Você está na página 1de 40

A

PAIXÃO
DE
CRISTO
Os Mistérios da Fé

2020
ESCOLA MUNICIPAL LIVRE DE TEATRO DE ITAPEVI
Prólogo: Um de nós
(Se Jesus estivesse aqui, você o reconheceria?)

Espaço central. Céu aberto. Uma criança negra no centro do espaço. Espalhado pelo espaço, estão várias
pessoas, de todas as etnias, idades... Pobres, ricos, doentes, mendigos. Estão com roupas atuais. Algumas
pessoas passam apressadas e trombam nessas pessoas, que permanecem paralisadas... No decorrer do texto,
vemos que algumas seguram objetos iluminados, que se acendem aos poucos. As pessoas que estão
apressadas, aos poucos notam as luzes e celebram. Grande comemoração com dança, canto, onde todos
participam.
Aos poucos, pessoas com trajes do tempo de Jesus se misturam aos outros, em grande júbilo. Todos os locos
se acendem, onde vemos também as personagens contemporâneas a Jesus. Os últimos locos que acendem
são os palcos – Templo, Castelo, Ceia e vão se apagando um a um, até que apenas resta uma luz
(ribalta/contra) na Cruz. Num plano alto, anjos dançam e rejubilam a profecia, enquanto em meio ao povo um
coral canta o tema de abertura do espetáculo.
IDOSO – Buscamos incansavelmente um Deus inalcançável... Mas, e se ele já estivesse aqui? O que
diríamos diante dele? Se estivéssemos face a face com ele em toda a sua glória? O que perguntaríamos
se pudéssemos fazer uma só pergunta?

CRIANÇA - Se Deus tivesse um rosto... Como ele seria? E você gostaria de ver? Se ver significasse que
você teria que crer em coisas como o Céu, Jesus, os santos e todos os profetas, você acreditaria?

MENDIGO - E se Deus fosse um de nós? Apenas um desajustado como um de nós...


Apenas mais um estranho, tentando ir pra casa...

DOENTE - Apenas tentando ir pra casa, de volta para o Céu, sozinho.

SENHORA (DE SOBRETUDO) – E se Jesus já estivesse aqui, entre nós, escondido entre as pessoas
comuns, em meio à multidão... Você o veria?

MOÇO (DE SOBRETUDO) – Se ele estivesse na pele de um pobre, pedinte, você o olharia nos olhos?
Tocaria em suas vestes? O abraçaria e o chamaria de Mestre e Salvador?

MOÇO NEGRO ADULTO (DE SOBRETUDO) – E se ele fosse um negro, pobre e periférico,
absolutamente fora de todos os padrões, você o amaria ou desejaria secretamente sua morte?

TODOS – E se Jesus já estivesse aqui?

Início da música “One of Us – Orquestra, coro e povo”.

As pessoas de sobretudo tiram suas capas e se revelam anjos. Aos poucos, as luzes nas mãos de
algumas pessoas se acendem, e inicia-se uma grande sequência coreográfica e performática, onde
pessoas do passado e presente se misturam, na medida em que música e texto se desenvolvem.

CRIANÇA – Se Jesus já estivesse entre nós, neste exato momento, vendo tanta miséria, violência e
desamor... E se ele dissesse para acreditar que só o amor é a resposta... Alguém acreditaria nele?

ANJO NEGRO – Ou cometeriam os mesmos erros novamente?

ANJO MOÇO – Voltaremos mais uma vez ao passado, para que ao relembrar de tanto sofrimento,
causado pelo ódio, pela ganância e pelo desamor, nossos erros não sejam os mesmos, para que enfim
possamos olhar para o nosso irmão... e... ver Jesus nele.

1
ANJO SENHORA – Veremos Jesus e contemplaremos toda a sua sabedoria. Se atentem aos
ensinamentos do Mestre, e entendam que só o Amor é a resposta...

MARIA - (com as vestes típicas do tempo de Jesus (grávida, acaricia a barriga)) - E ele vêm porque Deus
amou o mundo de tal maneira que deu o seu único Filho, para que todo aquele que nele crê não pereça,
mas tenha a vida eterna. Deus enviará o seu Filho ao mundo, não para que condene o mundo, mas para
que o mundo seja salvo por ele.

POVO com as vestes típicas do tempo de Jesus (em coro) - E Ele vem para iluminar os que vivem nas
trevas e na sombra da morte, e dirigirá os nossos passos no caminho da luz e da paz. Eis que já vem o
cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo! (João 3:16-21)

No decorrer da fala do povo, todos se misturam numa grande celebração de alegria. (Performance de abertura).
Enquanto acontece a cena, desenrola-se uma grande performance com o povo e os anjos na parte baixa da cena.
Aos poucos os locos se apagam, enquanto vemos o loco da Santa Ceia, onde já está Jesus, acendendo os
candeeiros, enquanto Maria, Madalena e Rute preparam e distribuem os pratos e bebidas sobre a mesa.

2
OS MISTÉRIOS DA FÉ

Ato I – OS MISTÉRIOS DO PASSADO

#1 Última Ceia – Parte I


Maria, mãe de Jesus e Rute, a irmã de Jesus, preparam a mesa para celebração da Páscoa judaica. A mesa é
cercada de treze divãs para reclinar e almofadas, nela estão sendo colocados os elementos simbólicos da
Páscoa judaica: Zeroah (osso da perna de um cordeiro), Beytza (ovo cozido), Maror (ervas amargas), Haroset
(maça ralada, canela castanha e vinho), Karpas (salsa e aipo), Água salgada, Matzot (pão sem fermento) e
quatro taças para vinho.
CRISTO (a sua mãe) – É chegada a hora, minha mãe. Chegou o momento ao qual estive predestinado desde
antes de teu ventre.
MARIA – Irás embora, meu filho?
CRISTO – Tenho que ir, minha mãe. Antes, porém, farei saber a todos a verdade que vem de meu Pai.
MARIA – A verdade? Aquela que ensinas nos montes?
CRISTO – Esta noite será diferente de todas as outras... Acalme teu coração, mulher. Teremos ainda mais um
encontro, minha mãe, e lembrarás de minhas palavras.
MARIA – Já conheces teu próprio caminho, meu Filho. Cumpra-o e encontrará justificação diante de Deus. Dê
antes graças a Deus por estar vivo, meu anjo.
CRISTO – Darei.
Sala da Santa Ceia. Os apóstolos entram conversando. Jesus termina de acender o último candeeiro. Os
apóstolos parecem maravilhados pela beleza e fartura da recepção, pedem bênção à Maria, como à uma mãe e
se posicionam de pé ao redor de Jesus.
CRISTO – Meus irmãos, mais uma vez eu desejo compartilhar a Páscoa convosco! Compreendo que a minha
hora chegou, eu organizei esta ceia, e o amanhã pertence ao Pai. É a última vez que vamos comer juntos neste
mundo...
Reação dos apóstolos. Parecem confusos diante da tristeza e passividade do Mestre. Iniciam um burburinho
que logo é abafado pela voz do Mestre.
CRISTO - – Esta noite será diferente de todas as outras... Contarei aqui todos os mistérios do passado,
presente e futuro, para que quando estas coisas acontecerem, estejam preparados, e possam reconhecer os
sinais de que lhes disse a verdade desde o início, até o fim.
Ajoelha aos pés de Pedro com uma bacia d´água e um unguento nas mãos.
PEDRO – Rabi, o Senhor vai lavar os meus pés?
JESUS – O que eu faço, tu não sabes agora, mas saberás depois.
PEDRO – Nunca, de modo algum lavará os meus pés.
JESUS – Se eu não lavar os seus pés, não terás parte comigo.
PEDRO (exasperado) – Senhor! Então não lave somente os meus pés, mas também as mãos e a cabeça.
JESUS – Aquele que está lavado não necessita lavar todo o corpo, senão os pés, pois no mais está limpo.
Todos estão limpos. Todos, exceto um.
Ele começa a lavar os pés de Pedro e dos outros apóstolos e lhes passa o unguento em suas cabeças.
JESUS – Entendam o que faço. Me chamam Mestre e Senhor, e dizem bem, porque sou. Ora, se eu, Senhor e
Mestre, lhes lavei os pés, devem também lavar os pés uns aos outros. Porque eu lhes dou o exemplo, para
que, como eu lhes faço, façam vós também. Aquele que quer ser grande entre todos, que se torne como que
uma criança. Eu estou entre vós, dentro de cada um. E permanecerei assim até o final dos tempos. Pois meu
caminho foi anunciado muito antes de minha chegada (apaga o primeiro candeeiro). E eis aqui o primeiro
3
mistério, aqueles que me anunciaram e esperaram minha chegada, também vos ensinaram o caminho ao qual
seguir. E aquele que me anunciou e batizou, também teve seu caminho traçado em mistério antes mesmo de
seu nascimento, e assim como eu, também andou pelo caminho mais tortuoso e se curvou pela porta mais
estreita. Também foi perseguido, e sofreu na carne o peso de propagar a mensagem do Senhor...
Apaga-se o loco da Santa Ceia, permanecendo os candeeiros acesos, apenas. Ilumina-se o loco do batismo,
onde já podemos ver João Batista em seu ofício, junto à centenas de seguidores.

#1 Testemunho de João Batista


Luz a pino sobre João, que inicia em oração e segue com os batismos e ensinamentos.
João Batista, de aparência rústica, à beira do rio Jordão, batiza um grande número de fiéis que formam uma
aglomeração gigantesca diante dele.
JOÃO BATISTA – “Aquele que não nascer de novo, não verá o reino de Deus, aquele que não nascer da água
e do Espírito, não entrará no reino de Deus. O que é nascido da carne é carne, e o que é nascido do Espírito é
espírito. Não vos maravilhem por eu ter dito isso: É necessário nascer de novo.” João 3:5-8

JOÃO BATISTA (repete várias vezes, sempre que batiza alguém) – Eu vos batizo com água.

Em determinado momento, ele começa a pregar em voz alta. Alguns sacerdotes chegam a sua procura.
JOÃO BATISTA – Quem tiver duas túnicas, reparta com quem não tem, e quem tiver alimentos, faça da mesma
forma. Soldados, não tratem mal a ninguém, e se contentem com seus salários. Publicanos, não peçam mais
do que lhes foi pedido. O homem não pode receber coisa alguma, se não lhe for dada por Deus, que está nos
céus.
Os sacerdotes se aproximam mais. André e João Zebedeu demonstram certo temor.
Os fiéis de João Batista se perguntam e murmuram e um dos seus seguidores se destaca. André beira os
sacerdotes para interpelá-los.
ANDRÉ – Shalom. Vieram ouvir a respeito do Cristo?
SACERDOTE GAMALIEL – Este é o seu Messias, o filho de Deus?
ANDRÉ – Ele é um profeta de Deus. E prepara o povo para vinda do novo Rei.
SACERDOTE GAMALIEL – Diga-me: um profeta é maior do que um rei?
ANDRÉ – Um profeta fala por Deus. E um rei fala por seu reino.
SACERDOTE ZACARIAS – Então a quem devemos seguir? À este humilde buscador da verdade, ou a
Herodes?
ANDRÉ – Ele só diz o que Deus o manda dizer! Ele é apenas um servo do Senhor, não tem poder sobre suas
próprias palavras, pois elas vêm dos céus.
Um dos sacerdotes passa a pregar um sermão para atrair a atenção para si, começa uma pequena
movimentação, alguns fiéis vão para em torno dos sacerdotes, outros para trás de João Batista.
SACERDOTE GAMALIEL (em voz muito alta) – Assim diz o Senhor dos exércitos, o Deus de Israel: não se
enganem com os profetas que estão no meio de vós, nem com adivinhos, nem deem ouvidos aos seus sonhos,
porque eles profetizam falsamente em nome do Senhor.
João sobe em uma pedra.
JOÃO BATISTA (grita) – Raça de víboras, quem lhes ensinou a fugir da cólera que está por vir? Deveriam
produzir frutos de arrependimento sincero e não se iludirem dizendo que qualquer um pode ser o Messias, filho
de Abraão. Arrependei-vos! (Lucas 3: 7)
SACERDOTE GAMALIEL – Quem és tu?
SACERDOTE ZACARIAS – O Messias?

4
JOÃO BATISTA – Não, sou João, o Batista.
SACERDOTE ZACARIAS – Não tente nos enganar! Diga logo quem és! Temos que levar uma resposta para
aqueles que nos enviaram.
JOÃO BATISTA – Eu sou a voz que clama no deserto: “Aplanem o caminho para o Nosso Senhor passar!”
A multidão aclama-o.
SACERDOTE GAMALIEL – Não passas de um ignorante no deserto e julgas ter poder para guiar este povo?
JOÃO BATISTA – Conheço vossos corações, são hipócritas. Vieram aqui para saber o que penso sobre o seu
rei? Pois ouçam bem: Ele vive e reina em pecado, roubou a esposa do irmão e esse é um pecado pelo qual ele
terá que responder a Deus.
SACERDOTE GAMALIEL – Não precisamos ouvir mais nada. Acho que não nos veremos mais.
Os sacerdotes se entreolham e vão embora. João Batista volta a pregar em voz alta para todos. Jesus
aproxima-se no final da fila.
JOÃO BATISTA – Um cuja vinda foi anunciada desde a eternidade breve estará entre nós, maior que todos
nós. Este é aquele a respeito de quem falei. Aquele homem que vem depois de mim, cujas sandálias não sou
digno de levar. Ele passou na minha frente porque já existia antes mesmo que eu nascesse. Agora é
necessário que ele cresça, e que eu diminua.
João Zebedeu e André entreolham-se. João continua batizando os fiéis, em voz mais alta agora.
JOÃO BATISTA - Eu vos batizo com água e ele batizará com o Espírito e fogo. (Lucas 3: 16)
João Batista vê Jesus se aproximar. Visivelmente emocionado e feliz, João anuncia a chegada de Jesus.
JOÃO BATISTA – Eis o Cordeiro de Deus. Aquele que tira o pecado do mundo.
André e João Zebedeu cumprimentam Jesus de longe e O trazem a João Batista. João o abraça emocionado.
JOÃO BATISTA – Senhor, eu que careço de ser batizado por ti, e vens tu a mim?
JESUS – Por hora, convém cumprir tudo o que é certo.
João Batista colhe a água com as duas mãos em concha, levantando-a ao céu e depois deixando-a escorrer
sobre a cabeça de Jesus.
Neste momento um coro de bailarinos vestidos de anjos realizam uma coreografia em festejo, como a pomba
que desce dos céus e repousa sobre Jesus. Pausa. João se emociona muito ao ver os anjos dançando junto ao
Cristo.
JOÃO BATISTA – Eu vi o Espírito Santo descer do céu como uma pomba e repousar sobre ele. (Para todos) Eu
vi e dou testemunho de que este é o Messias (aponta-lhes Jesus).
Jesus vai para margem e João fica ainda um tempo. A multidão celebra.
JOÃO BATISTA – É chegado o meu tempo. Cumpri minha missão. Pertencem a Deus agora os mistérios que
rondam o meu caminho.
ANDRÉ – Onde moras, Rabi?
JESUS – Venham e verão.
JOÃO ZEBEDEU – Iremos contigo, Senhor, aonde quer que vás.
JESUS – Perdoem, nem eu próprio sei as rotas do meu caminho, apenas que devo ir, nada mais. Vós não sois
obrigados a me acompanhar, pois não vou para uma celebração. Vou para uma guerra!
Deus está dentro de nós. O demônio está fora de nós, pelo mundo em torno de nós. Pegaremos um machado e
cortaremos a garganta dele. Nós o combateremos aonde quer que ele esteja. Na doença, na riqueza, até no
templo. Quem vem comigo?
Multidão aclama.

5
Jesus sai com André e João Zebedeu. Ao passar pelo loco da Santa Ceia, já sem os apóstolos, para e apaga
uma vela do candeeiro. Em seguida se encaminha para o deserto.

#2 Quarenta Dias no Deserto

[JESUS – EM OFF, enquanto apaga mais um candeeiro]: Por isso me compadeço dos fracos, dos injustiçados
e dos perseguidos, pois quando estão fracos, é que verdadeiramente são fortes. Não pretendam vós agir
como Deus modificando a realidade em benefício próprio; adorar poderes e glórias humanas em lugar de
Deus; ou provocar e esperar infantilmente a intervenção milagrosa de Deus, pois assim mesmo o inimigo
os tentará quando estiverem fracos. E não estamos todos em meio ao deserto, em jejum?
Jesus, muito cansado, todo seu corpo arde como se estivesse a suar sangue. Por um longo tempo só, mantém-
se em espírito de oração. Levanta-se, mas por uma vertigem cai e se apoia no chão, composto de uma areia
movediça criada pelo corpo dos bailarinos, que se movem criando uma tempestade de areia em torno de Jesus.
A luz que incidia sobre Jesus escurece. Os dançarinos como obsessores gargalham.

Lúcifer surge em meio à tempestade. Aparenta ser um anjo casto e bom, usa vestes claras que iluminam o
caminho por onde passa.

LÚCIFER – Quarenta dias neste deserto esquecido por Deus... Sem comida ou água... E fraco, como estás,
irás morrer logo, Jesus. Então vim lhe fazer companhia, e lhe oferecer algum auxílio.
Entram um coro de pessoas trazendo algo que parece comida e uma jarra com água, feitos de areia colorida
(MIRAGEM), enquanto Jesus fala, eles desmancham os objetos, revelando seu material enquanto também
“desmancham” como areia ao chão.
JESUS – Não preciso de auxílio algum. E não morrerei enquanto não tiver cumprido a vontade do meu Pai.
Jesus caminha alguns passos com dificuldade, dando as costas ao demônio, mas este começa a segui-lo.
LÚCIFER – Seu Pai? E onde Ele está agora? Se és mesmo o Filho de Deus, porque Ele o deixa sofrer tanto?
JESUS – Pois acredite, eu sofreria muito mais que isso para espalhar o amor de Deus. Vim para que se
cumprisse a promessa de meu Pai, e pela palavra Dele salvar o mundo.
LÚCIFER – O mundo não precisa ser salvo, Jesus... O mundo não quer ser salvo... (Sorri) Olhe nos meus
olhos e veja a verdade. Se és mesmo o filho de Deus, mande que essas pedras se transformem em pães e
Deus ouvirá a tua voz, assim saciará tua fome. Ou peça a mim, e a produção de alimentos será muito grande
em toda Judeia. Saciará a fome de toda a nação. Eu prometo.
JESUS – Está escrito: Não só de pão viverá o homem, mas de toda palavra que procede da boca de Deus.
Lúcifer se recolhe, mas volta a cercá-lo.
LÚCIFER – Jesus, eu sei quem tu és. E tu sabes quem eu sou.... Bem sei quem são as pessoas a quem viestes
salvar. Mas antes, elas precisam crer, pois está escrito: “aos teus anjos ordenarás a seu respeito e assim o
guardarão... E eles o sustentarão em suas mãos, para que não tropeces em pedra alguma.” Acredite, Jesus...
Atire-se do alto do Templo, e quando as pessoas virem que os anjos o salvarão, elas acreditarão e saberão que
és o Filho de Deus.
JESUS – Tu dizes que está escrito que eu serei salvo.
LÚCIFER – E está!
JESUS – Mas também está escrito: “Não tentarás o senhor teu Deus!”
LÚCIFER – Jesus, poderias ter o que quiser... O país que quiser. Todos eles. Ter poder sobre Roma. Ou sobre
todo o mundo. Eu estou disposto a lhe dar todo o poder do mundo.
JESUS – Eu nunca quis um reino na Terra. O reino do céu é o suficiente.
Satanás recolhe-se outra vez e volta com toda sua potência.

6
LÚCIFER – Jesus, as pessoas deste mundo obedecem a minha voz. Una-se a mim. Juntos nós governaremos
até a vida e a morte. Tu darás e tirarás a vida. E eu me sentarei ao teu lado no dia do julgamento. Imagine
juntos como seremos fortes. Venha até mim, e fique ao meu lado. Não tenha medo. Tu és o Messias e mereces
ter tudo!
JESUS – Satanás, retire-se daqui. Está escrito: Ao Senhor, teu Deus, adorarás, e só a Ele, somente a Ele
servirá. Retire-se Satanás! Eu ordeno em nome de meu Pai!
Grande tempestade de areia formada coreograficamente. Lúcifer desaparece em meio à tempestade. A luz
volta a brilhar sobre Jesus, que aparenta total exaustão. Dois anjos em forma de crianças trazem água e frutas
à Jesus, enquanto outros oito anjos maiores tomam o deserto com dança de vitória e júbilo e trazem um
pergaminho e um machado. Jesus levanta-se.

#3 Chegada de Pilatos

Vê-se surgir um destacamento de soldados, à frente da tropa, armada de lanças, espadas e punhais, como se
fossem para a guerra; a cavalo, Pilatos. O comboio marcha ao compasso dos tambores dos generais de
Pilatos, que conduzem a escolta a voltear montadas em alardes de alta escola, exibindo o estandarte SPQR (o
Senado e o Povo de Roma). O comandante do exército romano anuncia ao som da trombeta. O Templo
também está iluminado.
LÚCIO GALBA – Saúdem o digníssimo governador da Judéia, o representante do grande César Tibério: o
general Pôncio Pilatos.
Herodes Antipas e Caifás esperam-lhe no Palácio, junto com mais dois sacerdotes. Pilatos aproxima-se.
HERODES – Pôncio Pilatos, o mais reverenciado cidadão de Roma. Eu, Herodes Antipas, Tetrarca da Galileia,
dou-lhe as boas-vindas.
(Bate palmas e inicia-se uma grande apresentação de danças das cortesãs do castelo)
PILATOS – Eu aceito suas boas-vindas, Herodes. César envia bênçãos a sua terra.
CAIFÁS – Em nome do povo, eu, Caifás, o guardião da lei de Moisés, saúdo Pôncio Pilatos, procurador de
Roma na Palestina.
HERODES – Por favor, Pilatos, venha ao meu lado, acompanhe-me.
PILATOS – Devo dizer que a cidade de Séforis me surpreendeu.
CAIFAS – A nenhum gentio é permitido cruzar o limiar que rodeia o Templo. Aquele que se atrever pagará com
a vida.
HERODES – Deus é tanto mais Deus quanto mais inacessível for. (Risadas. Reação de Caifás)
PILATOS – Como seu Deus pode se sentir feliz em meio a esta carnificina? Há sangue por toda parte, cheiro
de carne queimada de seus animais sacrificados!
CAIFÁS – O que matamos em sacrifício, não chega a aplacar os séculos de padecimentos e humilhações; e em
todos os cantos da terra somos dizimados, espoliados, banidos. Tomaram-nos nossa pátria. Nossa cidade
santa foi incendiada...
HERODES – ...e reconstruída por meu pai, Herodes, o Grande, muito amado pelo povo.
PILATOS – Que estranho, nunca vi o imperador mencionar o nome de seu pai.
Neste momento, Pilatos põe-se a caminho de sua fortaleza.
PILATOS – Agradeço as boas-vindas, Antipas e visitarei o Templo como sugeriu (sai).
CAIFAS – Vá, leve suas tropas e exiba suas insígnias com orgulho.
Caifás também prepara-se para ir, mas Herodes o impede.

HERODES – Caifás. E então, o que o profeta do deserto tinha a dizer?

7
CAIFÁS – Ele disse que não devias ter casado com Herodíades, e que ambos estão em pecado, pois
infringiram a Lei Sagrada.
HERODES – Ele disse o quê? Quem ele pensa que é?
CAIFÁS – Majestade, há trinta anos, o povo começou a dizer que o Messias havia nascido em Belém. Seu pai,
Herodes, o Grande, mandou soldados a Belém e matou todos os bebês meninos...
HERODES – Onde queres chegar, Caifás?
CAIFÁS – Prenda este João Batista, antes que ele leve o povo à loucura e à perdição.
HERODES – E devo prendê-lo por quê? Por se vestir muito mal, ou por comer insetos?
Ri, provocando a ira de Caifás.
CAIFÁS – Por blasfêmia!
HERODES – Ah, deixe ele pregar. Que me importa se um lunático fica berrando “arrependei-vos!” no meio do
deserto? Ora, João não me assusta. (Bebe) Ninguém me assusta.
Blackout

#4 Encontro com os discípulos


JESUS – [EM OFF] “Ainda sem saber ao certo as rotas do meu caminho, sentia que era chegada a hora de
escolher os pastores do meu rebanho. Foi então que fui ao encontro de cada um de vós. Guiado apenas pela
chama da palavra em meu coração, e oferecendo-lhes apenas um caminho tortuoso a seguir, com a promessa
de que, ao arrebatar os filhos de meu Pai pela palavra, cada um teria seu lugar ao meu lado no reino dos céus.”
Um rio é posto em cena, cortando o deserto, como um longo tecido azul; pescadores, redes, pessoas
carregando remos, objetos de madeira e ferro. Os irmãos Simão (Pedro) e André, em seu barco, arrumam rede.
Jesus posiciona-se à margem e observa a manobra dos pescadores. (Mateus 4: 18)
JESUS – Precisas de ajuda?
PEDRO – Não. Não preciso. Aliás, não tem nada em que ajudar... (Jesus vai subindo no barco) Ei, não podes
subir assim no meu barco!
JESUS – Tens razão. Me dê a tua mão, me ajude a subir. (Pedro o ajuda a subir, então Jesus desancora o
barco e desdobra a rede)
PEDRO – Ei, o que pensas que está fazendo?
JESUS – Nós iremos pescar!
PEDRO – Mas não tem peixe aqui nessa hora do dia. Aliás, não tem peixe aqui em hora nenhuma...
JESUS – Pedro, dê-me apenas uma hora e eu lhe darei uma vida completamente diferente.
PEDRO – E quem lhe disse que quero outra vida? (impaciente, porém curioso) Estou dizendo que aqui não tem
peixe...
Jesus então joga a rede ao rio, as ondas se movimentam e a rede volta repleta de peixes. Pedro fica eufórico,
sem acreditar no que vê.
PEDRO – Tem peixe?! Como isso aconteceu? Como? Como fizestes isso?
JESUS – Estou lhe dando a chance de mudar de vida... Tu és Simão, filho de João, mas irás se chamar Pedro.
Tu és Pedro – a pedra, e sobre esta pedra construirei a minha Igreja, e nem a morte poderá vencê-la. Eu lhe
darei as chaves do Reino do Céu, tudo o que proibir na terra será proibido no céu, e o que permitir na terra será
permitido no céu. Venhas comigo, deixes de pescar peixes e eu te farei um pescador de almas.
PEDRO (ainda confuso) – Mas, o que nós vamos fazer?
JESUS – Mudar o mundo!

8
Ancoram novamente o barco, agora carregado de peixes. Os pescadores, Filipe, Tomé, Judas, Tiago, João, se
aproximam para ver a grande quantidade.
JOÃO ZEBEDEU – Rabi! Estávamos nos preparando para recebê-lo.
JESUS – Então vamos daqui! Eu vos guiarei. Se tens ovelhas, deem-nas. Se tens uma família, deixem-na. Hoje
e amanhã eu exorcizo demônios e faço curas. Quem vem comigo?
Os outros discípulos concordam e glorificam.
DISCÍPULOS – Sim, Senhor!
JOÃO ZEBEDEU – Tu vens, Pedro?
PEDRO – Sim, vou...
Filipe sai para buscar seu amigo Natanael que medita debaixo a uma figueira.
JESUS (sobe no barco) - A Deus pertencem o mundo e tudo o que nele existe; a Terra e todos os seres vivos
que nela existem são Dele.
Enquanto uma multidão começa a se formar em torno de Jesus.
FILIPE – Encontramos Aquele de quem Moisés escreveu no livro da lei. E de quem também escreveram os
profetas. Ele é Jesus, filho de José, de Nazaré.
NATANAEL – E pode sair alguma coisa boa de Nazaré?
FILIPE – Venha e verá.
Natanael segue Filipe até Jesus, que olha para Natanael e aproxima-se dele.
JESUS – Eis aí um israelita verdadeiro. Não há nada de falso nele.
NATANEL – De onde me conheces?
JESUS – Eu o vi, quando ainda estavas debaixo da figueira, antes que Filipe o chamasse.
NATANAEL – Mestre. És o filho de Deus! És o rei de Israel!
JESUS – Acreditas apenas porque te vi debaixo da figueira? Coisas maiores que esta virão.
Eles beijam as mãos, tocam e tentam falar todos ao mesmo tempo com Jesus. No caminho, Mateus e Simão
Zelote cobram pedágios em uma pequena tenda na estrada. Os passantes apresentam-lhe as mercadorias.
PEDRO – São cobradores de impostos, devemos seguir adiante.
NATANAEL – Deverias manter distância deles...
JESUS – Dois homens foram ao templo orar, um era fariseu e o outro cobrador de impostos. O fariseu orou:
“Deus, eu Vos agradeço por não ser como os outros homens, ladrões, adúlteros ou como esse cobrador de
impostos, mas o cobrador de impostos nem olhou para o céu e disse “Deus (neste momento a voz do cobrador
se mistura com a voz de Jesus)
MATEUS – Deus, eu sou um pecador!
JESUS – E Deus abençoou o cobrador de impostos e não o fariseu. Aquele que se glorifica será humilhado,
mas aquele que se humilha será glorificado. Venha Mateus, o que tenho lhe darei.
Tomé, Judas Alfeu e Tiago Alfeu se aproximam pelo outro lado.
TOMÉ - Dê uma prova de que és o Filho de Deus e então lhe seguirei.
JESUS – Se o teu coração te trouxe a mim, então me seguirás sempre. Não terás outro remédio senão vir a
mim pelo coração.
JUDAS ALFEU (referindo-se a Tiago Alfeu) – Mestre, nós viemos ouvir e seguir tuas palavras. Deixe-nos seguir
contigo?
JESUS – Venham.

9
Eles se apresentam e conversam entre si com muita alegria e entusiasmo. Dividem alguns pães e frutas, outros
conversam. Preparam-se para acender a fogueira, enquanto aproximam-se Judas Iscariotes e Barrabás.

Ato II Campanha Pública de Jesus


ISAIAS 35 5-6

#1 Livramentos
Deserto. Ao fundo, o sul do vale do Jordão, as montanhas sobre as águas quietas do mar Morto. Na metade do
caminho até Jerusalém, Jesus e seus discípulos. Eles se levantam e Pedro se dirige a Jesus.
JESUS [EM OFF] – Era chegado o momento de realizar a obra de meu Pai. Curar os males do corpo para que
através deles a alma e a fé de seu rebanho também fosse restaurada. Muitos puderam ouvir e ver as grandes
obras que ali eram realizadas, para exaltação do nome de meu Pai, mas bem-aventurados os que não ouviram
e viram, mas creram mesmo assim.
Aproxima-se um jovem leproso e é empurrado por uma pessoa.
LEPROSO – Cura-me, filho de Deus!
PEDRO – Senhor, quem pecou para que ele nascesse leproso?
JESUS – Nem ele pecou nem seus pais; mas foi assim para que se manifestem nele as obras de Deus.
LEPROSO – Senhor, eu sei que o senhor pode me curar se quiser.
Jesus estende a mão e toca-o, no mesmo instante retira-lhe as escaras de lepra.
JESUS – Sim, eu quero. Você está curado. Escute! Não conte isso para ninguém, mas peça ao sacerdote que
examine você para provar a todos que você está curado. (Mateus 8: 2)
O leproso segue em direção ao Templo.
ANDRÉ – Bendito seja Deus por dar esse poder a ti, Jesus! Exultem e cantem o Nome do Senhor! Porque
grande é o que está por vir!
JESUS – Felizes as pessoas que têm o coração puro, André, pois elas verão a Deus.
JESUS – Quem procura os seus próprios interesses nunca terá a vida verdadeira; mas quem esquece a si
mesmo, porque é meu seguidor, terá a vida verdadeira. O que adianta alguém ganhar o mundo inteiro, mas
perder a eternidade? Não há nada que se possa pagar por ela.
Grande tumulto em torno de Jesus e seus discípulos, pessoas que tentam tocá-lo, falar com ele, porém os
apóstolos abrem caminho entre a multidão para o Mestre passar. Em algum momento uma mulher se aproxima
em meio à multidão, toca o manto de Jesus, ajoelha e chora agarrada à barra de suas vestes. Em seguida ela
percebe que foi curada e mantém-se em prantos, ajoelhada, se perdendo em meio à multidão. (Mateus 9:20-22;
Marcos 5:5-25; Lucas 8:43-48)
JESUS – Quem tocou em meu manto?
JOÃO ZEBEDEU – Mestre, em meio à essa multidão é impossível descobrir quem o tocou...
JUDAS ALFEU - Não vimos, Senhor...
TOMÉ – Em meio à toda essa multidão aglomerada ao teu redor ainda pergunta: “Quem tocou em mim?”
FILIPE – Alguém poderia ter visto, Tomé.
NATANAEL – Mas realmente há um tumulto muito grande, todos querem ser curados pelo Mestre.
Enquanto os apóstolos conversam, Jesus continua olhando ao redor a procura de quem o tocou, quando a
mulher se aproxima e prostra-se aos seus pés. A multidão abre caminho para verem quem foi a mulher curada
por Jesus.

10
LEILA – Senhor, em meio à tantas pessoas precisando de ajuda, não me senti digna de chamar tua atenção,
sofro há tantos anos com essa hemorragia incessante, perdi tudo o que tinha em busca de uma cura em vão,
mas quando o vi pensei que se eu tão somente tocasse em seu manto, ficaria curada.
JESUS – Filha, sua fé a curou! Vá em paz e fique livre do seu sofrimento.
POVO - Milagre! Jesus a curou! Senhor,dê-nos também a cura!
Grande agitação entre o povo. Jesus e seus seguidores caminham em procissão em direção ao Templo.
Alguns poucos que ficaram em torno de Jesus ainda duvidam e o questionam.
JESUS – Chegou a hora de nós irmos para Jerusalém. Lá o Filho do Homem terá que sofrer para que se
cumpra a promessa.
PEDRO – Que Deus não permita isso! Os chefes dos sacerdotes farão com que sofra, Senhor!
JESUS – Você é uma pedra no meu caminho para fazer com que eu tropece? (A todos os discípulos) Eu vim ao
mundo para revelar o Pai e estabelecer o Seu Reino! Eu vim com um propósito. Eu vivo para a vontade Dele
que me enviou! Proclamar a boa-nova do Reino do céu.
Caminham em procissão em direção ao Templo.

#2 Milagre no Sábado

Foco no Templo. Os sacerdotes estão reunidos. Em frente ao templo o comércio comum, pessoas comprando e
vendendo, alguns doentes e mendigos perambulam e pedem dinheiro. Um cego chama a atenção, sendo logo
interceptado por Pedro e Judas Alfeu. (João 9)
CEGO – Filho de Davi, tenha pena de nós!
JESUS – Tragam ele a mim.
Eles encaminham o cego pela multidão formada pelos grupos que agora se aglomeram até Jesus.
JESUS – [Ao povo] Os olhos são a lâmpada do corpo. Portanto, se teus olhos forem bons, teu corpo será pleno
de luz. Porém, se teus olhos forem maus, todo o teu corpo estará em absoluta escuridão. Por isso, se a luz que
está em ti são trevas, quão tremendas são essas trevas! [Ao cego] Crê que eu possa te curar?
CEGO – Sim, senhor! Creio!
JESUS (toca nos olhos dele) – Então que seja feito como crê!
Uma forte luz incide sobre eles.
JESUS – Enquanto estou no mundo, sou a luz do mundo. (Passa os dedos nos olhos do cego, que
imediatamente volta a enxergar) (João 9: 5)
CEGO – Ai! Milagre! Estou vendo! Meu Deus! Estou vendo! Milagre!
JESUS – Eu vim ao mundo como luz para aquele que crê. Ainda por um pouco de tempo a luz estará entre vós.
Andem enquanto têm a luz, para que as trevas não lhes apanhem, pois quem anda nas trevas não sabe para
onde vai. Enquanto têm a luz creiam na luz, para que não fiquem nas trevas. (João 12: 35 – 46)
O cego sai, alguns o acompanham. Os sacerdotes que observavam da porta do templo se manifestam com ira.
SACERDOTE GAMALIEL – Hoje é sábado e a lei não permite que você faça estas coisas!
JESUS – Ficam indignados contra mim, porque curei um homem no sábado? Meu Pai continua trabalhando no
sábado e eu também trabalho. (João 5: 17)
Com cólera os hebreus pegam em pedras para lhe atirarem. O povo grita para apedrejá-lo. Em meio à
confusão, os sacerdotes mandam trazer uma mulher que está prestes a morrer para testar Jesus. Jogam-na à
sua frente e esperam sua reação.

11
#3 Madalena
Trazem-lhe uma mulher aparentemente rica, porém com as vestes sujas e esfarrapadas. Enquanto ela se
contorce e diz coisas ininteligíveis, atrás dela Jesus vê sete demônios que a maltratam, manipulam seu corpo o
contorcendo e causando grande dor. A mulher mistura momentos de lucidez, onde pede ajuda, a momentos
onde é totalmente tomada pela possessão dos sete demônios. Ao ver o estado da mulher, o povo abre caminho
numa mistura de medo e curiosidade.
MULTIDÃO – “O que é isso?!” “Vejam!” “Ela está possuída.” “É um espírito mal.”
Madalena atravessa a multidão conduzida pelos demônios, que a torturam a todo momento.
MADALENA – (numa mistura de choro desesperado e cansaço profundo) Me salve! (cai em prantos, que se
transformam em uma gargalhada transfigurada, orquestrada pelos demônios)
JESUS – Qual é o teu nome?
MADALENA E DEMONIOS - (ergue-se um coro de vozes diabólicas) – (rapidamente. Para confundir e zombar
de Jesus) 1,2,3,4,5,6,7. (Falam seus respectivos nomes) Somos sete, somos muitos, centenas, milhares...
Somos Legião. E tu, quem pensas que és? Veio nos destruir?! Sabemos quem tu és, Filho do Altíssimo.
JESUS – Cale-se, e saia dela.
Os demônios são lançados por terra e saem se espalhando pelo espaço. Madalena desmaia sem se ferir,
levanta-se e abraça Jesus. Comentário entre os apóstolos, que estão espantados e admirados.
Madalena estende as mãos. Jesus ajuda a levantar-se.

MADALENA – Senhor, de ti nada sei, mas de agora em diante será minha vida e para sempre serei tua serva.

JESUS – Não se prenda a mim pelo bem que lhe fiz.

MADALENA - O bem que me fez não é prisão, é liberdade. (Ajoelha-se diante de Jesus) Senhor, permita-me
aprender teus ensinamentos, e deixarei tudo para segui-lo.

JESUS – Tua fé te libertou. Deixaria tua vida de riquezas para seguir conosco?

MADALENA – Sim, Senhor... E como posso chamá-lo? Mestre?

JESUS – Jesus. Jesus de Nazaré. E tu?

MADALENA – Maria, de Madalena. Nunca esquecerei a sua bondade.

Madalena sorri e levanta a cabeça. Olha nos olhos de Jesus e o abraça em forte comoção. Pedro se aproxima
e a cobre com um manto.

Chega um sacerdote próximo à Jesus. Está visivelmente abalado. Ajoelha-se aos seus pés e chora. (Mateus
9:18, 23-26; Marcos 5:22-24, 35-43; Lucas 8:41-42, 49-56)

SACERDOTE JAIRO – Jesus, minha filha está morrendo! Venha comigo até minha casa, ponha suas mãos
sobre ela para que sare e viva!
Comoção entre o povo ao ver um sacerdote se prostrando aos pés de Jesus. Jesus o levanta e o ampara.
JESUS – Vamos até sua casa.
Antes que possam sair, chega um servo da casa de Jairo, cansado e triste avista seu chefe.
SERVO – Senhor, não há mais necessidade de incomodar o Mestre. Sua filha morreu.
JESUS (a Jairo) – Não tenha medo, tão somente creia, e ela será curada. Vamos.
Jesus sai com ele. Uma grande multidão vai junto, apertando-o de todos os lados. Acende-se o locco onde será
a casa de Jairo. Nela estão sua esposa em prantos e sua filha deitada já morta numa cama. Entram Jairo,
Jesus, Pedro, João e Tiago, enquanto os outros permanecem junto ao povo do lado de fora.
12
ESPOSA DE JAIRO (em prantos) – Jairo, nossa filha, nossa filhinha faleceu. Não tivemos tempo suficiente para
o Messias curá-la.
JESUS – Acalme seu coração. Ela não está morta, apenas dorme.
Comentários entre os discípulos. Um certo tom de descrença entre as pessoas dentro e fora da casa. Jesus
toma a menina pela mão e faz uma prece. Os discípulos, mesmo com dúvida fazem também uma prece em
silêncio.
JESUS – Levante-se, criança.
Neste momento os olhos da criança se abrem, ela respira fundo e se senta na cama. Jairo e a esposa ficam
maravilhados, choram e abraçam a menina, depois olham para Jesus com intensa gratidão.

JESUS – Deem de comer a ela. Peço que não contem a ninguém o que se passou aqui.

JAIRO – Nunca esqueceremos sua bondade, Mestre!

Jesus sai e segue com seu séquito rumo à Samaria.

MARIA – Filho, me preocupa este povo todo a te perseguir. Entendo sua missão, mas temo que não deixarão
passar impune.
JESUS – Mãe, eu vi Deus.
MARIA – E o que o Senhor te disse, meu Filho?
JESUS – Que um dia pedirá a minha vida. (Pausa. Maria sente o peso da revelação) E que em troca da vida
que darei, terei poder e glória.
MARIA – Que glória, que poder poderá ser dado a alguém que morreu?
JESUS – Não sei, mãe. Ele disse que assim se fará cumprir a promessa. Crê em mim?
MARIA – Creio, filho meu, meu anjo, nunca duvidei.
Tiago, irmão de Jesus, segue sozinho. Maria tenta alcançá-lo, mas não consegue.
A multidão começa a se afastar, alguns vão embora. João Zebedeu, ao lado de Maria, aproximam-se de Jesus.
JOÃO ZEBEDEU – Seu irmão, Tiago, nos abandonou.
JESUS – Quem é meu irmão, quem é minha família? Meus irmãos e minha família são aqueles que creram na
minha palavra na mesma hora em que eu as proferi.

#4 Samaria
Seguem em peregrinação, param, formando grupos distintos dos homens e das mulheres. Jesus, destacado
dos outros, está com sua mãe. Na proximidade, há um enorme poço, a Fonte de Jacó. Algumas mulheres
entram para tirar água do poço. Jesus senta-se a fonte de Jacó um pouco afastada dos outros. Entra a
samaritana também para buscar água no poço.
JESUS [EM OFF] – Era preciso levar a palavra e a obra de meu Pai aos cantos mais longínquos do mundo.
Mas antes, era necessário destruir dentro de nossa própria terra os preconceitos gerados por anos de orgulho e
intolerância.
JESUS – Dê-me água para beber.
SAMARITANA – É um judeu e eu sou samaritana. Como tem coragem de pedir algo a mim?
JESUS – Se soubesse o que Deus dá, e quem está lhe pedindo água, você pediria a Ele e Ele te daria água
viva.

13
SAMARITANA – O Senhor não tem um balde e o poço é fundo. De onde pegaria essa água viva? Foi nosso
ancestral Jacó que nos deu este poço, do qual ele bebeu com seus filhos e animais. Não estás dizendo ser
maior do que Jacó, não é?
JESUS – Quem bebe da água desse poço terá sede de novo, mas aquele que beber a água que eu vou lhe dar
agora, este nunca mais terá sede. A água que eu lhe darei se tornará uma fonte de água viva que jorra para
sempre.
SAMARITANA – Senhor, então me dê desta água para que eu não tenha mais sede e nem precise vir aqui para
tirar.
JESUS – Vá chamar seu marido e volte aqui.
SAMARITANA – Não tenho marido.
JESUS – Tem razão em dizer que não tem marido. Já teve cinco maridos e o homem com quem vive agora não
é seu marido.
Samaritana o olha admirada pela revelação.
SAMARITANA – Vejo que é um profeta, senhor. Diga-me: nossos ancestrais samaritanos adoram a Deus nas
montanhas e vocês judeus dizem que é em Jerusalém o lugar onde deve se adorar a Deus. Então, qual é o
lugar onde nossas preces podem ser ouvidas?
JESUS – Mulher, crê em mim que a hora vem em que nem neste monte nem em Jerusalém adorarão o Pai.
Está chegando a hora e já é agora. Deus é Espírito e está em todos os lugares. E todos aqueles que o adoram
devem fazer em espírito e verdade, adorando-o pelo coração.
SAMARITANA – Lindas palavras. Eu acredito que um dia vai chegar o Messias. E quando Ele chegar, nos
mostrará tudo.
JESUS – Eu sou o Messias. Eu que estou falando contigo.
Apóstolos voltam um pouco desanimados por não terem conseguido alimento para todos. A mulher samaritana
larga o seu balde e corre anunciando. As outras mulheres que ainda estão tentando retirar água do poço
param.
SAMARITANA– Venham, vejam um homem que me disse tudo o que tenho feito. É ele, sim, o Cristo... Glória!
Adonai!
Elas seguem em torno de Cristo.

#5 Multiplicação de pães
Dois discípulos enviados por João Batista que estava na cadeia, vêm até Jesus, junto uma multidão de pessoas
para escutá-lo, inclusive os sacerdotes Jairo e Simão.
DISCÍPULO DE JOÃO 1 – Jesus, Rabi. Somos discípulos de João Batista. Quando ele ouviu falar dos atos do
Senhor, nos mandou aqui para levar notícias à cadeia aonde está.
JESUS – Voltem e contem a João o que estão ouvindo e vendo. Digam a ele que os cegos veem, os coxos
andam, os leprosos são curados, os surdos ouvem, os mortos são ressuscitados, e os pobres recebem o
evangelho. E felizes são aqueles que não abandonam a sua fé!
DISCÍPULO DE JOÃO 2 – A paz esteja contigo, Rabi!
Os discípulos saem. Os apóstolos escutam tristes por João estar preso.

TIAGO ZEBEDEU – Eu pensei que fôssemos para Jerusalém para ele ser coroado rei, André.
ANDRÉ – Sim, Tiago, mas ele também disse que lá o Filho do Homem terá de sofrer para que se cumpra a
promessa de Deus.
TIAGO ZEBEDEU – Muita coisa que ele diz não dá para entender. O pensamento dele está acima do nosso.
Entre os discípulos, Jesus continua pregando.

14
JESUS – Por isso vos digo... Não andeis cuidadosos quanto à vossa vida. Não é a vida mais do que o
mantimento, e o corpo mais do que o vestuário? Olhai para as aves do céu, que nem semeiam, nem colhem,
nem ajuntam em celeiros; e vosso Pai celestial as alimenta. Não tendes vós muito mais valor do que elas?
Olhai para os lírios do campo, como eles crescem; não trabalham nem fiam; E eu vos digo que nem mesmo
Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qualquer deles. Pois, se Deus assim veste a erva do campo,
que hoje existe, e amanhã é lançada no forno, não vos vestirá muito mais a vós, homens de pouca fé ?
Buscai primeiro o reino de Deus, e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas. Mateus
6:25-34
A multidão aclama e ora. Os apóstolos notam que estão todos com muita fome e André leva a mensagem até
Jesus.
ANDRÉ – Mestre! O lugar é deserto e há dias peregrinamos. O dia está chegando ao fim. Despede-os, para
que se agasalhem e achem o que comer nas aldeias, porque não o temos.
JESUS – Alimentem essas pessoas.
Judas Iscariotes traz o alforje e João o interrompe antes que ele diga qualquer coisa.
JOÃO ZEBEDEU (a Judas Iscariotes) – Duzentos dinheiros de pão não bastarão para que cada um deles tome
um pedaço que lhes tire a fome.
JUDAS ALFEU – Se os deixarmos irem jejum para suas casas, desfalecerão no caminho, porque alguns deles
vieram de longe.
PEDRO – Mestre, por favor, devem estar por aí perto de 10 mil pessoas ou mais. Alimentá-las seria impossível.
JESUS – Vão e verifiquem se existe comida no meio delas.
André e Pedro começam a perguntar as pessoas.
ANDRÉ – Digam,alguém tem alguma comida?
SEGUIDOR – Não, eu saí cedo de casa.
TIAGO ZEBEDEU – Alguém trouxe alguma comida?
JOÃO ZEBEDEU – Jesus quer saber se alguém aqui trouxe alguma comida.
TIAGO ALFEU – E a senhora, trouxe alguma comida?
Sempre acenam que não.
JUDAS ALFEU – Um pedaço de pão, frutas, qualquer coisa?
FILIPE – Então ninguém trouxe nenhum alimento?
Um garoto aproxima-se com um cesto e entrega a Filipe. Filipe guia-o até Jesus.
FILIPE (que põe a cesta aos pés do mestre) – Este menino tem cinco pães de cevada e dois peixes, Mestre.
Foi só o que conseguimos. Mas o que é isso para tanta gente? Como alimentaremos a todos?
JESUS (para o menino) – Está sendo muito bom em compartilhar o seu pão. (Para os apóstolos em voz alta)
Sentem a todos sobre pastos verdejantes repartidos de cem em cem e de cinquenta em cinquenta, e que
apontem um líder para cada grupo.
Cada apóstolo fica responsável por separar e deixar um cesto vazio em doze grupos. Eles se organizam para
que, sem que o público perceba, encham os cestos de pães. Jesus também com o seu cesto, com os pães e
peixes, ergue-o ao céu, agradecendo ao Pai. Reparte-os e cada líder de um grupo ergue pedaços inteiros de
pão e passam a reparti-los entre eles.
JOÃO ZEBEDEU – Veja, há muito pão e peixe para todos que haverá de sobrar!
PEDRO – Jesus transformou cinco pães e dois peixes em comida suficiente para todos. Peguem!
Os apóstolos podem levar os pães até o público e pedem a todos para que não desperdicem nem joguem no
chão e glorificam o Nome do Senhor. Enquanto todos distribuem os pães ouve-se Jesus em júbilo e oração.

15
#6 Jesus anda sobre as águas
Um lago se abre em cena, preenchendo o espaço. Os apóstolos, sentados num barco, remam de Tiberíades a
Cafarnaum. Um vento forte repentino começa a levantar ondas e tão fortes que elas arrebentam enchendo o
barco de água.

PEDRO – Recolham as velas! Recolham tudo!


NATANAEL – Acho melhor voltarmos.
JOÃO ZEBEDEU – Não ouviu o que Ele disse? É para encontrarmos com Ele.
TOMÉ – Nós vamos morrer!
PEDRO – Cuidado nós vamos afundar!
ANDRÉ – Por favor, fiquem abaixados!
TIAGO ZEBEDEU – Mais calma!!
NATANAEL – Confiemos em Deus!!
FILIPE – Vamos orar!
Breve pausa na tempestade. Chega Jesus por cima das águas. Os apóstolos O avistam e o ritmo das ondas
aceleram novamenteO vento e o lago param e tudo fica calma.
TOMÉ – Olhem! É um fantasma?!
PEDRO – Não. É Jesus!
Os discípulos, cheios de medo, dizem uns aos outros. Pedro não havia desafixado os olhos de Jesus ainda.
JESUS – Coragem! Não tenham medo! Sou eu! Venha até mim, Pedro.
PEDRO - Se és tu mesmo, Mestre... Mande que eu vá andando sobre da água daqui até onde o senhor está.
JESUS – Venha.
Pedro sai do barco e começa a andar sobre da água, em direção a Jesus. Porém, sente a força do vento e fica
com medo, começando a afundar.
PEDRO (grita) - Socorro, Senhor!
APÓSTOLOS – Pedro! Ajudem-no! Ele vai afundar!
Imediatamente Jesus estende a mão e segura Pedro.
JESUS - Como é pequena a sua fé! Por que você duvidou, Pedro?
Então os dois sobem no barco e o vento se acalma. Os discípulos adoraram Jesus.
(Mateus 14 : 28-32)
JOÃO ZEBDEU - De fato, o senhor é o Filho de Deus!
JESUS – Se a fé de vocês for do tamanho de um grão de mostarda, então ordenarão que uma montanha se
mova, e ela sairá do lugar. Igualmente ordenarão que a tempestade diminua e ela cessará. Como expulsarão
demônios em meu nome, se sequer acreditam ter fé suficiente para manterem-se vivos durante uma
tempestade? Creiam em Deus e creiam também em mim. Pela palavra de Deus e somente pela fé poderão
curar o mundo. Vamos daqui! Eu guiarei vocês.

16
Ato III Decessos

#1 Salomé (Mateus 14; Marcos 6; Lucas 3)


Palácio de Herodes. Em confraternização, Pilatos com seu escudeiro, Lúcio Galba. Caifás e dois sacerdotes,
duas pajens, dois soldados da guarda e algumas dançarinas. Toda a corte distribui-se pelo espaço. O tetrarca,
sentado em seu trono, embriaga-se, ao seu lado, sua esposa Herodíades, com um vestido cravejado de pérolas
e seus cabelos com adereços dourados. Durante o festejo dançarinas, cortesãs e serviçais se movimentam
pelo espaço para satisfazer as vontades da alta corte. Frutas e vinhos são servidos e apresentações artísticas e
lutas acontecem para entreter o rei e seu séquito.
HERODES – Espero que esteja apreciando nossa magnífica recepção, Pilatos, mas obviamente guardei o
melhor para o final... Esta noite verá o tesouro mais cobiçado de toda a Galiléia! (Pausa. Beija a mão de
Herodíades e vai até o centro do palco) Salomé? Onde está a Princesa? Ah! Aí está ela!
Entra Salomé com uma beleza e pose magistral, deita-se sobre almofadas, num lugar separado. Herodes fita-a.
Pilatos e o restante da corte ficam impressionados com sua beleza.
PILATOS (a Herodes) – Como é linda a Princesa! (Para Salomé) Realmente, Herodes não mentiu quanto a sua
beleza.
Ouvem-se os gritos abafados de João Batista que se encontra aprisionado no castelo do tetrarca.
VOZ DE JOÃO BATISTA – Ele está sentado em seu trono. Em suas mãos ele segura um cálice dourado cheio
de suas blasfêmias. E o anjo do senhor o ferirá e ele será comido por vermes!
HERODÍADES – Ouviu o que ele disse, Herodes? Que serás comido por vermes! Como pode deixá-lo lançar tal
maldição?
HERODES – Não é de mim que ele fala. É do Rei da Capadócia, meu inimigo. Além disso, ele é um grande
profeta.
HERODÍADES – Se ele é apenas outro profeta judeu, porque não o entrega à seu próprio povo, para que os
sacerdotes cuidem dele?
CAIFÁS – Verdadeiramente, meu senhor, é melhor entregá-lo em nossas mãos.
HERODES – Chega desse assunto! Já dei minha resposta. Não o entregarei em suas mãos. Ele é um homem
santo. Ele viu Deus.
CAIFÁS – Não pode ser! O profeta Elias foi o último a ver Deus.
VOZ DE JOÃO BATISTA – É chegada a hora, chegou o dia do Senhor. Ele é o Salvador do mundo.
HERODÍADES (indignada) – O que significa isso? Salvador do mundo.
LUCIO GALBA – Este é um dos títulos dados a César.
JOANA (Com receio da reação de Herodes) – Majestade, com sua permissão. (Gesto de Herodes) Não é de
César que fala o profeta, Senhor.
HERODES – De quem ele fala então?
JOANA – De Jesus, o Messias que veio salvar o povo judeu.
SACERDOTE SIMÃO – O Messias ainda não veio.
PILATOS – Herodes. (Gesto para seu comandante se aproximar) A meu pedido, meu comandante, Lúcio
Galba, colheu informações sobre esse Jesus, que João Batista diz ser o seu Messias.
Lúcio apresenta o relatório.
LÚCIO GALBA – Nobre Pilatos. (Lendo) “Um dia antes dos idos de abril, Jesus deixou Jerusalém, com seus
doze discípulos. Viajaram para o norte. Num casamento, na Galileia, testemunhas dizem que ele transformou
água em vinho.”

17
HERODES – Água em vinho?! Essas coisas podem ser verdade? (abre um sorriso, que se torna uma
gargalhada ao final da frase) Então quero esse Jesus em meu castelo o quanto antes... Não beberei mais água
pelo resto de minha vida! (gargalhadas)
LUCIO GALBA – Eu não sei, senhor. Eu mesmo nunca vi um milagre.
HERODÍADES – Ha! Ha! Milagres! Eu não acredito em milagres. Já vi tantos truques. (Para a Pajem 1) Meu
leque!
LÚCIO GALBA – “No quarto dia após as nonas de maio, Jesus e seus discípulos chegaram à cidade de
Cafarnaum. Lá, Jesus tocou uma mulher e expulsou 7 demônios dela. No mesmo dia, Jesus curou uma menina,
filha de um de seus sacerdotes, que estava à beira da morte. Testemunhas dizem que ela já estava morta
quando chegaram e que ele a ressuscitou”.
CAIFÁS – Agora ele também ressuscita criancinhas?! (Aos sacerdotes) De quem é essa criança?!
LÚCIO GALBA – “Um dia antes das nonas de julho, Jesus falou a uma multidão de mais de cinco mil, ao pé do
monte Tabor, perto do mar da Galileia. Segundo relatam, com uma cesta contendo dois peixes e cinco pães...
Jesus alimentou toda a multidão”.
HERODES – Nunca ouvi tanta bobagem! (risos) Tragam-no aqui, quero ver se ele também multiplica dinheiro!
LÚCIO GALBA – “Um dia após os idos de julho, Jesus andou sobre o mar da Galileia".
HERODÍADES – Ridículo! Herodes, como permite que este homem espalhe esse tipo de mentira entre o povo?
Não vê que ele quer ser maior que o próprio rei da Galiléia? Quer agora que ele seja conhecido como o “Rei
dos Judeus”?
HERODES – Eu, somente eu sou o rei dos judeus! E eu o proíbo de fazer milagres. Nenhum homem está
autorizado a andar sobre as águas do meu reino. Onde está esse homem?
Herodes chacoalha Joana, que olha com medo em direção ao marido.
JOANA – Ele está em todos os lugares, Majestade, dizem que anda em todos os lugares curando e fazendo
milagres... É difícil encontrá-lo.
HERODES – Não importa! (Aos soldados e sacerdotes) Apenas o encontrem e façam com que ele saiba que
eu, Herodes Antipas, Tetrarca da Galiléia, não autorizo que ele cure leprosos, cegos ou que transforme a água
em vinho. (à Cuza, marido de Joana) Relate isto e mande que os soldados espalhem pelas ruas.
Ouve-se os gritos abafados de João Batista.
VOZ DE JOÃO BATISTA – O Senhor virá. O Filho do homem chegou.
HERODIADES – Herodes, será que este homem nunca irá nos deixar em paz?
HERODES (ordena para os guardas) – Tragam-no aqui. Talvez ele se acalme depois de ter uma audiência.
Os guardas saem. Entra João Batista, procurando por Herodes e Herodíades. Herodes está cada vez mais
embriagado.
JOÃO BATISTA – Onde está aquele cujo cálice está cheio de abominação? Onde está aquela que se deitou
com os capitães do exército sírio? Está escrito que eu presenciaria teus adultérios e tua repugnância. As leis
são bem claras, levarão sobre si suas iniquidades.
SALOMÉ – É da minha mãe a quem ele fala?!
JOÃO BATISTA – Essa mulher, Herodíades, é a mulher do seu irmão, Filipe, que ainda vive. Envia Herodíades
de volta ao teu irmão. Arrependendei-vos, Herodes!
Salomé vai até João Batista e tenta seduzi-lo.
SALOMÉ – Então esse é o profeta que se esconde no deserto... Eu sou Salomé, filha de Herodíades, princesa
da Judéia.
JOÃO BATISTA –Não se aproxime. Filha de Sodoma! Cubra seu rosto com um véu, vá para o deserto e
procure o Filho do homem.
SALOMÉ – Quem é o Filho do homem?

18
Herodíades vai se aproximando de João.
JOÃO BATISTA – Não me toque, não profane o Templo do Senhor Deus. Para trás! Filha da Babilônia!
HERODÍADES (esbofeteia-o) – Cale-se, comedor de gafanhotos! Estou farta de sua voz!
HERODES – Guardas, levem-no daqui.
JOÃO BATISTA (inflamado, enquanto é levado para fora) – Podem me aprisionar, mas não poderão jamais me
fazer calar. Enquanto estiver vivo, pregarei a palavra do Senhor. Arrependei-vos!
HERODÍADES – Você ouviu as coisas horríveis que ele disse contra mim? Como permite que ele insulte sua
esposa à frente de toda corte?
HERODES – Levante-se, Salomé, e me agrade com sua maravilhosa dança.
HERODÍADES – Como pode querer que ela dance depois de ter sido humilhada em publico? Eu não permito
que ela dance.
HERODES – Salomé, Salomé, dance pra mim... Peça o que quiser que eu lhe darei.
SALOMÉ – Qualquer coisa que eu te pedisse, Tetrarca?
HERODES – Qualquer coisa, até mesmo metade do meu reino.
SALOMÉ – O senhor jura?
HERODES – Juro por minha vida, por minha coroa, por meus deuses. Tudo o que me pedir, eu lhe darei. Oh,
Salomé, dance pra mim!
Salomé ri. Herodiades olha para a filha fazendo um sinal afirmativo. Em seguida estala os dedos e as pajens se
movimentam para arrumar a princesa.
As pajens levam perfumes e os sete véus até Salomé, e tiram-lhe suas sandálias.
HERODES – Fez muito bem, Salomé, e eu lhe darei tudo o que quiser. E nunca quebrei minha palavra.
Salomé realiza a dança dos sete véus. Ao terminar ajoelha-se perante Herodes.
HERODES – Ah! Maravilhoso! Maravilhoso! Venha, Salomé, venha pedir sua recompensa. Eu lhe darei aquilo
que mais deseja.
SALOMÉ – Eu quero que traga numa bandeja de prata…
HERODES (gargalhando) – Ela é encantadora, não é? Uma bandeja de prata...
SALOMÉ (levantando-se) – Numa bandeja de prata, a cabeça de João Batista.
Herodes cala-se transtornado. Gargalhada vitoriosa de Herodíades.
HERODÍADES – Ah! Escolheu muito bem, minha filha!
HERODES – Peça-me outra coisa. Peça-me metade do meu reino, eu lhe darei.
SALOMÉ – Essa é minha vontade. Eu quero a cabeça de João Batista numa bandeja de prata.
HERODÍADES – Prometeu dar a Salomé o que ela quisesse. Todos ouviram. Não volte atrás com seu pedido,
Salomé. Herodes jurou pelo seu reino que lhe daria tudo o que quisesse.
HERODES – Calada! Não quero ouvir mais nenhuma palavra sua.
Herodes esvazia seu cálice de vinho num gole.
SALOMÉ – Eu exijo a cabeça de João Batista. Majestade, o senhor jurou diante de todos...
HERODES (afundando-se de volta em seu trono) – Que seja feito como ela pede! Decapitem João e tragam a
cabeça a Salomé.
Os guardas saem.
HERODÍADES – Minha filha fez bem em pedir a cabeça de João Batista. Ele me cobriu de insultos, disse coisas
monstruosas sobre nós. Pode-se ver que ama sua mãe, Salomé.
19
Ouve-se um grito surdo de João Batista. Um soldado traz a cabeça de João em uma bandeja e entrega à
Salomé, que a entrega à sua mãe.
HERODES (enlouquecido) – Quem bebeu meu vinho!? Meu cálice estava cheio de vinho. Alguém bebeu meu
vinho. Ah! Alguém vai pagar caro por isso!

#2 Lázaro
#Um mensageiro vem do loco onde Lázaro foi enterrado. Marta, Maria e alguns judeus velam por ele em frente
ao túmulo.

JESUS [EM OFF] – Não vos enganem, para tudo há uma ocasião certa. Há um tempo certo para cada
propósito debaixo do céu: Tempo de nascer e tempo de morrer, tempo de plantar e tempo de colher, tempo de
matar e tempo de curar, tempo de derrubar e tempo de construir, tempo de chorar e tempo de rir, tempo de
calar e tempo de falar, tempo de amar e tempo de odiar, tempo de lutar e tempo de viver em paz. Eclesiastes
3:1-8
MENSAGEIRO – Senhor, seu amigo Lázaro está muito doente.
JESUS – Esta enfermidade não é para morte, mas para glória de Deus, para que o Filho de Deus seja
glorificado por ela. (Aos seus discípulos) Vamos outra vez para Judeia.
PEDRO – Rabi, ainda agora os judeus tentaram te apedrejar.
JESUS – Lázaro, o nosso amigo, dorme, mas vou despertá-lo do sono.
JUDAS ALFEU – Senhor, se dorme, está tudo bem.
JESUS – Irmãos, Lázaro já está morto. E dou graças, por amor a vós, de que Eu não esteja, para que
acreditem; mas vamos ter com ele.
Os apóstolos começam a seguir Jesus.
TOMÉ – Vamos nós também, para morrermos com ele.
Seguem ao túmulo de Lázaro. Judas Iscariotes discorda e se esvaece em direção ao Templo. Jesus faz uma
pequena pausa antes de chegar. Rumor entre os apóstolos. Chegam em Betania
JESUS – Meus irmãos, meu dever é lhes dizer tudo o que sei de Deus. Tenham paciência. Fiquem comigo se o
vosso coração lhes pedir. Eu ficarei convosco só mais um pouco e depois irei para aquele que me enviou. (João 7:
33 -34)

Marta vem ao encontro de Jesus e, correndo, ajoelha-se a seus pés. Ela está acompanhada de muitos judeus
que choram a morte de Lázaro.
22
MARTA – Senhor, se estivesse aqui, meu irmão não teria morrido! Mas eu sei que mesmo agora não é tarde
demais, pois tudo o que pedires a Deus ele te dará
JESUS – Teu irmão, Lázaro, há de voltar à vida. (João 11: 23)
MARTA – Há de ressuscitar na ressurreição do último dia.
JESUS – Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim viverá, ainda que esteja morto. E todo aquele que
vive e crê em mim nunca morrerá. Crê nisto?
MARTA – Sim, Senhor. Creio que és o Cristo, o Filho de Deus.
JESUS – Verdadeiramente mortos estão aqueles que não tiveram a felicidade de serem abençoados por Deus.
(A Marta) Onde foi que o sepultaram?
MARTA – Vem e vê, Senhor.
Seguem até o sepulcro, uma caverna. Maria, irmã de Marta, corre até Jesus e lhe diz as mesmas palavras.
MARIA – Se o Senhor estivesse aqui, o meu irmão não teria morrido!
JESUS – Tirem a pedra.
20
MARIA – Mas, Senhor, passaram-se quatro dias, já cheira mal.
JESUS – Não disse que verão a glória de Deus se crerem? Tirem a pedra.
Dois apóstolos afastam a pedra.
JESUS (ajoelha-se) – Deus, rei do universo, que com justiça nos criou e nos manteve a vida, nos alimentou, e
nos fez conhecer o mundo, bendito sejas Senhor, que os mortos ressuscita. (Pausa) Pai, graças te dou haveres
me ouvido. Eu bem sei que sempre me ouves, mas disse em voz alta por causa da multidão, para que creiam
que o Senhor me enviou. (Levanta-se e chama) Lázaro, vem para fora!
Lázaro sai do sepulcro.
JESUS – Desenrolem-no e o deixem.
Lázaro segue até Jesus..
LÁZARO – Jesus de Nazaré, filho de Deus.
Jesus vai abraçar a Lázaro.
JESUS – Que não te surpreenda ver que o filho de Deus é um filho de homem, em verdade.
LÁZARO – Deus não podia escolher melhor.
Marta se junta a Lázaro, enquanto observam a caravana que segue para o Monte das Oliveiras.
JESUS – Vamos.

#3 Sermão da Montanha, Parábolas e Oração do Pai Nosso


Eles estão retirados no Monte das Oliveiras e Jesus está em pregação. Todos os apóstolos estão em pé.
JESUS - Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o Reino dos céus; bem-aventurados os que
choram, porque eles serão consolados; bem-aventurados os mansos, porque eles herdarão a terra; bem-
aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão fartos; bem-aventurados os misericordiosos,
porque eles alcançarão misericórdia; bem-aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus; bem-
aventurados os pacificadores, porque eles serão chamados filhos de Deus; bem-aventurados os que sofrem
perseguição por causa da justiça, porque deles é o Reino dos céus; bem-aventurados sois vós quando vos
injuriarem, e perseguirem, e, mentindo, disserem todo o mal contra vós, por minha causa. Exultai e alegrai-
vos, porque é grande o vosso galardão nos céus; porque assim perseguiram os profetas que foram antes de
vós.
MATEUS - Nós cremos em ti, Senhor, mas nada podemos ofertar aos pobres. Como demonstrar nossa fé?

JESUS – Já o fez, com suas palavras, Mateus.. (aos apóstolos) Meus irmãos, vós sois o sal da terra; e, se o sal
for insípido, com que se há de salgar? Para nada mais presta, senão para se lançar fora e ser pisado pelos
homens. Vós sois a luz do mundo; não se pode esconder uma cidade edificada sobre um monte; nem se
acende a candeia e se coloca debaixo do alqueire, mas, no velador, e dá luz a todos que estão na casa. Assim
resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem o vosso Pai,
que está nos céus.
TIAGO ALFEU – E quando virá o Reino de Deus?
JESUS – Não verão vir o Reino do Céu, Tiago. Ninguém dirá: ‘Aqui está’, ou, ‘Ali está’. Porque o Reino de Deus
está dentro de vós.
NATANAEL – Mestre, queremos saber para aonde o Senhor vai?
JESUS – Vou preparar um lugar para vós. Conheceis o caminho por onde irei.
TOMÉ – Senhor, perdoe-me, mas nós não sabemos onde é que vai, e como podemos saber o caminho?

21
JESUS – Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém pode chegar ao Pai a senão por mim. Não temam,
pois daqui a pouco não me verão mais. Porém, pouco depois, me verão novamente. (João 16: 16)
ANDRÉ (a Filipe) – O que será que ele quis dizer?
FILIPE – Senhor, o que quer então que façamos?
JESUS – Que ajudem com a minha morte a poupar a vida dos que virão depois de mim. O Filho de Deus
deverá morrer para que assim se cumpra a vontade do Pai.
PEDRO (a André) – Mas e se no lugar dele puséssemos um simples homem?
ANDRÉ – Quer por um homem em seu lugar, um de nós?
JESUS – Então Deus não sacrificaria seu único Filho.
Ao chegarem ao cume do monte das Oliveiras, de onde se tem uma visão plena das torres do Templo, um
discípulo de João Batista vem correndo ao seu encontro.
DISCÍPULO DE JOÃO 1- Senhor, João Batista foi decapitado por ordem de Herodes Antipas.
JESUS (a todos) – Escutem, João Batista, o profeta que me anunciou e batizou está morto. Herodes mandou
decapitá-lo. Não haverá mais demora. É chegada a hora de proclamarmos o Reino abertamente e com toda
força. Iremos em direção à Jerusalém. A partir de agora eu lhes dou autoridade para expulsar espíritos maus e
curar todas as enfermidades e doenças graves. Anunciem que “O Reino do Céu está próximo”.
TIAGO ALFEU – Mestre, então nos ensine a orar como João ensinou aos seus discípulos.
JESUS – Filhos, quando orarem, não sejam como os hipócritas, porque gostam de orar em pé nas sinagogas e
nos cantos das praças, para serem vistos pelos homens. Em verdade digo que eles já receberam a sua
recompensa. Portanto, orarão assim: Pai nosso, que está nos céus, santificado seja o teu nome; venha o teu
reino, faça-se a tua vontade, assim na terra como no céu; o pão nosso de cada dia nos dá hoje; e perdoa-nos
as nossas dívidas, assim como nós perdoamos aos nossos devedores; e não nos deixe cair em tentação; mas
nos livre do mal, pois teu é o reino, o poder e a glória para sempre. Amém.

#4 A Tentação de Judas
No caminho à casa onde estavam Jesus e os outros discípulos, Judas encontra com um homem apoiado em
um tronco escuro, que parecia aguardar para encontrar alguém.Judas sente algo como um arrepio vertiginoso
percorrer seu corpo. Tenta apressar o passo para longe, porém o homem acena para ele, como que pedindo
ajuda ou atenção.
LÚCIFER – Não é um dos doze que acompanham Jesus, o Galileu?
Judas permanece calado, e o demônio continua.
LUCIFER – Mesmo que não me responda sei quem é e como te chamam. É Judas, filho de Simão, e nasceu
em Iscariotes, no ano em que morreu Herodes, o Grande. Não é verdade?
Judas continua em silêncio.
LUCIFER – Ainda sei mais a seu respeito. Sei qual é a tua missão entre os discípulos do profeta de Nazaré. Os
outros pregam às multidões, curam enfermos, ou ouvem as confissões do Mestre. Tu, entretanto, guarda a
bolsa... Não passa do tesoureiro, o caixa da companhia. Belo ofício para o seguidor de quem diz ter
repugnância ao dinheiro e fala contra os ricos. Teus companheiros vão ganhando o reino dos céus com suas
boas ações enquanto o que te resta é contar moedinhas. Querias tanto ser um santo, Judas, e te fizeram o
mais humilde, o mais miserável o mais desprezível dos banqueiros!
Judas pensa em responder, mas contem-se.
LÚCIFER – Poderia me explicar, por qual razão tem necessidade de dinheiro os discípulos de um mestre que
aconselha a todos a não pensarem no dia de amanhã?
JUDAS – A nós basta o pouco de cada dia, mas o que sobra doamos aos pobres. Depois, por que deseja saber
de tanta coisa? Quem és tu? Talvez um espião dos fariseus de Jerusalém? Como pode saber de tantas coisas
assim?

22
LUCIFER – Eu procuro, ouço, investigo, pergunto, recordo. Saber, saber tudo sobre todos é a minha paixão. E
sei muitas outras coisas mais, que sequer imagina. Sei, por exemplo que os dirigentes do templo querem se
apoderar do teu Mestre, mas não têm coragem de mandá-lo prender. Têm medo, e com razão do povo que se
afeiçoou a Jesus, que o ouve como a um rei, que espera dele pão e paz, e que se insurgiria contra os
sacerdotes se tocarem no Messias. Tu, que pertence aos doze devias saber disso.
Judas ouve a tudo com o intuito de correr, fugir dali e não mais ouvir aquela voz que parecia entrar direto em
seus pensamentos, mas sentia-se condenado a escutar, pois seu corpo não mais o obedecia.
LUCIFER – Não compreende, Judas? Só tu, entre os doze, poderia compreender. Responda-me: ama a teu
Mestre mais do que a ti mesmo?
JUDAS – Não me amo, e amar Jesus mais do que a mim mesmo seria dizer pouco. Mas não o amo quanto
queria amá-lo, e nem o amo tanto quanto ele quereria que o amasse.
LUCIFER – Teu amor por ele é grande o bastante para sacrificar-se por ele? Para a glória deele? Se o ama
realmente, deveria, hoje mesmo, ir secretamente ao Templo e dizer a Caifás que está pronto a entregar-lhe o
teu Mestre, Judas.
Judas reage com violência. Lúficer ri com desdém.
JUDAS – Eu, trair Jesus? Vendê-lo aos seus inimigos? Vá embora daqui e não diga mais nada, se tem apreço
pela própria vida!
LUCIFER – Valente, Judas. Não deseja ser um traidor, mas não se importa em ser um assassino? Entenda o
que lhe direi: Os outros discípulos não passam de Galileus simplórios, tu és o mais instruído de todos, e creio
que já tenha descoberto os erros na doutrina de Jesus, e que deseja libertar Israel daqueles sonhos perigosos.
Só tu foste chamado para esse sacrifício. Sob a aparência de traidor tu serás, na verdade um heroico
colaborador do Messias.
Judas enxuga o suor em sua testa. Seu corpo todo treme e parece desorientado, como se estivesse tomado por
uma febre.
JUDAS – Eu repito que jamais venderei meu Mestre, nem por brincadeira nem por bom fim. Nunca trairia o
Filho de Deus e me condenaria à danação eterna, mesmo que por um bom motivo.
LUCIFER – Mesmo que o prendam, que mal podem fazer-lhe Judas? Se ele é um Deus, deve compreender
que é inatingível e imortal. Se lhe tocarem, cairão por terra, como acontecia aos que se aproximavam da arca
santa.
JUDAS – E o que ele pensaria de mim, sabendo que estaria prestes à entregá-lo aos Sacerdotes a pretexto de
glorificá-lo, a negociar seu sangue com seus inimigos por dinheiro?
LUCIFER – Pensaria que tu havias sacrificado a própria reputação em benefício da glória do Filho de Deus.
Mas quero que fique tranquilo. Teu Mestre saberá de imediato quando decidir entregá-lo, e tu deves observar
atentamente o que ele dirá. Aposto contigo que ele lhe dirá, ainda hoje: “O que tem a fazer, faça depressa.” E
isso será a confirmação do que estou dizendo, o consentimento explicito de Seu Mestre. Façamos um pacto: se
ele se calar, não o entregue, agora se ele te ordenar e te exortar, vá, pois será o sinal de que eu tenho razão.
Judas, inflamado de cólera, tenta movimentar-se e sai, tropeçando desorientado, em direção ao looco da Santa
Ceia.
JUDAS – Não tenho nada com tuas profecias e teus pactos. Vai-te daqui!
Judas foge desnorteado. Lúcifer permanece em cena, esboçando um leve sorriso.

23
OS MISTÉRIOS DO PRESENTE

Ato IV Traições

#1 Última Ceia – Parte II


A cena segue em off. Maria, mãe de Jesus e Rute, a irmã de Jesus, preparam a mesa para celebração da
Páscoa judaica.
RUTE – Sabe o que dizem? Que ele falou com uma tempestade e ela se acalmou. (Saramago, J.: 339-344)
MARIA – Qual tempestade?
RUTE – Ah, mãe, uma bem grande, em alto mar! E também disseram os pescadores de Cafarnaum que com
seu poder enchia de peixe as barcas dos pescadores.
MARIA – O anjo tinha razão.
RUTE – Que anjo?
MARIA – O anjo que me disse: “Deus, o Senhor, vai fazer o teu filho rei, como foi o antepassado dele, o rei
Davi. E reinará eternamente, e o reino dele não terá fim.” (Lucas 1: 30-33)
Sentam-se à mesa na seguinte ordem: à direita de Jesus, João Zebedeu, Pedro, Tomé, Natanael, Filipe, Judas
Alfeu; à esquerda, Judas Iscariotes, Simão zelote, Mateus, Tiago Zebedeu, André e Tiago Alfeu. Todos sentam-
se para cear.
CRISTO – Meus filhos, essa é a última vez que vamos comer juntos neste mundo. Tomem este cálice e dividam
entre vocês. Quando beberem, vão compreender que vamos nos assentar deste modo outra vez no Reino.
Devo vos advertir que o filho do homem entrará em Jerusalém como um rei, e sairá dela como um condenado.
Mas não vos admirem quando ouvirem rumores sobre traições, confabulações e perseguições contra mim.
Nenhum profeta é bem recebido em seu reino, e já é chegada a minha hora. Para que se cumpra a palavra que
vem de meu Pai, todas estas coisas haverão de acontecer.
As mulheres trazem a Jesus o pão e o vinho com as ervas amargas e a pasta de frutas secas, como o próximo
prato da Última Ceia e saem.
CRISTO – Oremos todos ao Pai, abençoando a graça desta Páscoa.
Eles se dão as mãos em silêncio. Pequena pausa. Jesus parte o pão e entrega para os discípulos que vão
repartindo entre si, alimentando-se. Sob a influência do comportamento jovial do Mestre, começam a conversar
descontraidamente.
CRISTO – Desde agora digo a vocês, antes que aconteça, para que, quando acontecer, acreditem. Um entre
vocês, amigo meu de muitos anos, que ainda agora compartilha comigo do pão, está prestes a me trair.
Entreolham-se, estranhando-se, em tom desconcertado, falam separadamente várias vezes.
APÓSTOLOS – Serei eu? Senhor?! Sou eu? Eu, não! Jamais, Senhor!
CRISTO – Este mesmo que agora coloca a sua mão junto comigo no prato.
Os apóstolos se inflamam ainda mais. Enquanto isso, Judas Iscariotes num tom muito mais baixo e tímido
pergunta a Jesus.
JUDAS ISCARIOTES – Serei eu?
Neste momento Jesus segura o pão no prato das ervas e passa a Judas que come. Pedro se exalta e ameaça
seus companheiros.
PEDRO (a todos) – Morra logo quem daqui se mover!
CRISTO – Tu o disseste.
JUDAS ISCARIOTES – Comi do pão que repartiu, como poderia agora te denunciar?

24
CRISTO (a todos) – Já vos disse. Tudo isso eu faço apenas para que sejam fortalecidos contra as tentações e
provações que estão pela frente e para que se lembrem de que eu sabia sobre todas essas conspirações e os
adverti sobre a traição. É necessário fazer saber sobre os mistérios que rondam também o nosso presente,
para que no futuro não vos alarmem ao repetirem os mesmos erros de outrora.
Jesus, prontamente, inclinando-se para Judas Iscariotes.
CRISTO – O que tem a fazer, faça depressa. A tua hora é minha hora. E a vontade do meu Pai será cumprida.
Judas levanta-se e sai. Pedro se levanta para seguir Judas, mas Jesus o segura pelo braço.
TIAGO ZEBEDEU (a Mateus) – Aonde Judas foi com tanta pressa?
MATEUS – Não sei.
SIMÃO ZELOTE – Talvez tenha ido buscar mantimentos.
Um dos apóstolos traz-lhe o terceiro cálice de vinho, o “cálice da bênção”. Jesus levanta-se do divã e, tomando
o cálice nas suas mãos, abençoa-o, e parte o pão, enquanto postula.
CRISTO – Repartam e comam todos, isto é meu corpo, que é dado por vós. Este pão da lembrança é, de fato o
pão da vida. E este é o cálice da nova aliança no meu sangue, que será derramado por muitos, para remissão
dos pecados. Façam assim, todas as vezes que beberem em memória de mim.
A conversa entre Jesus e os apóstolos continua enquanto a luz se apaga e a música aumenta. Algumas
palavras podem ser ouvidas.

#2 Hosana! Festa de Ramos (João 12)

Início da semana de Páscoa. Dança e júbilo. Rodeando o grande quadrilátero do Templo uma multidão:
cambistas, passarinheiros, marchantes que vendem borregos e cabritos, peregrinos e estrangeiros trazidos pela
curiosidade. Vê-se a frenética atividade dos comerciantes nas barracas do Templo com facas, cutelos,
machados e serrotes. A atmosfera está carregada de fumaça da lenha e dos animais queimados. Jesus está
reunido com seus apóstolos enquanto descem o Monte das Oliveiras. Antes de chegarem ao Templo de
Jerusalém, Tiago e Judas Alfeu põem os seus mantos num jumentinho para o Mestre montá-lo. Eles o veem
chorando. (João 12: 14)À medida que se aproximam, a multidão festiva joga peças de roupa no chão e segura os
ramos das árvores próximas, para fazer um tapete de honra ao asno que traz o Filho Real, o Messias
prometido.

MULTIDÃO – Hosana ao filho de Davi! Paz no céu e glória a Deus!


Abençoado é aquele que vem em nome do Senhor!
Hosana nas alturas!João 12: 13)

Jesus chega em frente ao Templo.

SACERDOTE GAMALIEL – Deveria repreender os seus discípulos e ensiná-los a se comportarem mais


convenientemente.

JESUS – Em verdade, é conveniente que deem as boas-vindas ao Filho da Paz. É inútil tentar pará-los, pois, no
lugar deles, até as pedras gritariam.

Neste momento, na mesa de dinheiro de um cambista, surge uma discussão violenta, um cândido galileu é
ridicularizado e empurrado por uns judeus arrogantes e pretensiosamente metidos a superiores. Ele cai no
chão. Jesus se dirige até os bazares onde começa a virar as mesas dos cambistas, chamando-os “ladrões” e
chicoteando. Outras pessoas o ajudam e protegem. Exaltação e gritaria. Rapidamente todo o comércio é
varrido do Templo. Os guardas romanos surgem em cena e aquietam a multidão. Permanecem em cena
observando.

25
JESUS – Tirem isso daqui! Parem de transformar a casa de meu Pai num mercado! Esta é a casa de meu Pai!
Este é um lugar de adoração... Não um mercado!

SACERDOTE ZACARIAS – Todas as moedas estrangeiras têm que ser trocadas na nossa moeda. É a lei.

JESUS – “A minha casa será chamada de uma casa de oração para todas as nações, mas fizeram dela um
covil de ladrões.” (Mateus 21.12-17; Marcos 11.15-19) Testemunham o que está escrito nas escrituras e nada fazem.

Sacerdote Jairo e Simão vão em direção a Jesus e tomam-lhe pelo braço agressivamente.

SACERDOTE GAMALIEL - (A Jesus) Sabemos que o senhor é honesto, ensina a verdade sobre a maneira de
viver que Deus exige, contudo não se importa com a opinião dos outros. Então o que acha: é ou não é contra a
nossa lei pagar impostos ao Imperador romano?

JESUS – Hipócritas! Tragam a moeda com que se paga o imposto! Por que é que estão procurando uma prova
contra mim? (Entregam-lhe a moeda) De quem é o nome e a cara que estão gravados nesta moeda?

SACERDOTES – São de César.

JESUS – Pois deem a César o que é de César e a Deus o que é de Deus.

Tumulto entre as pessoas. Murmúrios entre todos. Jesus sai com os apóstolos para não serem apedrejados
mais uma vez. Os sacerdotes entram para o Templo.

#3 A traição de Judas
Todos os sacerdotes reunidos. Entra Caifás, e se senta na grande cadeira principal do Templo. José de
Arimateia relata o episódio de Lázaro.

JESUS [EM OFF] – Estejam certos de que todas estas coisas que vos digo que ainda irão acontecer, devem
acontecer no tempo de meu Pai, para que a Sua obra seja completa. Ele possui as chaves do incognoscível,
coisa que ninguém, além dele, possui; Ele sabe o que há na terra e no mar; e não cai uma folha de árvore
sem que Ele disso tenha ciência; não há um só grão, no seio da terra, ou nada verde, ou seco, que não
esteja registrado no Livro lúcido” (6ª Surata versículo 59).

CAIFÁS – Silêncio! Silêncio! (A José de Arimateia) Agora explique.


JOSÉ DE ARIMATEIA – Eu estava lá, Caifás. Eu vi o meu amigo Lázaro sair do túmulo. Eu senti o cheiro da
carne podre, mas ele saiu do mausoléu vivo. Eu acompanhei todo o funeral. Eu vi o corpo ser colocado no
mausoléu e a porta ser fechada e selada.
SACERDOTE SIMÃO – Ouça a minha prova, sumo Sacerdote. Jesus e Lázaro eram velhos amigos. Então
pensem. Quem melhor para inventar esta história? Lázaro finge estar morto, passa algumas noites num
mausoléu... Tudo que é preciso é uma história de ressurreição dos mortos para esse Jesus virar lenda. E de
repente ele é o Messias.
NICODEMOS – Existem relatos de outras ressurreições.
CAIFÁS – Sempre haverá relatos! Pensem. Ninguém, ninguém pode derrotar a morte!
JOSÉ DE ARIMATEIA – Como pode um instrutor, que ensina as leis de Moisés e mantém nossas tradições,
representar perigo? Um homem que ama nosso povo. E dá a ele a coragem para viver uma vida difícil.
NICODEMOS – Devemos ponderar para não acusar injustamente um inocente. O que faremos, sumo
Sacerdote Caifás?
CAIFÁS – Nós somos os guardiões da paz. Se a paz não for mantida, Roma destruirá o Templo e a nação. Não
podemos permitir isso por causa de um falso Messias.
SACERDOTE GAMALIEL – Não podemos esperar mais. O que está se espalhando entre a população é que o
Messias chegou e que é chegada a hora de se rebelar contra Roma.
26
SACERDOTE SIMÃO – Os romanos irão esmagar a revolta. E desta vez eles nos esmagarão juntos.
Tumulto entre os sacerdotes.Começam todos a apelar para Caifás.
SACERDOTE JAIRO – Caifás, digo que não há porquê tornar-se inimigo Dele. Se sua obra for apenas um
trabalho dos homens, acabará por se destruir sozinha, mas se for obra de Deus nada a destruirá. Corremos o
risco de sermos conhecidos como aqueles que combateram Deus! O que planeja fazer, Caifás?
CAIFÁS – Vamos aguardar o momento oportuno. Este homem será punido, sim. Punido por proclamar-se o
Messias, rei davídico! Porém, o povo ainda celebra a Páscoa, causaria tumulto prendê-lo agora. Deixemos o
festim passar e, então, mandarei que prendam Jesus de Nazaré.
Judas Iscariotes aparece a porta do Templo.
SACERDOTE SIMÃO – O que queres aqui? Não és um discípulo do nazareno?
SACERDOTE JAIRO – Achas que pode vir aqui a qualquer hora? Foi ele quem te mandou? Viestes nos
espionar?
JUDAS ISCARIOTES – Sou Judas Iscariotes, filho de Simão. E sou discípulo de Jesus. Eu guardo a bolsa, sou
o tesoureiro, os outros pregam à multidão ou curam enfermos. Vim falar com Caifás, Chefe do Templo. Vim
pedir redenção por meus pecados contra o Templo e oferecer-lhes a cabeça de Jesus.
SACERDOTE SIMÃO (À Caifás) – Este discípulo do nazareno veio entrega-lo à nossa corte em troca de
perdão.
CAIFÁS – Queres dialogar, Judas? Nós temos como dever acolher todos os que nos procuram. Há sempre
lugar à mesa do Pai, mas antes diga-me, o que quer em troca da sua conversão?
JUDAS ISCARIOTES – Não posso suportar mais e aceito todo o peso da culpa. É justo chamar de diabólica
minha obediência? Eu não vim apenas pedir ajuda, vim cumprir meu dever junto a Deus.
SACERDOTE SIMÃO – Dever junto a Deus? Então porque segue alguém que é contra o Templo?
JUDAS ISCARIOTES – Supremo sacerdote, sei que o povo ouve e aclama Jesus, mas duvido que o amem a
ponto de pegar em armas para salvá-lo. Jesus é amor e não pede nada senão amor. Ele pode me perdoar, e
vocês? Ouçam, eu não traí o Templo! E mesmo que o prenda, Caifás, que mal lhe podem fazer? Jesus é filho
de Deus. Pois se é um Deus, devem compreender que é inatingível e imortal.
CAIFÁS – Homem de débil fé! Diga, Iscariotes, como pretendes entregar teu mestre?
JUDAS ISCARIOTES (hesita) – Esta noite estaremos juntos no jardim do Getsêmani.
CAIFÁS – É o momento de nos preparar, rapidamente, todo o Templo. Façam o serviço discretamente, para
não alarmar a população. Judas não cobrou nada pelo seu ato. Dê a ele dinheiro suficiente para comprar um
escravo. O conselho deve ser convocado imediatamente.
Caifás entrega a bolsa de dinheiro ao sacerdote. Ele vai até Judas e conta as moedas que recebe-as relutante.
SACERDOTE SIMÃO – Pegue seu dinheiro e ponha o plano em ação. Nos entregue o falso rei, então dez
serão vinte, depois trinta moedas.
Entra o sacerdote Zacarias acompanhado de um soldado, Malcos.
SACERDOTE ZACARIAS – Judas, temos organizado um grupo armado de soldados romanos para a captura
do Nazareno. Você deve ser o guia.
JUDAS ISCARIOTES – Façam como quiserem.
Saem para buscar os soldados.
CAIFÁS – Judas, Jesus é seu inimigo, inimigo de todos os homens, e é preciso tirá-lo de perto deles.
Barulho entre os sacerdotes. Eles se reúnem.

27
OS MISTÉRIOS DO FUTURO

Ato V O Martírio de Cristo

#1 Última Ceia – Parte III


Em cena estão os apóstolos no final de sua ceia. Jesus permanece com uma expressão de profunda tristeza,
pois acaba de receber a confirmação de que foi entregue aos sacerdotes.
CRISTO (à Maria)– Mulher, sei que me acompanhas desde o ventre, me salvas e acalentas nos momentos
mais difíceis. É chegada a minha hora, e com ela virá um grande martírio sobre vós. Terás de ser forte e
carregar sobre si o peso de toda a dor do mundo, e nada poderás fazer para salvar-me do meu próprio martírio,
a não ser, talvez, prometer que serás forte por ti e por mim e me levantarás mais uma vez, como quando ainda
era menino e caía pelas vias estreitas de Jerusalém.
MARIA – Agora entendo as palavras de Simeão, quando me disse que “serias a salvação de todos os povos, a
luz para iluminar o mundo, a espada para queda e elevação de muitos em Israel, que serias um sinal de
contradição para que se manifestem os pensamentos de muitos corações... E para mim, serias como
uma espada que transpassaria minh’alma.” Lc: 2 22-35. E mesmo com a alma transpassada e retalhada aos
pedaços, eu te prometo, meu filho, não sairia do teu lado jamais.
O abraça em prantos.
CRISTO – Meus filhos, dou-lhes um novo mandamento: Que amem uns aos outros; como eu vos amei. Todos
saberão que são meus discípulos, se amarem uns aos outros. (Pausa.) Ainda por pouco tempo estou convosco.
Entendam o que está por vir. Haverá ainda muita dor e sofrimento, mas devem ser resilientes. Se mantenham
na palavra e espalhem a verdade que vem de meu Pai pelos quatro cantos do mundo.
JOÃO ZEBEDEU – Não nos apartaremos de ti, Mestre!
FILIPE - O seguiremos aonde fores!
CRISTO - Eis que aqui revelo os mistérios do futuro. Eu vou para o meu Pai. Na Casa de meu Pai há muitas
moradas. Quando eu for, vou lhes preparar o lugar. E assim sendo, virei outra vez e lhes levarei comigo, para
que onde eu estiver estejam vós também... Vamos daqui. Peço-vos que permaneçam em vigília e oração. Que
protejam uns aos outros e não se apartem nos momentos de maior dificuldade.

#2 Getsêmani

CRISTO – Esperem aqui e se mantenham em oração. Estamos à espera de soldados que vêm para matar, mas
meu Pai vem com eles para fazer cumprir a promessa.
Alguns apóstolos se afastam e oram. Procuram se espalhar.
TIAGO ZEBEDEU (a Jesus) – Permaneceremos em vigília. Não nos afastaremos de ti, mestre.
Os três apóstolos e André permanecem próximos a Jesus que começa a entristecer-se e angustiar-se muito.
Ele ajoelha e chora. Os apóstolos também choram.
CRISTO – Minha alma está cheia de tristeza até a morte. Fiquem aqui para velar comigo. Vigiem, meus irmãos,
e orem juntos para que não caiam em tentação.
Jesus ao centro.
CRISTO – Estou aqui, Pai, venho fazer a tua vontade.
Entra os mesmos demônios do deserto, um deles porta um cálice de fel em suas mãos. Performance de dança-
teatro. Os apóstolos dormem, com exceção de André, João e Tiago Zebedeu e Pedro, que se mantém em
oração, chorando profundamente por medo e tristeza do futuro de seu mestre.

28
DEMÔNIO – Posso ver o desespero e a angústia que agora te cercam, Jesus. Olhe ao seu redor e veja como
todos sofrem em Teu nome. (Neste momento Jesus olha para Pedro e João Zebedeu, que estão ajoelhados ao
seu lado, paralisados em posição de oração, chorando) Sofrem por sua infinita Paixão.
DEMÔNIO – Se não pode poupar-lhes a vida, silêncio! Em frente à morte não se pronunciam palavras.
Os demônios riem e debocham do sofrimento de Jesus.
CRISTO (em oração) - Se possível, misericordioso Pai, me permita não provar cálice tão amargo.
DEMÔNIO – Um brinde, Jesus! A você e a mim.
CRISTO – Se possível, Pai, afasta de mim este cálice!
DEMÔNIO – Que espera?! Vá em frente! Desista deste martírio! Una-se a mim, e derrubaremos juntos todo o
império romano... É divino.
CRISTO – Todavia não seja como eu quero, mas sim como Tu queres.
DEMÔNIO – Suportarás dores e sofrimentos sem fim, Jesus. É um preço muito alto a ser pago pela redenção
destes que vêm justamente te fazer sofrer.
DEMÔNIO – E para quê?! No fim tu morrerás como um homem rejeitado e desprezado por todos.
Completamente esquecido. Pense... Pense em minha proposta. Ao meu lado serás lembrado por toda a
eternidade!
Cristo permanece em oração. Ouve-se Pedro em oração.
PEDRO – O que pensar das nossas culpas, ó Deus? Por que o está castigando? É o nosso sofrimento que ele
carrega, a nossa dor! Nós fomos curados por ele. Não deixe que Ele sofra em nome de nossos erros.
ANDRÉ - Todos nós éramos como ovelhas perdidas. Cada um de nós seguia o seu próprio caminho, mas
Deus, não faça com que ele sofra o castigo que nós merecemos... (Isaías 53)
JOÃO ZEBEDEU – Estamos aqui, Senhor. Aceitamos dividir o peso da missão. Conforte nossos corações para
que o peso da prova não nos destrua.
TIAGO ZEBEDEU – Como podemos ser dignos de misericórdia? Ó Deus, meu coração se enche de dor e culpa
por estar aqui a espera de entregar Jesus como um cordeiro ao sacrifício. Nos ajude a sermos fortes o bastante
para continuar seu legado, nos oriente em qual caminho seguir para que não nos percamos na escuridão.
O diabo ainda insiste indignado, cruza a frente de Pedro e os outros enquanto caem em sono. Jesus fica
calado, gélido olhando para o Céu.
DEMONIO – Veja, Jesus, quanto sofrimento irá causar. Seu Pai revelou sobre seu martírio, mas agora direi o
que acontecerá com aqueles que dizes proteger.
DEMONIO – Pobre Pedro, que será julgado e crucificado como seu Mestre, mas de cabeça para baixo, para
sufocar em sangue e sofrimento.
DEMONIO – E André, que terá de fugir em vão, apenas para ser crucificado em um madeiro em forma de “X”.
DEMONIO – João será jogado em azeite fervente, suplicará pela morte, mas ela não virá.
DEMONIO – Tiago selará com sangue seu testemunho, pois morrerá pela espada enquanto prega em Teu
nome.
DEMONIO – E o povo? O povo não se importará com o que vai te acontecer. Por causa dos pecados desse
mesmo povo tu serás crucificado ao lado de criminosos e depois sepultado com os ricos, mesmo sem ter
cometido crime algum.
Jesus, chora sofrendo pelo destino dos apóstolos. Depois pausa, respira fundo e olha para o céu.
CRISTO – Seja feita a Tua vontade, oh Pai. Não ouça minha súplica humana. Minha carne teme pela morte,
mas meu espírito está disposto a te obedecer.
DEMONIO - Prepare-se, pois aquele que vendeu teu sangue aproxima-se.
Os discípulos estão caídos no sono. Ele os acorda.

29
CRISTO – Pedro, são essas as promessas que me fez? Não consegue manter vigília por uma hora?
PEDRO – Mestre, perdão pelo pecado que cometi. Já podemos ouvi-los na estrada.
Pelo lado oposto ao que Jesus entrou com os apóstolos aproxima-se Judas Iscariotes com cinco soldados
armados.
JUDAS ISCARITOES – Lembrem-se do plano, para que não ataquem ninguém. Não o machuquem, ele não irá
reagir. Eu lhes darei um sinal. Ouçam bem, o homem que eu saldar e der um beijo, capturem, este será Jesus.
Os apóstolos fazem um cerco em torno de Jesus.
CRISTO – Meus filhos, é chegada a hora em que o Filho do homem deve sofrer.
Pedro e João Zebedeu sacam as espadas. Tempo. Judas chega de cabeça baixa e para em frente à Jesus,
como se não tivesse coragem de entregar o Mestre. Jesus, numa tentativa de encorajá-lo olha em seus olhos.
CRISTO – Judas, por que trai o Senhor com um beijo?
Forte reação de Judas, que chora de cabeça baixa, segurando o saco de dinheiro em uma das mãos. Jesus
estende os braços para ele, e baixa a cabeça em sinal de que ele precisa continuar. Judas lhe estende os
braços e beija-lhe a fronte e tenta sair, mas Jesus o segura e olha em seus olhos. Judas olha nos olhos de
Cristo e deixa cair o saco de moedas enquanto corre para trás tomado pela culpa.
Os soldados preparam-se para capturá-lo, porém os apóstolos criam um cerco em volta de Jesus. Ouvem-se as
vozes dos apóstolos ao fundo, enquanto segue a sequencia performática.
JOÃO ZEBEDEU – Defendam o Senhor!
PEDRO – Eles vieram o matar!
JOÃO ZEBEDEU – Cerquem-no!
PEDRO – Saquem as espadas!
Os soldados se afastam como impelidos por alguma força maior e Pedro ataca e fere a orelha de Malcos. Jesus
olha firmemente para Pedro, que recua. Jesus abaixa-se e recoloca a orelha do soldado no lugar. Os soldados
reagem a isso com espanto, Malcos permanece ajoelhado diante de Cristo, enquanto Ele estende as mãos em
sinal de rendição.
Capturam o Cristo que é levado à casa de Caifás. Pedro, João e Tiago Zebedeu seguem-nos, o restante
retorna ao locos onde ocorrera a Santa Ceia. Judas se dirige para árvore onde se enforcará.

#3 Casa de Caifás (Mateus 26.57-68; Marcos 14.53-65; Lucas 22.54,66-71, João 18:19-28)
Os soldados trazem Jesus à casa de Caifás. Pedro e João Zebedeu aguardam do lado de fora. Caifás dispensa
os soldados.
CAIFÁS – Jesus, o Nazareno. Deve estar ciente das gravíssimas acusações que temos contra vós.
SACERDOTE ZACARIAS – Ele alega ser o Messias, o Filho de Deus. Os discípulos dele alegam que ele trouxe
um homem dos mortos.
SACERDOTE GAMALIEL – Impossível!
CAIFÁS – É isso que alega ser?
Jesus mantém-se calado.
JOSÉ DE ARIMATEIA – Isso é um julgamento?
SACERDOTE GAMALIEL – É nosso dever de anciões da Lei para proteger o Templo de falsos profetas.
CAIFÁS – Silêncio. Vejamos o que o homem tem a dizer em sua defesa. Diga-me, o que exatamente tentas
ensinar ao povo?
CRISTO – Eu sempre falei abertamente ao mundo, sempre falei na sinagoga e no Templo. Nunca disse nada
em oculto. Para que então perguntas isso a mim?
30
CAIFÁS – Quer então que eu pergunte aos seus discípulos? E quem são seus discípulos, além de Simão, o
agitador?
CRISTO – Todos que ouviram o que eu ensinei. Todos podem dar testemunho.
SACERDOTE GAMALIEL (esbofeteia-o) – É assim que responde ao sumo sacerdote?
CRISTO – Se falei mal, dá testemunho do mal, mas se falo a verdade, por que me bates?
CAIFÁS – Dentre nós existem testemunhas que podem afirmar teus atos de rebeldia.
TESTEMUNHA 1 (amargo e odioso) – Muitas vezes vi este homem no Templo de Jerusalém incitando
multidões a rebeldia. Ele disse: “Eu não vim trazer a paz, senão a espada!”; e coisas piores.
TESTEMUNHA 2 – E eu o vi bater violentamente em comerciantes sem piedade alguma, dizendo que todos
eram ladrões.
CAIFÁS – Então, Jesus, perdeu o dom da fala?
Jesus fica em silêncio.
SACERDOTE SIMÃO – Quem pensas ser para pregar as multidões?
SACERDOTE ZACARIAS – Este homem se proclama “Rei dos judeus! Filho de Davi!” em meio ao povo.
SACERDOTE GAMALIEL (a Jesus) – Queres causar uma rebelião? Não passas de um simples carpinteiro e se
considera o Messias enviado dos céus?
CAIFÁS – Eu o conjuro pelo Deus vivo, digas se és o Filho de Deus.
CRISTO – Que eu sou ele teus ouvidos podem ouvir claramente, mas há algo que não ouvirão.
SACERDOTE SIMÃO – Ele admite. Blasfêmia!
SACERDOTE GAMALIEL – Agora não pode negar.
Vários sacerdotes se aproximam e esbofeteiam e cospem no rosto de Jesus. O primeiro Sacerdote, então,
indaga.
SACERDOTE GAMALIEL (mordaz) – Profetiza-nos, ó Cristo. Quem foi que te bateu?
Jesus permanece em silêncio e resiste.
CAIFÁS – Todos ouviram. Está decidido. Levem-no ao palácio do governador. Somos proibidos de condenar
quem quer que seja à morte, logo a melhor opção é mandá-lo pra quem possa. É réu de morte.

Quadro – 1ª Negação de Pedro


Os próprios sacerdotes saem levando Jesus com brutalidade. Passam por Pedro e os outros dois apóstolos do
lado de fora do Templo. João os segue, Tiago Zebedeu fica com Pedro. Duas mulheres e dois soldados
começam a segurá-lo e persegui-lo.
CRIADA (para Pedro) – Ei, eu vos conheço! Tu também estavas com Ele. (Grita) Ele estava com o Messias!
PEDRO – Não, não o conheço, mulher. Não seja tola.
CRIADA – Tens vergonha de admitir? Ainda há pouco o seguia para todo lado como um cão.
PEDRO – Juro! Eu nunca vi este homem antes.
Pedro vê passar Jesus e fica em silêncio para não lhe identificarem.

31
#4 Palácio Macabeu de Herodes
Palácio Macabeu de Herodes. Soldados e sacerdotes trazem Jesus e colocam-lhe de joelhos a frente de
Herodes.
HERODES – Estou satisfeito e muito encantado em vê-lo diante de mim, Jesus Cristo. Tenho ouvido coisas
impressionantes sobre os milagres que tem feito e, realmente, esperava vê-lo para fazer alguma coisa
prodigiosa. Será que derrubarás as colunas do Templo? Podes fazer visíveis os anjos e seres sobrenaturais?
Ou operas apenas milagres de curas? Tenho problemas terríveis na saúde. Eu vos imploro, em minha
humildade real, que faças um milagre, pois sempre quis ver um milagre diante de meus olhos.
Jesus permanece em silêncio sem olhar para Herodes.
HERODES (continua escarnecendo) – Serias tu João, ressuscitado dos mortos? Não, João não se apresentaria
com esta aparência impotente. Estou assombrado, tu não tens cara de “rei dos judeus”. Onde está toda a
coragem, a força, a agressividade? Ensinas apenas para os fracos e escravos a se contentarem com a miséria.
Tua religião não é para este mundo; os homens não podem viver como tu ensinas.
Jesus permanece em silêncio.
HERODES – Não me respondes, não entendo o porquê? Parece que me tomas por tolo. Tenho autoridade
sobre vós. Como ousas não me olhar nos olhos enquanto falo contigo?
Jesus levanta levemente seu olhar. Herodes se enfurece, então satiriza.
HERODES – Levem-no ao grande Pilatos, a jurisdição na Judeia não é minha. Esperem! Permitam-me antes
vesti-lo de vermelho (põe sobre Jesus um antigo manto real). É um presente da Galileia. Tenho uma antiga
dívida com Pilatos, digam-lhe que não me esqueci e envio o Cristo embrulhado para presente.
O primeiro e o segundo soldado levantam Jesus e arrastam-no e o levam. Cada vez mais gente começa a
chegar.
HERODES – Agora me sinto contente por, finalmente, ver a Galileia livre desse Jesus.

Quadro – 2ª Negação de Pedro


Os guardas levam Jesus a Pilatos. Pedro intercruza com Jesus novamente.
SERVA (a um dos soldados) – Este homem me parece um seguidor do profeta. Tenho quase certeza que é um
de seus discípulos. Ele estava com Jesus de Nazaré. Deve ser condenado junto de seu mestre. Admita, és
amigo do Cristo, senão não estaria tão aflito.
PEDRO – Mentira. Eu juro que nunca vi esse homem, e nunca pertenci ao seu grupo, eu não conheço essa
gente, muito menos ele.

#5 Suicídio de Judas
Judas está entre as pessoas que aguardam o julgamento de Jesus. Encoberto e tentando disfarçar sua
presença, mostra-se transtornado e profundamente arrependido de ter entregado seu mestre. Ele delira, anda
por vozes agonizantes e se comunica com elas.
JUDAS ISCARIOTES – Irão me chamar de traidor... “Judas, aquele que traiu o Cristo!” Se passarão mil anos, e
ainda serei lembrado como aquele que entregou à morte o Filho de Deus. Miserável o dia em que nasci!
Dinheiro maldito que aceitei receber. Que nome pode ser pior do que traidor? Vou direto para o inferno.
Judas cai ao chão e um transeunte o ajuda a levantar, porém ao invés de ver e ouvir sua voz, ele enxerga
demônios transfigurados.
LEGIÃO (OFF) – Temos que considerar a intenção e não a aparência, o conteúdo real e não a forma, a
finalidade justa e não o meio repugnante.

32
Judas olha para os lados e enxerga nas pessoas comuns demônios repugnantes. Passa pelas pessoas que
aguardam o julgamento de Jesus como um louco, e transtornado se esquiva delas.
JUDAS ISCARIOTES –. Tive que fazer essa coisa horrível porque era preciso. Tinha que fazer cumprir a Lei.
Ele mesmo disse que alguém teria que o trair. Mas estou enlouquecendo, não posso suportar o peso da culpa.
Judas foge em direção à um monte alto e seco. Seus próprios pensamentos o perturbam e ele tenta, em vão,
afastá-los, fugindo de um lado para outro.
LEGIÃO (OFF) – Vai descobrir que aquele pouco de amor que acredita sentir por Jesus não é senão a faceta
mais hipócrita e medrosa de seu ódio.
Judas sente-se fraco, trêmulo e confuso.
JUDAS – Mentiroso! Deixa-me! Devolva-me a paz!
Tenta correr, mas faz apenas três passos tropeçando e cai sobre uma pedra próxima da figueira.
JUDAS – Quanto vale a vida de um homem? E o sangue do Cordeiro de Deus? Mal pude ter enxergado minha
ambição... O que foi que eu fiz? Será que fiz o que era certo? Porque então me encontro arrependido de ter
entregado meu mestre? E tudo isso por quê?. Trinta moedas?
Joga o saco de moedas, que se espalham pelo espaço.
JUDAS - Os sacerdotes não aceitaram minha devolução! Tantos sinais me foram dados para que traísse meu
mestre, sei que nenhum dos outros discípulos teria sido capaz de tal ato. Como pude trocar a vida de meu
Mestre por dinheiro? Pois que fique aqui esse maldito dinheiro! Um campo para minha iniquidade. Um campo
cercado de morte e sofrimento, amaldiçoado pela minha culpa.
Judas avista uma árvore e se aproxima dela aos prantos. Olha um tempo para a cidade abaixo dele e amarra-
se na árvore numa mistura de delírio e lucidez.
JUDAS – O peso da culpa é grande demais, não me convém viver depois desse crime. Minhas mãos serão
meu carrasco. Se traí o Cristo, a mim posso trair também. Não suporto mais tanto tormento!
Pausa. Judas chora compulsivamente de arrependimento.
JUDAS – Deus, se é justo, me mate agora, não tenho forças para fazer isso sozinho! (Pausa) Vou direto para o
inferno, tamanho é o peso em meu coração.
Aos poucos se solta de onde estava seguro e se enforca.

#6 Fortaleza de Pilatos
Os sacerdotes aguardam a presença de Pilatos. Os soldados afastam o povo. Claudia Prócula, a esposa de
Pôncio Pilatos, e ele estão conversando a sós na fortaleza.
PRÓCULA – Esta noite, num sonho, eu sofri muito...
PILATOS – Sabes qual é meu sofrimento, Cláudia? É estar nessa província fétida, com essa ralé imunda à
porta. Os sacerdotes querem condenar um galileu de nome Jesus. Cedo ou tarde vão encontrar um modo de
prendê-lo e virão me pressionar para que tome parte no ato.
PRÓCULA – Meu sonho era sobre esse galileu... Ele é um santo, Pilatos. Por favor, não te envolvas no caso
deste homem. Não concedas que sobre suas mãos caia o sangue desse inocente. As consequências dessa
morte serão terríveis. Em sonho eu ví a verdade.
PILATOS – O que é a verdade, Cláudia? Tu sabes, reconheces quando ouve alguém dizê-la?
PRÓCULA – Sim, eu reconheço. Tu não? Se não quiseres ouvir, ninguém pode te dizer.
PILATOS – Quer saber qual é a minha verdade, Cláudia? Levo 11 anos sufocando revoltas nesta província
asquerosa. César me alertou, Cláudia. Duas vezes. Ele jurou que da próxima vez o sangue a ser derramado
seria o meu. Essa é a minha verdade.
Entram os sacerdotes junto com soldados e Jesus. Entra Lúcio Galba e anuncia a Pilatos.

33
LÚCIO GALBA – Senhor, os sacerdotes vêm a sua presença com um prisioneiro.
PILATOS – O que querem aqui a esta hora?
LÚCIO GALBA – Trazem o Jesus, de Nazaré.
Prócula olha para Pilatos. Ambos sentem o que está por vir. Pilatos vai a frente.
PILATOS – (Aos sacerdotes) Que acusações trazem contra este homem?
SACERDOTE GAMALIEL – Este blasfemador é punível com a morte.
SACERDOTE ZACARIAS – Este homem incita o povo; começou pela Galileia e continuará por toda a Judeia.
PILATOS – Isto não é um crime contra Roma.
SACERDOTE ZACARIAS – Não o entregaríamos se não fosse um malfeitor.
PILATOS - Levem este homem para julgá-lo de acordo com suas próprias leis. Este homem é galileu, não é?
Pois levem-no imediatamente a Herodes Antipas, o Tetrarca da Galileia.
Entra Caifás.
CAIFÁS - Herodes se recusa a condenar o homem. Nós somos homens santos e não podemos condenar
nenhum homem a morte. Esse agitador da nação é digno de morrer pelas coisas que disse e fez. Vamos
precisar de reforços.
PILATOS – Não quero começar uma rebelião.
CAIFÁS – A rebelião já começou.
PILATOS – Eu sou Pôncio Pilatos, o governador da Judeia, e não sentenciarei este homem à morte sem um
julgamento.
CAIFÁS – Por isso viemos aqui buscar a confirmação desse decreto.
PILATOS (indignado, mas paciente) – Já disse, não consentirei em interrogá-lo até terem apresentado as
acusações que têm contra ele, por escrito.
O sumo sacerdote dá um sinal para que o primeiro sacerdote passe às mãos de Lucio Galba as acusações
escritas contra Jesus. Lucio lê em voz alta para Pilatos.
LUCIO GALBA – O tribunal sinedrista considera este homem um malfeitor e um perturbador da nossa nação,
sendo culpado de: 1. Subverter a nossa nação e incitar nosso povo à rebelião contra Roma e contra o Templo.
2. Proibir o povo de pagar o tributo a César. 3. Chamar a si próprio de rei dos judeus e de pregar a fundação de
um novo reino. Essas são as acusações.
Pilatos, atônito e impressionado com a injustiça.
PILATOS – Interrogarei o prisioneiro com privacidade.
Os sacerdotes saem e Jesus é levado diante de Pilatos para o meio do palácio. João Zebedeu consegue
acompanhá-lo. Pedro corre para alcançar Jesus. Um soldado se aproxima e impede.

Quadro – 3ª Negação de Pedro


SOLDADO 3 – Este homem estava com Ele! És um galileu, também és um deles!
PEDRO – Por Deus que eu nunca vi esse homem antes, juro, pelas escrituras sagradas! Não quero estar nem
nunca estive ao seu lado!
Pedro termina a frase e entra em desespero, acusado pela própria consciência. Tumulto do lado de fora,
conversas em grupos.

34
#7 Pretório
Em tom amigável e com as acusações na mão, Pilatos pergunta.
PILATOS – Asseguro-lhe que não acredito na primeira acusação, mas diga-me, ensinastes alguma vez, que
deveriam se recusar a pagar os tributos a César?
CRISTO (indica João) Pergunte a ele ou a qualquer homem que tenha ouvido aos meus ensinamentos.
PILATOS – Diga homem: Seu Mestre proibia-lhes de pagar o tributo a César?
JOÃO ZEBEDEU – Testemunho a respeito dos ensinamentos de meu mestre e afirmo em julgamento que todos
nós pagávamos os impostos tanto a César quanto ao Templo.
PILATOS – Trate de não contar a ninguém que eu lhe dirigi a palavra (dispensa a presença de João Zebedeu
do castelo).
Pilatos volta-se para Jesus com interesse particular.
PILATOS – E agora sobre a terceira acusação: Tu és o Rei dos Judeus?
CRISTO – Dizes isso por si mesmo ou te disseram isso de mim?
PILATOS – O teu próprio povo te traz aqui e me pede para que te sentencie à morte. Sabes que não sou judeu,
apenas quero saber por mim mesmo o que foi que fizeste para te odiarem tanto. Diga-me agora, galileu,
tentastes fundar um novo reino?
CRISTO – Meu Reino não é deste mundo. Se o meu Reino fosse deste mundo, os meus discípulos não
permitiriam que eu fosse capturado. A minha presença aqui, de mãos atadas, é o suficiente para mostrar a
todos os homens que o meu Reino é um domínio espiritual, pela fé e pelo amor, tanto dos gentios, quanto dos
judeus.
PILATOS – Pelo modo que falas, tens autoridade nas mãos.
CRISTO – Sim. Para isso eu nasci, para dar testemunho da verdade. Qualquer homem que conheça a verdade
ouve o que digo.
PILATOS – Verdade? Quem sabe o que é a verdade?
Pilatos caminha até a frente novamente e se dirige a Caifás. Uma multidão começa a se formar.
PILATOS - Estudei a filosofia, compreendo quando chama a si próprio de rei, pois “o homem sábio é um rei”.
Estou convencido de que, em vez de ser um perigoso instigador de sedições, nada mais é do que um visionário
inofensivo, um inocente fanático.
SACERDOTE GAMALIEL – Ele deve morrer.
SACERDOTE ZACARIAS – Ele é um promotor de desordens. Um malfeitor.
CAIFÁS (a Pilatos) – Lamentarás muito se deixares este homem sair livre, Governador!
Neste momento uma vasta multidão se instala em frente à fortaleza, reivindicando a liberdade de um
prisioneiro, em comemoração da Páscoa. Pilatos ordena a Lucio Galba que traga um prisioneiro.
MULTIDÃO – Libertem um prisioneiro! Libertem! (várias vezes)
Pilatos vai à frente do pretório, aonde está o seu assento de julgamento e os estandartes levantados. Jesus e o
prisioneiro Barrabás são colocados lado a lado.
LÚCIO GALBA (anuncia) – Povo de Jerusalém! O magnânimo pretor Pôncio Pilatos, representante da Judeia
do Divino Imperador de Roma e Senhor do mundo de Tibério! (Aguarda, enquanto Pilatos reverencia o povo) É
costume dos governadores romanos permitir aos populares escolherem um homem preso para receber o
perdão na ocasião da Páscoa.
PILATOS (toma a palavra) – Eis aqui um assassino, Barrabás, o qual pessoalmente não posso perdoar e não
perdoarei jamais. Do outro lado, um inocente, Jesus de Nazaré. Jesus foi trazido pelos sacerdotes para ser
condenado à morte.
CAIFÁS – Libertem Barrabás!!
35
SACERDOTE GAMALIEL – Liberdade para Barrabás!
PILATOS (a Caifás) – Como podem escolher a vida de um assassino no lugar da vida deste homem, cujo pior
crime é chamar-se de rei dos judeus?
SACERDOTE ZACARIAS – Não temos outro rei além de César!
CAIFÁS (irado) – Se libertares esse homem, não é amigo de César. Libertem Barrabás!!
SACERDOTE GAMALIEL – Liberdade para Barrabás!
Vendo que os sacerdotes principais estavam decididos, unem-se todos ao pedido de libertação e gritam bem
alto.
MULTIDÃO – Liberdade! Libertem! Libertem Barrabás!
PILATOS (para os soldados reunidos) – Por que ainda querem crucificar este homem? Que mal ele fez? Por
que fazem questão de meu consentimento na sua morte? Porém, se ainda pensam assim, estou disposto a
puni-lo e depois soltá-lo.
Pilatos ordena para que montem a tribuna no locos aonde Jesus será açoitado.
PILATOS – Lúcio, ordene aos soldados e levem-no para a quarentena. Amarrem-no à coluna e batam com
força, mas deixem-no vivo. Assim todos ficarão satisfeitos com o seu sofrimento.
LÚCIO GALBA – Sim, senhor. Obedeço as suas ordens.
Os guardas levam Jesus ao tronco de flagelo para o suplício. Enquanto os soldados caminham com Jesus até
lá, enquanto os sacerdotes chamam a atenção da multidão. Claudia Prócula leva panos para que Maria limpe o
sangue de Cristo que ficou espalhado pelo pretório. Madalena ajuda Maria a limpar o espaço junto com João
Zebedeu.
CAIFÁS – Escutem, todos de Jerusalém, o pronunciamento do procurador romano Pôncio Pilatos, a quem
devem respeitar como amigo de César. Este ano escolheremos o prisioneiro para ser solto por motivo da
páscoa. Façam sua escolha com inteligência, para evitar que toda a nossa nação pereça, ao invés de um só
homem. O proclamado Rei dos Judeus, é contra César. Se o deixarmos assim, os romanos nos tirarão o nosso
lugar e a nossa nação.
Sob o comando, começam a chibatar e, antes que houvesse terminado com as quarenta chibatas, Pilatos
manda aos açoitadores que parem e os guardas levam-no para o lado de Barrabás nos degraus do palácio.
Enquanto Jesus é açoitado, sente suas forças se esvaírem, porém olha para Maria, que está de pé, à sua
frente, irredutível, então se ajeita novamente, recupera suas forças e se posiciona para continuar seu flagelo,
enquanto Maria sofre em silêncio.
PILATOS (a todos) – Eis o homem. De novo declaro que não vejo nele crime algum e por isso gostaria de
libertá-lo. O que foi que ele fez para merecer a morte?
CAIFÁS (a Pilatos) – Qualquer que se faz rei é contra César. Se o deixarmos assim, todos crerão nele. Terá de
vir o próprio César resgatar sua nação?
SACERDOTE GAMALIEL – Ele se fez passar pelo Filho de Deus.
PILATOS (a Cristo) – Fale comigo. Não sabe que eu ainda tenho poder de te libertar ou de te crucificar?
CRISTO (com muita dificuldade) – Nenhum poder teria sobre mim, se de cima não te fosse dado.
Pilatos vai novamente a frente para se pronunciar ao povo, mas o sumo sacerdote instiga a multidão.
CAIFÁS – Libertem Barrabás!
MULTIDÃO – Libertem Barrabás! Liberdade para Barrabás!
PILATOS – Querem liberdade a Barrabás? O que devo fazer com aquele que é chamado de rei dos judeus?
SACERDOTE ZACARIAS (com toda força) – Crucifica-o!
MULTIDÃO (gritam em um só acorde) – Crucifica-o! Crucifica-o! Crucifica-o! Crucifica-o!
PILATOS (a todos) – Mais uma vez, eu ainda pergunto, qual desses prisioneiros devo libertar nesta época da
Páscoa?
36
MULTIDÃO (gritam) – Dá-nos Barrabás! Liberdade a Barrabás! Libertem Barrabás!
Pilatos vacila, entra, olha para Prócula e volta para encarar Barrabás de frente.
PILATOS – Teus concidadãos me constrangeram a te libertar, libertar um assassino. Vás para o mais longe que
puderes e arranje-se para que nunca mais esteja diante de mim, porque na próxima vez não escaparás à minha
justiça. (Para os soldados) Soltem Barrabás. E tragam numa bacia um pouco de água.
Os soldados arrastam Barrabás até a escadaria e o expulsam a pontapés. Barrabás ergue-se imediatamente
rangendo os dentes.
BARRABÁS (incita o povo) – Liberdade! Foi salvo da cruz! Liberdade para Barrabás!
Assim que Barrabás é solto, Lúcio traz a água a Pilatos e Jesus é levado para crucificação.
PILATOS – Estou inocente do sagrado sangue deste homem. Estão decididos que ele deve morrer, mas eu não
encontrei nenhuma culpa nele. A multidão fez sua escolha.
JOSÉ DE ARIMATEIA – Que seu sangue caia sobre nós e sobre os nossos filhos.
Um soldado segura uma placa em que Pilatos escreve: “Jesus Nazareno, Rei dos Judeus”.
SACERDOTE SIMÃO (aos sacerdotes, indignado) Rei dos Judeus?!
SACERDOTE ZACARIAS (grita para Pilatos) – Escreva que “ele disse” que é o rei dos judeus.
PILATOS – O que escrevi, está escrito.
Claudia Prócula chora em silêncio enquanto vê o sofrimento de Maria.

Ato V CRUCIFICAÇÃO

#1 Via Crucis

Por volta das nove horas da manhã. Cruzes acham-se em destaque já firmemente fincadas no loco do Gólgota.
Antes de golpearem com os seus chicotes cheios de nódulos zombam de Jesus.
SOLDADO 3 (bate-lhe no rosto com as mãos) – Salve, rei dos judeus!
Entrega-lhe um talo de cana, simulando um cetro e cospe-lhe.
SOLDADO 4 – Digno de grande fama e excelência! Certamente és um rei agora. E nós somos seus servos.
Ele se ajoelha diante d´Ele e zomba. Coloca-lhe a coroa de espinhos.
SOLDADO 5 – Com minhas próprias mãos eu te coroo rei!
Antes de deixar o pátio do pretório, os soldados colocam a viga nos ombros de Jesus. Ao longo de todo o
caminho, sacerdotes, soldados, mulheres, hebreus e todo tipo de gente se posiciona para ver passar os
prisioneiros. O povaréu escarnece, ridiculariza e zomba enquanto Jesus passa por eles. Muitas mulheres
lamentam discretamente. Sacerdotes estimulam a galhofa. Outros sacerdotes ocupam-se com uma reunião no
Templo para discutirem o que deveria ser feito com os seguidores de Jesus.
Em certo momento, Jesus cambaleia e cai. Maria, mãe de Jesus, se aproxima com João Zebedeu e Madalena
e tenta impedir os guardas como pode. Algumas mulheres também se reúnem a frente, no caminho da
procissão.
MARIA – Meu filho, como posso suportar o teu sofrimento?
CRISTO – Lembras, mãe? Lembras de quando eu era menino? Lembras do que te disse na ceia?
Jesus toca o rosto de Maria. (Pausa) Maria o ajuda a se levantar, Jesus se recompõe e continua a carregar a
cruz. O loco da ceia se acende e Maria o reconhece em suas memórias. Os guardas a afastam e Jesus
continua seu martírio.
37
Neste momento os guardas ocupam-se com as mulheres que impedem os açoites. Jesus anda mais um pouco,
os soldados o escorraçam. Ele cai pela segunda vez. Uma mulher de nome Verônica se aproxima de Jesus, tira
seu véu e tenta enxugar o rosto de Jesus, e tenta lhe oferecer um pouco de água.
VERÔNICA – Permita-me, meu Senhor.
Verônica tenta dar um pouco de água para Jesus, mas um soldado a afasta e a derruba no chão.
SOLDADO 4 – Saia! Saia! Vamos!
Os soldados gritam com ele e chutam-no, ele cai e não consegue mais se levantar. Quando o capitão percebe,
comanda aos soldados que desistam. E então ordena a um transeunte, Simão de Cireneu, que tire a viga da
cruz dos ombros de Jesus e obriga-o a carregá-la pelo resto do caminho ao Gólgota.
SOLDADO 3 – Ei, tu mesmo, Não me oviste?. Este homem já não pode carregar a cruz por si mesmo. Ajude-o.
Cireneu tenta fugir e se afasta.
SOLDADO 3 – Estou mandando. Ajude-o!
CIRENEU – Tudo bem, o ajudo, mas saibam que sou um inocente a carregar a cruz de um condenado.
Jesus segue cambaleante. Eles chegam ao Gólgota, onde não permitem outras pessoas. Os que seguiam a
procissão ficam à base da colina divididos entre homens e mulheres.

#2 Cruz
Dois ladrões são postos em suas cruzes, maldizendo a todo o tempo e cuspindo nos seus executores. Os
soldados despem Jesus e roubam-lhe as vestes, disputam sua túnica e decidem rasgá-la para dividi-la.
Preparam a crucificação de Cristo. Martelam-lhe as mãos e os pés. Ouvem-se os gritos de agonia.
CRISTO (na cruz) – Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que fazem.
GERBAS (para Jesus) – Se és mesmo o Messias, Filho de Deus, como diz, e viestes para salvar a todos, por
que não se salva? Estamos aqui em cima e ninguém tem pena de nós. Por que não se salva, a ti mesmo e a
nós? Então acreditarei.
DIMAS (para Gerbas) – Cale-se! Nós merecíamos isto e coisa pior. Este homem não fez mal nenhum. Ele não
cometeu pecado algum neste mundo. (Para Jesus) Senhor, embora eu não seja merecedor de tanta graça,
lembre-se de mim, quando estiver em teu Reino.
CRISTO – Em verdade vos digo que hoje mesmo estarás comigo no Paraíso.
MARIA - Ah! Meu filho! Meu menino! Levado a morte sem culpa! Levado a cruz por pecados que não são seus!
Como pode haver tanta tristeza? Minha alma está dilacerada, meu coração está em cinzas.
Mais adiante encontra-se com as mulheres que choram. O mestre volta a sua cabeça para elas.
CRISTO – Filhas de Jerusalém, não chorem por mim, chorem antes por vós e por vossos filhos. A minha obra
está completa e eu vou para o Pai.
MARIA - Meu filho. Eu estou aqui. Vou morrer se não te ajudar!
CRISTO – Mãe, porque lamentas tão alto? Apoie-se em João, ele será teu filho. Contempla teu filho. (Para
João) Filho, esta é a tua mãe, contempla tua mãe.
MARIA – Filho!
JOÃO ZEBEDEU – Senhor, eu farei o que me pede.
Os soldados comem e partilham vinho, pois é dado meio-dia. Eles brindam a ‘Jesus de Nazaré’.
SOLDADO 3 – Saúde, rei dos judeus!
CRISTO – Pai, tenho sede.
SACERDOTE GAMALIEL – Vamos, não morra por uma gota d´água.

38
SACERDOTE ZACARIAS – Se és Deus, estás fingindo sofrer.
SACERDOTE SIMÃO – Se és mesmo o Filho de Deus, desça da cruz e salve-te a ti mesmo!
Lúcio Galba tira um pouco do vinho da sua garrafa e, com a tampa esponjosa saturada do líquido, na ponta de
uma lança, leva-a a Jesus para que molhe os seus lábios secos
CRISTO (Jesus balbucia os Salmos, ouve-se alguns versículos) – “Deus meu, durante o dia eu te chamo, mas
não respondes. Eu te chamo de noite, mas não consigo descansar.” “Meu Deus, meu Deus, por que me
abandonaste?” “Por que ficas tão longe?” “Por que não escutas quando grito pedindo socorro?” (Salmos 23:1-8) “Eli,
Eli, lama sabactani!”
SACERDOTE SIMÃO – Ele clama por Deus!
SACERDOTE ZACARIAS – Vejamos se isso o salvará da morte.
SACERDOTE GAMALIEL – Abram bem os olhos para ver se Deus vem libertá-lo da cruz e levá-lo deste
martírio!
MARIA – Meu Filho, carne da minha carne, sangue do meu sangue, coração do meu coração, deixa-me morrer
contigo?!
SILÊNCIO.
CRISTO – Está consumado. Fui obediente a Sua vontade. Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito.
Jesus morre. Maria grita desesperada. Trovões, escuridão e gritos tenebrosos. Terror. Soldados ali presentes
ficam muito assustados. Eles tiram os prisioneiros das cruzes, mas Lúcio Galba enfia a lança ao lado de Jesus
para tirá-lo. Desolado, entrega o corpo a Maria.
LÚCIO GALBA – Não há dúvida. Este homem era inocente! O que foi que fizemos?
Maria, que tenta limpá-lo com seu manto (Pietá).
MARIA – Seu sangue torna ingrata esta grama. Ele escurece sua pele alva. Meu filho, as mãos criadoras do
universo, furadas. Sua voz me fez sofrer como se eu estivesse na cruz.
Maria, com Jesus nos braços. Do outro lado, Maria Madalena. Os apóstolos aproximam-se de Maria e levam o
corpo de Jesus ao sepultamento. Trilha sobe. Mulheres choram em frente ao sepulcro de Cristo, mas aos
poucos vão saindo, até sobrar apenas dois soldados, que adormecem e Madalena, que permanece chorando
aos pés do sepulcro de Cristo.

Epílogo Ressurreição de Cristo


Luz muito forte incide de dentro do sepulcro, anjos aparecem e a pedra que sela a porta se abre sozinha. Surge
Jesus, de branco, com os braços abertos e as máculas nas mãos. Uma multidão vai se reunindo no centro do
espaço. Madalena,que chorava aos pés do sepulcro fica extasiada de alegria e corre até a multidão para contar
a boa nova.

JESUS – Tudo está consumado! Creiam em Deus, e creiam também em mim. Eu Sou o Alfa e o Ômega, o
Princípio e o Fim. O primeiro e o último. Sou o caminho, a verdade e a vida. Se me amam, guardem meus
ensinamentos. Preguem o Reino dos Céus. Curem enfermos, ressuscitem mortos, purifiquem leprosos,
expulsem demônios. O que de graça receberam de graça darão. E amem. Amem ao próximo como a ti mesmo,
e vejam no próximo o brilho dos meus olhos. Pois de todos os ensinamentos, o maior e mais importante é o
amor. Iluminem o mundo de quem está na escuridão com a luz das palavras de meu Pai.. Estou vivo!
Levantem: Deixo-lhes a paz, a minha paz lhes dou. Eu estarei convosco todos os dias até o final dos tempos.

FIM

39

Você também pode gostar