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Processo: 94/14.1T8LRA.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MARIA TERESA ALBUQUERQUE
Descritores: INCAPACIDADE ACIDENTAL
ÓNUS DA PROVA
ANULAÇÃO DO ACTO
VÍCIO DE FORMA DA DECLARAÇÃO
NULIDADE
ROGADO
Data do Acordão: 22-10-2019
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA – J.C. CÍVEL DE LEIRIA – JUIZ 3
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTºS 257º E 947º DO C. CIVIL; 41º, Nº 2, 70º, Nº 1, ALS. C) E E), E Nº 2, E 154º DO CÓD.
NOTARIADO
Sumário: I - Não incumbe ao A. fazer prova inequívoca de que a doadora no
momento da celebração da doação não se encontrava na plenitude
das suas faculdades intelectuais, mentais e cognitivas que lhe
permitissem entender o sentido da sua declaração negocial, mas
apenas demonstrar ser altamente provável que assim tivesse sido,
visto que a prova stricto sensu se basta com essa alta probabilidade.
II - Na incapacidade acidental há declaração e há vontade, mas esta
apresenta-se, no momento da prática do acto, viciada por
insuficiente esclarecimento e liberdade.
III - Tendo-se provado que a doadora, no dia e hora da doação, não
tinha o discernimento e a vontade suficientes para proceder à
doação em causa, e tendo-se provado, igualmente, que essa falta de
discernimento e vontade eram notórias, impunha-se, à luz do art
257º C. Civil, a anulação de tal doação.
IV - Mas a doação em causa, alem de anulável, mostra-se também
nula por sofrer de vício de forma, na medida em que tendo sido
realizada por documento particular, este carecia, por razões de
forma (cfr. art 947º CC, na redacção do DL 116/2008, de 4/7, e arts
22º e 24º desse DL), e de conteúdo (arts 373º/1, 3 e 4 CC, visto que a
doadora não podia assinar e não sabia ler), de ser autenticado e se
verifica que o termo de autenticação se mostra ele próprio nulo.
V - Com efeito, na sua segunda folha, e na 1ª linha desta, está
rasurada uma data, não tendo tal rasura obedecido ao disposto no
nº 2 do art 41º CN, o que, nos termos da al c) do nº 1 do art 70º e nº
2 desta norma, implica a nulidade do acto notarial em causa.
VI - Por outro lado, não foi ressalvado todo o texto entrelinhado
que se encontra entre a expressão «Este termo foi lido e explicado o
seu conteúdo aos outorgantes» e as assinaturas, o que implica que
todo esse texto se tenha por não escrito, e que, consequentemente,
não conste do termo de autenticação o nome completo, a
naturalidade, o estado e a residência do rogado, e tão pouco, e mais
relevantemente, a menção de que o rogante confirmou o rogo no
acto da autenticação, tudo em desarmonia com os arts 152º e 154º
do CN.
VII - A não confirmação, perante o notário, da assinatura a rogo,
acarreta a sua invalidade e, por acréscimo - já que ela é elemento
integrante essencial e formalidade ad substantiam do documento
particular onde consta - a nulidade da declaração negocial neste
ínsita — art°s 373º, n°s 1 e 4, 220º e 286º do C. Civil e 154° do C.
Notariado, outra não podendo ser a conclusão perante a
importância que no acto em causa o rogante desempenha.
VIII - Ao rogado deve atribuir-se uma posição idêntica à do
rogante/outorgante, na medida em que, por definição, a assinatura
daquele é destinada a suprir a falta da assinatura deste, pelo que é
natural que a falta de assinatura do primeiro tenha o mesmo efeito
do da segunda, devendo assim entender-se, nos termos da alínea e)
do nº 1 do artigo 70º do CN, que a falta de assinatura do rogado no
termo de autenticação é causa de nulidade do mesmo.
IX - É causa de nulidade do acto notarial a circunstância da rogada
ser funcionária do solicitador autenticador do acto, pois se, nos
termos do nº 2 do art 71º do CN, a incapacidade ou a inabilidade
dos intervenientes acidentais determina a nulidade do acto notarial
- sendo que é causa de incapacidade ou inabilidade relativamente a
«abonadores, intérpretes, peritos, tradutores, leitores ou testemunhas»
a circunstância de, nos termos da al d) do art 68º do CN,
corresponder nessas pessoas a qualidade de funcionários em
exercício no cartório notarial - ter-se-á de concluir, por maioria de
razão, que será causa de nulidade do acto notarial a circunstância
da rogada ser funcionária do solicitador autenticador do acto.