MÓRFICO-SEMÂNTICAS

J. Bento

Na língua portuguesa, a alternância morfológica de gênero – masculino vs. feminino –, nos


vocábulos que a admitem por norma (bem como pela própria deliberação potencial do sistema
linguístico), parece não estabelecer uma relação exclusiva com a flexão (de gênero), pois que também
incluiria os fenômenos da derivação (ou o uso do mecanismo da flexão para derivar vocábulos) e da
variação (sociolinguística), caso em que se observa a alternância por conta das diferenças de registro
linguístico (notadamente, mas talvez não só, no que se refere a regionalismos e/ou estratificações
sociais).
É mais ou menos como se pode perceber nos exemplos arrolados agora:

ALTERNÂNCIA DE GÊNERO

Flexão Derivação Variaçãosociolinguística


↓ ↓ ↓
‘garoto’ / ‘garota’ ‘jarro’ / ‘jarra’ ‘chinelo’ / ‘chinela’

Em sendo isto um fato, surge a dúvida de como saber se se trata de flexão de gênero ou, pelo
contrário, uma derivação ou variação sociolinguística. Parece que a flexão stricto sensu, e não a
derivação ou variação sociolinguística, carrega em si os seguintes traços mórfico-semânticos:

a)alusão à sexualidade (ainda que apenas implicada via linguagem figurada);


b)possibilidade de neutralização.

No que concerne à neutralização, queremos dizer que, por exemplo, ‘garoto’ / ‘garota’ podem
ter suspensas suas respectivas noções específicas, ligadas à sexualidade – ‘garoto’ / ‘garota’ >
‘garotos’ –, enquanto as noções veiculadas em ‘jarro’ / ‘jarra’ não podem ser reunidas através de
‘jarros’, da mesma forma que, em ‘chinelo’ / ‘chinela’, a opção ‘chinelos’ não contemplará a sua
contraparte ‘chinelas’ (ou vice-versa, se assim o quisermos):

ALTERNÂNCIA DE GÊNERO

Flexão Derivação Variaçãosociolinguística


↓ ↓ ↓
‘garoto’ / ‘garota’ ‘jarro’ / ‘jarra’ ‘chinelo’ / ‘chinela’

‘garotos’ ‘jarro(s)’ e ‘jarra(s)’ ‘chinelo(s)’ ou ‘chinela(s)’

Desta forma, por ilustração, teríamos, em português corrente:

a)Os garotos foram para a escola.


b)O(s) jarro(s) e a(s) jarra(s) foram quebrados.
c)A(s) chinela(s) foi(ram) rasgada(s) ou O(s) chinelo(s) foi(ram) rasgado(s).

Resumindo: a flexão de gênero, stricto sensu, deve ser aquela que faz alusão à sexualidade e
acolhe a neutralização (desta sexualidade). Não havendo estes traços caracterizadores, estaríamos
diante de derivação ou variação sociolinguística, conforme nos dirá a análise do fato linguístico em
observação.

fim
202

FLEXÃO DE GÊNERO EM PORTUGUÊS E O CASO POMBO/POMBA

J. Bento

Eis um exemplo esclarecedor de como o gênero gramatical não combina com o gênero biológico,
e vice-versa:

/pombo/

Gramática → [pombomasculino] [pombafeminino]

Referente → [pombomacho] [pombofêmea] [pombamacho] [pombafêmea]

Ou seja, /pombo/ se flexiona em gênero –

masculino → “pombo”
feminino → “pomba”

– mas esta flexão não funciona como indicador/referenciador de sexo. Trata-se de um processamento
linguístico motivado por outro fator, talvez o tamanho, a coloração, o comportamento do animal etc.
Quando a questão é referenciar a sexualidade, o sistema do português, neste caso, abandona o campo
da morfologia flexional e apela para o nível sintático:

pombo macho / pombo fêmea

pomba macho / pomba fêmea

A necessidade de referenciação à sexualidade desse tipo de animal, por outro lado, não costuma estar
presente na cultura e na linguagem ordinária, cotidiana, e se aplica mais a uma área específica do
conhecimento, a Biologia. Sabe-se que a identificação do sexo em animais, em grande medida, não é
tarefa muito fácil, ao alcance da pessoa comum. Nada obsta que esta realidade tenda a explicar a
respectiva lacuna mórfico-flexional na língua portuguesa, cuja noção gramatical de gênero se dirige,
no campo semântico relativo a {animais}, à distinção sexual.
Aproveitamos para lembrar que [pombafeminino] não se flexiona em gênero quando referencia o
órgão genital masculino (e – diga-se de passagem –, levando em conta certo raciocínio, deveria ser
[pombomasculino] a unidade linguística “adequada”). Em outras palavras, a categorização de gênero,
na perspectiva do sistema linguístico em sua integralidade, é arbitrária, também no sentido de que
não costuma se alinhar por uma ordem conceitual constante e uniforme, mesmo quando tudo faria
crer que o aspecto cultural favorecesse tal deliberação).

fim
203

GÊNERO NEUTRO EM PORTUGUÊS

J. Bento

Como se dá, por alto, a flexão de gênero:

alunomasculino alunafeminino

alunoneutro

Isto significa que o neutro é o meio linguístico de anular a oposição dicotômica masculino/feminino.
Ou, por exemplo:

*O aluno João [masculino]


*A aluna Maria [feminino]
*Os alunos João e Maria [neutro] = nem masculino, nem feminino

Como se interpreta a flexão de gênero:

a)hipótese dominante

Não existe o gênero neutro, em português; aquilo a que se poderia chamar de neutro, é, de fato, o
masculino, ou seja, o masculino supre a ausência do neutro.

Hipótese, aparentemente, espelhada no latim (de onde emana o português), essa proposta
compreende o dado linguístico a partir da forma, ou seja, a identidade de formas entre o masculino
e o neutro exclui a possibilidade gramatical do neutro.

b)hipótese alternativa

Existe o gênero neutro em português, como forma homônima do masculino, fato que nos leva a
consultar o contexto, linguístico e/ou extralinguístico, para confirmar se se trata do masculino ou
neutro.

Hipótese apoiada no conteúdo, ou seja, sustenta que a identidade de forma não é suficiente para
desconsiderar a diferenciação do conteúdo. Devido à ação do fenômeno homonímico, as formas
claramente se identificam, mas os conteúdos distintos podem ser apreciados, mesmo assim, via
contexto.
204

Certos movimentos ideológicos que tentam impingir à linguagem natural um artifício para o
gênero neutro –

alunomasculino alunafeminino

alunxneutro

– parecem, por conta disso, se basear na hipótese dominante:

Não existe o gênero neutro, em português.


Mas criemo-lo, para marcar ou fazer valer, na linguagem, a presença do gênero sexual psicológico –
que seria naturalmente fluido, e não biologicamente formatado.

Pelas pretensões desse tipo de movimento, o gênero neutro – que não consistiria, simplesmente,
em deixar de pontuar a diferença entre masculino e feminino – chega a suplantar as noções de
masculino/feminino, as quais podem, inclusive, ficar suprimidas no discurso oficial e em outros
discursos públicos e assemelhados. Neste aspecto, visualizam-se, em seu todo, três etapas do processo
no decorrer dos últimos tempos, a contar do procedimento original e espontâneo:

1º. – A ocorrência da forma linguística dita masculina apenas, tanto em casos que envolvem
masculino/feminino, como até mesmo exclusivamente o feminino (quando se quer manter a
neutralidade na dicotomia masculino/feminino):

Aluno: -------------------------------------------

2º. – A adoção de formas linguísticas distintas, para contemplar ambos os sexos, masculino e
feminino, dando-se exclusividade ao feminino quando, sabidamente, o referencial consiste somente
de mulheres:

Aluno(a): -------------------------------------------
ou
Aluna: -----------------------------------------------

3º. – A adoção exclusiva da forma artificial criada para o neutro, para que não reste nenhuma dúvida
sobre a firme convicção do “respeito às diferenças [sexuais, ou de gênero]”:

Alunx: -----------------------------------------------

fim
205

DEFINIÇÃO DE GÊNERO GRAMATICAL

J. Bento

O gênero, em português, é uma particularidade linguística dos nomes que implica em selecionar
o artigo [o] – se o perfil gramatical é o que se chama de masculino – ou o artigo [a] – se, ao contrário,
o perfil gramatical é o que se denomina de feminino –, no evento da constituição do sintagma nominal:

*O cofre
*A mamadeira
*O caderno barato
*A casa de Pedro

Quando se trata, especificamente, de referência à sexualidade, o sistema linguístico do


português tende a fazer valer a relação:

masculino → macho
feminino → fêmea

Podemos dizer que, em português, os nomes encerram obrigatoriamente gênero, embora, na


perspectiva mórfica, não necessariamente se flexionam em gênero, ou seja, possam passar do
masculino para o feminino, e vice-versa, conforme a linha de pensamento/referenciação no discurso.
Aliás – diga-se de passagem –, a flexão de gênero, nesta língua, é bastante reduzida, abrangendo,
proporcionalmente, poucas realidades linguísticas. Ainda que esteja em jogo, de alguma forma, o
fator sexualidade, não está garantida a possibilidade de flexão; por exemplo, existe –

*a criança

– mas não temos –

*o crianço

– o que era de se esperar, se levarmos em conta a interligação entre gênero gramatical/sexo. Um


suposto aprendiz de português como língua estrangeira, provavelmente, poderia fazer esta
insinuação lógico-linguística, [criança/crianço], a qual, de pronto, seria rechaçada pelo falante nativo.
O mecanismo flexional do gênero se limita, como o próprio conceito sugere, às alterações
mórficas, notadamente sobre a terminação da palavra – grosso modo, a comutação que se pode fazer
entre [o]-[a], ou algo equivalente –, e, por conseguinte, não abrange os casos exógenos, de natureza
lexical, como:

*homem/mulher
*boi/vaca
*bode/cabra

Nesta circunstância, não há flexão de gênero, mas apenas nomes diferentes para a representação do
fator sexualidade: [homem], [boi] e [bode] são gramaticalmente masculinos, mas não se flexionam
em feminino; os seus correspondentes femininos, do ponto de vista semântico – [mulher], [vaca] e
[cabra] – são, porventura, nomes femininos, mas constituem-se de outros vocábulos da língua, ou não
resultam da flexão de seus respectivos pares masculinos.
Finalmente, o português pode neutralizar, ou suspender, a conotação semântica
masculino/feminino, através do uso do morfe destinado ao masculino: [aluno] – [aluna] = [aluno]. É
por esta razão que, muitas vezes, só se sabe, por exemplo, se [aluno] é masculino ou neutro
consultando-se o contexto linguístico ou a situação de fala. Os especialistas preferem dizer que não
há o gênero neutro nesta língua, o que é verdade do ponto de vista meramente morfológico.

fim
206

GÊNERO GRAMATICAL EM PORTUGUÊS E SEXUALIDADE HUMANA


[padrão geral]

J. Bento

1.Lingua portuguesa histórica

GÊNERO MORFEMA EXEMPLO SEXO

Masculino [o] aluno macho

Feminino [a] aluna fêmea

Neutro [o] aluno suspensão da referência ao sexo

Assim, teríamos, por exemplo –

Os alunos de Letras

– que, de fato, arregimenta uma ambiguidade, por homonímia, a ser resolvida pela situação:

*apenas os alunos do sexo masculino de Letras; ou


*todos alunos, do sexo masculino/feminino, de Letras.

2.Língua portuguesa ideologicamente forjada [pela Esquerda]

2.1.Etapa 1: abolição do neutro (ou suspensão da referência ao sexo)

GÊNERO MORFEMA EXEMPLO SEXO

Masculino [o] aluno macho

Feminino [a] aluna fêmea

Assim, estamos tendo, corriqueiramente, por exemplo –

Os alunos e as alunas de Letras

– que, de fato, representaria uma danificação do sistema linguístico original: torna-se “proibido”
suspender a referência ao sexo. A rejeição à forma neutra, homônima a do masculino, é
ideologicamente justificada para evitar o alegado machismo.
Mas depois se percebe que alguém “ficou de fora” – o que vamos chamar aqui de terceiro sexo
–, de maneira que só arranjando um terceiro morfema para suprir esta lacuna:
207

2.2.Etapa 2: reimplantação do neutro com outro viés

GÊNERO MORFEMA EXEMPLO SEXO

Masculino [o] aluno macho

Feminino [a] aluna fêmea

Indefinido [e] alune nem um/nem outro

É preciso lembrar, de passagem, que esta incrustação do terceiro sexo, até quanto se sabe, parece não
ser encontrada em língua natural alguma. Trata-se, portanto, de uma invencionice esdrúxula,
capitaneada pela força ideológica esquerdista. Em outras palavras, salvo engano, não há o terceiro
sexo nas línguas naturais. Não obstante, este elemento exógeno é lançado no sistema linguístico
circulante, e chamam a isto de gênero neutro.
Vamos ver se a gente entende esta manobra ideológica algo confusa:

Excluíram o gênero neutro do sistema da língua e, depois, apresentaram um morfema para “gênero
neutro”, que não é gênero neutro, mas uma representação do gênero indefinido, que porventura irá
funcionar, também, como gênero neutro.

Por que isto é assim? Adivinharam, e eu já tinha frisado. É que o gênero neutro da língua histórica
não servia, por ser machista. Agora, este gênero neutro forjado serve, por não ser machista, mas
indefinista. Assim, ficaríamos com o gênero indefinido exercendo os papéis semântico-gramaticais de
[indefinido] e [neutro]:

GÊNERO MORFEMA EXEMPLO SEXO

Masculino [o] aluno macho

Feminino [a] aluna fêmea

Indefinido [e] alune nem um/nem outro

Neutro [e] alune suspensão da referência ao sexo

E, lá na frente, quando a sociedade estiver toda desprevenida contra a “astúcia”, não deveremos ter

Os alunos e as alunas de Letras

– nem mesmo a necessidade de postular –

Os alunos, as alunas e es alunes de Letras


208

– mas apenas:

Es alunes de Letras

Esta é a decorrência lógica do processo, que vai se consumando à medida que a sociedade vai
perdendo a sua identidade sociolinguística. Talvez leve muito tempo, mas o importante é que a coisa
caminhe nesta direção.

Atentemos para o jogo de poder inscrito na artimanha. Passa-se da alegada, e repudiada,


preponderância do masculino –

GÊNERO

Masculino Feminino
Neutro

– para a desejável preponderância do indefinido –

GÊNERO

Masculino Feminino Indefinido


Neutro

– sob a justificativa propagandeada do respeito às diferenças!


E as mulheres, como ficarão neste novo sistema? De acordo com que o se vê, continuarão na
mesma, ou apenas mudarão de dono (como se diz). E os homens (os que restarem até lá), como ficarão?
Serão, eventualmente, tratados por “alune”, e se acharem ruim... que é que se pode fazer? A
propósito, por esta ideologia, não existem homem ou mulher; trata-se de invencione sócio-histórico-
cultural, a qual manteve a humanidade iludida por milênios. O gênero real da humanidade é o
indefinido; este, sim, é que não é invencionice! Dá pra perceber a inversão de valores? Pois é...

fim
209

GÊNERO NEUTRO, IDEOLOGIA DE GÊNERO E FEMISMO

J. Bento

Eis a concepção fundamental de gênero (gramatical) sob a estrutura linguística regular do


português:

Masculino Feminino
/o/ /a/

/o/
Neutro

Nesta situação, o gênero neutro é suprido pela forma masculina, ou também pode ser interpretado
como homônimo da forma masculina:

Masculino Feminino
o aluno a aluna

o aluno
Neutro

É de se notar que a leitura homonímica da relação masculino/neutro, por determinar a


diferenciação sígnica (já não se trata do mesmo signo, mas de signos distintos que compartilham
identidade de significante – /o1/, masculino; /o2/, neutro), denuncia o equívoco da interpretação
segundo a qual se protesta que o morfema de masculino sobrepuja hierarquicamente o morfema de
feminino ao ter a prevalência na representação do neutro, o que não seria, de fato, verdade.
Deve-se observar também, embora isto não altere significativamente a perspectiva estrutural
ora estipulada, que o masculino, chamado de forma não-marcada, talvez seja melhor descrito como
morfema-zero, ou seja, desprovido de forma fônica, reservando-se ao /o/, final do vocábulo, a natureza
gramatical de vogal temática:

Masculino Feminino
/ø/ /a/

/ø/
Neutro

Na interpretação de morfema-zero para o masculino, exclui-se, portanto, a noção de masculinidade


para a partícula /o/. Em certo sentido, o vocábulo não está no masculino porque termina em /o/, mas
porque se contrapõe ao par opositivo em /a/, do feminino. O caráter do masculino como forma não-
marcada – na prática, atualizada em zero – talvez seja o que justifique, linguisticamente falando, o
caminho traçado para a consecução do neutro, o qual, já semanticamente, sugeriria esta condição de
não-marcado.
Eis, agora, a proposta ideológica proveniente do esquerdismo, consubstanciada na ideologia
de gênero em conjunção com o femismo (que não deve ser confundido com feminismo, ou a busca
sensata do espaço da mulher no meio social) e os princípios derivados do chamado politicamente
correto:
210

Masculino Feminino
/o/ ou /ø/ /a/

/x/
Neutro

Ou:

Masculino Feminino
o aluno a aluna

ox alunx
Neutro
Ou, melhor dizendo –

Neutro
ox alunx

Masculino Feminino
o aluno a aluna

– em que o neutro assume o “comando/topo” da estrutura, prevalecendo sobre os outros gêneros,


agora subalternos.
Pelo que se percebe, do ponto de vista meramente estrutural, e a despeito do incômodo de
ordem fonológica apresentado (é inusual, por exemplo, a pronúncia [aluniks] no sistema da língua),
entre alguns outros problemas adjacentes, não se vislumbra nenhuma alteração relevante. No
máximo, poder-se-ia dizer que foi aplicado ao neutro um corpo fônico exógeno, distinto do masculino

o/ø > x

– ou então, numa análise mais detida, constatar, porventura, que foi atribuída ao neutro uma
categorização marcada (/x/), em paralelo com o feminino (/a/).
Mas, do ponto de vista pragmático, há toda uma reorganização semântico-ideológica,
exatamente por conta do itinerário claramente deduzível: desbancar a suposta e alegada
masculinidade (quer dizer, machismo), ora presente no sistema linguístico, colocando em seu lugar a
figura do gênero neutro como preponderante.
Em princípio, poder-se-ia pensar – e assim talvez seja divulgado – que esse gênero neutro
implementado estaria a funcionar como um mecanismo linguístico de promoção da igualdade sexual
entre homens e mulheres no mundo da realidade, uma proposta do bem que visaria também a inclusão
daqueles que assumem, dentro da visão tradicional, comportamentos sexuais não ortodoxos.
Não obstante, outras leituras podem ser feitas, principalmente quando se observa a fonte de
onde emana a proposta: movimentos ideológicos sabidamente radicais. Uma dessas leituras é a de
que subjaz ao procedimento o intuito de subjugar e defenestrar a classe masculina (detidamente a de
cunho heterossexual, ou os “machistas”, como são pejorativamente apelidados), contra a qual se
devota uma inimizade mortal. A subversão da linguagem é, por conseguinte, uma das vias escolhidas
para atingir esse objetivo. fim
211

“LINGUAGEM NEUTRA”? – NÃO, MESMO!

J. Bento

A flexão gramatical, basicamente, pressupõe que, através de elementos morfemáticos, uma


mesma palavra varie de forma conforme determinada orientação semântica. É neste sentido que, no
português padrão, sob a mesma unidade sígnica, a referência ao homem se dá através do que se
chama o masculino, enquanto a referência à mulher se faz pelo feminino. Um exemplo:

“garoto” – masculino
“garota” – feminino

“ele” – masculino
“ela” – feminino

Ainda no português padrão, quando se quer suspender a orientação semântica específica – masculino
ou feminino –, elege-se a forma masculina para exercer esta função, a de neutro, ou seja, nem
masculino, nem feminino, mas ambos, indiferentemente. Esta formulação do neutro, quando se trata
de referenciação ao ser humano, particularmente, não é tão simples como se poderia imaginar à
primeira vista. De fato, soaria bastante estranho que um item como –

“garoto”

– por exemplo, viesse a servir de neutro numa construção como:

“O garoto comprou um sorvete.”

Neste caso, aparentemente, a referência se restringe ao [masculino], e não há como pensar em


[neutro]. No entanto, se a construção for –

“Os garotos compraram sorvete.”

– no plural, aí sim, torna-se mais viável a dupla intepretação: serão apenas indivíduos do sexo
masculino ou, ao contrário, indivíduos do sexo masculino e feminino, juntos e misturados. Somente
o contexto situacional poderá nos fornecer esta informação.
Naturalmente, se a forma utilizada for a feminina –

“As garotas compraram sorvete.”

– não restará a menor dúvida ao falante de que se trata apenas de garotas (sexo feminino).
De uns anos para cá, correntes ideológicas de Esquerda vêm reivindicando uma alteração na
base gramatical do português usual, a fim de atender àqueles indivíduos que não se sentem homem
ou mulher, pelo menos na percepção que é aplicada correntemente a tais referentes. São os não-
heterossexuais, nem todos, mas os que militam nesta causa ou são por ela cooptados.
Por esta via de raciocínio, advoga-se pela implementação de um morfema, adicional, para
representar tal fatia da sociedade, sob a justificativa de fazer valer a igualdade social, ou igualdade
sociolinguística, mais especificamente. Assim é que, para /garot/, por exemplo, deveria haver, mais
ou menos:

/garot/

[garoto] [garota] [garote]


↓ ↓ ↓
masculino feminino “neutro”

Cabe lembrar, de passagem, que é bastante incomum, na História, se propor, diretivamente,


alterações na base gramatical das línguas, ao contrário do que se passa com o componente lexical,
212

que é normalmente bastante “vigiado”, ou “questionado”, digamos assim, sobretudo na esfera


ideológica no sentido estrito. É, também, supostamente implausível que alguma língua histórica tenha
dedicado sua feição semântico-gramatical para servir à distinção entre {homem}, {mulher} e {não-
homem/não-mulher}, a despeito de sempre ter havido, em todas as sociedades, homens, mulheres e
os que não se “sentem assim” na perspectiva do modelo social regular. Mas isto não é relevante no
momento.
Pois bem. Como deve ter sido percebido, isto a que os militantes esquerdistas chamam de
neutro, ou linguagem neutra, não o é, efetivamente, neste ponto que estamos explorando
sucintamente. Trata-se de um morfema criado para representar a fatia que, por falta de expressão
mais adequada, estou denominando de {não-homem/não-mulher}, ou, dito de maneira prosaica, a
“comunidade LGBT”.
A ideia precisa de neutro vem a posteriori. Para os defensores desta ideologia, consiste em
desbancar a função de neutro atribuída ao masculino, na língua padrão, e colocar em seu lugar a
forma “neutra” que se propõe para a referenciação aos {não-homem/não-mulher}.
Nestas condições, teríamos, na passagem da língua padrão para a língua reivindicada, o
mecanismo gramatical corrente –

/garot/

[garoto] [garota]
↓ ↓
masculino feminino

neutro

– sendo substituído pelo mecanismo gramatical reclamado:

/garot/

[garoto] [garota] [garote]


↓ ↓ ↓
masculino feminino “neutro”

neutro

Nesta circunstância, dizer, por acaso –

“Bom dia, garotes!”

– estaria satisfazendo a todas as exigências da nova língua. O item [garotes], com a função de neutro,
abrangeria, [garotos] e [garotas], além, evidentemente, do próprio [garotes]. Enfim, os defensores da
chamada “linguagem neutra” não querem “nadinha”, mas apenas que:

a)Adicione-se à gramática da língua um morfema para representar os {não-homem/não-mulher}, ou


LGBT´s;
b)Retire-se do masculino a função de indicar o neutro, constante na língua usual.

Relativamente ao item ‘b)’, deve-se notar, de passagem, sob a visão desta vertente esquerdista, a
seguinte diretriz ideológica: elimina-se o reclamado machismo da linguagem e, em seu lugar,
instaura-se o desejado elegebetismo. Ainda que possa nos soar estúpido, dada a flagrante
irracionalidade, pretende-se promover a igualdade social transpondo o suposto Poder de um lugar
para outro do espectro social.
213

De qualquer maneira, pergunta-se:

ISTO É LINGUAGEM NEUTRA!?

Não, mesmo!
É, muito pelo contrário, linguagem supercarregada de vieses ideológicos, exatamente o que se
condena na estrutura do português usual. Os não-partidários deste pensamento – a imensa maioria
das pessoas comuns, ou as pessoas em geral – estão, simplesmente, correndo o risco de serem
desalojados de sua linguagem, historicamente constituída, ou sendo instigados (quiçá, depois,
obrigados por força de lei) a adotar uma forma de linguagem originária de um grupo específico e
minoritário da sociedade, a fim de atender às suas demandas e caprichos ideológicos.
Um fato curioso a ser notado é que as mulheres, na interpretação sociológica original, sequer
foram cogitadas durante o percurso de implementação da nova humanidade. A ninguém da ala
ideológica esquerdista ocorrera instituir para o neutro semântico-gramatical uma predominância
feminina, quer ainda na fase em que se guiava pela modalidade linguística padrão, o que daria –

/garot/

[garoto] [garota]
↓ ↓
masculino feminino

neutro

– mas que se ativeram a anular a possibilidade do neutro, dizendo, por exemplo –

“Os garotos e as garotas compraram sorvete.”


“Todos e todas...”

– quer na modalidade linguística artificialmente criada posteriormente, o que daria:

/garot/

[garoto] [garota] [garote]


↓ ↓ ↓
masculino feminino “neutro”

neutro

Por que será que as mulheres de verdade dançaram nesse jogo? É uma resposta da qual não
tenho a menor ideia. O fato é que, sob o quesito do neutro semântico-gramatical, as mulheres (de
verdade) apenas passaram do jugo masculino para o jugo elegebetista.
E por que será que, ao lado do morfema de “neutro” – do tipo [garote], ou equivalente –,
aplicado ao {não-homem/não-mulher}, ou LGBT, não se bolou um morfema de neutro, formalmente
diferente, para sobrepor-se indistintamente ao masculino/feminino/“neutro”? Deve ser porque um
morfema específico para o neutro semântico-gramatical não sugeriria a noção de mando, pretendida
pela ideologia, em prol do {não-homem/não-mulher}. Ou também pode ser que a teoria linguística
na qual se basearam para a criação do esdrúxulo artifício linguístico não lhes possibilitou enxergar
a devida nuance.
fim
214

CATEGORIA IDEOLÓGICA DO GÊNERO NEUTRO

J. Bento

VOC

DES

RAIZ

LEX GRA VT GE

Ø a/e/i/o/u/Ø Δ
↓ Ø
a/Ø/sub/alt
x

GÊNERO

MASCULINO NEUTRO FEMININO


↓ ↓ ↓
{Ø} {X} A
Ø
subtração
alternância

regras:

aplicável [ser humano]
*agrupamentos homogêneos/heterogêneos (homens/mulheres) → [Ø/x/a]: “todos”/“todx”/“todas”
*infantes → [x]: “garotx”
*concordância determinado/determinante: “ox garotx é bonitx”
“todos os associados”
“todas as associadas”
“todx ox associadx”

fim
215

MORFEMA ZERO & MORFEMA DELTA

J. Bento

Nós podemos dizer que o português compõe seus vocábulos em termos de 6 elementos
morfêmicos, discretos:

gênero / número[nomes]
prefixo / raiz / sufixo / vogal temática
modo-tempo / número-pessoa[verbos]

Acontece, no entanto, que, no geral, tais elementos podem não ter existência física, corpórea –
ou seja, não têm um significante [sonoridade] para representa-los. Disso, decorre um dos dois
fenômenos:

a)o elemento existe apenas como noção semântica – morfema zero;


b)o elemento existe apenas como espaço estrutural indeferido (não passível de realização) – morfema
delta.

Utilizamos os seguintes símbolos para a representação desse tipo de morfema:

*morfema zero → [ø]


*morfema delta → [Δ]

Apenas teórico, a razão prática do morfema delta é sustentar a estrutura do vocábulo em 6


elementos. Deste modo, nós podemos criar uma estrutura fixa do vocábulo, em português, e a partir
deste arcabouço, auscultar, em um determinado corpus a analisar, os elementos realizados (com ou
sem configuração física concreta) e irrealizáveis, os quais seriam o que postulamos como delta:

VOCÁBULO

prefixo raiz sufixo vogal temática gênero número = nomes


↕ ↕
modo-tempo número-pessoa = verbos

[x] [x] [x] [x] [x] [x]


[ø] [ø] [ø] [ø] [ø] [ø]
[Δ] [Δ] [Δ] [Δ] [Δ]

Perceba-se que a raiz, logicamente, nunca pode ser delta. Ainda com relação ao morfema delta, é
possível considera-lo quando tratamos dos nomes (em que há delta para modo-tempo e número-
pessoa) ou, pelo contrário, quando se analisam os verbos (em que há delta para gênero e número).

fim
216

RESTRIÇÕES MÓRFICO-FLEXIONAIS EM PORTUGUÊS

J. Bento

Os componentes linguísticos –

Enformantes Enformados

Fonológico
Morfológico
Sintático Lexical
Semântico
Pragmático

– se interpenetram e exercem influência uns sobre os outros. Em morfologia, portanto, não poderia
ser diferente. Eis como se dão, em caráter ilustrativo, as ingerências de outros níveis sobre o nível
morfológico:

RESTRIÇÕES

fonológicas sintáticas semânticas pragmáticas


↓ ↓ ↓ ↓
piressingular/ tardesubstantivo/ caneta/ dinheiro/
piresplural tardeadvérbio, caneto(*), dinheiros(?),
lápissingular/ terrenosubstantivo/ núpcias/ sol/
lápisplural terrenoadjetivo núpcia(*) sóis(?)

Notas:
a)Como “pires” e “lápis” já terminam em ‘s’ no singular, e como o plural se faz em ‘s’, torna-se
praticamente inviável estabelecer distinção entre singular/plural: “píreses*” e “lápises*” seriam
formas fonologicamente muito esdrúxulas para se tornarem aceitas no padrão geral da língua.
b)Pode-se dizer “minhas tardes de verão”, no plural, mas em “chegamos tarde” a oposição
singular/plural é gramaticalmente obstada; “terrenosubstantivo” não se flexiona em gênero, embora
“terrenoadjetivo”, sim; nesta mesma perspectiva, temos apenas “deznumeral/plural”, mas
“dezsubstantivo/singular”/ “dezessubstantivo/plural”, e por aí vai.
c)O sistema semântico, no presente estágio da língua, não prevê a existência de “caneto” como forma
masculina de “caneta”, apesar de fonológica e morfologicamente não haver nenhum impedimento;
“núpcias” é privativamente plural, sem possibilidade semântica de oposição ao singular.
d)Itens como “dinheiro” e “sol” têm seus plurais a depender da variante linguística em jogo; na
maioria das variantes coloquiais, senão em todas, é, no mínimo, estranho pluralizar “dinheiro” e
“sol”, exatamente porque só temos um dinheiro, o Real, bem como só temos um sol, o Sol, aquele que
está sobre nossas cabeças o dia todo.
e)Distinções conceituais/factuais que se arguem entre os níveis sintático, semântico e pragmático são
passíveis de muita contestação em virtude das estreitíssimas interconexões que tais níveis mantêm
entre si. Na realidade, talvez não se possa conceber como um dado linguístico seja, rigorosamente,
apenas sintático ou apenas semântico ou apenas pragmático, mas, ao contrário, sempre sintático-
semântico-pragmático, concomitantemente.
fim
217

NEUTRALIDADE EM MORFOLOGIA E O GÊNERO NEUTRO

J. Bento

A neutralidade em morfologia, particularmente no que diz respeito à noção de gênero, pode ser
interpretada como uma relação hiperonímico-hiponímica, e tem analogias com fatos fonológicos e
lexicológicos:

hiperônimo/
arquifonema/
arquilexema

[não-marcado]
[neutro]
“garoto(s)”
“homem”
“filho(s)”
“dia”
/p/

homonímia

hipônimo1/ hipônimo2/
fonema1/ fonema2/
lexema1 lexema2
↓ ↓
[não-marcado] [marcado]
[masculino] [feminino]
“garoto” “garota”
“homem” “mulher”
“filho” “filha”
“dia” “noite”
/p/ /b/

Notas:

1.Pela interpretação dada aqui, a forma não-marcada funciona como


neutro/arquifonema/arquilexema, sendo essa característica o que a define como tal.

2.Aparentemente, itens como “garoto” e “filho” só se elevam à condição de hiperônimo na forma


plural, e não resta dúvida de que está muito em voga a tendência, ideológica, à dicotomização –
“garotos e garotas”, “filhos e filhas” –, desfazendo-se, de algum modo, a perspectiva hiperonímica
destas noções e outras equivalentes.

3.Em português corrente, o gênero neutro/não-marcado não existe enquanto morfema independente,
ou terceira via, adotando-se a forma masculina como suporte, numa perspectiva homonímica, em
que somente o contexto linguístico/extralinguístico poderá nos informar se se trata do masculino ou
do neutro. Por exemplo, na sentença –

*Os alunos ficaram reprovados.

– no frigir dos ovos, tanto é possível uma leitura em que apenas os matriculados do sexo masculino
foram reprovados, como a leitura em que todos os alunos – do sexo masculino e feminino,
indistintamente – sob a referência foram reprovados.
218

4.Não obstante, nem sempre a forma masculina, em português, tem a prevalência da forma não-
marcada, pois há casos em que a forma feminina também faz este papel –

“cabra”

“cabra” “bode”

– como quando alguém diz –

*Fulano é criador de cabras.

– em que não há necessidade de deixar de fora os bodes, os quais, normalmente, apesar de em menor
quantidade, também compõem os chiqueiros.

5.Dependendo da ideologia subjacente, a tentativa de inserir um morfema esdrúxulo (p. ex. [x] ou
algo que o valha) para representar o neutro pode estar ligada à aversão pela dicotomia biológica
macho/fêmea, substituindo-a pelo conceito progressista de diversidade sexual no ser humano.
Não seria, portanto, necessariamente, apenas uma preocupação com a indicação do gênero
gramatical neutro diferente do masculino, desbancando o suposto “machismo”, mas com a
implementação, nos parâmetros internos da linguagem, do conceito relativo a uma terceira opção
sexual, o gênero indefinido, o qual se encontraria excluído do campo linguístico. Faz sentido: ora, se
não existem apenas “homem” e “mulher” (na acepção clássica), por que admitir um sistema
linguístico que faça tal restrição, “simplória, deficiente e injusta”?
O interessante é que, devido à tendência da língua em arregimentar a categoria de neutro, ou
forma não-marcada, hiperonímica, não por acaso se deixa entender que o candidato exclusivo a
exercer esta função gramatical, a de neutro, passa a ser a forma esdrúxula inserida, significando que
não se trata de abolir o espaço do alegado “machismo”, sob o princípio da igualdade tão almejada
entre os indivíduos do corpo social, mas, exatamente, pôr em seu lugar uma “força mais conveniente”,
os grupos que se inserem ou se autoproclamam inseridos na categoria social de gênero indefinido:

hiperônimo
nem-masc./nem-fem.

hipônimo1 hipônimo2 hipônimo3


masculino nem-masc./nem-fem. feminino

Na prática, então, assim deveria se comportar o falante, em síntese:

a)Quando a referência diz respeito a pessoas do gênero indefinido → Elx


b)Quando houver mistura de índoles sexuais divergentes → Elx
c)Quando não se quer especificar a índole sexual → Elx

Apenas quando se tratar de pessoas definidamente heterossexuais – homens ou mulheres – ou, em


todo caso, de indivíduos que assim queiram ser percebidos, é que se poderia, talvez, lançar mão das
categorias marcadas: → Eles/Elas

fim
219

PRONOMES PESSOAIS DO CASO RETO


J. Bento

1.Descrição dos pronomes pessoais

[1]
ELEMENTOS PRIMORDIAIS DO DISCURSO

PARTICIPANTES CIRCUNSTÂNCIA
[“pessoas”] [situação]

1ª pessoa 2ª pessoa 3ª pessoa lugar tempo modo causa fim


↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓
eu tu ele/algo onde quando como porquê para quê

[2]
VISÃO CLÁSSICA DOS PARTICIPANTES

1ª pessoa 2ª pessoa 3ª pessoa 1ª pessoa 2ª pessoa 3ª pessoa


singular singular singular plural plural plural
↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓
eu tu ele nós vós eles

Ou, em outra organização:

[2.1]

1ª pessoa 2ª pessoa 3ª pessoa

singular plural singular plural singular plural


↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓
eu nós tu vós ele eles

[3]
VISÃO PROPOSTA PARA OS PARTICIPANTESnota

1ª pessoa 2ª pessoa 3ª pessoa 1ª/2ª pessoas 1ª/3ª pessoas 1ª/2ª/3ª pessoas 2ª/3ª pessoas
[singular] [plural] [plural] [plural] [plural]

singular plural singular plural

eu tu vós ele eles nós vós


↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓
me te vos se se nos vos
mim ti vosco si si nosco vosco
migo tigo vocês sigo sigo vocês
você lhe lhes
o os
220

NOTA:

1.Os colchetes indicam que a forma é singular (ou plural), apenas, sem variação;

2.Deixamos de indicar a flexão, explícita, de gênero (ocorrente em formas de 3ª pessoa – “ele”,


“ela”, “eles”, “elas”, “o”, “a”, “os”, “as”), por não ter nenhuma contribuição informativa sobre o
tema em destaque;

3.As formas paradigmáticas relativas aos participantes do discurso também podem ser interpretadas,
em grande medida, como alterações morfossintáticas de um único item (alomorfia), o que,
naturalmente, dispensa o conceito de sinonímia. Assim, em “me”, “mim”, “migo” é bastante viável
estabelecer o fenômeno da alomorfia (alterações de forma para representação de funções sintáticas
diversas, ou caso gramatical), antes que a sinonímia propriamente dita.

2.Pronomes pessoais do caso reto

2.1.Categorização gramatical [abordagem tradicional]

PESSOA GÊNERO NÚMERO ITEM

singular Δ
masculino
plural Δ

singular eu
primeira neutro
EU plural nós

singular Δ
feminino
plural Δ

singular Δ
masculino
plural Δ

singular tu
segunda neutro
TU plural vós

singular Δ
feminino
plural Δ

singular ele
masculino
plural eles

singular Δ
terceira neutro
ELE plural Δ

singular ela
feminino
plural elas
221

2.2.Categorização gramatical [abordagem proposta]


PESSOA GÊNERO NÚMERO ITEM
singular eu
masculino
plural Δ

singular Δ
primeira neutro
EU plural Δ

singular eu
feminino
plural Δ

singular tu
masculino
plural vós1

singular Δ
segunda neutro
TU plural Δ

singular tu
feminino
plural vós1

singular ele
masculino
plural eles

singular Δ
terceira neutro
ELE plural Δ

singular ela
feminino
plural elas

singular Δ
masculino
plural nós1

singular Δ
quarta neutro
eu+tu+/-ele plural Δ
[nós]1
singular Δ
feminino
plural nós1

singular Δ
masculino
plural nós2

singular Δ
quinta neutro
eu+ele plural Δ
[nós]2
singular Δ
feminino
plural nós2

singular Δ
masculino
plural vós2

singular Δ
sexta neutro
tu+ele plural Δ
[vós]2
singular Δ
feminino
plural vós2 fim
222

CATEGORIZAÇÃO GRAMATICAL DOS NOMES EM PORTUGUÊS

J. Bento

A categorização gramatical dos nomes em português se dá, basicamente:

a)por flexão (morfêmica), ou, segundo a ilustração –

VOCÁBULOX,Y..

– em que x e y correspondem às variações (flexões) que o vocábulo sofre para representar a categoria
(masculino/feminino, singular/plural):

“garotoØ [masculino]”
“garota [feminino]”
“corpoØ [singular]”
“corpos [plural]”

b)por suplementação (vocabular), ou, segundo a ilustração –

VOCÁBULOX
VOCÁBULOY...

– em que x e y, aparentemente específicos do gênero e pessoa, significam comutação de vocábulos na


representação da categoria, como nos exemplos do português:

“bode[masculino]”
“cabra[feminino]”

“eu[primeira pessoa] ”
“tu[segunda pessoa]”
“ele[terceira pessoa]”

O sistema do português prevê, nos nomes, abundantes restrições categoriais, sob as quais os
elementos da língua se limitam à adoção de uma categoria única, invariável:

“cadeira[feminino]”
“núpcias[plural]”

Neste ponto, e com exceção dos pronomes pessoais – que fazem variação categorial vocabular
(primeira > segunda > terceira) –, a categoria de pessoa é absoluta e em terceira:

“bode[terceira]”
“cabra[terceira]”
“cadeira[terceira]”
“núpcias[terceira]”
etc. etc.

Embora condições lógicas possam estar envolvidas (por exemplo, parece-nos inviável
pensarmos em –

“núpcias”

– como uma noção singular, ou em –

“um[singular] ”
“dois[plural] ”
223

– com os sentidos de pluralidade e singularidade, respectivamente), as restrições categoriais tendem


a ser moldadas, preponderantemente, pelo componente semântico-pragmático. Assim é que o
vocábulo –

“dinheiro[singular]”

– por exemplo, se torna refratário à pluralização, ou, no mínimo, de pluralização esdrúxula para
muitos falantes, não devido à inexistência de condições fono-morfológicas plenas –

“dinheiroØ[singular]”
“dinheiros[plural]”

– mas por destoar do universo sociolinguístico-cultural a assunção de mais de um dinheiro


(comumente, só temos o Real, e olhe lá!). De igual modo, deve-se pensar com a categorização de
gênero, pois que –

“dinheira[plural]”

– seria perfeitamente enunciável, do ponto de vista fono-morfológico, embora não encontre um


universo de discurso efetivo em que possa ser inserido. Evidentemente, entre “dinheiros” e
“dinheira” há uma grande diferença, já que o primeiro, pelo menos, tem livre circulação em certos
universos de discurso, enquanto o segundo ainda é absolutamente nulo em termos de proposta
enunciativa. (A propósito disso, quando escrevemos “dinheiros” / “dinheira”, o editor de texto do
Word só cisma com “dinheira”, o que nos sugere a usualidade do primeiro, em contraste com a
inusualidade, embora não a impossibilidade, do segundo.)

fim
224

GÊNERO GRAMATICAL DOS PRONOMES PESSOAIS NO PORTUGUÊS PADRÃO


[esquema demonstrativo geral]

J. Bento

P1 eu me mim comigo
↓ ↓ ↓ ↓
N N N N

P2 tu te ti contigo
↓ ↓ ↓ ↓
N N N N

P3 ele ela se si consigo lhe o a


↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓
M F N N N N M F

P4 nós conosco
↓ ↓
N N

P5 vós convosco
↓ ↓
N N

P6 eles elas se si consigo lhes os as


↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓
M/N F N N N N M/N F

Notação:
P1 – primeira pessoa/singular M – masculino
P2 – segunda pessoa/singular F – feminino
P3 – terceira pessoa/singular N – neutro
P4 – primeira pessoa/plural
P5 – segunda pessoa/plural
P6 – terceira pessoa/plural
Obs.:
1.P3-M, aparentemente, pode realizar a função semântica de neutro em situações cuja referência, anafórica, é abstrata, e não
concreta, pessoal, ou seja, cujo item referenciado já encerra o viés de neutralidade em função do gênero. Por exemplo: “Aluno
é bicho esperto; ele vive a querer passar a perna no professor”. Enquanto se dirige a indivíduos plenamente identificados, não
parece que P3-M possa, normalmente, realizar o neutro, restringindo-se ao fator masculino, ou sexo biológico, ou algo
figurativamente equivalente.
2.Atentemos que, nos casos indicados, P 6-M tem que dividir a sua carga semântica de masculino com N, neutro, enquanto F,
indistintamente, tem exclusividade semântica de feminino.

fim
225

UM EXEMPLO DE CACHORRADA NA LÍNGUA PORTUGUESA

J. Bento

Vendo:

comer[...] pessoal flexão – P1/P2/P3/P4/P5/P6

acontecer[ocorrer] pessoal flexão – P3/p6

haver[existir] impessoal inflexionável

ser[horas] impessoal flexão – P3/P6

Compreendendo:

1.O verbo –

comer[...]

– é pessoal (ou seja, tem sujeito), e segue a expectativa plena, flexionando-se em P1/P2/P3/P4/P5/P6,
enquanto

acontecer[ocorrer]

– apesar de pessoal (ou seja, tem sujeito), só se flexiona em P3/P6 → motivação semântica.

2.O verbo –

haver[existir]

– é impessoal (ou seja, não tem sujeito), e segue a expectativa plena, não se flexionando, enquanto

ser[horas]

– apesar de impessoal (ou seja, não tem sujeito), flexiona-se em P3/P6 → motivação sintática.

A motivação sintática de –
ser[horas]

– é, ademais, esdrúxula, no sentido de que a flexão não se dá com o sujeito, que é inexistente, mas
com o termo indicador da hora, ou o adjunto adverbial.

fim
226

“VOCÊ/SENHOR”, SEGUNDA PESSOA/TERCEIRA PESSOA

J. Bento

Enredo diacrônico:

significado denotativo = de que se fala / terceira pessoa

ideológico-cerimonioso x
Tempo1 → você/senhor significado conotativo =
ↆ ideológico-cerimonioso y
vossa mercê
referente = com quem se fala / segunda pessoa

significado denotativo = com quem se fala / terceira pessoa

ideológico-habitual
Tempo2 → você/senhor significado conotativo =
ideológico-respeitoso

referente = com quem se fala / segunda pessoa

Observe-se que, no Tempo2, o significado denotativo se altera, passando de –

{de que se fala}

– para –

{com quem se fala}

– sem que haja uma correspondência a nível estritamente gramatical, que se mantém com o caráter
de terceira pessoa.
O significado denotativo –

{de que se fala / terceira pessoa}

– inscrito no Tempo1, pode ser melhor entendido se fizermos uma analogia com os discursos, muito
comuns, do tipo –

*Sua simpatia está me convidando para um passeio!?

– em que o emissor, afetuosamente, se dirige ao receptor selecionando uma qualidade pessoal


atribuída, ao invés da pessoa propriamente dita. Trata-se de um jogo estilístico, com grande força
expressivo-ideológica. Traduz, mais ou menos, o íntimo das pessoas, que gostariam de ser vistas a
partir de seus atributos positivos, deixando de lado os negativos, que também se inserem no todo do
indivíduo.

fim
227

AFIXOS COMUNS DO PORTUGUÊS COLOQUIAL


[panorama geral]

J. Bento

Síntese:

VOC

SUF

RAIZ

PRE LEX → [VERB SUBST ADJ]


↓ ↓ ↓ ↓
A/an AGEM ADO/edo/udo AÇO
DE/des ÇÃO AGEM ADO
EM/en DOR AL/ar DADE
IM/in/i MENTO (Z)ÃO E(S)CER
RE ÂNCIA/ança ARIA ÉRRIMO/imo/íssimo
VEL ÁRIO/(d)eiro EZ/eza/ice/ície
ÇAL/gal/ral MENTE
ECO/eto/ico/ito
ENSE/ês
(L)ENTO
FICAR
(Z)INHO
OSO

A partir das bases, a adjunção dos sufixos pode alterar ou não a classe da palavra:

a)Base verbal

VERBO

Substantivo Adjetivo
↓ ↓
AGEM DOR
ÇÃO VEL
MENTO
ÂNCIA/ança
228

b)Base substantiva

SUBSTANTIVO

Substantivo Adjetivo Verbo


↓ ↓ ↓
ADO/edo/udo AL/ar FICAR
AGEM ENSE/êz
(Z)ÃO (L)ENTO
ARIA OSO
ÁRIO/(d)eiro
ÇAL/gal/ral
ECO/eto/ico/ito
(Z)INHO

c)Base adjetiva

ADJETIVO

Adjetivo Substantivo Verbo Advérbio


↓ ↓ ↓ ↓
AÇO DADE E(S)CER MENTE
ADO EZ/eza/ice/ície
ÉRRIMO/imo/íssimo

A derivação não se encerra nos limites da afixação. Existe um modelo formatador de vocábulos
na língua, dentro do mesmo princípio derivacional, que consiste em comutar as flexões (nominal →
verbal; verbal → nominal). Estou denominando este artifício de derivação por comutação flexional, e
os exemplos abaixo nos dão uma ideia do que se trata:

mudar ↔ muda
pescar ↔ pesca
ajudar ↔ ajuda
combater ↔ combate
atacar ↔ ataque
rematar ↔ remate
chorar ↔ choro
cortar ↔ corte
martelar ↔ martelo
coroar ↔ coroa

Como se pode perceber, de “mudar”, por exemplo, em que a estrutura mórfico-flexional verbal nos
sugere –

VOC

RAIZ vt dmt
mud a r
229

– tem-se, por comutação flexional, o substantivo “muda” –

VOC

RAIZ vt dn
mud a Ø

– em que a vogal temática verbal se transforma em vogal temática nominal (a despeito da


homonímia), e a desinência modo-temporal cede a vez à desinência nominal de número (singular);
não há desinência de gênero porque o nome é invariável em gênero (conforme o posicionamento
teórico admitido).
A mesma verdade teórica pode ser visualizada, se se quiser, pelo inverso – um nome a se
transformar em verbo, pela comutação flexional. Então se constata que a derivação, neste caso, não
consiste de uma relação clara entre vocábulo primitivo e vocábulo derivado, ou vice-versa, mas de
mera inter-relação biunívoca sistemática entre nomes e verbos na língua:

VOC VOC
[nome] [verbo]

RAIZ vt dn RAIZ vt dmt


mud a Ø mud a r

No caso da derivação afixal, a massa fônica do morfema nos revela o vocábulo derivado em
contraste com o primitivo. Na derivação por comutação flexional, esta informação, claramente, não
fica evidente.
Finalmente, instituindo-se idêntica disposição aplicada à comutação flexional, poderíamos
pensar na derivação por comutação funcional, ou derivação imprópria, como é chamada
tradicionalmente. Por esta categoria, as formas linguísticas simplesmente têm/adquirem a
propriedade de alternar sua função sintática, e certos nomes substantivos podem ser tipificados como
nomes adjetivos, e vice-versa, em português; assim, “céu azul” – “o azul do céu”. Outrossim, talvez
seja pertinente estabelecer, ulteriormente, a distinção entre derivação funcional e mero processo
metalinguístico, em que, por exemplo, qualquer elemento da língua pode se tornar um substantivo,
ou forma substantivada – “de” (preposição) / “o de” (nome) etc. Será preciso maior reflexão sobre
estes fatos.

fim
230

AFIXAÇÃO E CLASSIFICAÇÃO DOS VOCÁBULOS


[“bolacha” por ilustração]

J. Bento

RAIZ LEXICAL
[bolach]

combinações potenciais função sintática

em - bolach - ar
im - - ecer verbo
a - - aremos
de(s) - - a
re - - ão
- agem
- ação
- amento
- ança
- aria
- eiro substantivo
- inha
- eco
- ice
- idade
- ez
- ral
- ador
- ado
- ante/ente/inte
- ável
- ense adjetivo
- ento
- érrimo
- íssimo
- oso
- udo
- amente advérbio

Notas:

1.Não há, no português, as chamadas classes de vocábulos, mas funções vocabulares a depender das
combinações afixais aplicadas às raízes. Fundamentalmente, seriam verbo, substantivo, adjetivo e
advérbio – ou, de outro modo:

a)função verbal → núcleo da oração


b)função substantival → núcleo do sintagma (nominal)
c)função adjetival → modificador do núcleo nominal
d)função adverbial → modificador do núcleo verbal (ou, por tabela, toda a oração)
231

O que há são tipos de raízes: raiz lexical (que recebe afixação, flexional/derivacional) e raiz
gramatical (que ou recebe afixação flexional nominal ou rejeita quaisquer afixações). Dizer, por
conseguinte, que tal vocábulo é um verbo, um adjetivo, um substantivo... é tecnicamente inadequado.
A rigor, está-se diante de uma raiz (lexical), a qual, adjungida de certo afixo, lhe confere a função –
obrigatória ou cambiante – de verbo, adjetivo, substantivo.
As raízes gramaticais invariáveis é que tendem a se prender às suas funções de saída: “hoje”,
por exemplo, excluída a situação da chamada derivação imprópria – “o hoje” substantiva “hoje” –, é
configurado para a função exclusiva de advérbio, e apenas nestes casos – em que se dá a relativa
equivalência entre classe e função, pode-se arguir pelo conceito de classe de vocábulo.

2.As combinações potenciais (no esquema acima) são privativas das raízes lexicais e certas raízes
gramaticais (estas, apenas no tocante às flexões nominais), pois que determinadas raízes, do tipo
gramatical (como as relativas aos conectivos, por exemplo), rejeitam variação mórfica, ou adjunção
afixal.

3.As combinações potenciais são posteriormente filtradas pelo uso, constituindo-se a(s) norma(s)
linguística(s).

4.As funções sintáticas do vocábulo construído podem ser obrigatórias (p. ex., [bolacharemos] só pode
ser verbo) ou cambiantes (p. ex., [bolachador] tende a ser substantivo ou adjetivo, conforme a
disposição no construto oracional).

5.O estranhamento advindo de construções vocabulares como [bolacharemos], [bolachador] etc. se


deve à fixação da(s) norma(s) linguística(s), às quais nos acostumamos, e/ou possibilidades
discursivas diretoras dos atos de fala – ou norma(s) discursiva(s). Será muito difícil, sem dúvida,
encontrarmos uma situação de discurso que sugira [bolacharemos] ou [bolachador] etc., mas também
não se poderia antecipar que nunca haveria circunstâncias comunicativas em que tais construções
não pudessem ou tivessem que ser efetivadas. Estamos, aqui, nos reportando à língua enquanto
sistema e, como todo sistema, há normalmente potencialidades não exploradas, embora exploráveis
conforme as necessidades e/ou conveniências.
De fato, até quanto se pode perceber, [bolach] consiste, segundo a norma linguística vigente, de
um substantivo com a seguinte disposição máxima:

RAIZ LEXICAL
[bolach]

combinações realizáveis função sintática

bolach - a
- ão/ona
- eiro substantivo
- inha

O item [bolacheiro] não é comum, ou pelo menos não tão comum, mas – creio – não causaria
grande perplexidade, particularmente se a comunidade de fala tivesse um indivíduo que produzisse,
ou tivesse como atividade, a produção de bolachas para vender na vizinhança.
Além disso, havemos de atentar para o fenômeno da homonímia, em que [bolach], na verdade,
pode compreender três itens distintos, ligados pela identidade de significante: [bolach 1] = {biscoito}
– o item anterior – mais [bolach2] = {bofete} e [bolach3] = {região facial}, que suportam:
232

RAIZ LEXICAL
[bolach2]

combinações realizáveis função sintática

bolach - ar
- ou verbo
- aremos
- etc.
- a
- ão substantivo
- inha
- ado adjetivo

RAIZ LEXICAL
[bolach3]

combinações realizáveis função sintática

bolach - a
- ão substantivo
- inha
- ado adjetivo
- udo

6.No cômputo geral, o que se passa relativamente ao que se tem chamado de classe de palavra, é o
preenchimento de funções sintáticas previstas no construto oracional, as quais podem ser
teoricamente delineadas como segue:
233

ORAÇÃO

verbo sintagma nominal {conectivos}

advérbio determinante substantivo adjetivo


[modificador] adjetivo

advérbio adjetivo
[modificador]

(pronome)

* * * * * *

E estas funções sintáticas costumam ser preenchidas por determinados itens lexicais/gramaticais de
maneira regular, atendendo prescrições afixo-funcionais. Assim, um vocábulo em [-dor] revela-se
com funcionalidade substantival e adjetival, rejeitando a função verbal ou conectiva. Substituindo-
se [-dor] por [-mos], em [cantador] –

canta-dor

canta-mos

– alteramos a função de substantivo/adjetivo para verbo.


Em outras palavras –

[cantar]

– por exemplo, não é rigorosamente um verbo por inerência, mas por ter adjungido o afixo [-ar] em
sua configuração mórfica.

fim
234

MORFOLOGIA DOS NUMERAIS CARDINAIS


J. Bento

PRIMITIVO DERIVADOS

sufixação/ sufixação/ composição


composição prefixação

um(a) on-ze ... ...


dois(uas) do-ze ... du-zentos
três tre-ze tr-inta tre-zentos
quatro quator-ze quar-enta quatro-centos
cinco quin-ze cinqu-enta quinh-entos
seis dez-e-seis sess-enta seis-centos
sete dez-e-sete set-enta sete-centos
oito dez-e-oito oit-enta oito-centos
nove dez-e-nove nov-enta nove-centos
dez ... ... ...
vinte ... ... ...
cem[cento] ... ... ...
mil milh-ão bi(mi)lhão...
tri(mi)lhão
quatri(mi)lhão
quinti(mi)lhão...

supressão da raiz

Como se percebe, a partir de treze raízes (e suas respectivas alomorfias) –

um(a) ~ on
dois(uas) ~ do ~ du
três ~ tre ~ tr
quatro ~ quator ~ quar
cinco ~ quin ~ cinqu ~ quinh
seis ~ sess
sete ~ set
oito ~ oit
nove ~ nov
dez
vinte
cem ~ cento(as) ~ zento(as) ~ ento(as)
mil ~ milh

– certos afixos –

ze
enta ~ inta
(lh)ão(ões)
bi
tri
quatri
quinti...

– e alguns processos de composição –

dez e seis > dezesseis


dois centos > duzentos
três centos > trezentos etc.

– a língua portuguesa constrói um pequeno montante dos numerais cardinais. Com o auxílio da organização
sintática, a qual, no caso desses numerais, se regula pelo mecanismo exclusivo da coordenação aditiva, dentro
de um modelo fixo que segue uma escala decrescente de valor numérico – por exemplo, em 22, vem primeiro o
“vinte” (valor maior), a que se adiciona o “dois” (valor menor) –, a língua fornece todas as possiblidades de
quantificação porventura requeridas:

22 = vinte e dois
114 = cento e quatorze
1954 = mil (e) novecentos e cinquenta e quatro
14.200 = quatorze mil e duzentos etc. etc. fim
235

O PROCESSO DA DERIVAÇÃO MORFOLÓGICA

J. Bento

Dá-se o nome de derivação, em morfologia, ao fenômeno linguístico segundo o qual, a partir de


uma palavra, dita primitiva, apõem-se ou podem ser apostas outras palavras, ditas derivadas, através
da adição de afixos (prefixos e/ou sufixos), que têm essa finalidade. Além deste princípio derivacional
geral, acolhe-se como processo derivacional a mera alternância de classe gramatical do vocábulo, sob
o fenômeno que podemos chamar de derivação por alternância, em contraposição à derivação afixal.
No caso da derivação por alternância, a relação entre palavra primitiva vs. palavra derivada –
diríamos, direcional – é bastante controversa, de difícil abordagem, pelo menos do ponto de vista
sincrônico, de maneira que talvez seja preferível anular a dicotomia primitivo/derivado em favor da
tese de uma não-direcionalidade intrínseca à natureza do próprio sistema linguístico, o qual
disponibilizaria, respeitadas as devidas restrições, a possibilidade de comutação da classe gramatical,
sob o princípio básico (eventualmente extrapolável) mediante o qual a um verbo deve corresponder
um substantivo e um adjetivo equivalentes, e vice-versa.

DERIVAÇÃO

Por Por
afixação alternância
gramatical

Direcional: Não-direcional:
primitivo > derivado parte ↔ contraparte
ex.: “cantar > cantador” ex.: “cantarverb. ↔ cantosubs.”
“azulsubs. ↔ azuladj.”
↓ ↓
MORFEMA ADITIVO MORFEMA ALTERNATIVO

Estudos tradicionais dividem a derivação por alternância gramatical em derivação regressiva e


derivação imprópria. Essa terminologia é algo problemática. A derivação regressiva sugere que se pode
alcançar com facilidade a determinação do elemento primitivo relativamente ao elemento derivado:
o elemento primitivo seria aquele que perde a terminação; daí, o nome regressiva. Isto não parece ser
toda a verdade.
Já a derivação imprópria sugere, ainda que de longe, que se trata de um torneio linguístico
“desautorizado”, de algum modo, pelo sistema linguístico, resultante do desvirtuamento da
gramática por parte dos falantes. Seria outra hipótese deveras questionável.
Seja como for, a derivação regressiva pode ser vislumbrada fora de contexto
(“cantarverb./cantosubs.”), ao passo que a derivação imprópria só pode ser dimensionada dentro de
contexto, isto é, só se surpreende a alternância gramatical através da implementação do construto
frasal – “o céu é azuladj; o azulsubs. do céu.”.
Explicitemos alguns exemplos de derivação, incluindo-se, indistintamente, a derivação por
afixação e a derivação por alternância, colhidos despretensiosamente a partir das primeiras páginas
de um dicionário comum:
236

SUBSTANTIVO ADJETIVO VERBO

bacharel abacharelado abacharelar


bacharelada bacharelático bacharelar
bacharelado bacharelesco
bacharelato
bacharelando
bachalerice
bacharelismo

bacia abaciar

bactéria bacteriano

badalo abadalado

bafo abafado abafar


abafo abafadiço
abafação abafante
abafadela abafativo
abafador abafanético
abafadura
abafamento
abafarete

SUBSTANTIVO ADJETIVO VERBO

bairro abairrado abairrar


bairrismo bairrista
abairramento

baixa baixo baixar


baixeiro baixinho abaixar
baixada baixíssimo
baixadão baixeiro
baixote baixote
baixão abaixado
baixaria abaixador
baixete abaixante
baixeza
baixura
baixio
baixinho
baixos
abaixadela
abaixador
abaixados
abaixamento
237

SUBSTANTIVO ADJETIVO VERBO

ba(h)ia abaianado abaianar


baiano baiano
baiana
baianas
baianada
baianidade
baianismo
abaianada
baião
baianal

bainha abainhado abainhar

abalo abalado abalar


abalada abalador
abalador abalável
abalamento
abaladura

balaio abalaiado abaialar


balaieiro

balanço balanceado balançar


abalançamento balançante abalançar

fim
238

VOCÁBULO FORMAL
[aspectos gerais]

J. Bento

ESTRUTURA MÓRFICA
[português]

mt np/∆

pre/∆ raiz suf/∆ vt/∆

ge/∆ nu/∆

Fonologia Semântica
↓ ↓
construto fonêmico construto semêmico
/patAt´i/ {arquissemema}

variação fonética variação semântica


[alofonia] [alossemia]

[paʈat´e] {nbcgs}
[paʈat´i] {trsgj}
[pɐʈɐᵵ´ɛ] {dfmvi}
[pɐʈɐʈ´e] {rhbgu}

Enquanto o construto fonêmico constitui-se num ajuntamento horizontal de fonemas –

/p/ /a/ /t/ /A/ /t/ /´i/

– o construto semêmico vem a se constituir num ajuntamento vertical de semas:

n
b
c
g
s

Como diria Saussure, o significante linguístico, ao contrário do seu significado, caracteriza-se


pela linearidade (um elemento após o outro numa escala horizontal). É a diferença básica inicial entre
significante e significado, pois que este último se configura como uma totalidade não-discreta,
obedecendo, numa perspectiva descritiva, a uma escala vertical de elementos de sentido, ou semas.
239

Nestas condições, enquanto a organização fonológica prevê uma série de elementos em variação
fonética individualizada, cada qual dispondo de sua própria variação –

/p/ /a/ /t/ /A/ /t/ /´i/

[p] [a] [ʈ] [a] [t] [´e]

[p] [a] [ʈ] [a] [t] [´i]

[p] [ɐ] [ʈ] [ɐ] [ᵵ] [´ɛ]

[p] [ɐ] [ʈ] [ɐ] [ʈ] [´e]

– a organização semântica se compõem de um único elemento semêmico – chamemo-lo, por sugestão,


de arquissemema – em variação:

{arquissemema}

n
b
c
g
s

t
r
s
g
j

d
f
m
v
i

r
h
b
g
u

Isto não quer dizer que os fonemas, em paralelo com os sememas, não tenham sua constituição
verticalizada. Cada fonema em particular deverá ser um composto de femas, como no exemplo de /p/

/p/

oclusivo
bilabial
surdo
240

– ou /t/:

/t/

oclusivo
dental
surdo

– e assim por diante. A propósito, estes femas se alteram, proporcionando os alofones do respectivo
fonema.
Isto também não quer dizer que os sememas não se organizem horizontalmente, pois que, nas
unidades linguísticas acima do vocábulo (e até mesmo interiormente aos vocábulos compostos de uma
série de unidades mórficas, ou morfemas), o que se passa é uma combinação sintática de sememas,
em que um se segue ao outro à maneira parecida com a dos fonemas em relação aos vocábulos:

{casa} + {amarela}
↓ ↓
lugar determinada
de morar cor

Nota:

Os exemplos arregimentados no texto –

[paʈat´e] {nbcgs}
[paʈat´i] {trsgj}
[pɐʈɐᵵ´ɛ] {dfmvi}
[pɐʈɐʈ´e] {rhbgu}

– pertencem a uma língua hipotética.

fim
241

VOCÁBULO MÓRFICO EM PORTUGUÊS

J. Bento

1.Definição de vocábulo mórfico

Uma ideia abrangente daquilo que se deve entender por vocábulo precisa levar em conta o
seguinte esquema teórico:

VOCÁBULO

VOCÁBULO MÓRFICO VOCÁBULO FONOLÓGICO


[Fonologia]

VOCÁBULO GRAMATICAL VOCÁBULO LEXICAL


[Gramática] [Lexicologia]

VOCÁBULO SEMÂNTICO
[Semântica]

A partir deste esboço, um tanto rudimentar, é possível observar que o termo vocábulo pode ser
considerado uma realidade múltipla, caracterizando-se apenas sob o ponto de vista que se adota:
fonológico, gramatical, lexicológico ou semântico. De um lado, nos encontramos com o vocábulo
mórfico em contraposição ao vocábulo fonológico; e, no âmbito do vocábulo mórfico, uma
subclassificação entre vocábulo gramatical e vocábulo lexical; finalmente, pode-se admitir a noção de
vocábulo semântico, quando levamos em conta o fenômeno da homonímia – dois ou mais vocábulos
lexicais (com estrutura significante igual), mas com significados diferentes. (A homonímia atinge,
também, a rede de vocábulos gramaticais, mas o foco crucial é a lexicalidade.)
O vocábulo fonológico é uma estrutura coordenada pelo significante no aspecto da tonicidade
silábica, pelo menos na perspectiva da língua portuguesa; o vocábulo mórfico é, por seu lado, uma
estrutura coordenada pelo significado, em que os elementos componentes (chamados morfemas) se
fazem acompanhar de sentido.
Basicamente, o sentido na língua pode ser visto sob duas dimensões: o sentido interno à língua
e o sentido externo à língua. Este modo de ver é, a rigor, praticamente uma tomada de posição
metodológica, já que todo sentido veiculado pela língua, a meu ver, tende a representar uma
determinada realidade extralinguística absorvida pelo mecanismo linguístico em seu funcionamento.
Porém, no geral, não é de todo desprovido de razão argumentar que os conhecidos artigos, as
preposições, as conjunções, os pronomes são construtos que estão mais voltados à organização dos
conteúdos nocionais em construções mais amplas (como a frase) – sentido interno –, do que a
representar ou denominar realidades das quais se fala, ao contrário dos substantivos, adjetivos e
verbos, que se empregam decididamente na função de nomear o mundo observável ou perceptível –
sentido externo.
O sentido interno pode ser rotulado de gramatical (consubstanciado em vocábulo gramatical),
pois consiste de nocionalidades onipresentes na construção linguística, condição sine qua non para a
gramaticalidade, digamos assim. Por exemplo, o artigo, no português, é um fato de língua imperioso:
alocar um substantivo numa frase imediatamente aciona, no falante do português, a necessidade de
seleção de uma forma articular (“o, a, os, as”) para servir de suporte ao nome; interligar os nomes
“café” e “açúcar” no sintagma obriga-nos a interpor uma preposição (“com”, “sem”).
É claro que tudo isso é muito relativo, e a nossa intenção é apenas enfatizar tendências gerais
inscritas no sistema da língua, a partir de uma tomada de posição. Alguém facilmente poderia
questionar: Mas se eu escolher um artigo na minha frase que pretendo elaborar também,
imediatamente, me vem à mente a seleção de um substantivo, e não de um verbo ou adjetivo, por
exemplo.
242

Tem razão, sem dúvida, pois tudo é uma questão de ponto de vista (como diria Saussure). No
entanto, parece haver uma diferença adicional entre as duas “escolhas automáticas” – do artigo para
o substantivo, do substantivo para o artigo: uma vez selecionado o substantivo a lista de opções sobre
o artigo é francamente reduzida (trata-se de um sistema fechado e, além disso, fixo); por outro lado,
se se começa a construção pelo artigo (digamos a forma “os”), o leque de possibilidades é
potencialmente infinito (pois se trata de um sistema aberto). Em outras palavras, depois de “os”
qualquer forma substantiva, real ou imaginável, desde que esteja no masculino/plural caberia na
construção.
Este traço me parece decisivo na compreensão daquilo que compete ao sistema gramatical,
stricto sensu, e o que compete ao léxico: visto que o léxico é a parte da língua responsável pela
nominação da realidade, a cada alteração percebida desta realidade, o léxico se apropria dos novos
dados, registrando-os linguisticamente. O mesmo nunca vai acontecer com os elementos gramaticais,
quando o sistema é observado sincronicamente. É como se a gramática, neste aspecto, consistisse de
uma urdidura autossuficiente e que se mantém indiferente ou alheia ao que se passa em derredor.
Outro traço muito sugestivo, profundamente ligado ao traço anterior, é a possibilidade de os
itens lexicais se replicarem, ou melhor, originarem-se de outros itens lexicais, primitivos, através do
mecanismo da derivação. Como os itens gramaticais são fixos, a derivação praticamente inexiste
entre eles. Nesta perspectiva, o vocábulo “casa”, por exemplo, pode ser a raiz de uma série inumerável
de outros vocábulos, tanto no que concerne ao já registrado e utilizado, quanto no que diz respeito
ao plausível: “caseiro”, “casario”, “casarão”, “casarucho” etc. etc.; qualquer preposição do
português, por outro lado, não se presta a esse tipo de potencialidade gramatical.
Seja como for, mantenhamos a distinção entre sentido interno e sentido externo, para justificar
a divisão dos vocábulos mórficos em vocábulos gramaticais e lexicais. E consideremos o vocábulo
mórfico como um nível estrutural do português, da maneira que sugere o esquema abaixo –

DISPOSIÇÃO HIERÁRQUICA DOS ELEMENTOS MORFOSSINTÁTICOS

FRASE
SINTAGMA

VOCÁBULO

MORFEMA

– em que, grosseiramente, se pode ler: os morfemas se juntam para formar o vocábulo, que se juntam
para formar o sintagma, que se juntam para compor a frase. (Chamamos a atenção para o fato de o
esquema acima ser uma observação da língua a partir de sua feição gramatical, embora não
estejamos nos esquecendo de que, no nível vocabular, gramática e léxico (enquanto componentes do
sistema), se interpenetram; o léxico se inscreve na língua por intermédio do nível vocabular.)
Pois bem. Dado que subjacente ao nível vocabular constatamos a realidade de um nível mórfico
inferior – o nível morfemático –, cabe-nos deduzir que os vocábulos mórficos são feitos de morfemas
(assim como os vocábulos fonológicos são feitos de sílabas; e que estas, por sua vez, são feitas de
fonemas; e que estes são feitos de traços fônicos).
Se os vocábulos mórficos são feitos de morfemas, estes carregam substancialmente a mesma
diretriz semântica que aqueles, e com idêntico caráter. Assim, os morfemas podem ter significação
externa e interna, de acordo com o esquema abaixo:

LEXICAL → significação externa


MORFEMA (raiz / semantema)
(menor unidade significativa)
GRAMATICAL → significação interna
(instrumento gramatical)

Os morfemas de significação externa são, por essa razão, chamados de lexicais, radicais ou
semantemáticos. Fazem parte do acervo dicionarístico da língua, no sentido de conjunto de itens que
exercem diretamente a função nominativa da realidade. Os morfemas de significação interna são
chamados de gramaticais, ou instrumentos gramaticais, e compõem o estoque de elementos dispostos
pelo sistema linguístico com o fim de concatenação e ordenação dos signos léxico-gramaticais em
243

unidades maiores, até chegar ao nível da frase (unidade tradicionalmente reconhecida como o nível
máximo de construção gramatical).
Se morfemas e vocábulos mórficos partilham da mesma natureza sígnica de compreenderem
significante + significado e, além disso, poderem ser classificados em lexicais e gramaticais, o que os
distingue e motiva a hierarquia gramatical?
É que os vocábulos mórficos se inscrevem, prioritariamente (embora não só), no conceito de
forma livre (ou seja, são unidades discursivas, no sentido de que se prestam, isolada e/ou
eventualmente, a enunciar “ideias”), enquanto os morfemas se limitam a configurar essas unidades
vocabulares, conferindo-lhes o estatuto morfossintático e semântico correspondente, incluindo-se aí
a orientação sintática sob a construção frásica. O que os morfemas fazem, em essência, é:

a)Conduzir a significação radical do vocábulo mórfico, quer sejam estes lexicais ou gramaticais; ou
b)Formatar essas raízes (lexicais e gramaticais) para que exerçam sua condição de forma livre, ou
seja, vocábulos (vide os morfemas flexionais); ou
c)Possibilitar a criação de novos itens lexicais a partir de uma base lexical comum (vide os morfemas
derivacionais); ou
d)Possibilitar a alocação sintática dos vocábulos lexicais ou expressões afins na construção (vide os
conectivos, preposições e conjunções); ou
e)Preencher determinados espaços estruturais requeridos pela plano sintático da língua (vide
pronomes oblíquos).

Os morfemas são, portanto, formas agregadas (nos casos ‘a’, ‘b’ e ‘c’, acima) ou agregadoras
(os itens ‘d’ e ‘e’). Enquanto formas apenas agregadoras (e não substancialmente agregadas), os
morfemas tendem a partilhar ou ser tidos como de natureza vocabular, podendo, assim, ser
interpretados como vocábulos, particularmente de natureza gramatical. Na verdade, tais formas
agregadoras situam-se a meio-caminho entre o morfema e o vocábulo, revelando-se um campo neutro
de transição entre ambos os construtos:

Forma livre

VOCÁBULO

Forma agregadora

MORFEMA

Forma agregada

Isto quer dizer, por outra perspectiva, que referindo-nos à classificação dos vocábulos em
gramaticais e lexicais, enquanto os vocábulos lexicais só podem ser formas livres, os vocábulos
gramaticais podem ser formas livres ou agregadoras. Vejamos o esquema:

forma livre

Gramatical

forma agregadora
VOCÁBULO

Lexical (PALAVRA) → forma livre

Em línguas como o português, o padrão mórfico-vocabular se sustenta na impossibilidade


essencial de obtermos formas livres que não sejam o resultado da concatenação de formas agregadas,
244

ou seja, não há o que se vem a chamar de formas livres puras, compostas de uma única unidade
morfemática. Esta situação, não obstante, revela-se diferente no que concerne às formas agregadoras,
em que se faz presente a ocorrência de formas agregadoras puras, como se percebe a partir da notação
(+/-) na feição dos vocábulos gramaticais:

forma livre ou agregadora

Gramatical

morfema gramatical +/- morfema gramatical


VOCÁBULO

forma livre

Lexical (PALAVRA)

morfema lexical + morfema gramatical

No esquema ainda se deve ler que a característica dos vocábulos gramaticais é serem formados
apenas de morfemas gramaticais; já os vocábulos lexicais (ou palavras) devem conter, pelo menos no
contexto de línguas como o português, morfema lexical e morfema gramatical. Se classificarmos os
morfemas gramaticais em flexionais, derivacionais e concatenadores sintáticos (do tipo preposições
e conjunções), os flexionais servem indistintamente aos dois tipos de vocábulos; os derivacionais são
privativos dos vocábulos lexicais; os concatenadores sintáticos são privativos dos vocábulos
gramaticais (inclusive sendo itens vocabulares per si).

2.Classificação dos vocábulos mórficos em português

Podemos dizer, inicialmente, que os vocábulos mórficos podem ser de dois tipos: vocábulos
gramaticais e vocábulos lexicais. Esta tipologia se baseia na natureza léxico-gramatical do sistema
linguístico como um todo, sob a qual determinados itens vocabulares são melhor definidos como de
característica gramatical, por fazerem parte de uma ordem pré-determinada de elementos
marcadores de noções internas e privativas ao sistema (por exemplo, os pronomes pessoais, no
português, são um fato distintivo da língua, a despeito de poder haver línguas com organização
pronominal equivalente), enquanto os demais buscam nocionalizar, efetivamente, a realidade
percebida ou sentida, em termos de nominação dos fatos e fenômenos ocorrentes fora da linguagem
em si.
Sob este raciocínio, por conseguinte, devemos dizer que os vocábulos gramaticais pertencem a
listas fechadas e mais ou menos delimitadas de elementos – constituem um sistema fechado –,
enquanto os vocábulos lexicais se inserem numa lista aberta de elementos, em que a todo momento
se pode adicionar nova unidade, sem comprometer a harmonia do sistema – compõem um sistema
aberto.
Os vocábulos gramaticais podem ser formas livres ou formas apenas agregadoras, enquanto os
vocábulos lexicais são apenas formas livres, dentro do critério sintático de classificação.
De maneira geral, os vocábulos gramaticais podem ser subdivididos em flexionais e não-
flexionais; quando flexionais, recebem as noções restritas aos nomes (gênero e número). Já os
vocábulos lexicais são, via de regra, flexionais, podendo conter, conforme o caso, flexões de natureza
nominal e flexões de natureza verbal (modo-tempo e número-pessoa, tradicionalmente falando). Este
é o critério mórfico de classificação dos vocábulos.
Os vocábulos gramaticais compostos de raízes têm-nas improdutivas: a raiz gramatical não se
presta ao enriquecimento lexical, ou aumento do acervo vocabular da língua. Os vocábulos lexicais
sempre contêm raízes, e raízes produtivas, teoricamente falando: a partir de uma raiz lexical
qualquer pode-se enfileirar uma série de vocábulos daí originados, só havendo limitação por conta
das necessidades nominativas circunstancialmente presentes no ambiente sociocultural (se
assumirmos a criatividade linguística do falante em seu nível máximo de proficiência). A este critério
de classificação, chamaremos de lexicológico.
Eis, então, que podemos esquematizar a classificação dos vocábulos como segue:
245

VOCÁBULOnota

Gramatical Lexical

Sistema fechado Sistema aberto

Forma livre Forma agregadora Forma livre

Flexional Não-flexional Flexional

Nominal Nominal Verbal

Raiz improdutiva Raiz produtiva

Nota: As chamadas interjeições constituem um modelo à parte, ou intermediário, ou especial de vocábulos, pois que, a despeito
de serem classificadas dentro dos conceitos de sistema aberto e forma livre, como os lexicais, ao contrário destes, não recebem
flexão, nem encerram raiz produtiva. Além disso, pode haver outras considerações em torno deste tipo de vocábulo, mas que
devemos deixar de lado neste momento.

Aplicando-se concretamente esta diretriz a uma construção linguística qualquer, tal como –

*Os meninos gastaram todo o dinheiro em doces.

– obteremos:

1)OS → vocábulo gramatical agregador


2)MENINOS → vocábulo lexical nominal
3)GASTARAM → vocábulo lexical verbal
4)TODO → vocábulo gramatical livre flexional
5)O → vocábulo gramatical agregador
6)DINHEIRO → vocábulo lexical nominal
7)EM → vocábulo gramatical agregador
8)DOCES → vocábulo lexical nominal

É fácil perceber que, na realidade, a classificação dos vocábulos se resume a –

VOCÁBULO

Gramatical Lexical

Forma livre Forma agregadora

Flexional Não-flexional Nominal Verbal


246

– já que, uma vez atribuída uma determinada característica ao vocábulo, outra característica pode
ser plenamente redundante. Assim, dizer que “meninos” é vocábulo lexical está concomitantemente
dizendo que pertence ao sistema aberto, é forma livre, flexional e de raiz produtiva, e assim por
diante. Não obstante, a classificação anterior, mais “completa”, tem a utilidade de confirmar
hipóteses sobre a verdadeira classe em que se enquadra o construto; nem sempre a identificação é
clara e simples, devemos estar cientes disso.
Aparentemente, ou conforme muitos casos, tanto a atribuição de flexão (particularmente a
nominal), quanto a caracterização de uma classe para determinado vocábulo, está a depender de
fatores extra-morfológicos, quer sejam sintático-semânticos ou apenas sintáticos ou apenas
semânticos (coisa que ainda precisa ser melhor analisada).
Neste sentido, “dinheiro”, na frase destacada acima, a rigor, não parece comportar flexão (de
número), pelo menos no sentido nele inscrito: é o fator semântico-referencial influenciando, de algum
modo, a feição mórfica do construto, o qual, tomado isoladamente, sem um contexto semântico-
referencial, certamente será flexionável (em número): “dinheiro-dinheiros”.
Por outro lado, o item vocabular “só”, nas frases –

*Ele vive só.


*Só ele ganhou o prêmio.

– pode ser interpretado como vocábulo lexical (em “Ele vive só”) ou vocábulo gramatical (em “Só ele
ganhou o prêmio”), a mercê do contexto sintático (ou sintático-semântico) que o rege.

3.Dicionário, vocabulário & glossário

Podemos interpretar que os itens linguísticos dotados de significado pertencem a duas esferas
distintas de caracterização linguística:

a)Léxico – quando a sua ocorrência/significação reclama a inclusão em um determinado universo de


discurso;

b)Gramática – quando a sua ocorrência/significação se sobrepõe às ingerências dos inúmeros


universos de discurso passíveis de existência sociocultural.

Os itens linguísticos de natureza gramatical incluem os primeiros – lexicais –, quando estes são
vistos em sua significação abstrata, isto é, alheia a universos de discurso determinados, mais os
elementos privativamente gramaticais, nomeadamente os conectivos, pronomes, advérbios, assim
como também as chamadas formas presas (morfemas flexionais e derivacionais).
Do ponto de vista do léxico, podemos entender que os conjuntos organizados de itens, que
assumem a feição genérica de listagens lexicográficas, ou compêndios lexicográficos (mais
correntemente apresentados como dicionários), de fato se distribuem em três categorias distintas,
conforme a natureza da significação que está em pauta:

a)Dicionário, propriamente dito – representa o conjunto total de itens lexicais com suas respectivas
significações em nível de abstração profunda, ou correlacionadas ao sistema;

b)Vocabulário – representa um conjunto de itens lexicais específicos de um determinado universo de


discurso, com suas respectivas significações correlacionadas à norma referida;

c)Glossário – representa o conjunto de itens lexicais de uma norma, que foram utilizados em
determinado texto ou enredo discursivo, além das eventuais acepções especiais, desviantes, de que se
revestem os vocábulos atualizados naquela circunstância específica.

Os nossos conhecidos dicionários de uso costumam ser tipificados como o conjunto lexical da
língua, revestido das variadas significações que assumem em conformidade com as diversas normas
socioculturalmente existentes, ou universos de discurso, incluindo-se a própria dimensão significativa
abstrata, correspondente ao sistema como um todo.
247

COMPÊNDIO LEXICOGRÁFICO

DICIONÁRIO VOCABULÁRIO GLOSSÁRIO

stricto sensu usual

descrição descrição descrição descrição


do dos usos de uma norma de um conjunto
sistema em normas [universo de discurso] de itens utilizados
num determinado
texto, obra ou
Discurso
léxico + gramática
[abstrato]

fim
248

CLASSIFICAÇÃO DOS VOCÁBULOS


[breve resenha]

J. Bento

1.Classificação tradicional dos vocábulos

VISÃO TRADICIONAL

artigo substantivo adjetivo pronome numeral verbo advérbio preposição conjunção interjeição
249

2.Modelos de classificação dos vocábulos

átono
monossílabo
tônico

oxítono
dissílabo
paroxítono
fonológica
oxítono
trissílabo paroxítono
proparoxítono

oxítono
polissílabo paroxítono
proparoxítono
[esdrúxulo; ex.: “cantávamos-lhe”]

inflexionável
gramatical
flexionável → nominal
morfológica
nominal
lexical → flexionável
verbal

verbal
PERSPECTIVA determinado
nominal
sintática conectivo
verbal
determinante
nominal

substantivo
adjetivo
pronome
semântica numeral
verbo
advérbio
conectivo

gramatical

coloquial/vulgar
culto/nobre/clássico
estilístico/pragmática
frequente/familiar
raro/especializado

lexical regional
geral/comum

indecoroso/chulo
decoroso/corrente

ríspido/grosseiro
terno/delicado
250

3.Classificação tradicional dos vocábulos em visão melhorada

VISÃO TRADICIONAL

artigo substantivo adjetivo pronome numeral verbo advérbio preposição conjunção interjeição

ordinal
fracionário
multiplicativo

cardinal

substantivo adjetivo pronome numeral verbo advérbio conectivo interjeição


[essência] [acidência] [indicante] [quantificante] [existência] [modificante] [ligante] [emotivante]

* *
ordem ordem
do do
SER ACONTECER

VISÃO MELHORADA
251

4.Classificação [adaptada] dos vocábulos proposta em Monteiro

UNIDADE: VOCÁBULO

CLASSE FUNÇÃO

NOMINAL Substantivo
Adjetivo
Advérbio

VERBAL Núcleo do predicado

CONECTIVO Coordenativo
Subordinativo

REALÇADOR Enfatizador

MONTEIRO, José Lemos. “Classes e funções”. In: Morfologia portuguesa. Fortaleza, EDUFC,
1987 (p. 203-213). [obs.: o conteúdo foi retirado do texto original para uso exclusivo em sala-
de-aula, como apoio didático.]

5.Classificação [adaptada] dos vocábulos proposta em Perini

CLASSE TRAÇOS

Verbo [+NdP] [+PTN]


Pronome [-Adnpós] [-Adnpré] [-PredCV] [+SNtotal] [+NSN] [-Int__] [-íssimo]
Substantivo [-Adnpós] [-Adnpré] [-PredCV] [-SNtotal] [+NSN] [-Int__] [-íssimo]
Adjetivo1a [+Adnpós] [-Adnpré] [+PredCV] [-SNtotal] [+NSN] [+Int__] [-íssimo]
Adjetivo1b [+Adnpós] [-Adnpré] [+PredCV] [-SNtotal] [+NSN] [+Int__] [+íssimo]
Adjetivo1c [+Adnpós] [+Adnpré] [+PredCV] [-SNtotal] [+NSN] [+Int__] [+íssimo]
Adjetivo1d [+Adnpós] [+Adnpré] [+PredCV] [-SNtotal] [-NSN] [+Int__] [+íssimo]
Adjetivo2 [+Adnpós] [-Adnpré] [+PredCV] [-SNtotal] [-NSN] [-Int__] [-íssimo]
Advérbio [+Adv] [-NV] [-Int] [-Atit]
Intensificador [+Adv] [-NV] [+Int] [-Atit]
Atitudinal [+Adv] [-NV] [+Int] [+Atit]
Negação verbal [-Adv] [+NV] [-Int] [-Atit]
Relativo [+Rel]
Predeterminante [+PDet] → “todos”, “ambos”
Determinante [+Det]
Preposição [+pró-SAdj/SAdv]
Conjunção [+pró-SAdv/SNoracional]
Coordenador [+Conectorconstituintes iguais]

Notação:
[NdP]
→ propriedade de exercer a função de núcleo do predicado
[PTN]
→ propriedade de ser marcado com as flexões de pessoa, tempo e número
[NSN]
→ propriedade de exercer a função de núcleo de um SN
[Adnpós]
→ propriedade de exercer a função de adjunto adnominal pós-núcleo
[Adnpré]
→ propriedade de exercer a função adjunto adnominal pré-núcleo
252

[Int__ ]
→ propriedade de ser marcado com elemento de intensificação (= intensificador)
[SNtotal]
→ propriedade de formar todo o SN, rejeitando a adjunção de outros elementos
[PredCV]
→ propriedade de exercer a função de predicativo do objeto
[íssimo]
→ propriedade de ser marcado com o sufixo “-íssimo”/ “-rimo” / “-imo”
[Rel]
→ propriedade de transformar SA em SA oracional, exercendo concomitantemente função sintática
no respectivo SA oracional
[Det]
→ propriedade de exercer a função de determinante
[PDet]
→ propriedade de exercer a função de predeterminante, posição antes do artigo
[pró-SAdj/SAdv]
→ propriedade de transformar SN em SAdj ou /SAdv
[pró-SAdv/SNoracional]
→ propriedade de transformar SN em SAdv oracional ou SN oracional
[Conectorconstituintes iguais]
→ propriedade de ligar dois constituintes de mesma classe
[NV]
→ propriedade de fazer a negação verbal
[Adv]
→ propriedade de exercer a função de advérbio
[Int]
→ propriedade de exercer a função de intensificador
[Atit]
→ propriedade de exercer a função de atitudinal

PERINI, Mário A. “Classes de palavras em português”. In: Gramática descritiva do português.


São Paulo, Ática, 1996, p. 319-342. [obs.: o conteúdo foi retirado do texto original para uso
exclusivo em sala-de-aula, como apoio didático.]

6.Classificação morfológica dos vocábulos

a)Vocábulos gramaticais não-flexionáveis

VOC

RAIZ

GRA


253

b)Vocábulos gramaticais flexionáveis

VOC

DES

RAIZ
N

GRA VT GE NU

Ø a/e/i/o/u/Ø Δ Δ
↓ Ø Ø
a/Ø/sub/alt s/Ø

c)Vocábulos lexicais de incursão nominal

VOC

SUF
Ø

DES

RAIZ
N

PRE LEX BASE VT GE NU

Ø Ø a/e/i/o/u/Ø Δ Δ
↓ ↓ Ø Ø
a/Ø/sub/alt s/Ø
254

d)Vocábulos lexicais de incursão verbal

VOC

SUF
Ø

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/ã/e/i/o/Ø Ø ∆
↓ ↓ va/ve/a/e Ø/o/i/ou
Ø/ra s/ste/Ø
ra/re Ø/u/o/i+alt/alt
re/rá/rã mos
ria/ríe is/stes/s/des/i/de
e/a m/o
sse
r/re
Ø/e/a
r
ndo
do/to/o/e
255

7.Afixação e classificação dos vocábulos [“bolacha” por ilustração]

RAIZ LEXICAL
[bolach]

combinações potenciais função sintática

em - bolach - ar
im - - ecer verbo
a - - aremos
de(s) - - a
re - - ão
- agem
- ação
- amento
- ança
- aria
- eiro substantivo
- inha
- eco
- ice
- idade
- ez
- ral
- ador
- ado
- ante/ente/inte
- ável
- ense adjetivo
- ento
- érrimo
- íssimo
- oso
- udo
- amente advérbio

Notas:

1.Não há, no português, as chamadas classes de vocábulos, mas funções vocabulares a depender das
combinações afixais aplicadas às raízes. Fundamentalmente, seriam verbo, substantivo, adjetivo e
advérbio – ou, de outro modo:

a)função verbal → núcleo da oração


b)função substantival → núcleo do sintagma (nominal)
c)função adjetival → modificador do núcleo nominal
d)função adverbial → modificador do núcleo verbal (ou, por tabela, toda a oração)

O que há são tipos de raízes: raiz lexical (que recebe afixação, flexional/derivacional) e raiz
gramatical (que ou recebe afixação flexional nominal ou rejeita quaisquer afixações). Dizer, por
conseguinte, que tal vocábulo é um verbo, um adjetivo, um substantivo... é tecnicamente inadequado.
A rigor, está-se diante de uma raiz (lexical), a qual, adjungida de certo afixo, lhe confere a função –
obrigatória ou cambiante – de verbo, adjetivo, substantivo.
256

As raízes gramaticais invariáveis é que tendem a se prender às suas funções de saída: “hoje”,
por exemplo, excluída a situação da chamada derivação imprópria – “o hoje” substantiva “hoje” –, é
configurado para a função exclusiva de advérbio, e apenas nestes casos – em que se dá a relativa
equivalência entre classe e função, pode-se arguir pelo conceito de classe de vocábulo.

2.As combinações potenciais (no esquema acima) são privativas das raízes lexicais e certas raízes
gramaticais (estas, apenas no tocante às flexões nominais), pois que determinadas raízes, do tipo
gramatical (como as relativas aos conectivos, por exemplo), rejeitam variação mórfica, ou adjunção
afixal.

3.As combinações potenciais são posteriormente filtradas pelo uso, constituindo-se a(s) norma(s)
linguística(s).

4.As funções sintáticas do vocábulo construído podem ser obrigatórias (p. ex., [bolacharemos] só pode
ser verbo) ou cambiantes (p. ex., [bolachador] tende a ser substantivo ou adjetivo, conforme a
disposição no construto oracional).

5.O estranhamento advindo de construções vocabulares como [bolacharemos], [bolachador] etc. se


deve à fixação da(s) norma(s) linguística(s), às quais nos acostumamos, e/ou possibilidades
discursivas diretoras dos atos de fala – ou norma(s) discursiva(s). Será muito difícil, sem dúvida,
encontrarmos uma situação de discurso que sugira [bolacharemos] ou [bolachador] etc., mas também
não se poderia antecipar que nunca haveria circunstâncias comunicativas em que tais construções
não pudessem ou tivessem que ser efetivadas. Estamos, aqui, nos reportando à língua enquanto
sistema e, como todo sistema, há normalmente potencialidades não exploradas, embora exploráveis
conforme as necessidades e/ou conveniências.
De fato, até quanto se pode perceber, [bolach] consiste, segundo a norma linguística vigente, de
um substantivo com a seguinte disposição máxima:

RAIZ LEXICAL
[bolach]

combinações realizáveis função sintática

bolach - a
- ão/ona
- eiro substantivo
- inha

O item [bolacheiro] não é comum, ou pelo menos não tão comum, mas – creio – não causaria
grande perplexidade, particularmente se a comunidade de fala tivesse um indivíduo que produzisse,
ou tivesse como atividade, a produção de bolachas para vender na vizinhança.
Além disso, havemos de atentar para o fenômeno da homonímia, em que [bolach], na verdade,
pode compreender três itens distintos, ligados pela identidade de significante: [bolach 1] = {biscoito}
– o item anterior – mais [bolach2] = {bofete} e [bolach3] = {região facial}, que suportam:
257

RAIZ LEXICAL
[bolach2]

combinações realizáveis função sintática

bolach - ar
- ou verbo
- aremos
- etc.
- a
- ão substantivo
- inha
- ado adjetivo

RAIZ LEXICAL
[bolach3]

combinações realizáveis função sintática

bolach - a
- ão substantivo
- inha
- ado adjetivo
- udo

6.No cômputo geral, o que se passa relativamente ao que se tem chamado de classe de palavra, é o
preenchimento de funções sintáticas previstas no construto oracional, as quais podem ser
teoricamente delineadas como segue:
258

ORAÇÃO

verbo sintagma nominal {conectivos}

advérbio determinante substantivo adjetivo


[modificador] adjetivo

advérbio adjetivo
[modificador]

(pronome)

* * * * * *

E estas funções sintáticas costumam ser preenchidas por determinados itens lexicais/gramaticais de
maneira regular, atendendo prescrições afixo-funcionais. Assim, um vocábulo em [-dor] revela-se
com funcionalidade substantival e adjetival, rejeitando a função verbal ou conectiva. Substituindo-
se [-dor] por [-mos], em [cantador] –

canta-dor

canta-mos

– alteramos a função de substantivo/adjetivo para verbo.


Em outras palavras –

[cantar]

– por exemplo, não é rigorosamente um verbo por inerência, mas por ter adjungido o afixo [-ar] em
sua configuração mórfica.

fim
259

CLASSIFICAÇÃO DOS VOCÁBULOS EM VISÃO TRADICIONAL MELHORADA

J. Bento

VISÃO TRADICIONAL

artigo substantivo adjetivo pronome numeral verbo advérbio preposição conjunção interjeição

ordinal
fracionário
multiplicativo

cardinal

substantivo adjetivo pronome numeral verbo advérbio conectivo interjeição


[essência] [acidência] [indicante] [quantificante] [existência] [modificante] [ligante] [emotivante]

* *
ordem ordem
do do
SER ACONTECER

VISÃO MELHORADA
260

O fenômeno da transposição de uma classe para outra, chamado derivação imprópria, resulta
em homonímia. Assim é que “azul”, por exemplo, não consiste de um único vocábulo do ponto de
vista gramatical, pois pode se tratar de um adjetivo –

*O céu é azul.

– ou um substantivo:

*O azul do céu.

Os advérbios, em português, particularmente os de modo, costumam ser formados por


derivação sufixal em “-mente” na base de adjetivos:

*feliz → felizmente

Por conseguinte, a regra geral discrimina que grande parte dos adjetivos salta para a classe dos
advérbios pela simples sufixação em “-mente”. E muitas vezes, não há sequer necessidade deste
procedimento mórfico, até porque a norma linguística tende a rejeita-lo:

*Ela falou bonito.



[advérbio]

Mas não:

*Ela falou bonitamente. [?]

A classe dos vocábulos interjectivos tende a ser invadida por expressões linguísticas completas
– frases interjectivas ou equivalentes:

*Deus me livre!

Isto não deve invalidar, como alguns podem pretender, a classe das interjeições. Há vocábulos que,
apesar de características morfossintáticas esdrúxulas – por exemplo, não se deixam envolver pela
estruturação oracional regular –, são efetivamente vocábulos – com significante e significado – e,
portanto, hão de se encaixar numa categoria: “olá”, “vixe”, “arre!”, “xô!”, “caramba!”, “diabo!” etc.

fim
261

CLASSIFICAÇÃO DOS VOCÁBULOS

J. Bento

1.Modelos de classificação dos vocábulos

átono
monossílabo
tônico

oxítono
dissílabo
paroxítono
fonológica
oxítono
trissílabo paroxítono
proparoxítono

oxítono
polissílabo paroxítono
proparoxítono
[esdrúxulo; ex.: “cantávamos-lhe”]

inflexionável
gramatical
flexionável → nominal
morfológica
nominal
lexical → flexionável
verbal

verbal
PERSPECTIVA determinado
nominal
sintática conectivo
verbal
determinante
nominal

substantivo
adjetivo
pronome
semântica numeral
verbo
advérbio
conectivo

gramatical

coloquial/vulgar
culto/nobre/clássico
estilístico/pragmática
frequente/familiar
raro/especializado

lexical regional
geral/comum

indecoroso/chulo
decoroso/corrente

ríspido/grosseiro
terno/delicado
262

2.Modelo tradicional adaptado [sintático-semântico]

VOCÁBULO

gramatical lexical interjectivo/


enfatizador

conectivo determinante determinante determinado

adjetivo advérbio substantivo verbo

preposição artigo adjetivo advérbio substantivo verbo interjeição


conjunção pronome [pronome] expletivo
numeral
advérbio

3.Classificação morfológica dos vocábulos

a)Vocábulos gramaticais não-flexionáveis

VOC

RAIZ

GRA


263

b)Vocábulos gramaticais flexionáveis

VOC

DES

RAIZ
N

GRA VT GE NU

Ø a/e/i/o/u/Ø Δ Δ
↓ Ø Ø
a/Ø/sub/alt s/Ø

c)Vocábulos lexicais de incursão nominal

VOC

SUF
Ø

DES

RAIZ
N

PRE LEX BASE VT GE NU

Ø Ø a/e/i/o/u/Ø Δ Δ
↓ ↓ Ø Ø
a/Ø/sub/alt s/Ø
264

d)Vocábulos lexicais de incursão verbal

VOC

SUF
Ø

DES

RAIZ
V

PRE LEX BASE VT MT NP

Ø Ø a/ã/e/i/o/Ø Ø ∆
↓ ↓ va/ve/a/e Ø/o/i/ou
Ø/ra s/ste/Ø
ra/re Ø/u/o/i+alt/alt
re/rá/rã mos
ria/ríe is/stes/s/des/i/de
e/a m/o
sse
r/re
Ø/e/a
r
ndo
do/to/o/e

fim
265

CLASSIFICAÇÃO MORFOLÓGICA DOS VOCÁBULOS

J. Bento

Do ponto de vista estritamente linguístico, o vocábulo pode ser classificado segundo critérios do
tipo –

a)fonológico
b)morfológico
c)sintático
d)semântico

– os quais podem, eventualmente, se combinar, formando um critério misto, como os de base


morfossintática ou morfossintático-semântica.
Na perspectiva fonológica, as abordagens tradicionais costumam trazer duas modalidades
classificatórias:

a)Quanto ao número de sílabas

monossílabos
dissílabos
trissílabos
polissílabos

b)Quanto à acentuação

átonos

oxítonos
tônicos paroxítonos
proparoxítonos

Mas no que concerne à realidade gramatical, é a chamada classificação das palavras –


tipicamente falando – o que sobressai na visão tradicional. Esta classificação tende a misturar, quase
desordenadamente, critérios morfológicos, sintáticos e semânticos, prevalecendo em grande medida
estes últimos:

artigo
substantivo
adjetivo
numeral
pronome
verbo
advérbio
preposição
conjunção
interjeição

No cômputo geral, apesar de o tema da classificação dos vocábulos aparecer, normalmente, no


capítulo destinado à morfologia, não parece ser muito comum, na literatura sobre a linguagem verbal
em seu todo – e não apenas sob a ótica tradicional –, uma classificação vocabular que assuma por
critério exclusivo a morfologia da língua. Aqui, tentaremos expor – a título de sugestão – uma
possibilidade de classificação nestas bases, tendo em conta, particularmente, a estrutura da língua
portuguesa.
Primeiramente, observemos como se definiria o vocábulo em função da morfologia: trata-se,
efetivamente, de um conglomerado coeso de morfemas fixamente dispostos na cadeia sintagmática.
Nestas circunstâncias, o conceito relevante de coesão deve incluir o caráter de
necessidade/obrigatoriedade dos elementos mórficos em jogo (a despeito de tal obrigatoriedade ter
de responder, também, ao quesito impossibilidade de ocorrência, marcada aqui com o símbolo delta
– ∆). Assim, numa frase singela do tipo –
266

*o gato mia.

– surpreendemos, sob tal interpretação, três conglomerados mórficos, assim descritos –

1]
ARCABOUÇO

pre raiz suf vt ge nu

↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓

∆ ø ∆ o ø ø sintagma

↓ ↓ ↓ ↓

[...] [...] [...] paradigma

2]
ARCABOUÇO

pre raiz suf vt ge nu

↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓

ø gat ø o ø ø sintagma

↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓

[...] [...] [...] [...] [...] paradigma

3]
ARCABOUÇO

pre raiz suf vt mt np

↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓

ø mi ø a ø ø sintagma

↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓

[...] [...] [...] [...] [...] paradigma


267

– os quais consistirão em três unidades vocabulares, com enredos sintagmático-paradigmáticos algo


distintos entre si.
Os três vocábulos da oração –

*o gato mia

– poderiam, em tese e conforme o critério mórfico adotado, ser colocados, senão em uma única classe,
pelo menos em duas ou três classes:

a)duas classes – A e B – se, por exemplo, adotamos como critério a afixação (prefixo/sufixo), ou seja,
vocábulos que aceitam afixação (“gato” e “mia”) e vocábulos que rejeitam afixação (“o”);
b)três classes – A, B e C – se, por exemplo, adotamos critérios que levem em consideração mais
detalhes mórficos, que irão distinguir um vocábulo de outro. Assim, observamos que “o” e “gato” se
caracterizam por desinências chamadas nominais, enquanto “mia” se caracteriza por desinências
verbais; mas “o” e “gato” diferirão pela possibilidade de afixação no segundo item, inexistente no
primeiro, e por aí vai.

De qualquer maneira, do ponto de vista morfológico, um bom ponto de partida para a


classificação dos vocábulos é reconhecer, na estrutura da língua portuguesa, o seguinte enredo
mórfico geral, ou arcabouço – como denominamos –, ao qual se submetem, de formas distintas, todos
os vocábulos que compõem o acervo léxico-gramatical da língua –

mt np/∆

pre/∆ raiz suf/∆ vt/∆

ge/∆ nu/∆

– em que o símbolo delta prevê a impossibilidade de ocorrência, e a bifurcação flexional (mt/np, de


um lado, ge/nu, de outro) estabelece duas grandes classes de vocábulos, os nominais e os verbais, por
entre as quais devemos certamente incluir a possibilidade de ocorrência vocabular desprovida de
elementos desinenciais, o que determinaria a existência de uma terceira grande classe de vocábulos,
os adesinenciais, os quais, de todo modo, vão ser obrigatoriamente destituídos de afixação
(prefixo/sufixo), ou melhor, são, de fato, vocábulos meramente radicais, pois que só compreendem
raízes:

VOCÁBULO

Nominal Verbal Radical


[ge/nu] [mt/np] ∆

fim
268

APÊNDICE

ESTRUTURA DA ORAÇÃO [1]


[funções sintáticas de nível oracional]

Mário Perini

Vamos começar pela função de núcleo do predicado (abreviadamente, NdP). O NdP é o ponto
inicial que serve de fundamento à cadeia de definições que vou propor para as diferentes funções.
Vou então partir do seguinte postulado: o verbo desempenha na oração unicamente a função de
núcleo do predicado; essa é a única função que um verbo pode desempenhar, e somente um verbo
pode ser núcleo do predicado. Em outras palavras, o verbo é sempre o NdP da oração; e o NdP da
oração é sempre um verbo.
Vamos admitir, ainda, que o núcleo do predicado faz parte de um constituinte chamado
predicado (Pred). Desse modo, na oração –

(1)Batista detesta o dentista.

– o predicado é “detesta”, e o núcleo do predicado é igualmente “detesta”, porque o predicado só tem


um elemento. Essa dualidade de funções para um só elemento pode parecer gratuita no momento,
mas veremos que, em certos casos, o predicado é composto de mais de um elemento, sendo apenas
um deles o NdP. Ficará clara, então, a necessidade de distinguir Pred de NdP.
Como se devem tratar as sequências de verbos finitos + verbos em forma não-finita (gerúndio,
infinitivo, particípio)? Ou seja, na frase –

(2)Sarita está dormindo.

– há um ou dois núcleos do predicado? Temos aqui um problema a discutir; e, a bem dizer, esse
problema não está cabalmente resolvido, no que pesem os diversos trabalhos que trataram dele nos
últimos anos. Aqui vou apresentar uma espécie de compromisso, que espero seja adequado para a
maioria dos casos, e que se harmoniza, no essencial, com a maioria das análises existentes.
O predicado faz certas exigências quanto aos complementos que o podem acompanhar na
oração. Assim, há verbos, como “fazer”, que exigem a presença de um objeto direto; outros, como
“falecer”, recusam a presença de objeto direto; e ainda há outros, como “comer”, que admitem o
objeto direto opcionalmente, já que se pode dizer –

(3)Sarita já comeu a empada.

– e também –

(4)Sarita já comeu.

Cada verbo tem, portanto, um conjunto de traços que especificam os complementos que ele
exige, recusa ou aceita livremente; esse conjunto de traços exprime a transitividade do verbo. Cada
predicado (e, portanto, cada oração) possui um conjunto próprio de traços de transitividade,
derivado da transitividade de seu verbo. Vendo o fato de outro ângulo, podemos dizer que em uma
sentença há tantos conjuntos de traços de transitividade quantos predicados (ou orações) ela contém.
Mas em uma frase como –

(2)Sarita está dormindo.

– só se pode apurar um conjunto de traços de transitividade, aquele que se refere ao elementos


“dormindo”. Isto é, a transitividade da sequência “está dormindo” é idêntica, em todos os pontos, à
do verbo “dormir” sem verbo auxiliar. Isso acontece sempre que ocorre uma sequência de “estar”
mais um verbo no gerúndio. A presença ou ausência de “estar” nessas estruturas não faz diferença
para efeitos de aceitação ou recusa de complementos.
Ora, se quisermos manter o princípio de que cada predicado tem um conjunto próprio de traços
de transitividade, deveremos admitir que há um só predicado – e, por conseguinte, um só NdP – na
frase (5). Nesses casos, analisamos sequências do tipo de “está dormindo” como predicados
complexos, ou seja, compostos de NdP mais outro elementos ainda não definido.
269

Não se pode generalizar essa análise para qualquer sequência de verbo finito + gerúndio. Em
certos casos, a situação é diferente, obrigando-nos a aceitar a presença de dois NdPs e dois predicados
separados. É o caso, por exemplo, de:

(5)Toninho apanhou lutando.

À primeira vista, não haveria diferença entre (5) e (2): ambas apresentam um verbo em forma
finita, seguido de um gerúndio. No entanto, no caso de (5), o verbo finito, “apanhou”, tem
transitividade própria e pode receber complementos independentemente do outro verbo, “lutando”.
Por exemplo, “lutar” não aceita complementação por um termo regido da preposição “de”, ao passo
que “apanhar” aceita:

(6)*Toninho lutava de Sarita.


(7)Toninho apanhava de Sarita.

Ora, a frase (5) aceita o acréscimo de um termo com “de”:

(8)Toninho apanhou de Sarita lutando.

Como a possibilidade de ocorrência desse termo não pode ser atribuída ao verbo “lutar” (já que (6)
é inaceitável), temos de admitir que o verbo apanhar em (8) faz valer seus traços de transitividade. A
diferença entre (2) e (5), portanto, é a seguinte: em (2), a transitividade de “está dormindo” é idêntica
à de “dormia”, por exemplo; ou seja, “está” não influi em nada. Já em (5) cada verbo tem
transitividade independente.
A conclusão é que, em (2), temos somente um predicado e, em (5), temos dois; e uma
consequência é que em (2) há uma oração, e em (5) duas.
Na frase –

(2)Sarita está dormindo.

– o núcleo do predicado é “dormindo’; ao elemento “está” atribuiremos a função de auxiliar.


Essa análise introduz uma complicação na conceituação de NdP. Eu disse que o NdP é o verbo.
Mas em (2) encontramos um verbo, “está”, que não é NdP. No entanto, há razões importantes para
considerar “dormindo”, e não “está”, como NdP. Por outro lado, o número de verbos que podem
funcionar como auxiliar é pequeno, de modo que a complicação não é proibitiva. Vou, pois, completar
a conceituação de NdP especificando que essa função é sempre desempenhada pelo verbo da oração,
exceto nos casos em que há dois verbos em uma única oração. Nesses casos, o verbo em forma finita
(conjugada) é o auxiliar, e o verbo em forma não-finita (particípio, gerúndio ou infinitivo) é o NdP.
O NdP de (2) é um gerúndio; mas é possível mostrar, com argumentação análoga, que há
também NdPs com auxiliar formados por infinitivos ou por particípios, como em:

(9)Sarita vai dormir.


(10)Sarita tem dormido.

Nesses casos, tal como em (2), o elemento conjugado (“vai”, “tem”) é irrelevante para efeitos de
escolha de complementos e, portanto, não forma, por si só, um predicado. Os verbos que funcionam
dessa maneira são denominados verbos auxiliares, ou simplesmente auxiliares. Em português, são
poucos:

ir (+ infinitivo)
ter, haver (+ particípio)
estar, vir, andar (+ gerúndio)

A esses é preciso acrescentar o verbo “ser” (mais raramente, “estar”) que ocorre na construção
passiva:

ser, estar (+ particípio)

Isso porque o verbo “ser” nas passivas também não apresenta transitividade própria, e além do mais
a sequência ser + particípio parece funcionar como um constituinte.
E, finalmente, há ainda um grupo de auxiliares (tradicionalmente chamados modais e
aspectuais) que se constroem todos com infinitivo, e alguns com “de”, “que” ou “a”:
270

poder
dever
acabar de
deixar de
começar a
continuar a
ter de/que
haver de/que

É necessário considera-los também auxiliares porque, quando seguidos de infinitivo, não


apresentam traços próprios de transitividade.
É bom lembrar que todos esses verbos podem igualmente aparecer em construções nas quais
não são auxiliares; portanto, a identificação de auxiliar (e de um predicado complexo) exige sempre
algum cuidado.
Como se vê, cada tipo de complemento coocorre obrigatoriamente com um de seus auxiliares
específicos. Isto é, sempre que o auxiliar é o verbo “ir”, o NdP deve estar no infinitivo:

(11)Manuel vai cortar o bigode.

O auxiliar sendo “ter”, o NdP estará no particípio:

(12)Manuel tem falado mal de você.

E se o auxiliar for “estar”, “andar”, o NdP deverá estar no gerúndio:

(13)Manuel está penteando o bigode.

O predicado complexo é, pois, sempre composto de auxiliar (Aux) – um ou mais de um, como
em –

(14)Manuel vai estar contando piadas.

– mais NdP.
Agora temos um ponto de partida para investigar a organização da estrutura oracional.
Verificaremos que cada um dos constituintes em que se divide a oração tem um comportamento
gramatical próprio, ou seja, cada um desempenha uma função própria. Há também alguns casos de
dois ou mais constituintes de comportamento semelhante; nesses casos, alguma função poderá ser
repetida. Isso não acontece com qualquer função, porém; só algumas funções podem ocorrer mais de
uma vez em uma estrutura, e isso deverá ser apurado e explicitado ao se definir cada uma das funções.
Nossa primeira observação será a seguinte: existe, na maioria das orações, um constituinte
que se harmoniza com o NdP em número e pessoa. Vejamos primeiramente o que vem a ser esse
fenômeno de harmonização em número e pessoa.
Seja um exemplo como o seguinte:

(15)Meus sobrinhos comeram a melancia.

É fácil verificar que a forma do verbo (do NdP), “comeram”, depende, de certa forma, de traços
do constituinte “meus sobrinhos”. Assim, se no lugar de “meus sobrinhos” colocarmos o singular,
“meu sobrinho”, o verbo terá de se adaptar:

(16)Meu sobrinho comeu a melancia.

Por outro lado, uma mudança semelhante no constituinte “a melancia” não afeta a forma do verbo:

(17)a. Meus sobrinhos comeram a melancia.


b. Meus sobrinhos comeram as melancias.
c. Meu sobrinho comeu a melancia.
d. Meu sobrinho comeu as melancias.

Ou seja, existe uma espécie de harmonia formal entre o verbo e o constituinte “meu(s)
sobrinho(s)”, mas não há nada parecido entre o verbo e “a(s) melancia(s)”. dizemos que “meu(s)
sobrinho(s)” e o verbo estão em relação de concordância (ou, simplesmente, que concordam).
A concordância não funciona apenas para o número (singular, plural), mas também vale para
a pessoa. O sintagma “meus sobrinhos” é de terceira pessoa (assim como a imensa maioria dos
271

sintagmas da língua). Isso significa, na verdade, que, quando o verbo concorda com ele, deve assumir
uma dentre várias formas igualmente denominadas de terceira pessoa:

(18)Meus sobrinhos dormem no segundo andar.


(19)Meus sobrinhos serão grandes tenistas.

Se substituirmos “meus sobrinhos” por uma das poucas formas rotuladas como de primeira
pessoa, o verbo deverá assumir formas diferentes; existe, pois, um outro conjunto de formas verbais,
denominadas de primeira pessoa. Por exemplo:

(20)Nós comemos a melancia.


(21)Nós dormimos no segundo andar.
(22)Nós seremos grandes tenistas.

As formas “comemos’, “dormimos”, “seremos” são formas de primeira pessoa.


Voltando às funções sintáticas, então, verificamos que na oração –

(15)Meus sobrinhos comeram a melancia.

– os sintagmas “meus sobrinhos” e “a melancia” têm comportamento gramatical diferente: “meus


sobrinhos” está em relação de concordância com o NdP, e “a melancia” não está – portanto, cada um
desses sintagmas tem uma função diferente. A função desempenhada nessa frase por “meus
sobrinhos” é denominada sujeito (abreviadamente, Suj): dizemos que “meus sobrinhos” é o sujeito
da oração (15).
Vou, então, definir essa função da seguinte maneira:

Sujeito é o termo da oração que está em relação de concordância com o NdP.

Essa será nossa definição de sujeito. É uma definição formal e não diz nada a respeito do papel
semântico ou discursivo do termo em questão; em outras palavras, não estamos aqui preocupados
com o termo que exprime o agente de uma ação, nem com o termo que exprime a entidade sobre a
qual se faz uma declaração. Trata-se simplesmente de um dos constituintes da oração, vinculado a
ela através de uma relação formal bem definida. A função de sujeito é um dos aspectos da organização
formal da oração, e não um dos aspectos da mensagem veiculada pela oração.
A propriedade “estar em relação de concordância com o NdP”, que define o sujeito, é também
chamada um traço que o constituinte tem na oração. Esse traço é abreviado assim: [+CV] (CV
significa concordância verbal); dizemos, então, que o sintagma “meus sobrinhos” em (15) é marcado
com o traço [+CV]; os outros sintagmas, que não estão em relação de concordância com o NdP, são
todos marcados [-CV].
Observe-se que a definição adotada de sujeito nos obriga a analisar como sem sujeito frases do
tipo:

(23)Vendi meu jegue.

A solução tradicional é considerar que há aí um sujeito oculto; no entanto, essa análise é


inconsistente com a definição de sujeito como termo que está em relação de concordância com o
verbo. (23) é uma oração sem sujeito, já que não existe aí nenhum termo explícito que esteja em
relação de concordância com o verbo.
A aplicação da definição de sujeito, a bem dizer, deixa certos casos duvidosos. Talvez o mais
sério seja o do gerúndio, que não comporta desinência de pessoa-número, mas ainda assim é
analisado como tendo sujeito em frases como:

(24)Marivânia chegando, a farra vai começar.

A rigor, seria necessário negar que haja sujeito na primeira oração em (24), já que aí o verbo não
concorda com nenhum dos termos. No entanto, sob outros pontos de vista, “Marivânia” funciona
como se fosse um sujeito, o que cria um problema quanto a sua análise.
Acontece que o sujeito, definido por sua relação de concordância com o verbo, apresenta
também alguns traços que, se não estão presentes em todos os casos, estão presentes na maioria deles;
por conseguinte, esses traços contribuem para delinear o protótipo da função que chamamos sujeito.
O mais óbvio desses traços é a posição logo antes do NdP: sabemos que essa é a posição mais natural
272

do sujeito na maioria das frases. Em (24), o termo “Marivânia” está nessa posição, justificando pelo
menos a suspeita de que se trate de um sujeito.
Mas o mais significativo é que as condições que governam a possibilidade de ocorrência do
sujeito antes ou depois do NdP se aplicam igualmente aos casos evidentes de sujeito e casos como o
de “Marivânia” em (24). Assim, há casos em que não se permite a posposição do sujeito; podemos
dizer –

(25)Chegou um amigo meu de Cuiabá.

– mas não:

(26)*Está desenhando um sobrinho seu na biblioteca.

Ora, os fatos são exatamente paralelos com o SN que acompanha um gerúndio:

(27)Chegando um amigo meu, por favor receba-o bem.


(28)*Desenhando um sobrinho meu na biblioteca, tive que ficar no quarto.

Isso certamente sugere que o gerúndio tem sujeito. Ou seja, se o gerúndio tiver sujeito, ficará mais
simples a descrição das condições que governam a possibilidade de posposição de elementos, como
“um amigo meu” e “um sobrinho meu” nas frases (27) e (28). Já se analisássemos esses termos como
desempenhando outra função qualquer, teríamos de considerar esse um estranho caso de
coincidência entre o comportamento do sujeito e o dessa outra função.
Outra razão é que o sujeito, como sabemos, pode ser retomado por pronome em caso reto:
“eu”, e não “me” ou “mim”. Desse ponto de vista, também o SN que acompanha o gerúndio parece
ser um sujeito:

(29)Eu chegando, a farra vai começar.

Por essas razões, sugiro que “Marivânia” em (24), assim como “eu” em (29), seja analisado
como sujeito. Isso naturalmente complicará a conceituação de sujeito, já que não se poderá dizer
simplesmente que se trata do termo que está em relação de concordância com o verbo; mas traz
vantagens, porque nos permite analisar as condições de posposição de sujeito e de ocorrência dos
pronomes retos de maneira mais simples e unificada.
Voltemos ao exemplo:

(15)Meus sobrinhos comeram a melancia.

Vamos agora ver que função deve ser atribuída ao sintagma “a melancia”. Já sabemos que não
é sujeito, porque é marcado (nessa frase) como [-CV] – ou seja, não está em relação de concordância
com o verbo.
A gramática tradicional distingue várias funções dentre as que marcaremos como [-CV].
Assim, temos casos como:

(15)Meus sobrinhos comeram a melancia.


(30)Todos acharam esse livro uma droga.
(31)Jeremias reclama frequentemente.

Tradicionalmente, analisa-se o elemento grifado de (15) como objeto direto; o de (30) como
predicativo do objeto; e o de (31) como adjunto adverbial. Existem intuições provavelmente corretas
por trás dessa análise; vou tentar encontrar justificativas formais para ela.
Vamos começar com o caso de “a melancia” em (15), que seria um objeto direto. Procuraremos
propriedades sintáticas (traços) desse constituinte, as quais poderão servir de base para definir uma
nova função.
Podemos começar observando o seguinte: existe uma oração correspondente a (15), na qual o
constituinte “a melancia” se encontra deslocado para o início da oração:

(32)A melancia, meus sobrinhos comeram.

Esse é um traço do constituinte “a melancia” em (15); podemos dizer que esse elemento é
marcado [+Ant] (Ant quer dizer anteposição). Há elementos da oração que não podem aparecer
antepostos em frases correspondentes e que, portanto, são marcados [-Ant]:
273

(33)*Comeram, meus sobrinhos a melancia.


(34)*Uma droga, todos acharam esse livro.

Vamos admitir que esse traço é característico do objeto direto (abreviadamente, OD), que se
definirá, por enquanto, através do conjunto de traços [-CV, +Ant]. o objeto direto se distingue do
sujeito porque este é [+CV]; e se distingue da função representada por “uma droga” em (34) porque
esta é [-Ant].
Por ora, conseguimos distinguir o objeto direto tradicional do predicativo do objeto, através do
traço [Ant]. Mas ainda não fizemos a distinção entre o objeto direto e o adjunto adverbial que estaria
presente em:

(31)Jeremias reclama frequentemente.

Como decidimos dar um crédito à análise tradicional, vamos procurar um meio de distinguir
a função de “frequentemente” em (31) da função de “a melancia” em (15).
O traço que realiza essa distinção se baseia na seguinte observação: certos constituintes da
oração podem ser retomados em perguntas por meio do elemento “que” (ou “o que”, ou ainda
“quem”). Ou seja, pode-se definir uma relação discursiva tal que uma frase possa ser resposta
adequada a uma pergunta que é introduzida por um desses elementos interrogativos. As duas
(pergunta e resposta) se relacionam formalmente porque na pergunta o elemento “que” substitui o
constituinte em exame (com ou sem inversão de ordem). Assim, temos o par:

(35)a. O que meus sobrinhos comeram?


b. Meus sobrinhos comeram a melancia.

Creio que qualquer pessoa perceberá que (35b) é uma resposta adequada à pergunta (35a). Agora
veja-se o seguinte par:

(36)a. O que Jeremias reclama?


b. Jeremias reclama frequentemente.

Acontece que (36b) não é uma resposta adequada para (36a). Dizemos, nesses casos, que
“frequentemente” não pode ser retomado pelo elemento “o que”; o contrário acontece com “a
melancia” em (15), que pode ser retomado pelo elemento “o que”.
Esse traço é que distingue a função de “a melancia” em (15), que é marcada [+Q], da função de
“frequentemente” em (31), que é marcada [-Q].
Antes de passar adiante, vou abordar rapidamente alguns pontos de interesse. Em primeiro
lugar, é necessário decidir a função que deve ser atribuída ao constituinte anteposto “a melancia”
em:

(32)A melancia, meus sobrinhos comeram.

Sabemos que na oração correspondente (15), em que “a melancia” aparece no final, a função é de
objeto direto; pergunta-se agora se deve continuar sendo objeto direto em (32), ou se a diferença de
posição deve valer para que se defina uma nova função.
A resposta será que “a melancia” é objeto direto tanto em (15) quanto em (32); ou seja, a
anteposição não afeta a função do objeto direto. Essa conclusão vale, obviamente, para todas as
demais funções que podem aparecer deslocadas de seus lugares em frase correspondentes.
Utilizando os traços vistos até agora, o sintagma “um artista” em –

(37)Vincent é um artista.

– deveria ser analisado como objeto direto, pois, como é fácil verificar, é marcado com os traços [-
CV, + Ant, +Q]. Essa análise contraria a da gramática tradicional, que analisa tais casos como de
predicativo do sujeito. Na verdade, não é muito fácil distinguir essas duas funções, mas me parece que
o mais indicado é manter a distinção entre o objeto direto e a função desempenhada por “um artista”
em (37), definindo-a através de um novo traço.
O novo traço se baseia na relação de concordância nominal que se observa com frequência
entre o sujeito e o complemento de verbos como “ser”, que vou denominar complemento do predicado
(CP). Observa-se que, quando o CP é representado por um item passível de concordância nominal,
ele concorda com o sujeito:
274

(38)Carolina está entusiasmada.


(39)Os jogadores estão entusiasmados.

Por isso, diremos que os termos “entusiasmada”, “entusiasmado” são marcados [+CN]. Isso
estabelece a distinção entre CP e o objeto direto, que não mostra concordância nem mesmo nos raros
casos em que é representado por item apropriado:

(40)Carolina sonhou colorido.

Dessa maneira, temos aqui um novo traço distintivo, [CN], e uma nova função, o complemento
do predicado, cuja definição até o momento é [-CV, +Ant, +Q, +CN]. O objeto direto se define como
[-CV, +Ant, +Q, -CN]. Estou definindo o traço [CN] em função da possibilidade de concordância
nominal com algum outro termo da oração, não necessariamente o sujeito; isso porque, como
veremos, deve-se atribuir o traço [+CN] a certos termos que concordam com o objeto direto.
A identificação do CP apresenta determinado número de problemas práticos. O primeiro deles
diz respeito a limitações morfológicas de muitos itens léxicos. Assim, em –

(37)Vincent é um artista.

– não se pode dizer que haja concordância nominal explícita entre o sujeito e o CP; no caso, ambos
são masculinos e singulares, mas isso não é necessário:

(41)Vincent é a próxima testemunha.

Nesses casos, fica difícil demonstrar diretamente que “a próxima testemunha” é CP. É
importante notar que não há tampouco discordância, porque “a próxima testemunha” é um SN e
tem, por isso, gênero e número próprios, não atribuídos por concordância. O gênero e o número são
determinados, para os SNs, por razões semânticas, quando cabe; ou por marca idiossincrática, como
em (41): “testemunha” é idossincraticamente marcado como feminino.
A saída é lançar mão da transitividade normal do verbo como pista. Esse procedimento é
relativamente fácil porque há poucos verbos que aceitam CP ou OD, indiferentemente. Um desses
verbos é possivelmente “virar”, como em:

(42)Ela virou a picanha em cima da grelha. (OD)


(43)Ela virou um monstro depois da plástica. (CP)

Mas não há realmente certeza de que se trate de um só verbo; talvez seja um caso de homonímia. Por
ora, portanto, deixaremos de lado esses casos problemáticos.
Os verbos que admitem CP são relativamente poucos; podemos citar:

ser
estar
parecer
continuar
ficar
virar
permanecer
chamar-se
tornar-se
sentir-se

Dessa maneira, é preciso reconhecer que a identificação do CP apresenta dificuldades; por


outro lado, é importante distinguir o CP do OD porque, nos casos claros, existe uma diferença de
comportamento desses dois termos, e essa diferença se liga ao importante fenômeno da concordância
nominal.
Em uma frase como –

(37)Vincent é um artista.

– não se pode observar diretamente a concordância nominal entre o sujeito e o CP. Ainda assim,
diremos que “um artista” é [+CN]; a concordância não se manifesta aí por causa das limitações
morfológicas da palavra “artista”, que não admite variação derivada (isto é, “artista” tem gênero e
número, mas estes são propriedades inerentes à palavra, e não resultado de concordância). Uma
solução semelhante foi proposta anteriormente, para podermos aceitar que os gerúndios têm sujeito,
275

embora, por razões morfológicas, não manifestam a concordância verbal. Reconhecendo embora a
inconveniência ocasional dessa solução, vou adota-la como a mais indicada no caso.
Um segundo problema ligado à identificação do CP provém de frases como:

(44)Cerveja é bom para lavar o cabelo.

Essas construções são de funcionamento misterioso, pois o complemento é passível de


concordância e, no entanto, esta é bloqueada:

(45)??Cerveja é boa para lavar o cabelo.

Isso parece acontecer somente quando o sujeito é representado por um núcleo sem nenhum termo
acompanhante:

(46)Essa cerveja é boa para lavar o cabelo.


(47)*Essa cerveja é bom para lavar o cabelo.

Não parece tratar-se de alguma restrição semântica, porque não se pode atribuir importe
semântico ao gênero: que significado se poderia atribuir à diferença de gênero entre “violão” e
“guitarra”? Esse problema deverá ficar de lado, à espera de estudos que o esclareçam.
Há ainda duas outras funções que se podem considerar definidas, com nossos quatro traços.
Vimos que o sujeito se define como [+CV]; que o objeto direto se define como [-CV, +Ant, +Q, -CN];
e que o complemento do predicado se define como [-CV, +Ant, +Q, +CN]. Agora: nas orações (30) e
(31) temos duas outras funções que já podem ser formalmente definidas. Vejamos o exemplo:

(30)Todos acharam esse livro uma droga.

O constituinte “uma droga” é marcado [-CV], pois não está em relação de concordância com o NdP;
é marcado [-Ant], porque não pode aparecer anteposto em uma frase correspondente:

(81)*Uma droga, todos acharam esse livro.

É marcado [+Q] porque pode ser retomado por “o que”:

(48)a.Todos acharam esse livro o quê?


b.Todos acharam esse livro uma droga.

(48b) é uma resposta adequada a (48a).

E é marcado [+CN] porque, quando representado por um item possível de concordância


nominal, esta se manifesta (com o objeto direto):

(49)Todos acharam esse livro péssimo.


(50)Todos acharam essa peça péssima.

Temos, portanto, uma nova função, definida pelos traços [-CV, -Ant, +Q, +CN]. Vou chama-la
predicativo (Pv).
Passemos agora ao exemplo:

(31)Jeremias reclama frequentemente.

O constituinte “frequentemente” é marcado [-CV], por razões óbvias; é [+Ant], porque (51) é
aceitável:

(51)Frequentemente, Jeremias reclama.

E é marcado [-Q] porque, como já vimos, (36b) não é uma resposta adequada a (36a):

(36)a. O que Jeremias reclama?


b. Jeremias reclama frequentemente.

A função desempenhada por “frequentemente” em (31) se chama atributo (Atr) e se define pelos
traços [-CV, +Ant, -Q].
276

E quanto ao traço [CN]? Já vimos que esse traço só pode ser observado em certos casos. Se
substituirmos “frequentemente” por “indignado”, verificaremos que se trata ainda de um atributo,
pois deve ser marcado [-CV, +Ant, -Q]. E, além disso, é evidentemente [+CN]; vamos, pois,
acrescentar mais esse traço à definição de atributo: [-CV, +Ant, -Q, +CN].
As cinco funções estudadas até o momento (sujeito, objeto direto, complemento do predicado,
predicativo e atributo) são desempenhadas cada uma por um número muito grande de sintagmas;
não haveria meios de elaborar, por exemplo, a lista de todos os possíveis sujeitos do português.
Sabemos que a lista não acabaria nunca, pois incluiria não apenas palavras individuais, mas um
número ilimitado de sintagmas maiores.
Isso é o que acontece com muitas funções sintáticas. Por outro lado, existem outras funções que
só podem ser desempenhadas por um número limitado de elementos, de modo que é possível dar a
lista de todos eles. É o que acontece com a função que veremos agora, denominada negação verbal
(NV). Essa função é exemplificada pela palavra “não” na frase:

(52)O ministro não aprecia jiló.

Essa função, como é fácil verificar, é marcada negativamente para os traços já vistos: [-CV, -
Ant, -Q]. Com isso, a negação verbal fica diferenciada das demais funções estudadas. No entanto,
essa função tem uma característica mais importante, que merece ser expressa em um traço especial:
a negação verbal só pode ocorrer logo antes do NdP, sem possibilidade de inserção de nenhum
elemento entre os dois. Vou abreviar essa propriedade através da notação [pNdP]; assim, a negação
verbal é marcada [+pNdP]; todas as outras funções vistas, claro, serão [-pNdP]. É obviamente
impossível a existência, em uma mesma oração, de dois constituintes marcados [+pNdP], pois ambos
teriam de ficar imediatamente antes do NdP.
Entre a negação verbal e o NdP não podem ocorrer nem mesmo elementos parentéticos
separados por vírgula, como os dois exemplos:

(53)O ministro, dizem, não aprecia jiló.


(54)O ministro não aprecia, dizem, jiló.

Mas:

(55)*O ministro não, dizem, aprecia jiló.

A bem dizer, existe um pequeno grupo de elementos que podem aparecer entre a negação
verbal e o NdP, a saber, os pronomes clíticos, como “me”, “nos”, “lhe” etc.:

(56)O ministro não nos recebeu na hora marcada.

Mas, como se trata de um grupo bem delimitado, o fato não prejudica nossa definição; basta
acrescentar essa ressalva à formulação do traço.
Aparentemente, existem apenas duas palavras em português que podem desempenhar a função
de negação verbal: “não” e “mal”, em uma de suas acepções:

(57)A noiva mal chegou a tempo para o casório.

Há um grupo de itens que, provavelmente por razões de semelhança semântica, costumem ser
classificados juntamente com “não” e “mal”; no entanto, seu comportamento sintático é claramente
diferente de “não” e “mal”. Exemplos são “nunca”, “jamais”, “já”, “nada”, “ninguém”.
Uma última observação sobre a negação verbal: o fato de que ela não se pode separar do NdP
pela inserção de nenhum elemento (exceto clíticos) sugere que ela seja também parte do predicado –
não é, estritamente falando, um constituinte de nível oracional.
A gramática tradicional engloba, sob o rótulo adjunto adverbial, um conjunto bastante variado
de funções. Já vimos que uma dessas é a que chamamos aqui atributo; agora veremos outras três
funções, igualmente denominadas de adjuntos adverbiais pela análise tradicional.
Vejamos em primeiro lugar o comportamento do constituinte “completamente’ em:

(58)Miguel decorou o apartamento completamente.

Esse elemento tem os traços [-CV, -Q], tal como o atributo; mas, ao contrário dele, é [-Ant]:

(59)*Completamente, Miguel decorou o apartamento.


277

Trata-se, portanto, de uma nova função, caracterizada, entre outras coisas, por uma posição
relativamente fixa na oração. Chamo-a adjunto adverbial (AA); define-se pelos traços [-CV, -Ant, -Q,
-CN, -pNdP]. Relembro que, apesar da identidade de nomes, o adjunto adverbial só compreende uma
pequena parte dos termos tradicionalmente chamados adjuntos adverbiais.
Passemos agora ao caso de “francamente” em:

(60)Esse professor, francamente, é um neurótico.

Esse termo tem alguma semelhança com o atributo, porque é marcado [-CV, +Ant, -Q]; mas é
aparentemente marcado [-CN], o que o diferencia do atributo. Além disso, “francamente” em (60)
não parece compor constituinte com nenhum outro elemento, ao passo que em um caso claro de
atributo, como –

(31)Jeremias reclama frequentemente.

– “frequentemente” faz constituinte com “reclama”, assim:

(61)[Jeremias] – [reclama frequentemente]

Na literatura linguística moderna, elementos como “francamente” são considerados à parte,


como um elemento anexo à oração, talvez mesmo externo a ela; denominam-se advérbios de oração.
Aqui a função correspondente será chamada adjunto oracional (AO).
Existe um traço adicional (além de [CN]) que distingue o adjunto oracional do atributo. Para
defini-lo, vamos considerar brevemente o fenômeno da clivagem. Trata-se de uma construção que
põe em evidência um elemento da oração, com o auxílio do verbo “ser” mais o item “que”; pode-se,
assim, clivar um sujeito, como em –

(62)Foram meus sobrinhos que comeram a melancia.

ou então um objeto, como em –

(63)Foi a melancia que meus sobrinhos comeram.

– e assim por diante.


Digamos, então, que os constituintes que podem ser clivados como nos exemplos acima são
marcados com o traço [+Cl]; constituintes não-cliváveis são marcados [-Cl].
Ora, das funções vistas até o momento, todas podem ser clivadas, exceto apenas as de NdP e de
negação verbal (que já são em si suficientemente idiossincráticas). Em particular, o atributo pode ser
clivado:

(64)É o dia inteiro que Jeremias reclama.

Mas o adjunto oracional é claramente não-clivável, como se vê em:

(65)*É francamente que esse professor é um neurótico.

Dessa maneira, vamos utilizar o traço [Cl] para caracterizar o adjunto oracional. O adjunto
oracional, portanto, se define como [-CV, +Ant, -Q, -CN, -pNdP, -Cl].
Examinemos agora o comportamento de “muito” em:

(66)Juracy bebe muito.

Até onde podemos verificar, seria um atributo, pois é marcado com os traços [-CV, +Ant, -Q,
+Cl, -pNdP], e o traço [CN] pode não estar explicitado por causa da morfologia de “muito”, que é
invariável. Teria então a mesma função que “frequentemente” em:

(31)Jeremias reclama frequentemente.

Há, porém, uma diferença entre os dois casos no que se refere a suas possibilidades de
ocorrência em várias posições na oração. Sabemos que ambos podem ser antepostos (levados para o
início da oração) e, por isso, são marcados [+Ant]. Mas só o segundo pode ser colocado imediatamente
antes do NdP (ou da negação verbal, se houver):
278

(67)Jeremias frequentemente reclama.


(68)*Juracy muito bebe.

Temos aqui base para a postulação de um novo traço, a que chamarei [PA] (de posição do
auxiliar). O traço [PA] exprime a propriedade de ocorrer entre o sujeito e o NdP (ou entre o sujeito
e a negação verbal mais o NdP, se for o caso).
Além disso, voltando ao traço [CN, observa-se que, quando a concordância nominal é possível,
o transporte para a posição do auxiliar também é possível:

(69)Jeremias reclamou indignado.


(70)Jeremias indignado reclamou.

Isso sustenta a ideia de que temos um atributo em (31), mas não em (66).
Temos, assim, condições de diferenciar a função de “muito” em (66) da de “frequentemente”
em (31): no primeiro caso, temos uma definição definida como [-CV, +Ant, -Q, -CN, -pNdP, +Cl, -
PA]; vamos chamar a essa função adjunto circunstancial (AC). No segundo caso, a função é definida
como [-CV, +Ant, -Q, +CN, -pNdP, +PA]; e trata-se, como sabemos, de um atributo.
Devo avisar desde já que, dos traços utilizados nesta análise, [PA] é provavelmente o menos
satisfatório; e isso principalmente porque são muito numerosos os casos em que há variação ou
insegurança no julgamento dos falantes. Por exemplo, na oração

(71)Jeremias reclama o dia inteiro.

não é claro para todos os falantes se “o dia inteiro” pode ou não pode ocorrer na posição de auxiliar.
O leitor poderá verificar isso por si mesmo, pedindo a algumas pessoas que deem seu julgamento de
aceitabilidade sobre a frase:

(72)?Jeremias o dia inteiro reclama.

De qualquer maneira, como a presente análise não tem a pretensão de ser perfeita, ficaremos
com o traço [PA], no que pesem essas deficiências, como parte da distinção entre o atributo e o
adjunto circunstancial.
A essa altura já podemos fazer um sumário geral da análise da oração. Não acredito que haja
realmente esgotado a lista das funções de nível oracional. Mas as funções definidas aqui bastam para
fundamentar uma análise mais adequada e coerente da estrutura da oração do que a análise oferecida
pela gramática tradicional.
Vimos que a oração simples em português se compõe de um conjunto de constituintes de
comportamento sintático variado. Esse comportamento sintático pode ser descrito através de sete
traços distintivos, como segue:

Pred Voc

Suj NV Aux NdP OD CP Pv Atr AA AO AC


↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓
+CV ... -CV -CV -CV -CV -CV -CV -CV
... ... +Ant +Ant -Ant +Ant -Ant +Ant +Ant
... ... +Q +Q +Q -Q -Q -Q -Q
... ... -CN +CN +CN +CN -CN -CN -CN
... +pNdP -pNdP -pNdP -pNdP -pNdP -pNdP -pNdP -pNdP
... ... +Cl +Cl +Cl +Cl +Cl -Cl +Cl
... ... -PA -PA -PA +PA -PA +PA -PA
279

NOTAS:
a)O sujeito é também [+Ant, +Q, - pNdP, +Cl], mas esses traços não são cruciais para sua identificação, porque o sujeito é a
única função marcada [+CV].
b)O NdP, o auxiliar e a negação verbal possivelmente não são funções de nível oracional, mas fazem parte do predicado.
c)Traços distintivos:
*[CV] – a propriedade de estar em relação de concordância com o NdP;
*[Ant] – a propriedade de poder aparecer no início da oração em uma frase correspondente;
*[Q] – a propriedade de poder ser retomado pelos elementos “que”, “o que” ou “quem”;
*[CN] – a propriedade de estar em relação de concordância (nominal) com outro termo da oração;
*[Cl] – a propriedade de poder ocorrer como foco de uma frase clivada correspondente;
*[PA] – a propriedade de poder ocorrer na posição do auxiliar (entre o sujeito e o NdP);
*[pNdP] – a propriedade de só poder ocorrer imediatamente antes do NdP.
Um constituinte é marcado positivamente (+) quando tem a propriedade descrita, e negativamente
(-) quando não a tem.

Finalmente, vejamos o caso do vocativo, um termo geralmente considerado estranho à


estrutura da oração. Como veremos, essa análise tradicional é correta.
À primeira vista, o vocativo parece merecer o rótulo de adjunto oracional:

(73)Serginho, a bandeira está no chão.

É fácil ver que o constituinte “Serginho” tem os traços [-CV, +Ant, -Q, -Cl, +PA], o que faria dele um
AO.
No entanto, há certas considerações que nos levarão não só a negar que um vocativo seja um
caso de AO, mas ainda a afirmar que a análise por traços sintáticos não se aplica a ele, porque sua
conexão com a oração não é propriamente sintática. Quero dizer que a ligação entre o vocativo e a
oração junto à qual ele pode ocorrer não tem a ver com a estrutura própria da oração, mas com a
organização do discurso.
Há várias indicações formais que sugerem fortemente que esse é o caso. Em primeiro lugar, o
vocativo pode separar-se da oração não apenas por vírgula, como está em (73), mas também por
sinalização de final de período:

(74)Serginho! A bandeira está no chão.

Na fala, isso se traduz pela possibilidade de uma pausa de duração indefinida entre os dois elementos.
Depois, o vocativo pode estar separado da oração por uma mudança de interlocutor, sem que
isso produza a impressão nítida de interrupção:

(75) – Serginho!
– O quê?
– A bandeira está no chão.

Quando um termo da oração é assim separado por mudança de interlocutor, entende-se


claramente que houve interrupção:

(76) – Serginho...
– O quê?
– ...vai fazer aniversário amanhã.

Finalmente, pode-se dizer que o vocativo tem uma resposta própria (como “O quê?” ou “Estou
aqui...” etc.), o que indica que ele pode constituir, por si só, uma frase independente. Isso não se aplica
a termos individuais da oração: a oração (ou, melhor dizendo, o período) é que pode ter uma resposta,
mas não o seu sujeito, ou predicado, ou adjunto circunstancial etc.
Razões como essas mostram com bastante clareza que o vocativo realmente não pertence à
oração. A semântica apoia essa conclusão: o significado de um vocativo não se integra ao significado
de uma oração contígua. Já com um adjunto oracional, por exemplo, há essa integração:

(77)Com franqueza, desconfio de vocês.

O significado de “com franqueza” é claramente predicado de “desconfio de vocês”. Nada de parecido


se observa com o vocativo.

PERINI, Mário. “Funções sintática na oração”. In: gramática descritiva do português. São Paulo, Ática, 1996, p. 71-91.
Obs.: O texto foi copiado, com adaptação, para uso exclusivo em sala de aula, como apoio didático.
fim
280

ESTRUTURA DA ORAÇÃO [2]


[funções sintáticas de nível oracional]

Rocha Lima

Em sua estrutura básica, a oração consta de dois termos: a)Sujeito – o ser de quem se diz algo;
b)Predicado – aquilo que se diz do sujeito. O sujeito pode ser determinado ou indeterminado. É
determinado, se identificável na oração – explícita ou implicitamente; indeterminado, se não ou
pudermos ou não quisermos especifica-lo.
Para indeterminar o sujeito, vale-se a língua de um dos dois expedientes: 1)empregar o verbo
na 3ª pessoa do plural; 2)usá-lo na 3ª pessoa do singular acompanhado da partícula “se”, desde que
ele seja intransitivo ou traga complemento preposicional. Exemplos:

Falam mal daquela moça.


Mataram um guarda.
Vive-se bem aqui.
Precisa-se e professores.

Pode-se dar o caso de a oração ser destituída de sujeito: com ela, referimo-nos ao processo
verbal em si mesmo, sem o atribuirmos a nenhum ser. Nem há o propósito de esconder o sujeito,
atitude psicológica orientadora das construções indeterminadas.
São orações sem sujeito – entre outras – as que denotam fenômenos da natureza –

Chove.
Trovejou ontem.
Anoitece tarde durante o verão.

– e as que têm os verbos “haver”, “fazer”, “ser” empregados impessoalmente em construções como
as seguintes:

Há grandes poetas no Brasil.


Fazia muito frio naquele mês.
Fez ontem três anos que ele se doutorou
Seriam talvez duas horas da tarde.

Note-se que a impessoalidade de tais verbos se estende aos auxiliares que com eles formam
perífrases:

Não podia haver notícias mais tristes.


Costuma haver reuniões às terças-feiras.

O predicado pode ser: nominal, verbal, verbo-nominal. O predicado nominal tem por núcleo
um nome (substantivo, adjetivo ou pronome):

é
está
anda
Pedro permanece doente.
continua
ficou
parece

Em todas, a declaração feita relativamente ao sujeito “Pedro” contém-se no adjetivo “doente”. Este
adjetivo é, na realidade, o predicado; mas, pelos seus caracteres de forma e posição, recebe
particularmente o título de predicativo. Os verbos que aí figuram (“ser”, “estar”, “andar”,
“permanecer”, “continuar”, “ficar”, “parecer”) são elementos indicativos de diversos aspectos sob
os quais se considera a condição de “doente” em relação a “Pedro”. Chamam-se verbos de ligação.
O predicado verbal, que exprime um fato, um acontecimento ou uma ação tem por núcleo um
verbo, acompanhado, ou não, de outros elementos. Da natureza desse verbo é que decorrem os mais
termos do predicado. Verbos há que são suficientes para, sozinhos, representar a noção predicativa.
Chamam-se intransitivos. Exemplos:

Neva.
O soldado morreu.
Todos fugiram.
281

Outros, ao contrário, requerem, para a cabal integridade do predicado, a presença de um ou mais


termos que lhes competem a compreensão. São os verbos transitivos. Exemplos:

A criança encontrou → o quê?


A criança acudiu → a quê? ou a quem?
A criança deu → o quê a quem?

Em função do tipo de complemento que exigem para formar uma expressão compreensiva, os
verbos classificam-se, pois, em dois grupos:

Intransitivos, ou de predicação completa.


Transitivos, ou de predicação incompleta.

O predicado verbo-nominal tem dois núcleos: um, expresso por um verbo, intransitivo ou
transitivo; outro, indicado por um nome, chamado também predicativo. A razão é que o predicado
verbo-nominal representa a fusão de um predicado verbal com um predicado nominal. Exprimindo
um fato, encerra a definição de um ser. Cumpre distinguir dois casos:

1.O predicativo se refere ao sujeito da oração –

O trem chegou atrasado.

onde os elementos resultantes da decomposição seriam:

O trem chegou.

O trem estava atrasado.

2.O predicativo se refere ao objeto direto e, mais raramente, ao indireto, exprimindo, às vezes, a
consequência do fato indicado no predicado verbal:

A Bahia elegeu Rui Barbosa senador.

como que cruzamento das orações:

A Bahia elegeu Rui Barbosa.

Rui Barbosa ficou senador.

Exemplo de predicativo do objeto indireto:

Todos lhe chamavam ladrão.

O predicativo “ladrão” se refere ao objeto indireto “lhe”.


Os complementos verbais são os seguintes:

Objeto direto
Objeto indireto
Complemento relativo
Complemento circunstancial

Objeto direto é o complemento que, na voz ativa, representa o paciente da ação verbal.
Identifica-se facilmente: a)porque pode ser o sujeito da voz passiva; b)porque corresponde, na
terceira pessoa, às formas pronominais átonas “o”, “a”, “os”, “as”. O objeto direto indica:

*O ser sobre o qual recai a ação:

Castigar o filho.
Louvar os bons.
282

*O resultado da ação:

Construir uma casa.


Criar um poema.

*O conteúdo da ação:

Prever a morte do ditador.


Discutir política.

Ordinariamente não é o objeto direto precedido de preposição; todavia, casos há em que ela
figura em caráter facultativo, e outros, até em que sua presença se faz de rigor. O complemento
chamar-se-á, então, objeto direto preposicional. Exemplos:

Só há uma coisa necessária: possuir a Deus.


O reitor o esperava e aos seus respeitáveis hóspedes.
Aos pais ama-se com fervor.

Verbos intransitivos podem trazer complemento representado por substantivo do mesmo


radical, contanto que este venha acompanhado de adjunto:

Morrer morte gloriosa.


Dançar danças malditas.
Sonhar sonhos ruins.

Estes complementos chamam-se objetos diretos internos e, também, às vezes, são expressos por
palavras que, não sendo corradicais dos verbos respectivos, pertencem, todavia, ao mesmo grupo de
ideias:

Dormir um sono tranquilo.


Chorar lágrimas de sangue.

Objeto indireto é o complemento que representa a pessoa ou coisa a que se destina a ação verbal,
ou em cujo proveito ou prejuízo ela se realiza. Apontem-se-lhe os seguintes caracteres típicos:

a)o ser encabeçado pela preposição “a” (às vezes “para”);


b)o corresponder, na 3ª pessoa, às formas pronominais átonas “lhe”, “lhes”;
c)o não admitir – salvo raríssimas exceções – passagem para a voz passiva.

Alguns casos incontroversos de objeto indireto:

1.Serve de complemento a verbos acompanhados de objeto direto, representando o elemento onde


termina a ação: “dar”, “oferecer”, “entregar”, “doar”, “dedicar”, “negar”, “recusar”, “dizer”,
“perguntar”, “contar”, “narrar”, “pedir”, “rogar”, “pagar”, “dever” etc.;
2.Junta-se à unidade formada de verbo + objeto direto, indicando o possuidor de alguma coisa:

Mandou cortar a cabeça a Adonias.

3.Acompanha certos conglomerados constituídos de verbo + objeto direto, de que depende o indireto:
“ter medo de” (= temer), “ter amor a” (= amar), “fazer guerra a” (= guerrear), “por freio a” (=
refrear), etc.
Ainda se pode incluir neste grupo conglomerados do tipo:

Servir (lhe) de predicativo.


Ser (lhe) + predicativo.
Ouvir algo a alguém.
Merecer algo a alguém.

4.Liga-se a verbos intransitivos unipessoais, designando a pessoa em quem se manifesta a ação:

Custou muito ao menino aceitar esta situação.


283

Complemento relativo é o complemento que, ligado ao verbo por uma preposição determinada
(“a”, “com”, “de”, “em” etc.), integra, com o valor de objeto direto, a predicação de um verbo de
significação relativa. Distingue-se nitidamente do objeto indireto pelas seguintes circunstâncias:

a)Não representa a pessoa ou coisa a que se destina a ação, ou em cujo proveito ou prejuízo ela se
realiza. Antes denota, como o objeto direto, o ser sobre o cai recai a ação;
b)Não corresponde, na 3ª pessoa, às formas pronominais átonas “lhe”, “lhes”, mas às formas tônicas
“ele”, “ela”, “eles”, “elas”, precedidas de preposição:

Assistir a um baile.
Depender de despacho.
Precisar de conselhos.
Anuir a uma proposta.
Gostar de uvas.

Complemento circunstancial é um complemento de natureza adverbial – tão indispensável à


construção do verbo quanto, em outros casos, os demais constituintes verbais. Se compararmos frases
como –

Irei a Roma.
Jantarei em Roma.

– verificaremos que, na segunda, o liame entre a preposição e o substantivo se nos mostra muito mais
íntimo do que na primeira, onde, pelo contrário, a preposição como que forma bloco com o verbo:

Irei a Roma.

Jantarei em Roma.

Por seu valor de verbo e direção, “ir” exige, por assim dizer, a preposição “a” para liga-lo ao
termo locativo. Outros exemplos:

Morar em Paquetá.
Estar à janela.
Ter alguém ao colo.

Esse complemento pode construir-se, também, sem preposição:

A guerra durou cem anos.


Distar muitos quilômetros.

Agente da passiva é o complemento que, na voz passiva com auxiliar (também chamada voz
passiva analítica), representa o ser que praticou a ação verbal. Exemplos:

Nossa casa foi construída por este engenheiro.

Sendo este complemento o verdadeiro agente, ou seja, aquele que exerce a ação, podemos
transformar a construção passiva em ativa e, neste caso, ele figurará como sujeito:

Este engenheiro construiu nossa casa.

O agente pode declinar de importância a ponto de ser omitido:

Nossa casa foi construída há muitos anos.

Por quem? Não sei ou não interessa dizer.

Introduz-se o agente da passiva pela preposição “por” e, às vezes, “de”:

Os cartagineses foram vencidos pelos romanos.


Nosso chefe era muito estimado de superiores e subalternos.
284

Adjunto adverbial é o termo que modifica o verbo, exprimindo as particularidades que cercam
ou precisam o fato por este indicado. É expresso:

a)por um advérbio:

Visito-o diariamente.
Cometeu o crime premeditadamente.
O navio passou longe.
Dar-lhe-ei o livro amanhã.
Outrora, éramos felizes.

b)por uma expressão adverbial:

Partiremos de madrugada.
Lerei seu romance na próxima semana.

A classificação do adjunto adverbial, mormente quando constituído por expressão adverbial


(preposição + substantivo) nem sempre se alcança fazer com facilidade. E isto porque ela depende
das relações, muitas vezes sutis, estabelecidas pela preposição introdutória.
Como sabemos, uma só preposição pode estabelecer diferentes relações, como é o caso, por
exemplo, da preposição “de” (o que concorre para dificultar a interpretação):

Assunto: Falar da vida alheia.


Causa: Morrer de sede.
Meio: Vive do trabalho.
Modo: Olhou-me de esguelha.

Vocativo é um termo de natureza exclamativa, empregado quando chamamos por alguém, ou


dirigimos a fala a pessoa ou ente personificado. Não pertence propriamente à estrutura da frase,
devendo ser considerado à parte. Exemplo:

Senhor! Por que nos deste uma língua tão pobre na gratidão?

O vocativo pode ser precedido de algumas interjeições, especialmente “ó”. Em regra, é o


vocativo separado por vírgula (quando vem no início ou no fim da frase), ou figura entre vírgulas
(quando intercalado):

Filho meu, onde estás?


Fuja, fidalgo, que me perco!

Esquema da oração:

S P Voc

* V Od Oi Cr Cc Agp Pred (Adv)

ROCHA LIMA, Carlos Henrique da. “Teoria geral da frase e sua análise”. In: Gramática normativa da língua portuguesa.
Rio de Janeiro, Livraria José Olympio, 1976, p. 203 – 230.
Obs.: O texto foi copiado, e adaptado, para uso exclusivo em sala-de-aula, como apoio didático.
fim
285

ESTRUTURA DA ORAÇÃO [3]


[funções sintáticas de nível oracional]

Souza e Silva & Koch

Os constituintes oracionais são os sintagmas. O sintagma consiste num conjunto de elementos


que constituem uma unidade significativa dentro da oração e que mantêm entre si relações de
dependência e de ordem. Organizam-se em torno de um elemento fundamental, denominado núcleo,
que pode, por si só, constituir o sintagma. Nas frases –

Pedro está diante da vitrine de uma joalheria.


O policial deteve vários suspeitos do furto.
A criancinha doente adormeceu.
Meu filho sonha ansiosamente com o dia de Natal.
Você levará a encomenda

– os sintagmas “Pedro”, “o policial”, “a criancinha doente”, “meu filho” e “você” têm como núcleo
um elemento nominal (nome ou pronome), tratando-se, pois, de sintagmas nominais. Já em “está
diante da vitrine de uma joalheria”, “deteve vários suspeitos do furto”, “adormeceu”, “sonha
ansiosamente com o dia de Natal” e “levará encomenda”, o elemento fundamental é o verbo, de modo
que se tem, no caso, sintagmas verbais.
A natureza do sintagma depende, portanto, do tipo de elemento que constitui o seu núcleo; além
do sintagma nominal (SN) e do sintagma verbal (SV), existem os sintagmas adjetivais (SA), que têm
por núcleo um adjetivo e os sintagmas preposicionais (SP), que são, normalmente, formados de
preposição + sintagma nominal.
Na estrutura da oração, em sua forma de base, aparecem como constituintes obrigatórios o SN
e o SV. Por exemplo:

(1)O garoto / empinava papagaios de papel.


SN SV

(2)(Nós) / assistimos a uma conferência sobre tóxicos.


SN SV

Por mais longa que seja a frase, ela pode ser decomposta nesses dois subconjuntos:

(3)A irmã de uma conhecida de meu marido / recebeu uma belíssima homenagem de seus companheiros de trabalho.
SN SV

(4)A carrocinha de pão que passava pela minha rua todos os dias / pertencia a um antigo empregado da prefeitura municipal.
SN SV

O SN sujeito existe como posição estrutural, embora muitas vezes este elemento não se atualize,
isto é, sua posição não seja lexicalmente preenchida:

(5) Δ Chove.
SN SV

Além dos elementos obrigatórios, SN e SV, existem orações que apresentam um terceiro
subconjunto, com as seguintes características: a)é facultativo, isto é, sua ausência não prejudica a
estrutura sintática da oração; b)é móvel, ou seja, pode ser deslocado de sua posição normal (após o
SN e o SV), vindo anteposto a esses sintagmas ou, ainda, intercalado; c)apresenta-se, geralmente, sob
a forma de um SP:

(6)As flores / enfeitam os jardins / na primavera.


SN SV SP

Pode haver mais de um constituinte desse tipo na oração:

(7)O padeiro / entrega o pão / na minha casa / de madrugada.


SN SV SP SP

Assim, ao lado das orações constituídas apenas de SN + SV, tem-se aquelas compostas de SN +
SV + SP, de modo que a estrutura frasal vem a ser como segue:
286

SN SV
↓ ↓
a criancinha doente adormeceu

SN SV SP
↓ ↓ ↓
as flores enfeitam os jardins na primavera

De uma maneira geral, o sintagma preposicionado (SP) é constituído de uma preposição


seguida de um SN. Examinando-se, porém, as orações –

(8)O leiteiro sai cedinho.


(9)O leiteiro sai de madrugada.
(10)O leiteiro sai à mesma hora todos os dias.

– pode-se verificar, através do esquema arbóreo –

SN SV SP SP
↓ ↓ ↓ ↓
o leiteiro sai cedinho todos os dias
de madrugada
á mesma hora

– que as expressões grifadas, embora nem todas apresentem estruturas idênticas, desempenham o
mesmo papel: o de modificadores circunstanciais (no caso, de tempo). Levando-se em conta, contudo,
o fato de serem esses modificadores, em sua maioria, expressos por locuções verbais, normalmente
introduzidas por preposição, é possível atribuir-lhes a etiqueta de SP.
Quando o SP ocorre como constituinte independente, ou seja, uma terceira divisão da oração,
ele poderá veicular informações sobre as circunstâncias em que se efetivam os fatos na proposição
(tempo, lugar, modo, causa etc.), conforme o exemplo (11), ou indicar atitudes do falante, como nos
exemplos (12) e (13):

(11)No verão, os dias são mais longos que as noites.


Lentamente, a noite descia sobre a terra.

(12)Felizmente, não houve vítimas no desastre.


Pesarosamente, comunicamos o falecimento de nosso diretor.

(13)Provavelmente, o comício não se realizará.


Sem dúvida, nossa equipe será a campeã do torneio.

Observe-se que, em (12) e (13), ao contrário de (16), os SP não fazem parte do conteúdo proposicional:
em (12), exprimem os sentimentos do falante perante os fatos veiculados pela proposição, e em (13)
revelam o seu grau de engajamento relativamente ao enunciado que produz, funcionando em ambos
os casos como modalizadores ou modificadores atitudinais. Saliente-se, ainda, que esse tipo de
modificador circunstancial não se inclui nas definições apresentadas pela maior parte das gramáticas
de Língua Portuguesa, segundo as quais “o advérbio é a palavra invariável que modifica o verbo, o
adjetivo ou o próprio advérbio, acrescentando-lhes uma circunstância”. Alguns autores mais
287

modernos citam o modificador circunstancial da oração, mas não distinguem entre os dois subtipos
acima mencionados.
É necessário ressaltar, porém, que, além de apresentar-se, muitas vezes, como um terceiro
constituinte da oração, o SP pode ocorrer, também, dentro de um SN, de um SV ou de um SA,
funcionando como modificador do núcleo, como nos exemplos:

(14)As folhas das árvores / dançavam ao sabor do vento.


SP

SN

(15)A execução desse trabalho / levará vários dias.


SP

SN

(16)Os estudantes / gostaram da palestra.


SP

SV

(17)Os pais de Carlos / chegaram da Europa.


SP

SV

(18)O governo / atuou com firmeza.


SP

SV

(19)A decisão do juiz foi / favorável ao réu.


SP

SA

Examinando-se todas as ocorrências, podem-se distinguir dois tipos básicos de SP: os SPC, que
exercem a função de complementos nominais – (15) e (19) – ou verbais – (16) e (17) –, ocorrendo
necessariamente no interior do sintagma cujo núcleo complementam; e os SP A, que desempenham o
papel de adjuntos, apresentando-se ora no interior de outro sintagma (SN, SV, SA), como
modificadores nominais (14) ou verbais (18), ora no exterior de qualquer sintagma, formando um
constituinte à parte, como modificadores oracionais: (11), (12) e (13):
SP

SPC SPA
[interior do sintagma]

[interior do sintagma] [exterior do sintagma]

complemento complemento modificador modificador modificador


nominal verbal nominal verbal oracional

COMPLEMENTOS ADJUNTOS
288

A diferenciação entre os diversos tipos de SP nem sempre é das mais fáceis, apesar da existência de
alguns critérios de ordem predominantemente semântico-pragmática:

a)O SPA interno ao SV funciona como modificador ou intensificador do processo verbal: “andar
depressa”, “falar bem”, “trabalhar muito”, enquanto o SPA externo apresenta-se como modificador
circunstancial da oração como um todo, ou, então, como modificador atitudinal da frase, este último
ligado diretamente à enunciação. Note-se que, em se tratando de um SPA interno ao SV, é sobre ele
que recai a negação, e não sobre o processo verbal em si: “Ele não anda depressa”, “Ele não fala
bem”;
b)O SPC acompanha os verbos transitivos, isto é, de predicação incompleta, que exigem um
complemento preposicionado. Deve-se aqui considerar a transitividade em sentido lado, abrangendo
não apenas as construções com objeto indireto (tradicionalmente aceitas pelas nossas gramáticas),
mas também aquelas com verbos de movimento (como “ir”, “vir”, “chegar”, “morar” etc.), que
necessitam, na maioria das vezes, de um complemento para integrar-lhes o significado, insuficiente
por si mesmo. Já os SPA modificadores do verbo são termos estruturalmente acessórios, que
assinalam qualquer circunstância relativa ao processo verbal. Portanto, a classificação do SP como
SPC ou SPA depende da própria natureza semântica do verbo.
c)Finalmente, a distinção entre o SPC e o SPA interiores ao SN tem também causado inúmeras
controvérsias, embora possa, de maneira simplificada, ser relacionadas à questão de transitividade:
o SPC integra (como complemento) o significado incompleto de: 1)nomes abstratos de ação, de
movimento etc. derivados de verbos transitivos em sentido lato (deverbais), como “realização”,
“execução”, “ida”, “permanência”; 2)nomes abstratos de sentimentos que recaem sobre um alvo
específico, como “esperança”, “medo”, “saudade”; 3)nomes derivados de adjetivos de valor
transitivo, como “aptidão”, “incompatibilidade”, “capacidade”. O SPA, por sua vez, modifica nomes
intransitivos, isto é, de carga semântica completa, geralmente concretos, diminuindo-lhes a extensão
para aumentar-lhes a compreensão pelo acréscimo de uma caracterização, especificação,
delimitação, etc.

O sintagma verbal (SV), um dos elementos básicos da oração, pode apresentar configurações
diversificadas. Atribui-se a etiqueta verbo (V) ao constituinte do SV que contém a forma verbal,
composta de um só vocábulo (tempos verbais simples) ou de vários vocábulos (tempos compostos ou
locuções verbais).
O SV pode ser representado apenas pelo núcleo, isto é, o verbo, como em –

(30)A criancinha doente adormeceu.


V

SV

– ou pelo verbo acompanhado de um ou mais elementos, precedidos ou não de preposição,


dependendo da regência de cada verbo –

(31)a. O garoto chupou as balas.


V SN

SV

b. Os alunos gostaram da palestra.


V SPC

SV

c. Paulo mora na Lapa.


V SPC

SV

d.Os alunos desta turma ofereceram um jantar ao diretor.


V SN SPC

SV

e.Eu falei de você ao meu marido.


V SPC SPC

SV
289

Os exemplos de (31) apresentam o que as gramáticas tradicionais denominam de predicado


verbal. Quando, em lugar do verbo, aparece a cópula, tem-se o chamado predicado nominal, que pode
ser assim constituído:

(32)a. A lua é desabitada.


cóp SA

SV

b. A lua é um satélite.
cóp SN

SV

c.Estas rendas são do Ceará.


cóp SP

SV

Não raro, aparecem, ainda, dentro do SV, elementos modificadores do verbo (quer intransitivo,
quer transitivo), que ora intensificam o processo verbal (intensificadores), ora acrescentam
circunstâncias de tempo, lugar, modo etc. (SPA):

(33)a. Este operário trabalha muito.


V intens

SV

b. As crianças acordam cedo.


V SPA
[tempo]

SV

c. O balão incendiado caiu longe.


V SPA
[lugar]

SV

d. O foragido atravessou a fronteira muito lentamente.


V SN SPA
[modo]

SV

Sintetizando, pode-se estabelecer o seguinte diagrama arbóreo sobre a oração no português:


O

SN SV (SPA)

V intr (intens) (SPA)

trans (intens) SN (SPA)


SPC
SN + SPC
SPC + SPC

Cóp SA
SN
SP
290

Postula-se que a gramática sintagmática (esta que acaba de ser apresentada em suas linhas
gerais), em oposição à gramática tradicional, fornece meios mais adequados e simplificados para a
descrição estrutural das orações, com base, entre outros, nos seguintes argumentos referentes à
transitividade:

a)Verbos tradicionalmente considerados intransitivos, como “sonhar”, “viver”, “morrer”, podem,


em casos especiais, vir acompanhados de um SN objeto, cujo núcleo está implicitado necessariamente
no próprio processo verbal, com o intuito de atribuir a esse nome uma explicitação ou qualificação:

(34)A vítima do acidente ainda vive.


(35)O pobre homem viveu uma vida de amarguras.

b)A distinção entre objeto direto e objeto indireto pode ser considerada como relativamente
secundária, já que são ambos complementos verbais, sendo a presença ou a ausência de preposição
condicionada apenas pelo próprio verbo (regência verbal); este fato parece não constituir razão
suficiente para se distinguirem dois tipos diferentes de relação entre o verbo e o seu complemento,
em casos como:

(36)Rogério ama Renata.


(37)Paula gosta de seu irmão.

A distinção se justifica apenas no caso de verbos que exigem dois complementos (verbos transitivos
diretos e indiretos), em que o primeiro (objeto direto) funciona como alvo sobre o qual recai o
processo verbal ou o resultado desse processo, e o segundo (objeto indireto), como o destinatário ou
beneficiário:

(38)Jorge encaminha o requerimento ao diretor.


c)A diferenciação entre verbos pronominais essenciais e acidentais torna-se mais evidente na medida
em que, no caso dos primeiros, a partícula “se” faz parte do constituinte V, ao passo que, no segundo
caso, vem a constituir um SN dentro do SV, com função de objeto:

(39)Mônica queixou-se ao professor.


(40)Carlos penteou-se diante do espelho.

d)A análise proposta permite descrever estruturas como –

(41)Falei de você ao diretor.

– que não costumam ser consideradas em nossas gramáticas, já que não se admite a existência de dois
objetos indiretos na mesma frase. Em termos de análise tradicional, ter-se-ia de considerar “ao
diretor” como objeto indireto, e “de você” como um adjunto adverbial de assunto, ao passo que, na
análise aqui apresentada, ambos constituintes classificam-se como SPC.

e)A gramática tradicional estabelece, entre complementos do verbo e certos modificadores


circunstanciais que também funcionam como complemento, uma distinção que não se justifica, não
fazendo, por outro lado, uma diferenciação necessária entre tipos diversos de modificadores
circunstanciais. Também nesse caso, a unidade SV permite proceder a uma análise que parece
adequar-se aos fatos, como ocorre em:

(42)O grupo de turistas gostou do Rio de Janeiro.


(43)O grupo de turistas veio do Rio de Janeiro.
(44)O grupo de turistas divertiu-se no Rio de Janeiro, neste fim de semana.

Dentro dos modelos tradicionais, (42) é diferente de (43), visto que, na primeira, considera-se
“do Rio de Janeiro” como objeto indireto e, na segunda, como adjunto adverbial; por outro lado,
(43) e (44) são consideradas semelhantes, na medida em que os sintagmas preposicionados “do Rio
de Janeiro”, “no Rio de Janeiro” e “neste fim de semana” são analisados como adjuntos adverbiais.
A análise aqui exposta evidencia que (42) e (43) possuem SVs idênticos (V + SP C), diferenciando-se,
assim, de (44), em que tanto “no Rio de Janeiro”, como “neste fim de semana” são SPA independentes,
apresentando-se como um terceiro constituinte da proposição. A unidade SV permite, portanto,
distinguir os complementos verbais dos modificadores circunstanciais e atitudinais da frase: os
primeiros podem ou não ser introduzidos por preposição e completam a enunciação do processo
verbal, sendo, por esta razão, interiores ao SV; os segundos, por sua vez, veiculam informações sobre
291

as circunstâncias em que se efetivam os fatos descritos no enunciado ou sobre as atitudes do falante,


sendo, deste modo, exteriores ao SV.

f)A análise proposta permite, também, desfazer algumas ambiguidades. Assim, em frases como –

(45)A multidão assistia à cena da calçada.

– numa primeira interpretação – a multidão estava na calçada, assistindo à cena que se passava em
outro local – tem-se a frase dividida em três constituintes: SN (a multidão apavorada) + SV (assistia
à cena) + SP (da calçada); numa segunda leitura (a multidão, de outro local, assistia à cena que se
passava na calçada), a estrutura é binária: SN (a multidão apavorada) + SV (assistia à cena da
calçada).

SOUZA E SILVA, M. C. P de & KOCH, I. G. V. “Organização e constituição da frase”. In: Linguística aplicada ao português:
sintaxe. São Paulo, Cortez, 2001, pág. 11 – 37.
Obs.: O texto foi copiado, com adaptação, para uso exclusivo em sala-de-aula, como apoio didático.

fim

ESTRUTURA DA ORAÇÃO [4]


[funções sintáticas de nível oracional]

E. Back & Geraldo Matos

A oração é um conjunto de locuções: as locuções de uma oração formam uma estrutura: uma
das locuções é o sol da oração; as outras são planetas. O sol da oração recebe o nome de predicado. O
predicado é ocupado por uma locução verbal.
Em –
O

1 2 3
O menino admira aquele homem
Aquele homem chamou o meu tio
O meu tio ouviu alguém
Alguém viu o menino
Ninguém conhece ninguém

– cada uma das orações tem três possibilidades, três locuções, três funções. (A segunda locução é um
conjunto de um só vocábulo; podiam estar dois ou mais: “vai admirar”; “tem chamado”; “há de
ouvir”.)
Verificamos rapidamente que os ocupantes das funções 1 e 3 são os mesmos: são locuções
substantivas. Os ocupantes da função 2 são outros: são locuções verbais:

locução substantiva locução verbal locução substantiva


↓ ↓ ↓
O menino admira aquele homem
Aquele homem chamou o meu tio
O meu tio ouviu alguém
Alguém viu o menino
Ninguém conhece ninguém

Locuções substantivas não podem ocupar a função 2. Não ocorrem orações do tipo:
292

*O menino alguém aquele homem.

Locuções verbais não podem ocupar as funções 1 e 3. Não existem sentenças do tipo seguinte:

*Chamou admira meu tio.


*O menino chamou conhece.

Chegamos à conclusão que esse tipo de oração tem 3 funções (três possibilidades de aparecerem
locuções) e 2 classes de locuções: a locução substantiva, que ocupa as posições 1 e 3; a locução verbal,
que ocupa a posição 2.
Em –

1 2
O menino dorme
Aquele homem chora
O meu tio sonha
Alguém caiu
Ninguém morreu

– temos um tipo de oração com duas possibilidades (2 funções). Na função 1, ocorrem as mesmas
locuções substantivas; mas seria a função 2 idêntica à função 2 da oração 123 (oração com as funções
1, 2 e 3)? Os ocupantes seriam locuções verbais? Parece que sim, pois num diálogo seria possível
encontrarmos:

1 2
O menino chamou
O menino admira
O menino conhece
O menino ouviu
O menino viu

Por que não entrariam as locuções verbais da sentença 12 na sentença 123?

*O menino dorme o menino.


*Alguém caiu aquele homem.
*Ninguém morreu o meu tio.

Trata-se de restrição: certas locuções verbais não se articulam na sentença 123. Ocorre ainda
outro tipo de restrição. Em –

1 2
Os meninos dormem
Aqueles homens trabalham
Os meus tios sonharam

– é possível articular:

Os meninos trabalham.
Os meninos sonharam.
Aqueles homens dormem.
Aqueles homens sonharam.
Os meus tios dormem.
Os meus tios trabalham.
293

Mas não se encontra:

*O menino dormem
*Aquele homem trabalham.
Etc.

A restrição é que determinadas locuções substantivas se articulam com determinadas locuções


verbais.
O vocábulo que representa sozinho toda a locução verbal é o verbo; o vocábulo que representa
sozinho toda a locução substantiva é o substantivo.
Verificamos que os verbos têm grande número de variações: “dorme”, “dormem”, “dormia”,
“dormira” etc., ao passo que as variações da locução substantiva são em menor número, além de
serem de outra natureza; e alguns substantivos não variam, como “alguém” e “ninguém”. As
variações do verbo constituem a sua conjugação. O verbo se conjuga; o substantivo, não.
Em “durmo”, qual é o ocupante da função 1? O único que podemos encontrar é “eu”. Em
“dormes”, o único ocupante da função 1 é “tu”. Em “dormimos”, o ocupante da função 1 é “nós” ou
então locuções compostas como “tu e eu”, “ele e eu”. Em “dormis”, o ocupante da função 1 é “vós”
ou alguma locução composta. Em “dorme” e “dormem”, os ocupantes da função 1 são inumeráveis,
constituem uma classe aberta:

A criança dorme Os meninos dormem


O filho da vizinha Os meninos vadios
Alguém Eles
Etc. Etc.

Aceitamos como representantes de todos os ocupantes, respectivamente, “ele” e “eles”.


A oração é uma estrutura de locuções. O sol é o predicado, e as demais locuções preenchem a
função de complementos. O predicado é a função manifestada por locução verbal:

Complemento Predicado Complemento...

1.Complemento subjetivo [sujeito]

O sujeito é um planeta; portanto, não é de estranhar que haja orações sem o sujeito (ou
complemento subjetivo). O sujeito, como complemento, pode estar ou não na oração. O complemento
subjetivo é a função 1, a locução substantiva com que o verbo concorda na sentença.
Assinala-se o complemento subjetivo pelo algarismo 1. No caso dos substantivos “eu”, “tu”,
“nós” e “vós”, é mais frequente não se apresentar o sujeito; nos demais casos, geralmente o sujeito se
manifesta. Ocorrem também sentenças que não têm sujeito nem permitem a inclusão de nenhuma
locução com tal função.
Em –

Entendi o assunto.

– se nós conjugarmos o verbo, “entendi” se conjuga com “eu”. “Eu” não está escrito, mas pode ser
incluído (“Eu entendi o assunto”). A oração está sem sujeito, mas poderia ter um sujeito, o sujeito
“eu”, e apenas esse. O sujeito é facultativo. Já em –

Houve dois desastres.

– esta oração não tem sujeito nem admite a sua inclusão. O substantivo correspondente ao sujeito
deveria ser “ele”, “ela”, “isso”, “um desastre”. Não há concordância entre “houve” e “dois
desastres”; nem haverá concordância entre “houve” e “um desastre”: é pura coincidência.
294

2.Complemento objetivo [objeto]

Consideremos o diagrama seguinte:

1 2 3
O menino admira aquele homem
Meu tio chamou alguém
Ninguém conhece aquele homem

Neste tipo de oração, a ordem das locuções é obrigatória: em 1º lugar, o sujeito; depois aparece
o predicado; e, depois do predicado, a função 3. Na função 3 ocorrem as mesmas locuções que estão
no sujeito; por isso, a ordem é obrigatória, e qualquer troca de ordem implica em mudança de função
ou incompreensão.
Os ocupantes das funções 1 e 3 são locuções substantivas. É a ordem que revela as funções
desses substantivos. A posição 3 chama-se complemento objetivo, ou objeto.
Como existem variantes para o complemento objetivo, a ordem das locuções deixa de ser
constante. E, neste caso, frequentemente, o complemento objetivo surge antes do predicado:

Carlos me chamou.
Nós te adoramos.

O complemento objetivo que não se inicia por prepositivo é objeto direto; aquele que se inicia
por prepositivo é objeto indireto. Os vocábulos direto e indireto indicam respectivamente a ausência
ou a presença do conectivo prepositivo. A função é a mesma:

1 2 3
Suj Predicado Obj
↓ ↓ ↓
O leão matou o caçador = objeto direto
O leão matou ao caçador = objeto indireto

3.Complemento dativo [dativo]

O complemento dativo, a função 4, é uma posição oracional obrigatória (desde que não evidente
pelo texto ou a situação) que corresponde ao pronome “lhe”. O dativo pode ser direto ou indireto. É
obrigatoriamente indireto e introduzido pelo conectivo prepositivo “a” quando se trata de locuções
nominais; nas locuções pronominais, o dativo é direto ou indireto, respectivamente: “me” / “mim”,
“te” / “ti”, “lhe” / “ele” etc.

1 2 4 3
Suj Predicado Dat Obj
↓ ↓ ↓ ↓
A professora deu ao menino os livros = indireto
A professora deu a ele os livros = indireto
A professor a deu lhe os livros = direto

O complemento dativo é uma posição oracional obrigatória: não pode faltar (a não ser com
permissão da situação ou do texto); seria incompleta a oração, e não satisfatória: em “A professora
deu os livros”, viria imediatamente a pergunta “A quem?”.
A ordem da posição 4 é livre, quando o dativo é indireto; mas comumente depois da posição 3:
295

A professora deus os livros ao menino.

Quando dativo direto, ou antes ou no meio ou depois do predicado, imposição da norma:

A professora lhe deu os livros.


A professor deu-lhe os livros.
A professora não lhe deu os livros.

A ordem é livre, no sistema, porque a função dativo é revelada pelo prepositivo e, neste caso, o
objeto não pode ser indireto; dativo indireto ou direto exclui a possibilidade de objeto indireto.
Os pronomes “me”, “te”, “se” e “vos” ocorrem tanto na função de objeto como de dativo; são
ambíguos na função. Por isso, não servem para comprovar a existência nem do objeto nem do dativo.
Apenas a 3ª pessoa tem formas específicas: “o”, “a”, “os”, “as” para o objeto, e “lhe”, “lhes” para o
dativo.

4.Complemento genitivo [genitivo]

O complemento genitivo, a função 5, é uma posição oracional obrigatória (exigida pelo verbo,
desde que não evidente no texto ou na situação), iniciada por prepositivo e que não se deixa substituir
por locução mínima (de um só vocábulo) nem por locução de outra classe qualquer, e não se integra
em nenhuma outra posição. A locução substantiva pode comparecer com qualquer das duas
subclasses, nome ou pronome.

1 2 3 5
Suj Predicado Obj Gen
↓ ↓ ↓ ↓
Maria gosta ... de festas
João aspira ... ao cargo
O menino lembrou o pai da promessa

Vejamos que esta última oração (“O menino lembrou o pai da promessa”) tem uma estrutura
diferente de “O menino lembrou-lhe a promessa”, embora sejam orações equivalentes:

1 2 4 3
Suj Predicado Dat Obj
↓ ↓ ↓ ↓
O menino lembrou lhe a promessa

5.Complemento nominativo [nominativo]

Em –

Meu amigo é estudioso.

– ocorre uma nova função, a posição 6. É uma nova classe de locuções: a locução adjetiva. O vocábulo
que representa sozinho uma locução adjetiva é o adjetivo. Na posição 6 também pode ocorrer locução
substantiva (com ou sem prepositivo).
O complemento nominativo, a função 6, é uma posição sentencial obrigatória, manifestada por
locução adjetiva ou locução substantiva que, com o mesmo verbo, pode ser substituída por locução
adjetiva, embora nem sempre no mesmo texto.
Os verbos se subdividem em duas subclasses: verbos que admitem na posição 6 locuções
substantivas, como “ser”, “estar”, “parecer”, “ficar”; verbos que admitem na posição 6 unicamente
locuções adjetivas, como “permanecer”, “viver”, “cair”, “andar”, “ser”, “estar”, “parecer”, “ficar”.
296

1 2 6
Suj Predicado Nom
↓ ↓ ↓
As leis são belas
Os cabelos dela pareciam de prata
Os marrecos estão com fome
A mesa era de mármore

6.Complemento acusativo [acusativo]

O complemento acusativo, a posição 7, é:

a)Locução adjetiva ou locução substantiva comutável com adjetivo. O adjetivo estará em


concordância com o substantivo do objeto.
b)Locução substantiva sem prepositivo ou introduzida facultativamente pelos prepositivos “de” e
“como”.

1 2 3 7
Suj Predicado Obj Acus
↓ ↓ ↓ ↓
Ele achava tudo delicioso
Os moradores consideravam o engenheiro seu legítimo representante
Todos têm a alma cândida

7.Complemento ablativo [ablativo]

O complemento ablativo, a posição 8, é manifestado por:

a)Toda locução adverbial (com ou sem prepositivo, obrigatória ou não) ou qualquer locução
substantiva ou adjetiva comutável por locução adverbial ou advérbio.
b)Toda locução adjetiva facultativa.
c)Toda locução substantiva facultativa e que não se deixa substituir por nenhuma outra classe de
locução.

Resumindo:

1.Todo e qualquer advérbio (vocábulo que pode representar sozinho a locução adverbial) ou locução
correspondente;
2.Adjetivo obrigatório é 6; facultativo, é 8;
3.Locução, com ou sem prepositivo, insubstituível e obrigatória é 5; facultativa, é 8.

Em –

Meu irmão vai ao cinema. (= Meu irmão vai lá.)

– “ao cinema” não está ocupando nenhuma das posições estudadas até aqui; não é 3, 4, 5, 6 nem 7.
Estamos diante de uma nova posição, a posição 8. A locução substantiva pode ser substituída por
uma nova classe de locuções, as locuções adverbiais. O vocábulo que pode sozinho representar a
locução toda, ser promovido a locução adverbial, é o advérbio. As locuções adverbiais não podem
manifestar a nenhum dos complementos, a não ser os complementos ablativos.
297

1 2 8
Suj Predicado Abl
↓ ↓ ↓
Meu pai está no escritório
Minha irmã entrou no quarto
Minha irmã entrou lá

Encontramos uma nova classe de locuções: “lá”, “aqui”, “ali”. Jamais ocorrem nas primeiras
sete posições da oração. Portanto, constituem uma nova classe de ocupantes, que se denomina locução
adverbial. Preenche a função de complemento ablativo.
Apesar de essencialmente obrigatórios, existem também complementos ablativos facultativos:

Minha irmã lia os romances em seu quarto.


Minha irmã lia os romances.

Distinguir entre uma locução adjetiva na posição 6 ou 8 exige que se verifique se, no texto, a
locução adjetiva é obrigatória ou facultativa. Se for obrigatória, é nominativo; se for facultativa, é
ablativo:

Os alunos saíram apressados da sala de aula.


Os alunos saíram da sala de aula. → “apressados” não é obrigatório.

Não se confundem genitivo e ablativo: o genitivo é (a)uma posição oracional obrigatória;


(b)uma locução substantiva que não admite substituição por outra classe. Em –

Acusa-lo de injustiças.
Acusa-lo de injusto.

– “de injusto” é, do mesmo modo que “de injustiças”, complemento genitivo, porque se trata de
locução substantiva (com concordância). Para ser acusativo, o prepositivo “de” deve ser facultativo.
Reconhecemos o ablativo que é manifestado por uma locução substantiva:

a)Algumas locuções podem ser substituídas por advérbios:

Ele saiu do escritório na segunda-feira. (= Ele saiu do escritório ontem.)

b)Algumas locuções podem ser substituídas por adjetivos e, neste caso, não oferecem problemas: não
podem ser genitivo.
c)Algumas locuções não admitem substituição por nenhuma outra classe de locuções. São essas que
exigem maior exame.
A diferença é a seguinte: o genitivo é uma posição obrigatória; se for facultativa, será ablativo:

Voltou de carro, de São Paulo. (= Voltou de São Paulo)


“de carro” é facultativo: ablativo.

A menina gosta de bonecas.


“de bonecas” é obrigatório: genitivo.

Ela confia nos outros.


“nos outros” é obrigatório: genitivo.

Ele descascou a fruta com o canivete.


“com o canivete” é facultativo: ablativo.

São 20 as posições na oração: um sol e 19 complementos possíveis. Nenhuma oração pode ter
as vinte, sobretudo porque algumas posições não coocorrem na mesma oração, como o 3 e o 6 ou o 6
e o 7.
Doze das vinte posições são reunidas sob o nome de complementos ablativos, pelas seguintes
razões:
298

a)Uma, didática: enumera-las todas de 1 a 20 não seria muito claro e seria fácil confundi-las;
b)Outra, linguística: são quase todas posições manifestadas por vocábulos promovidos a locução;
todas podem ocorrer como posições facultativas, assim também aquelas que não podem ser ocupadas
por advérbios.

São 12 os complementos ablativos, embora não se tenha encontrado oração com os 12


complementos ablativos. São eles:
Alusão
Causa
Declaração
Extensão
Frequência
Instrumento
Lugar
Medida
Procedência
Rota
Tempo
Vergência

Exemplos de coocorrência de alguns ablativos:

1 2 8 8 8 8
Suj. Predicado Abl T Abl M Abl I Abl L
↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓
Mário foi ontem com os amigos em ônibus para a praia

1 2 8 8 8 8
Suj. Predicado Abl T Abl I Abl R Abl P
↓ ↓ ↓ ↓ ↓ ↓
João voltou sábado de carro pela Estrada Ribeira de São Paulo

A presença de mais de um algarismo 8 não significa que se trata de função composta. Não existe
função composta, apenas forma composta. Cada algarismo 8 representa outra posição, que é
especificada a posteriori (pelas letras encimadas). Assim nos parece mais fácil e mais justo do que
enumerar de 8 a 19.

1)Ablativo de declaração (AblD)

A melhor maneira de reconhecer o ablativo de declaração é ter a lista de seus ocupantes:


“positivamente”, “indubitavelmente”, “certamente”, “com certeza”, “realmente”, “naturalmente”,
“verdadeiramente”, “de fato”, “propriamente”, “exatamente”, “efetivamente”, “na certa”, “quiçá”,
“acaso”, “talvez”, “provavelmente”, “de modo nenhum”, “de modo algum”, “realmente” e outras
comutáveis.
Ex.: Aquilo positivamente não tinha sentido.
AblD

2)Ablativo de extensão (AblE)

A melhor maneira de reconhecer o ablativo de extensão é ter presente a lista de ocupantes, por
ser reduzida: “já”, “também”, “ainda”, “sempre”, “apenas”, “nem”, “nunca”, “jamais”. É uma
posição facultativa.
299

Ex.: Ainda me lembro de meu pai.


AblE

3)Ablativo de lugar (AblL)

O complemento ablativo de lugar pode ser substituído por um dos advérbios de lugar. Os
advérbios de lugar são: “aqui”, “ali”, “fora”, “dentro”, “longe”, “perto”, “cá”, “lá”, “aí”.
Uma locução substantiva (adjetiva, não) pode ocupar a função de complemento de lugar; neste
caso, é introduzida por um dos prepositivos seguintes: “a”, “até”, “com”, “contra”, “de”, “em”,
“entre”, “para”, “perante”, “por”, “sob”, “sobre”.

Ex.: Um carro parou junto da calçada.


AblL

4)Ablativo de procedência (AblP)

O complemento ablativo de procedência é ocupado por uma locução substantiva ou adverbial


iniciada pelo conectivo “de”, e correspondem todas a “daqui”, “dali”, “de lá”. O prepositivo “de”
que permite a substituição por outro indica lugar, não a procedência:

Assisti ao filme da poltrona. (= Assisti ao filme na poltrona.)


AblL

Ex.: Puxou do bolso uma porção de notas em maço.


AblP

5)Ablativo de rota (AblR)

O complemento ablativo de rota é manifestado por locução substantiva ou adverbial, que


correspondem a “por onde” no período interrogativo. As locuções substantivas podem ser iniciadas
por “por” e “através de”. O prepositivo “por” substituível por outro indica lugar, não rota:

Os alunos passeiam pelo parque. (= Os alunos passeiam no parque.)


AblL

Ex.: Ele olhava pelos buracos da prisão o povo debaixo do tamarindo.


AblR

6)Ablativo de tempo (AblT)

O complemento ablativo de tempo é manifestado:

a]por advérbios de tempo: “hoje”, “ontem”, “amanhã”, “cedo”, “tarde”, “agora”, “já”, “logo”,
“depois”, “após”...
b]toda locução substantiva ou adverbial que pode ser substituída por um dos advérbios acima.
c]toda locução substantiva iniciada pelo prepositivo “durante” que seja comutável por “em”.

O complemento de tempo corresponde à pergunta “quando”, “desde quando”, “até quando”.

Ex.: No dia seguinte, confiou suas dúvidas a Seixas.


AblT

7)Ablativo de frequência (AblF)

O complemento ablativo de frequência é manifestado por uma das locuções seguintes: “de
novo”, “frequentemente”, “muitas vezes”, “raramente”...

Ex.: Ontem, me apareceu de novo com um cesto de uvas nas mãos.


AblF
300

8)Ablativo de vergência (AblV)

O complemento ablativo de vergência é um complemento que permite a sua inclusão ou no


sujeito ou no objeto, desaparecendo nesta transformação o conectivo, que é substituído pelo conectivo
coordenativo “e”. Por razões semânticas, algumas locuções poderão não permitir a sua inclusão no
sujeito ou objeto; desde que se remova este substantivo e mantendo as demais partes da sentença,
será possível a transformação. A vergência ocorre com os prepositivos “com”, “a”, “em”, “de”, “por”.

Ex.: Paulo se aproximou de Pedro. (= Paulo e Pedro se aproximaram.)


AblV

A transformação não parece possível num exemplo como “Paulo se aproximou do poço”. Trata-se de
restrição semântica: não existe a sentença seguinte: “*O poço aproximou-se de Paulo”.

Outro exemplo:

O pavor do céu eu confundia com os castigos dos contos de Trancoso.


AblV
(= Eu confundia o pavor do céu e os castigos dos contos de Trancoso.)

9)Ablativo de medida (AblM)

O complemento ablativo de medida é manifestado:

a]por uma das locuções adverbiais seguintes: “muito”, “pouco”, “quanto”, “tanto”, “mais”, “menos”,
“bem”, “mal”...;
b]por uma locução que se deixa substituir por um dos advérbios acima;
c]por uma locução adjetiva facultativa ou por uma locução substantiva facultativa que se deixa
substituir por uma locução adjetiva.

Ex.: Decorou o trecho em cinco minutos.


O livro custa 30 reais.
AblM

10)Ablativo de instrumento (AblI)

O complemento ablativo de instrumento é iniciado pelos prepositivos “a”, “com”, “de”, “em”,
“mediante”, “por” (= por meio de), e que não se deixa substituir por nenhuma outra classe de locução,
nem substantiva, nem adjetiva.

Ex.: Eugênio segurou o chapéu pela aba.


AblI

11)Ablativo de causa (AblC)

O complemento ablativo de causa é manifestado por uma locução iniciada pelos prepositivos
“a”, “para”, “por”, “de” e locuções substantivas como “no sentido de”, “a fim de”, “a troco de”, “em
busca de”, “à procura de”. Na transformação para o período interrogativo, todos os complementos
de causa podem ser substituídos por “por que?”.

Ex.: O colégio levantava-se mais cedo para os preparativos da primeira comunhão.


AblC

12)Ablativo de alusão (AblA)

O complemento ablativo de alusão é uma locução iniciada pelos prepositivos “de”, “em”,
“sobre”, “por”, e permite a sua substituição por “a respeito de”, “em relação a”...

Ex.: O meu tio informava de tudo.


AblA
301

8.Complemento limitativo [limitativo]

O complemento limitativo, a posição 9, é um complemento não obrigatório, e é manifestado:

a]pelos pronomes “me”, “te”, “lhe”, “nos”, “vos”, “lhes” ou por locuções correspondentes;
b)por locuções introduzidas pelo prepositivo “a” que substituam ou dispensem partes de locução, e
podem ter aparência de obrigatórias, porque falta parte obrigatória da locução, mas não são exigidas
pelo verbo;
c)pelos pronomes “me”, “te”, “lhe”, “nos” e “vos” em substituição a complementos de causa e lugar.

O dativo e o limitativo podem coocorrer na mesma sentença. Contudo, há uma restrição: não
é possível substituir ambos por pronome conexo na mesma sentença.

Exemplos de complemento limitativo:

Não me voltem tarde.


Não nos diga tal coisa ao Diretor.
Anamaria me encomendou um violino ao gerente.
Tirou-lhe o dinheiro do bolso.
Voltaram-lhe as lágrimas.

Finalmente, eis como pode ficar diagramada a estrutura geral da oração:

Suj Predicado Obj Dat Gen Nom Acus Abl Lim

D E L P R T F V M I C A

BACK, E. & MATTOS, G. “Sintaxe da sentença”. In: Gramática Construtural da Língua Portuguesa. São Paulo, FTD, 1972,
p. 178-250.
Obs.: O texto foi copiado, com adaptação, para uso exclusivo em sala-de-aula, como apoio didático.

fim

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