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º 22/ CC /2020
Assunto: Documento particular( contrato de compra e venda) autenticado. Alegada falta de identificação do
comprador no termo de autenticação, o qual não tinha outorgado o contrato porque, sendo menor,
tinha sido representado pelos seus pais, que também outorgam o termo de autenticação –
Relatório
1. Mónica P...., advogada e ora recorrente, pediu online registo de aquisição do prédio descrito sob o nº
284/19881221 da freguesia de B…., concelho de F…., a favor de Ruben …. B…., solteiro, menor. Tal pedido, a
que coube a Ap. … de 2019/03/28, foi distribuído à Conservatória do Registo Predial de .....
1.1. Mediante menção do correspondente do código de depósito eletrónico, o pedido de registo foi
instruído com documento particular autenticado de contrato de compra e venda - cuja autenticação e depósito
(ambos com data da 21/03/2019) foram da autoria da apresentante -, bem como dos documentos que o instruíram.
O contrato de compra e venda foi outorgado por: Alexandre ….. B…., viúvo, vendedor e representante
legal (pai) do comprador, supra identificado; Susana M…., também representante legal (mãe) do dito comprador;
e, dando o consentimento «ao seu pai e sogro», Bruno ……. B….. e mulher, Carla R…., e Catarina B…., solteira,
maior.
O termo de autenticação foi outorgado pelos todos os indicados outorgantes do contrato.
1.2. A aquisição do indicado prédio encontra-se inscrita a favor do mencionado vendedor pela Ap…8 de
2015/08/07.
Encontram-se também em vigor uma inscrição de «2/3 de ÁGUA EXPLORADA», a favor de José B….
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(Ap… de 1915/03/31), uma inscrição de hipoteca voluntária, a favor do “Banco…, S.A.”( Ap. ..9 de 2015/08/07) e
uma inscrição de penhora, em que são exequentes S…. Augusto …. T… e Sérgio A….. T…., e executados
Alexandre ….. B…. e Rafael J…. ( pela Ap. …3 de 2018/12/20).
2. O registo foi recusado nos seguintes termos:
«Recusado: o menor comprador não foi identificado no termo de autenticação ( art.º 68º
e 69º, nº 2, 2.ª parte, CRP). Não fosse recusado, seria feito provisoriamente por dúvidas
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por não ter sido feita a advertência da ineficácia do ato ( art.º 174º, nº 2 Código Notariado
e 819º Código Civil).»
3. Daquela qualificação interpôs a apresentante o presente recurso (pela Ap. …56 de 2019/05/24), que
aqui damos por integralmente reproduzido e no qual, em síntese, se alega que:
- Num primeiro momento, o termo de autenticação não incluiu a identificação do comprador, mas o mesmo
foi posteriormente retificado pela requerente, que «elaborou “novo” termo de autenticação, no qual já consta a
identificação do menor comprador (…).Isto é retificou a primeira página e recolheu as assinaturas/rubricas da
mesma»), o qual juntou posteriormente ao pedido de registo mediante apresentação complementar;
- A deficiência que constituiu fundamento da recusa é inexistente, pois que se encontrava devidamente
sanada.
4. Em despacho proferido em cumprimento do disposto no art. 142º-A/1 do CRP, o senhor conservador
sustentou a decisão nos seguintes termos:
«(…)
Consultada a plataforma eletrónica para depósito dos documentos que baseiam os
pedidos de registo, constata-se que, efetivamente, a recorrente não depositou o
documento retificado que diz ter depositado, razão pela qual o presente recurso deve
ser indeferido.»
Questão prévia
1. Em sede de suprimento de deficiências a apresentante foi “alertada” para a necessidade de retificação
do termo de autenticação, por falta de indicação do “SEGUNDO (COMPRADOR)”.
A apresentante efetuou apresentação complementar, mencionando o mesmo Código do Depósito
Eletrónico relativo ao documento particular autenticado que havia apresentado com o pedido de registo, sem ter
prestado qualquer declaração complementar.
Confrontada com o fundamento da recusa, a apresentante veio em sede do presente recurso alegar que
“já” não se verifica a falta de identificação do comprador, porque procedeu á retificação do termo de autenticação
e que apresentou essa retificação mediante a referida apresentação complementar.
A recusa foi sustentada porque, consultado o documento a que respeita o código eletrónico (mencionado
no pedido de registo e na apresentação complementar), o mesmo correspondia exclusivamente à “versão” inicial.
2. Recebido o recurso no IRN, foi solicitada informação ao Helpdesk do SIRP «quanto à questão de saber
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se houve ou não alguma retificação ou alteração à autenticação e ao depósito eletrónico do documento em causa
que por algum motivo (técnico/tecnológico) não esteja ou não possa estar visível».
2.1. O referido helpdesk solicitou esclarecimento ao IGFEJ, que respondeu nos seguintes termos:
«Enviei um pedido de esclarecimento para a equipe do FileNet e obtivemos a resposta»: “Esse
documento não tem mais versões. O que leva a crer que foi usado sempre o mesmo documento particular
autenticado e que este não foi alterado”.
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2.3. Verificamos, por consulta entretanto efetuada, que sob o referido código constam depositados dois
documentos: um, de 21/03, relativo à 1ª versão do DPA e outro, de 28 de junho, relativo à 2ª versão do DPA,
correspondente ao teor resultante da “retificação” efetuada nos termos constantes do recurso.
3. Em face do exposto – nem a recorrente invoca qualquer constrangimento informático para o eventual
obstáculo à visualização do documento retificativo alegadamente depositado sob o mesmo código, nem o IGFEJ
logrou identificar esse eventual constrangimento - perece-nos poder intuir que terá havido lapso da apresentante
que, tendo procedido à “retificação”, se terá olvidado de proceder desde logo ao seu depósito [o qual veio a efetuar
muito mais tarde (28 de junho), já depois de haver interposto o recurso].
Temos, assim, que aquela “retificação” não pode aqui ser tida em conta1.
Resta, assim, saber se está em falta a referida falta de identificação do comprador e, em caso afirmativo,
qual a qualificação adequada.
Deliberação
1. Cabe dar por cumprido o disposto no art. 46º/1-c) 2 do Código do Notariado, aplicável aos termos de
autenticação de documentos particulares por força do determinado no art.151º/1 do mesmo diploma( «na parte
1 Apesar disso, não podemos deixar de chamar a atenção para a irregularidade no procedimento utilizado para o efeito (daí a
utilização das aspas) e que afastaria a possibilidade de lhe atribuir efeito retificativo: substituiu-se a primeira página do termo de autenticação
(com 20 linhas, para lá do cabeçalho, e sem identificação do comprador) por outra página (com 27 linhas, para lá do cabeçalho, já com
identificação do comprador) – ainda assim indevidamente numerada como “fls.62” em vez de “fls.61”, donde resultou uma numeração
repetida (“fls.62”) - que voltou a ser assinada, mantendo tudo o resto inalterado, inclusive a data.
Este Conselho já teve oportunidade de defender que o ato de autenticação pode ser retificado mediante novo termo de
autenticação ou por meio de averbamento (nos termos e condições previstao no art. 132º do Código do Notariado) – cfr. Pºs R.P. 259/2009
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2 Na parte em que institui como requisito comum do ato notarial a indicação do nome completo, estado, naturalidade e residência
habitual das pessoas singulares representadas pelos outorgantes.
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aplicável e com as devidas adaptações»), na situação em que, como a dos presentes autos - contrato de compra
e venda outorgado pelos representantes legais do comprador menor(concretamente por ambos os pais) -, em
que os termos utilizados permitem considerar que se remeteu para a identificação do representado que consta
do contrato objeto de autenticação3.
3 Na identificação dos outorgantes do termo de autenticação reproduziu-se exatamente o que consta do contrato, exceto na
parte em que se omitiu o “SEGUNDO (COMPRADOR”, precisamente porque este não outorgou o termo. Vejamos:
a) No contrato:
«CONTRATO DE COMPRA E VENDA
Entre
PRIMEIRO(VENDEDOR):
1) (…);
SEGUNDO(COMPRADOR):
1)(…);
TERCEIRO(AUTORIZANTES):
1)(…);
2)(…);
3)(…);
QUARTO (REPRESENTANTES LEGAIS):
1)(…);
2)(…), ambos na qualidade de representantes legais do segundo interveniente, melhor identificado na al. 1).»
b) No termo de autenticação:
«No dia 21 de Março de 2019, na cidade…, compareceram:
(…)».
Seguiu-se o mesmo texto supra, exceto, como referimos, a parte do “SEGUNDO (COMPRADOR)”.
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Perante a forma utilizada, embora pouco curial ou consentânea com o tipo de intervenção em causa, parece-nos que só uma
visão muito apegada à forma consente que se defenda que o termo de autenticação omite a identificação do representado dos outorgantes
“QUARTO (REPRESENTANTES LEGAIS)”.
4 Reproduzimos, com a devida adaptação, o ponto 2) da deliberação deste Conselho emitida no Pº R.P.46/2010 SJC-CT,
acessível no sítio da internet supra indicado, para cuja fundamentação remetemos e que aqui damos por reproduzida, o que traduz
discordância com a qualificação de provisoriedade por dúvidas incluída pelo senhor Conservador, a título subsidiário, no despacho de
qualificação.
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Em consonância com o exposto, propomos a procedência da presente impugnação.
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Processo R.P. 74/2019 STJSR-CC
Voto de vencido
Não concordo com a proposta de procedência do recurso, porquanto, para mim, em face da conjugação do
disposto nos artigos 46.º, n.º 1, alínea c) e 151.º, n.º 1, do Código do Notariado, a identificação dos outorgantes
em termo de autenticação de contrato de compra e venda celebrado pelos outorgantes em representação do filho
menor deve incluir a menção do exercício da representação legal e a identificação do menor representado.
Contudo, no meu entendimento, tal omissão não deveria constituir fundamento de recusa, antes de qualificação
provisória por dúvidas, na medida em que a falta não constitui vício de forma que possa ter como consequência a
nulidade formal do termo de autenticação (cfr. artigo 70.º, n.º 1, a contrario, do Código do Notariado), nem implica
falta de elementos para o registo, que posso determinar a recusa nos termos do disposto no artigo 69.º, n.º 2 do
CRP.
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