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Acórdãos TRL Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa

Processo: 34/12.2TBFC-A.L1-1
Relator: PEDRO BRIGHTON
Descritores: EXECUÇÃO
EXTINÇÃO
AGENTE DE EXECUÇÃO
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 20-06-2017
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: Não estando atribuída qualquer competência para declarar a extinção da
execução, quer à secretaria, quer ao juiz, cabe residualmente ao agente
de execução, por força do disposto no artº 719º nº 1 do Código de
Processo Civil, a decisão da extinção, atribuição essa que resulta, ainda,
do disposto no artº 849º nº 3 do Código de Processo Civil.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral:

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA :

I – Relatório
1- O exequente “Banco ... Mais, S.A.” instaurou acção executiva para pagamento de quantia certa
contra Ângelo Miguel ... ..., Jorge ... ... ... e Maria da Conceição ... ... ....
2- Foi nomeado Agente de Execução.
3- Em 24/11/2015 o exequente juntou aos autos um requerimento no qual refere que “continua a
aguardar que o Solicitador de Execução lhe dê nota da efectivação da penhora, logo requerida no
requerimento inicial, e pela qual o ora requerente, junto do dito Solicitador insistiu aos 11 de Março
de 2015, nos bens que guarnecem a residência dos executados, pelo que assim requer a V. Exa. a
notificação do dito Solicitador de Execução para que o mesmo, em prazo não superior a 45 dias,
leve a efeito a referida penhora e comunique nos autos a efectivação da mesma ou o motivo ou
razão da respectiva frustração, se for o caso, para que o exequente, ora requerente, possa nos autos
vir a requerer de conformidade”.
4- Em 26/11/2015 foi proferido despacho a ordenar a notificação do Agente de Execução,
concedendo-se-lhe um prazo de 30 dias para finalizar as buscas de bens penhoráveis, e “decorrido o
aludido prazo de trinta (30) dias, não havendo novos bens e não se mostrando a execução extinta,
será o Sr. Agente de Execução condenado na multa processual de 2 UC’s, por violação do dever de
cooperação com o Tribunal (artigo 417º nºs. 1 e 2 do C.P. Civil), sem prejuízo da sequente
comunicação à CAAJ”.
5- Em 23/12/2015 o Agente de Execução dirigiu aos autos um requerimento onde dá conta das
diligências que efectuou com vista a apurar bens penhoráveis.
6- Em 1/3/2016 foi proferido o seguinte despacho :
“Fls. 140 a 153:
Transcorridos os autos, e não obstante o determinado no despacho que antecede (ref. 41615510)
verifica-se, na verdade, que não se encontra penhorado qualquer bem, nem há novos bens que
possam ser penhorados. Contudo, o Sr. Agente de Execução não comunicou a extinção da presente
execução, apenas tenta eternizar a concreta execução, lançando, para tanto, mão de comunicação
electrónica para tal efeito, que mais não é do que pesquisas reiteradas e sucessivas ou dando aos
autos informações vagas e contraditórias da realização de actos processuais em curso ou
pendentes.
Apreciando.
As “decisões dos tribunais são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e
prevalecem sobre as de quaisquer outras autoridades” (artigo 205º, nº 2 da CRP).
O Sr. Agente de Execução foi notificado, com a expressa advertência de condenação em multa
processual, para vir comunicar a extinção da instância executiva, o que não fez (!).
Deste modo, e face ao exposto, condena-se o Sr. Agente de Execução na multa processual de 2
UC’s, por violação do dever de cooperação para com o Tribunal, ao abrigo do disposto nos artigos
417º, nºs 1 e 2 do C.P.Civil e 27º, nº 1 do RCP.
Por fim, e por ofício por mim assinado, comunique tal comportamento à CAAJ (criada pela Lei nº
77/2013, de 21 de Novembro), com cópias de todos os despachos proferidos para os efeitos tidos
por convenientes.
*
Transcorridos os autos, constata-se que não se encontra qualquer bem penhorado.
Estabelece o artigo 750º, nºs 1 e 2 do C.P.Civil, que se não forem encontrados bens penhoráveis no
prazo de três meses a contar da notificação prevista no nº 1 do artigo 748º, o agente de execução
notifica o exequente para especificar quais os bens que pretende ver penhorados na execução;
simultaneamente, é notificado o executado para indicar bens à penhora, com a cominação de que
a omissão ou a falsa declaração importa a sua sujeição a sanção pecuniária compulsória (…). Se
nem o exequente nem o executado indicarem bens penhoráveis no prazo de 10 dias, extingue-se
sem mais a execução.
Pretendeu-se, assim, fixar um prazo improrrogável de três meses para a identificação e penhora de
bens, sob pena de extinção da execução. O que se não tem por tolerável é que as execuções – como
é o caso dos presentes autos – se arrastem durante anos, em verdadeiras “expedições de pesca”,
sem que seja concretamente identificado/penhorado qualquer bem, sobrevivendo o processo
“informaticamente” à custa de periódicas informações de “pesquisa de bens” ou similar, o que é
defeso por Lei, porquanto são realizadas para além do indicado prazo. A adopção desta conduta
constitui, cremos, uma verdadeira e gritante fraude à Lei, com o sequente avolumar de pendências
processuais dos Tribunais com acções executivas inviáveis. Face ao exposto, e sem necessidade de
maiores considerandos, declaro extinta a presente execução, ao abrigo do disposto no artigo 750º,
nº 2, ex vi do artigo 849º, nºs 1, alínea c), 2 e 3, ambos do C.P.Civil.
Considerando que tal circunstância resulta de facto imputável ao executado, condeno o mesmo no
pagamento das custas, nos termos do artigo 536º, nº 3, 2ª parte, do C.P.Civil.
*
Proceda a secção ao cumprimento do disposto nos nºs 2 e 3 do artigo 849º do C.P.Civil.
Registe e notifique”.
7- Inconformado com tal decisão, dela recorreu o exequente, para tanto apresentando a sua
alegação com as seguintes conclusões :
“Em conclusão, portanto, por violação do disposto no artigo 2º, nº 1, do disposto no artigo 754º nº
1, alínea a), e igualmente por violação do disposto nos nºs 1 e 5 do artigo 281º e dos artigos 750º
nº 2 e 849º, nºs 1, alínea c), 2 e 3, todos do Código de Processo Civil, deve, atento o que dos autos
consta, o presente recurso ser julgado procedente e provado e, em consequência, revogar-se a
sentença recorrida substituindo-se a mesma por Acórdão que, ordene o normal e regular
prosseguimento da execução, desta forma se fazendo correcta e exacta interpretação e aplicação
da lei, se fazendo, em suma, Justiça”.
8- Não foram apresentadas contra-alegações.
***

II – Fundamentação
a) Os factos relevantes para a decisão do presente recurso são os que estão enunciados no supra
elaborado relatório, pelo que, por razões de economia processual, nos dispensamos de os reproduzir
aqui.
b) Como resulta do disposto nos artºs. 635º nº 4 e 639º nº 1 do Código de Processo Civil, sem
prejuízo das questões de conhecimento oficioso, as conclusões das alegações dos recorrentes
servem para colocar as questões que devem ser conhecidas no recurso e assim delimitam o seu
âmbito.
Ora, perante as conclusões das alegações do recorrente a única questão em recurso consiste em
determinar se deverá manter-se a decisão que declarou a extinção da execução.
c) O artº 849º do Código de Processo Civil refere que há lugar à extinção da execução nas seguintes
situações :
-Logo que se efectue o depósito da quantia liquidada, nos termos do artº 847º do Código de
Processo Civil (al. a)).
-Depois de efetuada a liquidação e os pagamentos, pelo agente de execução, nos termos do
Regulamento das Custas Processuais, tanto no caso do artigo anterior como quando se mostre
satisfeita pelo pagamento coercivo a obrigação exequenda (al. b)).
-Nos casos referidos nos artºs. 748º nº 3, 750º nº 2, 799º nº 6 e 855º nº 4 do Código de Processo
Civil, por inutilidade superveniente da lide (al. c)).
-No caso referido no artº 779º nº 4, al. b) do Código de Processo Civil (al. d)).
-No caso referido no artº 794º nº 4 do Código de Processo Civil (al. e)).
-Quando ocorra outra causa de extinção da execução (al. f)).
É em face destas situações que se poderá declarar extinta a execução.
d) Apuradas as situações que determinam a extinção da execução, importa saber a quem compete
declarar a extinção da execução, se ao agente de execução ou ao Juiz.
Ora, o acima citado artº 849º do Código de Processo Civil no seu nº 2, a propósito da extinção da
instância, estipula que “A extinção é notificada ao exequente, ao executado, apenas nos casos em
que este já tenha sido pessoalmente citado, e aos credores reclamantes”, adiantando o seu nº 3 que
“a extinção da execução é comunicada, por via electrónica, ao Tribunal, sendo assegurado pelo
sistema informático o arquivo automático e electrónico do processo, sem necessidade de
intervenção judicial ou da secretaria”.
Como se refere no Acórdão da Relação de Évora de 11/9/2014 (consultado na “internet” em
www.dgsi.pt), dessas normas “resulta que o legislador quis reduzir ao mínimo imprescindível a
intervenção do juiz na acção executiva esclarecendo tal intenção na Exposição de Motivos da Lei
nº 41/2013 de 26/06 que aprovou o Novo CPC”.
Conforme se lê na apontada Exposição de Motivos : “Cuida-se da clara repartição de competências
entre o juiz, a secretaria e o agente de execução, estabelecendo-se que a este cabe efectuar todas as
diligências do processo executivo que não estejam atribuídas à secretaria ou sejam da competência
do juiz. É de esperar que, em definitivo, os intervenientes processuais assumam e observem a
repartição de competências fixadas na lei, por forma a evitar intervenções ou actos desnecessários,
gerando perdas de tempo numa tramitação que se quer célere e eficiente”.
“Como não podia deixar de ser, faz-se depender de decisão judicial os actos conexionados com o
princípio da reserva do juiz ou susceptíveis de afectar direitos fundamentais das partes ou de
terceiros. Assim, além de lhe competir proferir despacho liminar, quando este deva ter lugar, julgar
a oposição à execução ou à penhora, verificar e graduar créditos, decidir reclamações de actos e
impugnações de decisões do agente de execução, é exclusiva atribuição do juiz : (i) adequar o valor
da penhora de vencimento à situação económica e familiar do executado ; (ii) tutelar os interesses
do executado quando estiver e causa a sua habitação ; designar administrador para proceder à
gestão ordinária do estabelecimento comercial penhorado ; (iii) autorizar o fraccionamento do
prédio penhorado; (iv) aprovar as contas na execução para prestação de facto ; (v) autorizar a venda
antecipada de bens penhorados em caso de deterioração ou depreciação ou quando haja vantagem
na antecipação da venda ; (vi) decidir o levantamento da penhora em sede de oposição incidental
do exequente a esse levantamento, perante o agente de execução, na sequência de pedido de
herdeiro do devedor”.
Tais princípios vieram a ter consagração no artº 723º do Código de Processo Civil.
Por sua vez, a competência do agente de execução é residual, dado que lhe compete efectuar todas
as diligências do processo executivo que não estejam atribuídas à secretaria ou sejam da
competência do Juiz, incluindo nomeadamente, citações, notificações, publicações, consultas de
dados, penhoras e seus registos, liquidações e pagamentos e, mesmo após a extinção da instância, o
agente de execução deve assegurar a realização dos actos emergentes do processo que careçam da
sua intervenção (artº 719º nºs. 1 e 2 do Código de Processo Civil).
Resulta do exposto que, não estando atribuída qualquer competência para declarar a extinção da
execução, quer à secretaria, quer ao Juiz, cabe residualmente ao agente de execução, por força do
artº 719º nº 1 do Código de Processo Civil, a decisão da extinção, o que igualmente resulta do
disposto no artº 849º nº 3 do Código de Processo Civil (“A extinção da execução é comunicada, por
via electrónica, ao tribunal, sendo assegurado pelo sistema informático o arquivo automático e
electrónico do processo, sem necessidade de intervenção judicial ou da secretaria”).
Se a extinção da execução é comunicada por via electrónica ao Tribunal, sem necessidade de
intervenção judicial ou da secretaria, é óbvio que não cabe ao Tribunal declarar a extinção da
execução (neste sentido, cf. Acórdãos da Relação de Guimarães de 15/5/2014, e da Relação de
Évora de 11/9/2014, ambos consultados na “internet” em www.dgsi.pt).
e) Importa, assim, determinar se deverá manter-se a decisão que declarou a extinção da execução.
Do acabado de expor resulta que tal decisão não se poderá manter, tendo em conta que a
competência para a declaração da extinção da execução compete ao agente de execução e não ao
Juiz, sendo certo que não se verifica nenhum das situações acima apontadas que poderiam legitimar
tal intervenção judicial (cf. artº 723º nº 1, als. c) e d) do Código de Processo Civil).
Assim, impõe-se a revogação da decisão recorrida e o prosseguimento da execução.
f) Sumário :
Não estando atribuída qualquer competência para declarar a extinção da execução, quer à
secretaria, quer ao juiz, cabe residualmente ao agente de execução, por força do disposto no artº
719º nº 1 do Código de Processo Civil, a decisão da extinção, atribuição essa que resulta, ainda, do
disposto no artº 849º nº 3 do Código de Processo Civil.

***

III – Decisão
Pelo exposto decide-se conceder provimento ao recurso e, nessa medida, revoga-se a decisão
recorrida, determinando-se que a execução prossiga os seus termos.
Sem custas.

Processado em computador e revisto pelo relator


Lisboa, 20 de Junho de 2017

(Pedro Brighton)
(Teresa ... Henriques)

(Isabel Fonseca)
(Vencida porquanto manteria a decisão recorrida pelos fundamentos constantes da mesma)

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