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356/13.STBFAF-AGI FERNANDO FERNANDES FREITAS HIPOTECA OBRIGACAO FUTURA HIPOTECA GLOBAL RG 29-09-2014 UNANIMIDADE s 1 APELACA IMPROCEDENTE, 2" SECCAO CIVEL |-Ahipoteca é uma garantia real que confere ao credor 0 direito de se pagar do seu crédito pelo valor de certos bens com preferéncia sobre os demais credores do devedor. ll - Com base na pratica corrente bancaria vem sendo admitida a designada “hipoteca global”, também designada “hipoteca genérica”, que é uma hipoteca voluntaria em que se convenciona que o devedor a constitui para todas e quaisquer dividas que tenha assumido ou venha a assumir (dividas futuras) com o credor, independentemente da sua causa, apenas se exigindo que no contrato conste um critério minimamente objectivo para determinagao da prestagao garantida ou a garantir, nomeadamente quanto aos limites dos montantes dos créditos garantidos. - ACORDAM EM CONFERENCIA NO TRIBUNAL DA RELAGAO DE GUIMARAES — A) RELATORIO 1.-“L..., S.A.” vem deduzir oposigao 4 execugao comum que lhe move a“C..., S.A.”, alegando: - a Sua ilegitimidade (passiva) por nao figurar no titulo executivo como devedora; - que 0 titulo executivo — contrato de muituo — é inexequivel por dele nao resultar que a Exequente tenha colocado a disposigaéo da mutuaria — a sociedade comercial “F...,Ld*.” — a quantia da qual esta se confessa devedora, nao fazendo a Exequente prova complementar dos factos que integram o nao cumprimento do mutuo; - a liquidagdo da divida, efectuada pela Exequente, é incompreensivel e nao esta fundamentada; - impugnando, alega ndo saber se a Devedora cumpriu ou no com as obrigagdes decorrentes do contrato de muituo; - e, finalmente, alega que a hipoteca sé abrange trés anos de juros. Contestou a Exequente defendendo a legitimidade da Embargante visto ser a actual dona do prédio onerado com uma hipoteca constituida a seu favor pela anterior proprietaria, sendo que, como demonstrou na execugao, a divida existe por a mutuaria nao ter cumprido com o que se obrigara no contrato de mituo dado a execugdo, sendo que a liquidagdo que fez obedeceu aos termos definidos no mesmo contrato. Reconhece a raz4o 4 Embargante no sentido de somente serem devidos juros relativos a trés anos, pedindo, por isso, que se considere uma redugao do pedido exequendo do montante liquidado a mais, passando os juros a totalizar o valor de € 49.412,69. Entendendo estarem reunidos todos os pressupostos que Ihe permitiam conhecer do mérito dos embargos, o Meritissimo Juiz proferiu douto despacho saneador-sentenga que julgou improcedente a excepgdo arguida pela Embargante, considerando-a parte legitima; julgou valido o titulo executivo por se tratar de um documento ao qual foi atribuida forca publica e nele uma das partes confessa-se devedora de uma determinada importancia em dinheiro; dependendo o valor da divida de simples calculo aritmético, considera que foi regularmente feita a liquidagao; e, finalmente, face ao reconhecimento da Exequente no que se refere aos juros, ordenou se promovesse a actualizagéo da quantia exequenda, quanto a esta parte, para os € 49.412,69. Inconformada, a Embargante impugna aquela decisao através do presente recurso, pretendendo que ela seja revogada e substituida por outra que a julgue parte ilegitima na acco executiva, com a consequente extingao da instancia Contra-alegou a Exequente propugnando para que seja negado provimento ao recurso e se mantenha a decisdo impugnada. © recurso foi recebido como de apelacdo com efeito devolutivo. Foram colhidos os vistos legais. Cumpre apreciar e decidir. I-A Embargante/Apelante funda o seu recurso nas seguintes conclusées: 1° - Nos precisos termos da oposigao oportunamente deduzida, no que a questao da legitimidade diz respeito, a aqui recorrente alegou, além do mais, nao ter subscrito contrato de mutuo dado & execugdo, desconhecer a veracidade das declaragées nele constantes e das assinaturas nele apostas. 2° - Independentemente disso, diz ter adquirido o imével hipotecado em data anterior a constituigao da divida, sendo que a data de tal aquisigao a sociedade vendedora F..., Ld*. nada devia a exequente C..., razao pela qual o registo de hipoteca feito anteriormente nao Ihe aproveita. 3° - Por fim, embora admita desvios 4 regra geral no que se refere a determinagdo da legitimidade passiva na agdo executiva, considera que no caso em aprego a executada/oponente é parte ilegitima porquanto a devedora ja nao era proprietaria do imével a data da constituigao da divida, sendo que no tinha legitimidade para dar o referido imével de garantia. 4° - Adouta sentenga proferida desconsidera a invocada falta de informag&o sobre o contrato de mutuo celebrado em 28/04/2008, bem como a veracidade das assinaturas dele contantes. Entende que a hipoteca anteriormente constituida se mantem como garantia das obrigagdes assumidas (e logo, como garantia do cumprimento desse novo contrato). Por fim, considera o titulo exequivel. 5° - Todavia, considera a executada/oponente, salvo melhor entendimento, que o tribunal “a quo" laborou em erro, nao fazendo uma correta interpretagdo dos factos nem uma adequada aplicagao do direito. 6° - Pelo que, impde-se revogar a douta sentenga proferida e substitui-la por outra que julgue a executada L..., Ld®, parte ilegitima na aco executiva e, por decorréncia, ordenar a extingdo da instancia executiva. 7° - Na verdade, debrugando-se sobre as questées suscitadas, a douta sentenga proferida, considera que "a hipoteca anteriormente constituida se mantinha como garantia das obrigagdes (e logo como garantia desse novo contrato)." 8° - Acontece que no modesto entender da recorrente, esta interpretagdo dos factos e aplicagao do direito nao se coaduna com a efetiva realizagao da justica e viola, entre outros principios, o da seguranga juridica e da protecao da confianga dos cidados, que so a concretiza¢ao do principio do Estado de Direito, que se encontra expressamente consagrado no artigo 2° da Constituigdo da Reptiblica Portuguesa. 9° - No caso em aprego, 0 titulo que serve de base a presente execugdo e que determina os limites e os fins da agdo executiva, foi celebrado em data posterior a data da aquisi¢do do imével por parte da executada, sendo que nele consta que a mutuaria presta garantia através do imovel propriedade da ora executada. 10° - Ou seja, a escritura de mUtuo com hipoteca constituida pela sociedade F..., Ld. a favor da exequente C..., SA. é nulae de nenhum efeito em relagdo a aqui executada, pois a mutuaria nao detinha, nessa data, nem a posse, nem a propriedade do imével em questao. 11° - Assim, sendo a divida constituida em momento posterior & aquisigao do imével por parte da executada, nao pode tal divida ser garantida pela hipoteca constituida anteriormente, sem qualquer intervengdo da nova proprietaria. 12°- De resto, embora 0 registo da hipoteca a favor da exequente tenha precedido o registo da aquisigao a favor da executada, a verdade é que aquela sabia que esta tinha adquirido o imével alguns anos antes e que nessa altura nada Ihe era devido, ou seja, a hipoteca nada garantia 13° - Portanto, sabendo a exequente da existéncia do negécio entre a executada L..., Lda e a mutuaria F..., Ld*, ao efetuar o contrato de mutuo com hipoteca, nao registada, nessa data, com esta, sem intervengdo da verdadeira proprietaria, conformou-se com o mesmo, e nesta medida aceitou a ineficacia da garantia alegadamente dada pela mutuaria. 14° - Assim, na perspetiva da executada, nao figurando esta como interveniente no contrato de mutuo que serve de titulo executivo a presente execug&o, nem se verificando 0 desvio a regra plasmada no artigo 56° do C.P.C., estamos em presenga da excegao da ilegitimidade da executada, facto que devia ter sido acolhido pela douta sentenga, 15° - Ao decidir de modo diferente, a douta sentenga proferida violou, além do mais, 0 disposto no artigo 2° da Constituigao da Republica Portuguesa e artigo 56° do Cédigo de Processo Civil. Ill.- Por sua vez, a Exequente conclui assim: 1. Arecorrida é titular de um direito real de garantia (hipoteca) e, nessa condigao, assiste-Ihe 0 direito de sequela, se a coisa for alienada a terceiro pelo seu proprietario, independentemente da transmissao da propriedade. 2. O direito de sequela segue a coisa, persegue-a, acompanha- a, podendo fazer-se valer seja qual for a situagao em que a coisa se encontre. 3. Sao proibidos tanto o pacto comissério (art. 694° CC) como a clausula de inalienabilidade dos bens hipotecados (art. 695°). Se 0 obrigado hipotecario alienar o bem dado de hipoteca em data posterior ao registo desta, este ato é inoponivel ao credor. 4. O credor pode executar a coisa hipotecada no patriménio do adquirente. 5. Este regime substantivo, consagrado no art. 818° do CC, esta devidamente consagrado na lei processual civil, artigo 54°. n°. 2 (anterior art. 56°. n°. 2) 6. Nos termos do n°. 2 do citado artigo 54°. do CPC., quando os bens dados em garantia pertengam a terceiro, o exequente pode fazer logo valer a sua garantia contra este. 7. Nao ocorre pois, a ilegitimidade passiva da recorrente, E sim parte legitima na execugao. 8. Aquantia exequenda esta efetivamente em divida e é liquida. 9. Na verdade existe divida desde 1997 que foi garantida por hipoteca de imével em 2001, que a data pertencia a devedora, mas, cuja propriedade foi transmitida em 2005 para a aqui apelante, com os énus da hipoteca que sobre si impendia e que continua a garantir a divida emergente do Contrato de Mutuo dado a execugdo, celebrado em 2008, para restruturagao das dividas existentes. 10. O titulo dado 4 execugao constitui titulo executivo nos termos do artigo 703°., n°. 1, alinea b) do CPC e artigo 46' alinea b) do anterior cédigo. IV.- Como resulta do disposto nos artos. 608°., n°. 2, ex vi do art. 663°., n°. 2; 635°., n°. 4; 639°., nos. 1a 3; 641°., n°. 2, alinea b), todos do Cédigo de Processo Civil (C.P.C.), sem prejuizo do conhecimento das questées de que deva conhecer- se ex officio, este Tribunal sé podera conhecer das que constem nas conclusées que, assim, definem e delimitam 0 objecto do recurso, Deste modo, e tendo em consideragao as conclusées acima transcritas cumpre reapreciar a questo da ilegitimidade passiva da Apelante na acco executiva. B) FUNDAMENTAGAO V.- Com base nos documentos juntos aos autos, o Tribunal a quo considerou provados os seguintes factos, que relevam para © conhecimento do presente recurso: 1.- Pelo escrito constante de folhas 6 a 11 dos autos de execugao n.° 356/13.5TBFAF, de que os presentes embargos s&o apenso, a Embargada/Exequente “C..., S.A.” e a sociedade comercial “F..., Ld.*", celebraram um contrato que titularam de “Mutuo”, pelo qual a primeira se obrigou a disponibilizar & segunda, 0 montante de € 200.000,00 (duzentos mil euros), destinando-se “o empréstimo a liquidagaio de responsabilidades contraidas” pela “Cliente” (a referida “F..., Ld.*”), junto da C.... 2.- Nos termos do ponto 7 do mesmo contrato “Os fundos sao entregues, na data da perfeigao do contrato, por crédito na conta de depdsitos a ordem adiante indicada”. 3.- De acordo com o ponto 26.1, “O presente contrato considera- se perfeito quando contiver as assinaturas de todos os CONTRATANTES’, 0 que se veio a verificar em 08 de Maio de 2008, data do reconhecimento das assinaturas (posto que nao consta dos autos qualquer dos demais elementos que permitam, segundo 0 contrato, determiné-la). 4,.- No capitulo 21 sob 0 titulo de “GARANTIAS”, para além do aval, consta ainda, sob 0 ponto 21.2: “HIPOTECA GENERICA QUE GARANTE O EMPRESTIMO: Todas e quaisquer quantias que sejam ou venham a ser devidas a C... pela CLIENTE no. Ambito do contrato de empréstimo, quer a titulo de capital, quer de juros, remuneratdrios ou moratérios, comissdes, despesas ou quaisquer outros encargos ficam garantidos pela Hipoteca do prédio urbano, composto de um armazém e logradouro, situado na Rua..., freguesia e concelho de Fafe, descrito na Conservatéria do Registo Predial desse concelho sob 0 numero... inscrito na matriz predial urbana sob 0 artigo ..., constituida para garantia de todas as responsabilidades assumidas ou a assumir pela CLIENTE até ao montante de capital de 224.459,06 euros (...), juros e despesas, celebrada por escritura datada de 21/02/2002, no Notéario Privativo da C. S.A., no Porto”. 5.- No registo do prédio acima identificado foi, com data de 25/09/2001, inscrita uma “Hipoteca Voluntaria”, a favor da Exequente “C..., S.A.”, “Para garantia de quaisquer responsabilidades ou obrigages pecuniarias decorrentes de qualquer operagées bancarias assumidas ou a assumir, em conjunto ou em separado, nomeadamente mtituos, aberturas de crédito de qualquer natureza, descobertos em conta a ordem, letras, livrangas, cheques, extracto de factura, warrants, garantias bancarias, fiangas, avales e empréstimos obrigacionistas, qualquer que seja a forma que revistam 6.- Ainda nos termos do mesmo registo, o montante do crédito garantido era de € 224.459,05 de capital, o “juro anual a taxa de 11,45% acrescido de 4% na mora, a titulo de clausula penal”, e ainda de “despesas” € 8.978,36, sendo o “MONTANTE MAXIMO ASSEGURADO” de “337.474,19 Euros”. 7.- Com data de 28/09/2005 foi registada a aquisigao da propriedade sobre aquele imével a favor da ora Apelante “L..., S.A.”. 8.- A altura da celebracdo do contrato acima referido em 1.a sociedade “F..., Ld.*” tinha como sécios-gerentes J... e J..., que outorgaram o mesmo contrato também como fiadores. 9.- Aquela data a ora Apelante tinha como administradores os acima referidos J... e J..., e ainda E.... 10.- A sociedade Ld.*” foi declarada insolvente em 28 de Janeiro de 2010, e a aqui Exequente “C...” reclamou no processo de insolvéncia um crédito no valor de € 127.778,84 relativo ao contrato referido em 1., crédito que Ihe foi verificado e graduado, mas nao recebeu qualquer quantia por conta dele. VI. Sendo apodictico que o direito de execugdo pode incidir sobre bens de terceiro quando estejam vinculados a garantia do crédito, nos termos do disposto no art.° 818.°, do Codigo Civil (C.C.), sendo, pois, reconhecida a legitimidade passiva para a execugao ao proprietario desses bens quando o credor pretenda fazer valer na execugao o direito real de garantia, de acordo com © que dispée 0 art.° 54.°, n.° 2, do C.P.C. vigente e dispunha o n.° 2 do art.° 56.° do anterior C.P.C. (com a redacgao que lhe deu o Dec.-Lei n.° 180/96, de 25/09) a decisdo sobre a legitimidade da Apelante impée que previamente se decida se a hipoteca constituida antes da sua aquisigao do prédio onerado abrange ou néo a divida resultante do incumprimento do contrato de mutuo acima referido em 1., celebrado cerca de dois anos e oito meses depois do registo daquela aquisigao. Ahipoteca é uma garantia real que confere ao credor 0 direito de se pagar do seu crédito pelo valor de certos bens com preferéncia sobre os demais credores do devedor. Se anteriormente foi motivo de acesa discussdo, 0 C.C. pés-lhe termo, permitindo, de forma expressa, que se constitua uma hipoteca para garantia de uma obrigagdo futura ou condicional — cfr. n.° 2 do art.° 686.°. Passou, pois, a ser possivel constituir uma hipoteca para garantia de dividas futuras, mas, pela imposigdo decorrente do art.° 280.°, n.° 1 do mesmo Cad., do contrato tem de constar um critério objectivo para a determinagdo da prestagdo garantida ou a garantir. Ahipoteca é um direito acessério do crédito que assegura e, por isso, 0 crédito garantido tem de estar mencionado no registo (que, na hipoteca, tem caracter constitutivo). Com efeito, 0 art.° 96.° do Cédigo de Registo Predial (C.R.P.) determina que o extracto da inscrigao da hipoteca deva conter: 0 fundamento da hipoteca, o crédito e seus acessdrios e 0 montante maximo assegurado (tratando-se de hipoteca de fabrica, cfr. a alinea b) do n.° 1), e se o capital vencer juros, caso a taxa convencionada nao venha mencionada nos documentos apresentados, menciona-se na inscrig&o a taxa legal — cfr. n.° 2. Da imposigdo legal de que fique a constar do registo o fundamento da hipoteca decorre a impossibilidade, mesmo havendo convengao nesse sentido, de a hipoteca originaria se estender a um crédito constituido posteriormente entre o mesmo credor e o mesmo devedor. Este novo crédito so ficara garantido com 0 registo de uma nova hipoteca — é 0 que resulta dos principios da acessoriedade e da especialidade. Hipotese diferente é a da transmissao da hipoteca para garantia de um crédito pertencente a outro credor do mesmo devedor ou para outro credor com garantia hipotecaria sobre os mesmos bens, observando-se o disposto nos art.os 727.° a 729.°, do CC. Ainda decorrentemente da acessoriedade, extinto 0 crédito a que serve de garantia, a hipoteca também se extingue, nos termos da alinea a) do art.° 730.°, do C.C., 0 que nao significa, porém, o cancelamento automatico do registo, que sé é feito contra a apresentagao de documento auténtico ou autenticado do qual conste o consentimento do credor, nos termos do art.° 56.°, do C.R.P., ou entéo com base numa decisao judicial que o imponha. Ainda diferentemente do que acima se deixou referido, e com base na pratica corrente bancaria vem sendo admitida a designada “hipoteca global”, figura paralela a “fianga omnibus” que garante quaisquer dividas assumidas e a assumir pelo devedor, sem propriamente as concretizar — 0 Ac. da Rel. de Coimbra de 26/05/1998 considerou ser determinavel uma fianga “e conforme aos bons costumes e aos principios de ordem publica, ainda que nao esteja fixado um limite temporal, designada de “fianca para todas as responsabilidades”, para garantia “de todas e quaisquer obrigagdes pecuniarias decorrentes de mituos, aberturas de crédito de qualquer natureza, descobertos em contas a ordem, letras, livrangas, extractos de factura, warrants, garantias bancarias, fiangas, avales e empréstimos obrigacionistas, concedidos ou a conceder”, se os fiadores sao os sdcios-gerentes da sociedade mutudria, agindo, por um lado, como representantes da empresa, vinculando-a, e, por outro, em nome préprio como fiadores, podendo assim, perfeitamente controlar o nascimento das obrigacées afiancgadas” (Processo: 229/97 PR 15-97, Des. Pires da Rosa, in www.dgsi-pt). A‘hipoteca genérica”, designagao preferida por Maria Isabel Helbing Menéres Campos, é uma hipoteca voluntaria em que se convenciona que o devedor a constitui para todas e quaisquer dividas que tenha assumido ou venha a assumir com 0 credor, independentemente da sua causa, caracterizando-se, assim, “por garantir uma divida que nao esta determinada ab initio sendo apenas determinado o montante maximo que assegura’, podendo as obrigagées garantidas terem a mais variada natureza, e nao sendo o seu numero limitado, (in “Da Hipoteca Caracterizagao, Constituigaio e Efeitos” Almedina, Reimpressao, pags. 103-108). E, como decidiu a Rel. de Coimbra no Ac. de 6/09/2011, é de admitir a constituigao de uma hipoteca global ou “genérica” desde que “no contrato que Ihe deu origem conste um critério minimamente objectivo para determinagdo da prestagao garantida ou a garantir, nomeadamente quanto aos montantes limites dos créditos garantidos ou a garantir” (in C.J., ano XXXVI, Tomo IV/2011, pags. 13-14). Na situagdo sub judicio, estamos perante uma hipoteca voluntaria que, como resulta, quer da escritura ptiblica, quer do registo, a sociedade “F..., Ld.®” constituiu a favor da aqui Exequente sobre o prédio urbano ai identificado, “para seguranga” de “responsabilidades ou obrigagées pecuniarias assumidas ou a assumir”, nomeadamente “mutuos, aberturas de crédito de qualquer natureza, descobertos em conta a ordem...”, até ao montante maximo de € 337.474,19. Consta ainda do registo a taxa de juro — “11,45% ao ano, acrescido de 4% em caso de mora, a titulo de clausula penal”, e ainda o montante de “€ 8.978,36 de despesas”. E foi com 0 conhecimento e aceitagao da existéncia deste 6nus que a Apelante comprou aquela “F..., Ld.*" o prédio hipotecado. O devedor, dono do prédio hipotecado, pode livremente vendé- lo, sendo até nula a convengo que proiba a venda — cfr. art.? 695.°, do C.C. — mas 0 6nus mantém-se e 0 direito de sequela permite ao credor executar o seu crédito demandando o adquirente. Este sempre poderé libertar do onus o prédio que adquiriu expurgando a hipoteca, nos termos e pelos modos definidos nos art.os 721.° a 726.°, do C.C. - mas a Apelante nunca o fez. No contrato de mutuo em mérito a mutuaria “F..., Ld.*” nao presta qualquer garantia a aqui Exequente. Essa garantia ja existia porquanto uma das origens das “responsabilidades ou obrigagdes pecuniarias”, também as futuras, abrangidas pela hipoteca é, precisamente, o mtituo, e a referéncia a ela como garantia da quantia mutuada destina-se, desde logo, a deixar inequivoco que a obrigagdo da mutuaria contraida por aquele mituo estava incluida na garantia da hipoteca. E apenas isto o que resulta do escrito a que acima se fez referéncia em V., 1., que no é acto constitutivo de qualquer hipoteca. Acredora C... nao renunciou a hipoteca constituida em 2001 -a rentincia, como forma de extingao da hipoteca, tinha de ser expressa e com observancia das formalidades prescritas no art. 731.° do C.C. — e nem ela se extinguiu por se nao haver verificado qualquer outra das causas de extingao legalmente previstas - cfr. art.° 730.°, do C.C. E ainda que, como ficou contratualmente estabelecido, a quantia mutuada se destinasse a “liquidagao das responsabilidades contraidas” pela mutuaria “F..., Ld.?” junto da mutuante, ora Exequente, “C...”, 0 que legitimaria considerar estarmos perante a novagao, como causa extintiva das anteriores obrigagoes — cfr. artos. 857.° a 861.°, do C.C. — 0 certo 6 que o mutuo integrado nas operagées bancarias que se desenvolviam entre aquela “F...,Ld.?”" ea “C...” esta expressamente previsto como fonte das obrigag6es cobertas pela hipoteca. Destarte, porque nunca se extinguiu, a hipoteca em mérito mantém-se valida e eficaz como garantia dos créditos com origem numa das operagées bancérias ali expressamente enumeradas. E essa garantia nao esta dependente do consentimento do adquirente do prédio onerado, ainda que o acto de onde emerge a obrigagdo tenha sido celebrado em data posterior a do registo de aquisigao, desde que a hipoteca abranja, como abrangia, esse acto futuro e tenha sido registada (como o foi) em data anterior a do registo de aquisigao (se bem que na situagdo sub judicio, sendo os outorgantes do contrato de mutuo simultaneamente titulares dos érgdos de gest4o da mutuaria “F..., Ld." (sdcios-gerentes) e da proprietaria, ora Apelante (administradores), por certo que “a metade” que geria aquela ndo se tera esquecido de avisar a “metade” que administrava esta do acto que tinha praticado se o considerasse ilegitimamente lesivo do patriménio da Administrada). Assim sendo resta concluir pela legitimidade da Apelante para a acgao executiva, destarte improcedendo os fundamentos do recurso. Posto que estamos perante direitos privados de natureza disponivel, exercidos, ao que tudo indica, com plena liberdade e consciéncia, nado se vé como e em qué a douta decisao impugnada (e este acérdao que a confirma), possa ofender o art.° 2.° da Constituigdo. C) DECISAO Nos termos que acima se deixam expostos, acordam os Juizes desta Relacao em julgar totalmente improcedente o presente recurso de apelagdo, confirmando a decisdo recorrida. Custas pela Apelante. Guimaraes, 29/09/2014 Fernando Fernandes Freitas Maria Purificagdo Carvalho Espinheira Baltar

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