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John Kanumbo

John Kanumbo

DIVORCIADO DE
DEUS
DIVORCIADO DE DEUS

Copyright © 2024 John Kanumbo

Todos os direitos reservados.

ISBN: 979-888-2825-84-2

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DEDICATÓRIA

Aos viceras
Que primeiramente terão que sugar o meu frio sangue na tumba!
ÍNDICE

Agradecimentos i

Prefácio 3

Introdução: O Casamento Divino 6

As Promessas Quebradas 7

O Deus Ciumento 20

A Inconstância Divina 32

A Ilusão do Amor Divino 37

Liberdade Além das Fronteiras da Fé 40

Em Busca da Verdade Interior 45

Bibliografia 46

Sobre Mim 47
AGRADECIMENTOS

Ao,
Cornélio Chipaki,
Atanásio Fabrino.
PREFÁCIO
Caro amigo leitor,

Ao segurar este livrinho em suas mãos, você está prestes a embarcar em uma
jornada íntima e provocativa através das complexidades da espiritualidade, da fé e
da busca pela verdade interior. “O Divorciado de Deus” não é apenas uma
narrativa pessoal, mas uma reflexão profunda sobre as interseções entre a
experiência humana e o divino, entre a liberdade individual e as estruturas
religiosas. Aqui, não encontrará respostas prontas ou dogmas a serem seguidos,
mas sim um convite para explorar as complexidades e nuances da experiência
espiritual humana.
Nesta obra, eu, John, convido você a explorar os labirintos da minha própria
jornada espiritual, marcada por questionamentos, descobertas e, finalmente,
libertação das garrascrências. Desde os primeiros passos na infância até os
momentos de confronto com a inconstância divina, cada página revela uma busca
incansável por autenticidade e significado. Ao longo de minha própria jornada
espiritual, deparei-me com desafios e questionamentos que me levaram a reavaliar
minhas crenças e a buscar uma compreensão mais profunda do divino.
Nas páginas que se seguem, compartilho minhas reflexões, descobertas e
significados ao confrontar com as promessas ilusórias, as inconstâncias, ilusão e
limitação do amor divino. Não pretendo impor uma verdade absoluta, mas sim
oferecer um convite especial para o diálogo e a reflexão sobre questões que são
fundamentais para a experiência humana. Um apelo amigável é que ném me julgue
e ném se julguem ao terminar esta obra.
À medida que desvendamos as camadas dessa narrativa, também exploramos
as vozes de pensadores e filósofos ao longo da história, religiosas e espirituais,
desde os antigos filósofos gregos até os pensadores modernos, cujas ideias
ressoam nas intersecções entre o humano e o divino. De Platão a Nietzsche, de
Simone de Beauvoir a Erich Fromm, cada voz contribui para o diálogo contínuo
sobre a natureza da fé, da liberdade e da busca pela verdade como se diz a verdade
nunca tem idade. Nossa jornada não se limita apenas aos domínios filosóficos,
mas também mergulha nas águas turbulentas da história e da cultura. Ao olharmos
para trás, encontramos os ecos das antigas epopeias hindus, os ensinamentos dos
profetas bíblicos e as reflexões dos poetas místicos, todos eles tecendo um rico
tapete de experiência humana e espiritualidade.
No entanto, esta obra não é apenas um exercício intelectual, mas um convite
à reflexão pessoal e à autodescoberta. À medida que você avança pelas páginas,
convido-o a questionar suas próprias crenças, a explorar os recantos mais
profundos de sua alma e a abraçar a liberdade de buscar sua própria verdade
interior. Que estas palavras possam abrir portas para novas possibilidades e
perspectivas, convidando-nos a abraçar a plenitude de nossa humanidade e a
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DIVORCIADO DE DEUS

transcender as limitações que nos prendem ao passado. Que possamos encontrar


liberdade e realização além das fronteiras da fé, celebrando a diversidade e a
riqueza da experiência espiritual humana. Que esta jornada o inspire a olhar para
além das fronteiras da fé convencional, a abraçar sua própria jornada espiritual
com coragem e curiosidade, e a encontrar, dentro de si mesmo, a luz da
autenticidade e da realização.
Com sinceridade,

John Oreste.

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DIVORCIADO DE DEUS

Este tratado convida o leitor a questionar as bases de sua


fé, a explorar os limites do divino e a abraçar uma
existência livre de dogmas e opressões religiosas

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DIVORCIADO DE DEUS

INTRODUÇÃO: O CASAMENTO DIVINO

Neste capítulo introdutório, eu sujeito pensante relato como foi seduzido pelas promessas de
amor eterno de Deus, representado pelos ensinamentos dos líderes religiosos.
No altar da minha alma, eu me ajoelhei diante da divindade. Como um amante
ardente, entreguei meu coração a um ser que prometia amor eterno, proteção e
salvação. Fui seduzido pelas palavras doces dos profetas, enfeitadas com a
promessa de um amor transcendental, capaz de preencher todos os vazios da
minha existência. Aceitei, sem questionar, os votos que me ligavam a uma entidade
que se dizia todo-poderosa, omnisciente e amorosa e sumo bom e de todas
bondades.
Porém, o que começou como um conto de fadas espiritual rapidamente se
transformou em um pesadelo de decepções e desilusões. As promessas feitas nos
sermões de domingo evaporaram-se na névoa da realidade, deixando para trás um
vazio doloroso e uma sensação de abandono. A mão divina, que deveria guiar-me
com segurança pelos caminhos da vida, pareceu recuar quando mais precisei dela,
deixando-me à mercê das tempestades da existência humana.
Neste pequiníssimo tratado, desvelarei as cortinas que ocultam a verdade por
trás do véu do divino. Não recuarei diante da linguagem rígida que me é sugerida,
pois é com a força das palavras que desmantelarei as estruturas que me
aprisionaram por tanto tempo. Seguirei adiante com determinação, sem desviar-
me do propósito desta obra: desvendar as amarras que me ligavam a um Deus
ciumento, inconstante e ilusório, e proclamar minha liberdade além das fronteiras
da fé.

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AS PROMESSAS QUEBRADAS
Aqui, exploro as expectativas frustradas do eu sujeito pensante em relação à ajuda divina e
à realização das promessas feitas por Deus.

Inicio a minha jornada com as palavras de Nietzsche, cuja crítica à moralidade


religiosa ecoa na minha alma, desafiando-me a questionar as bases da minha fé.
No início, acreditava piamente que minha devoção seria recompensada com a
proteção divina e o cumprimento das promessas feitas nos textos sagrados.
Através das lentes do filósofo existencialista Sartre, exploro o conceito de
liberdade em meio ao vazio deixado pelas promessas não cumpridas de Deus.
Entretanto, à medida que a vida avançava e os desafios se apresentavam diante de
mim, percebi que essas promessas eram frágeis como fios de seda, facilmente
desfeitas pelos ventos da adversidade.
À medida que avanço, sou guiado por Camus, que me lembrava do absurdo
da existência humana e da necessidade de confrontar a realidade sem ilusões.
Recordo-me no entanto, das noites de angústia e desespero, clamando por uma
resposta que nunca chegava. O silêncio ensurdecedor do céu era a única resposta
que eu recebia, ecoando em minha alma como um lembrete cruel de minha solidão
e abandono. As lágrimas vertidas em preces fervorosas pareciam evaporar antes
mesmo de tocar o chão, perdidas na vastidão indiferente do cosmos.
A cada promessa quebrada, um pedaço de minha fé se desfazia, deixando para
trás uma amargura crescente e a sensação de ter sido ludibriado por um amor que
jamais se concretizaria. O Deus que me prometia vida em abundância parecia
contentar-se em me observar naufragar nas águas turbulentas da existência, sem
estender sequer uma mão para me salvar do afogamento iminente. A cada página,
as promessas quebradas de Deus são confrontadas com a força do pensamento
crítico e a coragem de questionar. Não mais me contento com respostas fáceis e
consolações vazias, mas sim buscar a verdadeira essência do divino, além das
cortinas de ilusão. Ao mergulhar nas profundezas da minha própria jornada
espiritual, deparei-me com as promessas quebradas que definiram minha relação
com o divino. Cada promessa não cumprida foi como uma ferida aberta na minha
alma, deixando cicatrizes que ecoavam a dor da decepção e da desilusão.

Promessa de Ajuda Infalível

Desde os primeiros dias da minha jornada religiosa enquanto criança, fui


ensinado a confiar na promessa de que Deus sempre estaria ao meu lado, pronto
para intervir em meu favor nos momentos de necessidade. No entanto, à medida
que enfrentava desafios e dificuldades, percebi que essa ajuda era mais uma ilusão
do que uma realidade. Meus clamores por auxílio pareciam perder-se no vazio do
céu, sem resposta ou consolo. Ainda ao confrontar a ilusão da promessa de ajuda
infalível, encontrei apoio nas palavras de Friedrich Nietzsche, que questionou a
noção de um Deus omnipotente e benevolente em seu trabalho “Assim Falou
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DIVORCIADO DE DEUS

Zaratustra” (2002). Zaratustra proclama: “Deus está morto”, desafiando a crença


tradicional na intervenção divina nos assuntos humanos. Essa frase ressoou em
mim, revelando a fragilidade das expectativas que eu havia depositado em um ser
transcendental. Lembrei-me também das palavras de Jean-Paul Sartre, que
explorou a ideia do absurdo da existência humana em “O Existencialismo é um
Humanismo”. Sartre argumenta que estamos condenados à liberdade, responsáveis
por criar nosso próprio significado em um universo aparentemente sem sentido.
Essa noção confronta directamente a ideia de uma ajuda divina infalível,
desafiando-me a assumir a responsabilidade pela minha própria vida. Ao dialogar
com esses pensadores, percebi que minha busca por ajuda divina era, na verdade,
uma fuga da responsabilidade pessoal. Como Sartre apontou, a liberdade é uma
carga pesada, mas também é o que nos torna verdadeiramente humanos. Aceitar
essa responsabilidade significava reconhecer que eu era o único mestre do meu
destino, não um ser sobrenatural no céu. Portanto, ao invés de esperar por uma
ajuda que nunca vinha, decidi enfrentar meus desafios de frente, confiando na
minha própria força e nas redes de apoio humanas ao meu redor. Ao fazer isso,
descobri uma sensação de empoderamento e autonomia que nunca havia
experimentado antes. Em vez de me sentir abandonado pelo divino, senti-me mais
conectado com a humanidade e comigo mesmo. Assim, ao confrontar a ilusão da
promessa de ajuda divina infalível, encontrei a verdadeira libertação e fortaleci
meu compromisso com uma vida autêntica e responsável. Em vez de buscar
respostas nos céus, encontrei-as dentro de mim mesmo e na comunidade humana
que me rodeia. Essa jornada de autodescoberta e empoderamento foi, sem dúvida,
uma das maiores bênçãos que emergiram do meu divórcio com Deus.

Promessa de Amor Incondicional

Acreditava fervorosamente na promessa de um amor divino que transcenderia


todas as minhas falhas e fraquezas. No entanto, à medida que minha vida se
desenrolava, descobri que esse amor era condicional, baseado na minha
obediência e devoção cega. Cada erro que cometia era recebido com desaprovação
silenciosa, como se Deus estivesse me punindo por não atender às suas
expectativas irreais.

Ao reflectir sobre a ilusão da promessa de amor incondicional, encontro


ressonância nas obras de diversos pensadores que exploraram a natureza do amor
humano e divino. O filósofo Søren Kierkegaard, em sua obra “Obras do Amor”,
distingue entre o amor humano e o amor divino, argumentando que o amor
verdadeiro deve ser incondicional e altruísta, uma expressão do mais alto ideal
humano. No entanto, ao confrontar a realidade de um amor divino condicional,
vi-me obrigado a questionar se o amor de Deus era realmente digno desse nome.
E ao confrontar a promessa de amor divino, percebo que ela se assemelha mais
ao amor humano, condicionado à obediência e à devoção cega. Essa discrepância
entre a teoria e a prática do amor divino me deixou desiludido e confuso.

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DIVORCIADO DE DEUS

Além disso, ao me deparar com a desaprovação silenciosa de Deus diante dos


meus erros, lembro-me das palavras de Dietrich Bonhoeffer, que abordou a
questão do pecado e da graça em sua obra “Ética”. Bonhoeffer argumenta que a
graça divina não é uma licença para o pecado, mas sim um chamado para uma
vida de responsabilidade e redenção. No entanto, ao sentir-me constantemente
julgado e condenado pelos meus erros, questionei a verdadeira natureza da graça
divina e se ela realmente existia para mim. No entanto, à medida que a vida se
desdobrava diante de mim, essa promessa revelou-se nada mais do que uma
miragem, uma ilusão cuidadosamente tecida para manter-me cativo à religião. Ao
cometer erros e falhas, ao enfrentar desafios e adversidades, descobri que o amor
de Deus não era tão incondicional quanto me haviam prometido.
Cada vez que eu tropeçava, cada vez que eu falhava, sentia-me julgado e
condenado pela mão invisível do divino. A desaprovação silenciosa que permeava
meu ser era como uma sombra constante, obscurecendo qualquer vislumbre de
esperança ou redenção. Era como se Deus estivesse me punindo por não atender
às suas expectativas irreais, por não ser o ser perfeito que ele desejava que eu fosse.
Essa dicotomia entre a promessa de amor incondicional e a realidade de um amor
condicional abalou minha fé e me levou a confrontar a ideia de um Deus amoroso
e justo. Como poderia um Deus que se proclama amoroso e compassivo punir
seus filhos por suas falhas e fraquezas? Ao confrontar essas questões profundas e
dolorosas, percebi que a verdadeira natureza do amor divino não pode ser definida
por dogmas e doutrinas, mas sim pela experiência humana da compaixão e da
empatia. Em vez de buscar o amor em um ser transcendental e distante, encontrei-
o nas relações humanas, nos gestos de bondade e generosidade que permeiam
nossa existência diária.

Assim, ao confrontar essas questões, descobri que o verdadeiro amor não pode
ser imposto por meio de regras e regulamentos, mas deve brotar livremente do
coração humano. Não mais aceitando a ilusão de um amor divino condicional,
abracei a ideia de um amor humano, imperfeito, mas genuíno e libertador. Nesse
amor, encontrei consolo e redenção, longe das expectativas irreais de um Deus
distante e implacável. Esta foi uma jornada dolorosa e transformadora, mas
também uma que me trouxe uma nova compreensão do que significa amar e ser
amado. Ao confrontar a ilusão do amor divino incondicional, mergulhei ainda
mais fundo na compreensão do amor humano e suas nuances. Enquanto o amor
divino prometia uma perfeição irreal e uma conexão transcendental, o amor
humano revelou-se como uma experiência genuína e enraizada na realidade da
vida cotidiana.

Amor Divino versus Amor Humano

No amor divino, as promessas de perfeição e transcendência muitas vezes se


traduzem em expectativas irreais e inatingíveis. Deus é retratado como o ápice do
amor, capaz de perdoar todas as falhas e fraquezas humanas. No entanto, essa
imagem idealizada de Deus como o perfeito amante muitas vezes leva à decepção

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DIVORCIADO DE DEUS

quando confrontada com a realidade da vida humana. Por outro lado, o amor
humano é marcado pela imperfeição e pela vulnerabilidade. Não há promessas de
perfeição ou transcendência, mas sim um compromisso mútuo de aceitar e apoiar
um ao outro em meio às imperfeições e falhas. É no reconhecimento e na
aceitação dessas imperfeições que o verdadeiro amor humano floresce. Enquanto
o amor divino promete cura instantânea e libertação de todas as aflições, o amor
humano se manifesta nas pequenas acções do dia a dia. Um abraço reconfortante
em tempos de tristeza, uma palavra de encorajamento em momentos de dúvida,
são expressões tangíveis do amor humano que transcendem as promessas vazias
do amor divino.

O amor divino muitas vezes é retratado como unilateral, emanando do alto


para os seres humanos. No entanto, o amor humano é uma troca mútua de
cuidado e afecto, onde ambos os parceiros contribuem para o bem-estar e a
felicidade um do outro. É essa reciprocidade que dá profundidade e significado
ao amor humano. Enquanto o amor divino muitas vezes é retratado como
incondicional, baseado na obediência e devoção cega, o amor humano é
construído sobre a confiança, o respeito e a comunicação aberta. Não há exigência
de perfeição no amor humano, mas sim um compromisso de crescer e aprender
juntos ao longo do tempo. O amor divino pode parecer distante e impessoal, uma
entidade transcendental que observa de longe. Por outro lado, o amor humano é
tangível e palpável, enraizado na experiência compartilhada e na intimidade
emocional entre dois indivíduos. Ao explorar as nuances entre o amor divino e o
amor humano, foi essencial destacar ainda as contribuições de pensadores que me
ofereceram conhecimentos profundos sobre essa dicotomia.
No Amor Divino li o Agostinho de Hipona, em sua obra “Confissões”,
Agostinho explora a natureza do amor divino como uma força transcendental que
permeia todas as coisas. Ele enfatiza a gratuidade e a generosidade desse amor,
que é capaz de perdoar até mesmo os pecados mais graves. Agostinho defende a
ideia do amor divino como uma força transcendental e incondicional, emanando
do próprio ser de Deus. No entanto, sua concepção do amor divino eu critico por
ser em sua ênfase na soberania divina e na predestinação, o que limita a liberdade
humana e a responsabilidade pessoal no contexto do amor.

Por sua vez, fui buscar Erich Fromm em “A Arte de Amar” obra publicada em
1956, Fromm explora o amor humano como uma arte que requer dedicação e
prática. Ele enfatiza a importância da maturidade emocional e do
autoconhecimento no desenvolvimento de relacionamentos amorosos saudáveis.
Para Fromm, fui-lhe pereceber que ele critica a concepção de Agostinho sobre o
amor divino ao destacar a importância da liberdade e responsabilidade individuais
no amor humano. Argumentando que o amor verdadeiro é uma escolha
consciente e activa, baseada na autenticidade e na capacidade de se relacionar com
os outros de forma saudável e significativa.

Sumariamente, fui buscar em “Summa Theologica”, de Santo Tomás de Aquino,

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DIVORCIADO DE DEUS

ele aborda a questão do amor divino como uma manifestação da bondade de


Deusonde ele argumenta que o amor divino é incondicional e imutável, emanando
do próprio ser de Deus. E ainda por cima, ele elabora a ideia do amor divino como
uma manifestação da bondade e perfeição de Deus. Onde enfatiza a gratuidade e
a imutabilidade desse amor, que transcende as limitações humanas. No entanto,
sua concepção do amor divino pude eu efectuar uma critica por sua visão
hierárquica da criação, que coloca os seres humanos como subordinados a Deus
e limita sua capacidade de compreender e experimentar plenamente o amor
divino.

Enquanto no Amor Humano, tenho a distacar Jean-Paul Sartre: Em “O


Existencialismo é um Humanismo”, Sartre destaca a importância do amor humano
como uma expressão da liberdade e responsabilidade individuais. Ele argumenta
que o amor humano é uma escolha consciente, baseada na aceitação mútua e na
autenticidade. Jean-Paul Sartre, critica a visão de Aquino sobre o amor divino ao
enfatizar a importância da liberdade humana e da responsabilidade individual.
Sartre argumenta que o amor verdadeiro só pode existir no contexto da liberdade
e da autenticidade, e que qualquer forma de amor que limite ou coíba a liberdade
humana é essencialmente falsa e opressiva.

Ao confrontar as ideias desses pensadores com minha própria experiência de


amor divino e humano, percebi que o amor humano é mais tangível e significativo
em minha vida. Enquanto o amor divino prometia uma perfeição irreal e uma
conexão transcendental, o amor humano revelou-se como uma experiência
genuína e enraizada na realidade da vida cotidiana. Essa compreensão mais
profunda do amor humano me permitiu reconectar-me comigo mesmo e com os
outros de uma maneira mais autêntica e gratificante. Para desenvolver uma crítica
mais profunda da ideia do amor divino como uma fonte de dependência e ilusão,
podemos explorar as obras de pensadores contemporâneos como Friedrich
Nietzsche e Albert Camus, que desafiaram radicalmente as noções tradicionais de
amor e religião.

Nietzsche, em obras como “Assim Falou Zaratustra” e “Além do Bem e do


Mal”, critica fortemente a ideia do amor divino como uma forma de dependência
e fraqueza. Ele argumenta que a religião, incluindo a ideia do amor divino, é uma
criação do homem para evitar enfrentar a realidade da existência humana. Para
Nietzsche, o amor divino é uma ilusão que aprisiona os indivíduos em uma
mentalidade de rebanho, impedindo-os de buscar sua própria grandeza e
autenticidade.
Camus, em “O Mito de Sísifo” e “O Estrangeiro”, examina a natureza da esperança
e do sofrimento humano em um universo aparentemente sem sentido. Ele critica
a ideia do amor divino como uma fonte de consolação falsa, que obscurece a
verdadeira condição humana e impede os indivíduos de confrontar a realidade da
vida. Para Camus, o amor divino é uma ilusão que nos impede de encontrar
significado e propósito em nossas próprias ações e relações humanas. Ao unir as

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DIVORCIADO DE DEUS

críticas de Nietzsche e Camus à concepção tradicional do amor divino, pude ver


como essa ideia é prejudicial e limitadora para os indivíduos. Ao invés de
promover uma verdadeira liberdade e autenticidade, o amor divino levava-me à
dependência emocional e à falta de responsabilidade pessoal. Portanto, foi
essencial questionar e desafiar essas noções tradicionais de amor divino, buscando
uma compreensão mais profunda e significativa da natureza do amor e da
existência humana. Em última análise, ao confrontar a ilusão do amor divino e
abraçar o amor humano, descobri uma fonte de verdadeira conexão e significado.
É no calor dos relacionamentos humanos, na profundidade da intimidade
compartilhada, que encontrei a plenitude e a autenticidade que sempre busquei.
Este amor, longe das promessas falsas do divino, é o verdadeiro tesouro da vida
humana.

Promessa de Orientação Infalível

Confiei na promessa de que Deus me guiaria com sabedoria e discernimento


ao longo da minha jornada, iluminando o caminho diante de mim com sua luz
divina. No entanto, à medida que enfrentava encruzilhadas e decisões difíceis,
descobri que essa orientação era mais uma miragem do que uma realidade. Minhas
preces por clareza e direção pareciam cair em ouvidos surdos, deixando-me
perdido em um mar de incertezas e dúvidas. Ao confrontar a ilusão da promessa
de orientação divina infalível, mergulhei nas obras de diversos pensadores que
exploraram a natureza da fé e da busca por sentido na vida. Blaise Pascal, em seu
livro “Pensées”, Pascal aborda a questão da busca por orientação divina em meio à
incerteza e ao desconhecido. Ele argumenta que a fé em Deus é uma aposta
racional, uma escolha que devemos fazer mesmo quando as evidências são
escassas. No entanto, ao enfrentar as encruzilhadas da vida, podemos nos sentir
abandonados por essa orientação divina, levando-nos a questionar a validade de
nossa fé.

Søren Kierkegaard, em obras como “O Desespero Humano” e “Temor e Tremor”,


explora a natureza da fé como um salto para o desconhecido. Ele argumenta que
a fé verdadeira é caracterizada pela angústia e pela incerteza, uma luta constante
entre o desejo de clareza e a necessidade de confiar no divino. Ao confrontar as
dificuldades da vida, podemos nos sentir perdidos e desamparados, questionando
se Deus realmente está nos guiando ou se estou apenas vagando no escuro.
Nietzsche, em sua obra “Além do Bem e do Mal”, critica a ideia de fé como uma
busca por orientação divina em meio à incerteza. Ele argumenta que a fé é uma
forma de fraqueza e escapismo, uma tentativa de evitar a responsabilidade pessoal
e a autonomia. Ao confiar cegamente na orientação divina, corremos o risco de
nos tornarmos passivos e resignados diante das dificuldades da vida.

Ao dialogar com esses pensadores, percebi que a busca por orientação divina
é uma jornada complexa e multifacetada. Enquanto Pascal e Kierkegaard me
lembram da importância da fé e da confiança no divino, Nietzsche me alerta sobre

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DIVORCIADO DE DEUS

os perigos da dependência e da resignação. Nesse processo de confrontar as


incertezas da vida, é essencial encontrar um equilíbrio entre a busca pela
orientação divina e a responsabilidade pessoal pelo nosso próprio destino. Diante
da desilusão com a suposta orientação divina que parecia inexistente, é pertinente
explorar como os pensamentos de Baruch Spinoza e outros filósofos que
lançaram luz sobre essa experiência de incerteza e dúvida.
Baruch Spinoza, em sua obra “Ética”, propõe uma visão do universo como
uma totalidade coerente regida pelas leis da natureza. Para Spinoza, não há espaço
para a intervenção divina ou orientação sobrenatural; em vez disso, somos parte
integrante dessa ordem natural e devemos buscar compreendê-la através da razão
e da investigação científica. Diante das incertezas da vida, podemos encontrar
consolo na compreensão das leis naturais que regem o universo, em vez de
depender de uma orientação divina que pode não existir.

No “O Mito de Sísifo" Camus, aborda a questão da absurdez da existência


humana em um universo aparentemente sem sentido. Ele argumenta que, diante
dessa realidade desprovida de significado, somos desafiados a criar nosso próprio
sentido e propósito na vida. Em vez de buscar uma orientação divina externa,
devemos encontrar significado em nossas próprias ações e relações humanas,
mesmo que isso signifique confrontar a incerteza e a dúvida.
Portanto, ao confrontar a experiência de preces não respondidas e orientação
divina ausente, questionei a validade dessa concepção de um Deus que intervém
nos assuntos humanos. Essa crítica ecoa os questionamentos de Spinoza e Camus
sobre a natureza do universo e da existência humana, levando-nos a buscar
significado e direção dentro de nós mesmos e do mundo ao nosso redor, em vez
de depender de uma fonte externa de orientação. Assim, ao confrontar a falta de
orientação divina e a sensação de estar perdido em um mar de incertezas,
encontrei o consolo e direção nos conhecimentos filosóficos de Spinoza, Camus
e outros pensadores que me desafiaram a assumir a responsabilidade por meu
próprio destino e a buscar significado em meio à complexidade da vida. Assumir
a responsabilidade pelo próprio destino e buscar significado em meio à
complexidade da vida é uma jornada de autodescoberta e crescimento pessoal.
Para fundamentar essa abordagem, recorri a conceitos filosóficos e reflexões sobre
liberdade, escolha e propósito.

Filósofos como Sartre e Kierkegaard em que sempre me inspiro, enfatizam a


importância da liberdade humana na criação de significado e propósito na vida.
Sartre argumenta que somos “condenados à liberdade”, o que significa que somos
responsáveis por nossas escolhas e acções, mesmo em face da incerteza e da
adversidade. Kierkegaard, por sua vez, destaca a importância do compromisso
pessoal na busca pelo significado, enfatizando que a verdadeira realização vem da
escolha autêntica e comprometida.
O psicólogo Viktor Frankl, em sua obra “Em Busca de Sentido” publicado em
2019, explora a necessidade humana fundamental de encontrar significado e
propósito na vida, especialmente em meio ao sofrimento e à adversidade. Frankl

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DIVORCIADO DE DEUS

argumenta que podemos descobrir significado mesmo nas circunstâncias mais


difíceis, através do amor, do trabalho e do sofrimento com dignidade. Assumir a
responsabilidade por nosso próprio destino envolve encontrar significado em
nossas experiências e comprometer-se com o crescimento pessoal e a realização.
Aliás, lembrei-me no filme “Deus não Está Morto”, o professor de filosofia,
interpretado por Kevin Sorbo, desafia seus alunos a confrontar suas crenças
religiosas e a defender sua fé em um ambiente secular. Esse desafio oferece uma
oportunidade para os alunos explorarem suas próprias convicções e assumirem a
responsabilidade por suas escolhas e convicções pessoais, independentemente das
pressões externas.

O confronto entre o professor e os alunos no filme pode ser visto como uma
metáfora para a jornada individual de assumir a responsabilidade por nosso
próprio destino e buscar significado em meio às complexidades da vida. Ao
enfrentar desafios e adversidades, somos confrontados com a necessidade de fazer
escolhas autênticas e comprometidas, independentemente das expectativas sociais
ou pressões externas. Ao unir essas reflexões filosóficas com a narrativa do filme
“Deus Não Está Morto”, podemos encontrar significados valiosos sobre a
importância de assumir a responsabilidade por nosso próprio destino e buscar
significado em meio à complexidade da vida. Essa jornada de autodescoberta e
crescimento pessoal nos desafia a confrontar nossas próprias crenças e
convicções, e a encontrar sentido em nossas experiências e escolhas individuais.
Outro filme no qual esta na minha mente é “O Nome da Rosa” (The Name of the
Rose), dirigido por Jean-Jacques Annaud e baseado no romance homônimo de
Umberto Eco. Este filme apresenta uma narrativa rica que pode ser relacionada a
questão da responsabilidade pessoal, busca por significado e confronto com a
autoridade institucional. No enredo de “O Nome da Rosa”, o monge franciscano
William de Baskerville (interpretado por Sean Connery) é enviado a um mosteiro
no norte da Itália para investigar uma série de misteriosas mortes. Ele descobre
que os assassinatos estão relacionados à disputa sobre a presença de um livro
proibido na biblioteca do mosteiro - um livro sobre a comédia de Aristóteles. Este
conflito entre o conhecimento proibido e a autoridade da instituição religiosa me
ofereceu várias reflexões sobre este tratado:

Primeiro, compreendi a responsabilidade pessoal e busca por conhecimento:


William de Baskerville representa a figura do intelectual e investigador
comprometido em descobrir a verdade, mesmo que isso signifique desafiar as
regras da instituição religiosa. Sua busca pelo conhecimento proibido reflecte a
importância da responsabilidade pessoal na busca pela verdade e pela sabedoria.
Segundo, o confronto com a autoridade institucional: A proibição do livro de
Aristóteles na biblioteca do mosteiro simboliza o conflito entre a autoridade
institucional religiosa e o livre pensamento. A resistência dos monges em aceitar
novas ideias e perspectivas mostra como a autoridade pode ser usada para reprimir
a busca pelo conhecimento e a liberdade de pensamento. Terceiro, a busca por
significado e verdade: A investigação de William de Baskerville e seu discípulo

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DIVORCIADO DE DEUS

Adso é uma jornada em busca de significado e verdade em meio ao mistério das


mortes no mosteiro. Este tema ressoa com a busca humana mais ampla por
significado e propósito na vida, que muitas vezes envolve questionar as
autoridades estabelecidas e desafiar as normas sociais.
Em resumo, “O Nome da Rosa” ofereceeu-me uma narrativa fascinante que
aborda questões fundamentais sobre responsabilidade pessoal, busca por
significado e confronto com a autoridade institucional, temas que são relevantes
para nossas discussões sobre assumir o controle de nosso próprio destino e
encontrar significado em meio à complexidade da vida.

Promessa de Proteção Inabalável

A crença na proteção divina é um pilar fundamental para muitas pessoas em


sua jornada espiritual. No entanto, quando confrontados com as realidades da
vida, essa promessa muitas vezes parece desmoronar, deixando-nos
desamparados e questionando o papel de Deus em nossa existência. Pois eu, cresci
acreditando na promessa de que Deus me protegeria de todo mal e perigo,
guardando-me sob suas asas como um pai amoroso guarda seu filho. No entanto,
à medida que enfrentava os desafios da vida, percebi que essa proteção era frágil
e ilusória. Encontrei-me desamparado diante das tempestades da existência, sem
um abrigo seguro para me refugiar.
Nesta tempestade e vulnerabilidade, encontrei o consolo nos autores como
Jean-Jacques Rousseau e Michel de Montaigne, onde abordam a tempestade ou a
vulnerabilidade inerente da condição humana. Eles destacam como somos todos
susceptíveis ao sofrimento, à perda e ao infortúnio, independentemente de nossa
fé ou crença em uma proteção divina. Esta reflexão me convidou a confrontar
minha própria fragilidade e a buscar formas de lidar com ela de forma significativa
e autêntica. Recorri no filósofo e crítico social Karl Marx, argumenta que a ideia
de proteção divina pode ser uma ilusão criada para manter as massas subjugadas
e obedientes. Ele sugere que, em vez de depender de uma proteção divina que
muitas vezes falha, devemos nos unir como comunidade para enfrentar os
desafios e injustiças do mundo de forma colectiva e solidária.
A psicólogo e sobrevivente do Holocausto Viktor Frankl defende a
importância de encontrar significado e propósito mesmo nas circunstâncias mais
adversas. Ele ainda argumenta que, em vez de depender de uma proteção divina
externa, devemos cultivar nossa própria resiliência e autonomia, encontrando
força interior para enfrentar os desafios da vida com coragem e dignidade.

Ao reflectir sobre essas perspectivas e dialogar com outros pensadores,


encontrei um caminho para além da ilusão da proteção divina inabalável. Em vez
de depositar a minha confiança em uma fonte externa de segurança, sou
convidado a buscar resiliência e autonomia dentro de mim mesmo, encontrando
significado e propósito mesmo nas tempestades da vida.Perceber-se desamparado
diante das tempestades da existência geralmente ocorre em momentos de crise,
desafio ou adversidade. Esses momentos podem variar de pessoa para pessoa,

15
DIVORCIADO DE DEUS

mas geralmente envolvem uma profunda sensação de vulnerabilidade e


incapacidade de lidar com as circunstâncias da vida. Aqui estão algumas maneiras
pelas quais eu percebi essa sensação.
Primeiro foram momentos de crise pessoal: Situações como a perda de um
ente querido, o fim de um relacionamento significativo, uma crise financeira ou
um problema de saúde que desencadeou a percepção de desamparo. Nessas
situações, senti-me impotente para mudar a minha realidade e incapaz de
encontrar uma solução imediata para meus problemas. Segundo é conflitos
internos ou existenciais: em que as questões sobre o propósito da minha vida, a
existência de Deus, o significado do sofrimento humano e outras questões
existenciais levaram me a uma sensação de desamparo. Fui confrontado com
perguntas profundas e complexas sobre a vida e o universo, eu me senti perdido
e incapaz de encontrar respostas satisfatórias. Terceiro, são as experiências
traumáticas: Traumas passados ou presentes, como abuso, violência, acidentes ou
eventos traumáticos na infância, deixaram uma marca profunda em minha psique
e causou uma sensação de desamparo. Essas experiências minaram a confiança
comigo mesmo e no mundo ao meu redor, levando a uma sensação de impotência
diante da vida. E último é a percepção de injustiça ou crueldade do mundo: Eu
testemunhei e experimentei injustiças, negação a rejeição, crueldades ou tragédias
do mundo ao meu redor em que desencadeou uma sensação de desamparo e
impotência. Imagina, eu me senti indignado com a aparente falta de sentido ou
justiça no mundo, levando a perguntas sobre o papel de Deus e da fé em minha
vida.
Esses momentos de percepção de desamparo em que passei podem ser
extremamente desafiadores e dolorosos, mas também podem ser oportunidades
para o crescimento pessoal e a busca de significado mais profundo na vida. Ao
confrontar essas emoções e explorar suas origens, eu comecei a encontrar
maneiras de se fortalecer e encontrar um caminho para a frente, mesmo nas
tempestades da existência.

Promessa de Respostas Inquestionáveis

Acreditava na promessa de que Deus tinha todas as respostas, que a fé


inabalável me garantiria uma compreensão clara e definitiva sobre as
complexidades da vida e do universo. No entanto, à medida que mergulhava mais
fundo nas questões existenciais e confrontava a ambiguidade e incerteza da
condição humana, percebi que as respostas simplesmente não eram tão acessíveis
quanto esperava. Encontrei-me em um estado de questionamento constante, em
busca de significado e compreensão, mas sem garantias claras ou definitivas.
Essa jornada de autoconhecimento e questionamento constante é uma
temática recorrente na literatura filosófica e existencial. Muitos autores e
pensadores discutem sobre as limitações do conhecimento humano e a busca por
respostas diante das grandes questões da vida. E um dos autores tão marcante é o
filósofo existencialista Sartre, que argumentou que a existência humana é
caracterizada pela angústia e pela busca por significado em um universo

16
DIVORCIADO DE DEUS

aparentemente indiferente. Além disso, o escritor Albert Camus explorou o


absurdo da condição humana, enfatizando a impossibilidade de encontrar
respostas definitivas para os dilemas existenciais. Camus desafia a noção de que
podemos encontrar sentido em um universo sem sentido intrínseco, propondo
que devemos abraçar a absurdidade da vida e encontrar felicidade na própria busca
por significado.
Outro autor relevante no qual sempre admiro e me insprio é o filósofo de
todos os tempos o niilista Nietzsche, que criticou severamente a pretensão
humana de alcançar certezas absolutas e argumentou a favor de uma abordagem
mais fluida e interpretativa da verdade. Em “Assim Falou Zaratustra”, Nietzsche
celebra a incerteza como uma fonte de criatividade e vitalidade, convidando os
indivíduos a abraçar a complexidade da existência humana.
David Hume, filósofo escocês do século XVIII, desafiou também as noções
tradicionais de conhecimento e crença em sua obra “Investigação sobre o Entendimento
Humano”. Ele argumentou que nossas crenças são baseadas em experiências
sensoriais e hábitos mentais, e que devemos ser céticos em relação a ideias que
não podem ser comprovadas empiricamente.
Diante desse panorama, eu me encontro imerso em um dilema existencial,
enfrentando a necessidade de reconciliar a minha antiga crença em respostas
inquestionáveis com a realidade da incerteza e da ambiguidade. Minha busca por
significado e compreensão reflecte a luta humana universal para encontrar um
sentido diante da vastidão e complexidade do universo.

Promessa de Consolo e Paz Interior

Busquei refúgio na promessa de que Deus seria minha fonte de consolo e paz
interior, acalmando as tempestades que rugiam dentro de mim e trazendo cura
para minhas feridas emocionais. No entanto, à medida que lutava contra a dor e
o sofrimento, descobri que essa paz era fugaz e efêmera. Encontrei-me preso em
um ciclo interminável de angústia e desespero, sem encontrar alívio em lugar
algum. A busca por consolo e paz interior é uma aspiração universal, e muitas
vezes encontramos conforto na promessa de uma fonte divina de alívio e cura.
No entanto, ao confrontar o sofrimento e a dor da vida, essa promessa pode se
revelar insuficiente. Vamos explorar como alguns pensadores críticos da religião
abordam essa questão no qual eu encontrei o consolo e paz interior fora de Deus:
Richard Dawkins em seu livro “Deus, um Delírio” publicado em (2006):
Dawkins argumenta que a crença em um Deus consolador é uma ilusão criada
pela religião para lidar com o medo da morte e o desconforto diante da incerteza.
Ele sugere que é mais honesto e libertador confrontar a realidade da vida sem
depender de promessas de consolo divino. Segundo Dawkins, encontramos
significado e conforto na comunidade humana, na arte, na ciência e na exploração
do universo natural.
François-Marie Arouet (1694–1778), um dos principais filósofos do
Iluminismo, criticou fortemente as instituições religiosas de sua época,
especialmente a Igreja Católica. Ele argumentava que a religião frequentemente

17
DIVORCIADO DE DEUS

perpetuava a ignorância e o medo, em vez de oferecer verdadeiro consolo e paz


interior. Voltaire enfatizava a importância da razão e do pensamento crítico como
ferramentas para enfrentar as adversidades da vida e encontrar um sentido mais
profundo na existência.

Além de Dawkins e Voltaire, muitos outros críticos da religião argumentam


que a dependência de uma fonte divina de consolo e paz interior pode ser
prejudicial. Essa dependência pode nos impedir de confrontar e lidar com nossas
emoções de maneira saudável, levando a uma falta de autenticidade e
autoconhecimento. Em vez de buscar alívio externo, esses pensadores defendem
a importância de desenvolver habilidades emocionais e psicológicas para lidar com
o sofrimento humano. Ao explorar essas perspectivas críticas, somos desafiados
a repensar nossas noções de consolo e paz interior, questionando se a dependência
de uma fonte divina é realmente a melhor maneira de lidar com os desafios da
vida. Em vez disso, podemos encontrar conforto e significado na busca por
conhecimento, na conexão com os outros e no desenvolvimento de uma
compreensão mais profunda de nós mesmos e do mundo ao nosso redor.

Promessa de Justiça Infalível

Acreditava eu fervorosamente na promessa de que Deus seria o árbitro


supremo da justiça, recompensando os bons e punindo os maus de acordo com
sua sabedoria divina. No entanto, à medida que testemunhava a injustiça e o
sofrimento ao meu redor, essa promessa começou a desmoronar diante dos meus
olhos. Perguntei-me como um Deus justo permitiria tanta dor e injustiça no
mundo, questionando se realmente havia um propósito maior por trás de tudo
isso ou se era apenas um jogo cruel do destino.
Karl Marx (1818 – 1883), embora mais conhecido por suas teorias econômicas
e políticas, também abordou questões religiosas. Ele argumentava que a religião
era um “ópio do povo”, uma forma de alienação que distraía os trabalhadores das
injustiças sociais e econômicas. Em suas obras, como “Crítica da Filosofia do Direito
de Hegel” publicada em (1844), Marx analisa como as promessas de justiça divina
servem para manter o status quo e perpetuar a opressão. Mergulhei em Sam
Harris, um filósofo contemporâneo conhecido por seu cepticismo em relação à
religião e sua defesa do racionalismo científico. Cuja as obras como “Carta a uma
Nação Cristã” publicado em (2006) e “O Fim da Fé” (2004), ele argumenta que a
religião não é necessária para uma compreensão moral e que a fé cega pode levar
a conflitos e injustiças.
Essas são apenas algumas das promessas quebradas que marcaram minha
jornada espiritual e precipitaram meu divórcio de Deus. Cada decepção, cada
desilusão, foi como um golpe no coração, revelando a verdade dolorosa por trás
das ilusões que uma vez me confortaram. No entanto, foi precisamente nessas
provações que encontrei a força para seguir em frente e buscar a verdade além das
promessas quebradas. Feuerbach me acompanha nessa jornada, revelando as
projeções humanas por trás das divindades, desafiando-me a encarar a verdade

18
DIVORCIADO DE DEUS

sem medo. Diante dessas promessas quebradas, ergui-me com determinação,


disposto a desvendar os mistérios que envolviam o divino e a encontrar respostas
para as perguntas que ecoavam em minha alma atormentada. Não mais permitiria
que ilusões me mantivessem acorrentado a uma fé que já não mais me servia. Era
hora de buscar a verdade, custasse o que custasse.
No final deste capítulo, o eu sujeito pensante emerjo com uma determinação
renovada, pronto para desafiar as estruturas que me mantinham aprisionado e
buscar a verdade além das promessas quebradas. Com uma linguagem que oscila
entre a poesia e a prosa, entre o questionamento filosófico e a narrativa pessoal,
este capítulo estabeleço o tom para o restante do tratado, lançando as bases para
uma jornada de autodescoberta e libertação espiritual.

19
O DEUS CIUMENTO

Este capítulo abordo a natureza ciumenta e controladora de Deus, que sufoca a liberdade e
a autonomia do indivíduo. Reflecti sobre as interpretações teológicas e filosóficas que atribuem ao
divino características humanas, incluindo emoções como ciúme e possessividade.

Aos olhos do mundo, Deus é retratado como um ser todo-amoroso,


benevolente e compassivo. No entanto, minha experiência pessoal revelou uma
faceta obscura e perturbadora: a ciúmes exacerbado da divindade. Como um
amante possessivo, Deus exigia exclusividade em minha devoção e adoração.
Qualquer sinal de desvio de minha atenção era interpretado como uma traição
imperdoável, punida com o abandono e a negação de suas graças. Sob o disfarce
de amor incondicional, residia um ciúme doentio, que sufocava minha liberdade e
autonomia. Cada vez que ousava questionar as contradições e injustiças de suas
acções, era recebido com o silêncio gelado do céu, como se minhas dúvidas
fossem uma afronta à sua autoridade suprema. Era como se Deus temesse ser
desmascarado em sua fragilidade, escondendo-se por trás de um véu de mistério
e inacessibilidade. O Deus ciumento não tolerava a presença de outros amores em
minha vida. Qualquer tentativa de encontrar significado e propósito fora dos
limites estreitos da religião era vista como uma traição imperdoável, punida com
a condenação eterna. Era uma relação de amor e medo, onde a devoção era
extorquida através da ameaça da punição eterna. No entanto, ao confrontar a
natureza controladora e possessiva de Deus, descobri a verdadeira liberdade que
reside na autonomia do pensamento e na busca pela autenticidade pessoal. Não
mais permitiria que o ciúme divino me mantivesse acorrentado a uma fé que
apenas servia para aprisionar minha alma. Era hora de romper os grilhões do amor
doentio e abraçar a verdadeira liberdade além das fronteiras da religião.

Interpretações Teológicas e Filosóficas

Ao longo da história, várias interpretações teológicas e filosóficas atribuíram


ao divino características humanas, incluindo emoções como ciúme e
possessividade. Essas interpretações foram influenciadas pela visão de que os
deuses se envolvem directamente com os assuntos humanos e possuem
sentimentos semelhantes aos dos seres humanos. A fundamentação filosófica do
ciúme divino remonta a antigas tradições religiosas e culturais, onde os deuses
eram frequentemente retratados como possessivos e ciumentos. A interpretação
dessas características divinas variava de acordo com as crenças e valores de cada
sociedade, mas o tema central do ciúme divino permanecia presente em muitas
narrativas religiosas.
Na mitologia grega, por exemplo, os deuses frequentemente manifestavam
ciúmes uns dos outros e dos humanos. Zeus, o principal deus do panteão grego,
era conhecido por seus acessos de ciúmes em relação às suas conquistas amorosas,
20
DIVORCIADO DE DEUS

o que muitas vezes resultava em conflitos entre os deuses e punições para os


humanos envolvidos. Ainda na mitologia grega, podemos observar exemplos
claros do ciúme divino. Por exemplo, o deus Zeus frequentemente manifestava
ciúmes em relação às suas conquistas amorosas, como nos casos de sua esposa
Hera e suas amantes humanas e divinas. Esse ciúme muitas vezes resultava em
conflitos entre os deuses e punições para os humanos envolvidos.
Na tradição judaico-cristã, percebi que o ciúme divino é frequentemente
abordado em textos sagrados, onde Deus é retratado como um ser zeloso que
exige exclusividade na adoração e devoção de seus seguidores. Passagens como os
Decálogos, que proíbem a adoração de outros deuses além do Senhor, reflectem
essa visão de Deus como um ser ciumento. Na Bíblia cristã, encontrei várias
passagens que retratam Deus como um ser ciumento. Por exemplo, no Antigo
Testamento, o livro de Êxodo descreve Deus como “um Deus zeloso”, que não
tolera a adoração de outros deuses. Isso é evidente nos Dez Mandamentos, onde
Deus ordena aos israelitas que não tenham outros deuses além dele.

Análise dos Textos Sagrados

A análise dos textos sagrados das principais religiões do mundo forneceu me


uma visão importante sobre como o ciúme divino é retratado e interpretado
dentro dessas tradições. Ao examinar passagens específicas e narrativas
relacionadas ao ciúme divino, podemos entender melhor como essa característica
é percebida e compreendida pelos seguidores dessas religiões ao longo da história.
Aqui estão alguns exemplos de como o ciúme divino é abordado em textos
sagrados:

Bíblia Cristã (AT e NT)

No Antigo Testamento, encontrei várias passagens que retratam Deus como


um ser ciumento. Por exemplo, nos Dez Mandamentos, Deus ordena aos israelitas
que não tenham outros deuses além dele, enfatizando seu ciúme e exigindo
exclusividade na adoração (Êxodo 20:3-5). A passagem diz:
“Não terás outros deuses além de mim. Não farás para ti imagem esculpida,
nem figura alguma do que há em cima no céu, nem embaixo na terra, nem nas
águas debaixo da terra. Não te prostrarás diante delas e não lhes prestarás culto,
porque eu, o Senhor, teu Deus, sou Deus zeloso, que castigo a iniquidade dos pais
nos filhos até à terceira e quarta geração daqueles que me odeiam.” Essa passagem
revela a natureza ciumenta de Deus, que exige devoção exclusiva e não tolera a
adoração de outros deuses.
Além disso, em outros livros como Deuteronômio e Isaías, também
encontramos referências ao zelo e ciúme de Deus em relação à sua relação com o
povo de Israel. Por exemplo, em Deuteronômio 4:24, lemos: “Porque o Senhor,
teu Deus, é fogo devorador, Deus zeloso”. E em Isaías 42:13, encontramos: “O
Senhor sairá como um valente, como homem de guerra despertará o zelo; clamará,
e fará grande ruído, e mostrará a sua força contra os seus inimigos.” Essas

21
DIVORCIADO DE DEUS

passagens destacam a crença na fidelidade exclusiva a Deus e a reação divina


diante da idolatria e da infidelidade do povo de Israel. No contexto do Antigo
Testamento, as referências ao ciúme divino são bastante evidentes e
desempenham um papel significativo na teologia judaica. A ideia do ciúme de
Deus está profundamente enraizada na narrativa do relacionamento entre Deus e
o povo de Israel. No Novo Testamento, embora o tema do ciúme divino seja
menos proeminente, ainda podemos encontrar referências a essa ideia. Por
exemplo, em 1 Coríntios 10:22, o apóstolo Paulo escreve: “Ou provocaremos o
zelo do Senhor? Somos, porventura, mais fortes do que ele?” Essa passagem
sugere que Deus pode reagir com ciúme diante das acções dos crentes. Assim,
tanto no Antigo quanto no Novo Testamento, o ciúme divino é retratado como
uma característica de Deus que exige fidelidade exclusiva e reage à idolatria e à
infidelidade com zelo e zelo.

Alcorão (Islamismo)

No Alcorão, Deus é frequentemente retratado como misericordioso e


compassivo, mas também como alguém que não tolera a idolatria e a infidelidade.
Essa dualidade na descrição divina reflecte a crença islâmica na justiça e na
soberania de Deus, bem como em sua autoridade sobre a criação. Uma passagem
relevante que destaca a ira de Deus em relação à idolatria é encontrada na Surata
4:48, que diz:
‫ش نَن ُ َِرف َإغ َ إ‬
‫ا َِإ‬
"‫َ َّنِإ‬ ‫مّلل َُ ِكغشِإ َُاَن إ َُ َكم َإش ِاَن ك ََِ َإ‬
‫ش ََُنَإ اَم َُُ َِرف َإغ ِهإ َُ ِكغَ َإ‬ ‫َامُاِم َّ ِماِم كٰإَ ِِ ََغَإ َِ َدَإ ِ ِإ‬

Traduzindo, “Deus não perdoará que alguém lhe atribua parceiros, mas perdoará o que
estiver abaixo disso a quem Ele quiser. E quem atribui parceiros a Deus, comete certamente um
grande pecado.”. Nessa passagem, Deus expressa sua intolerância àqueles que
associam parceiros ou ídolos a Ele, indicando uma forma de ciúme divino em
relação à exclusividade da devoção e lealdade dos crentes. Além disso, na Surata
4:116, também encontramos uma advertência contra a idolatria e a atribuição de
parceiros a Deus:
“ ‫ََ َّنِإ‬ ‫ا ِإ‬ ‫ش نَن ُ َِرف َإغ َ إ‬‫ش ََُنَإ اَم َُُ َِرف َإغ ِهإ َُ ِكغَ َإ‬ ‫مّلل َُ ِكغشِإ َُاَن إ َُ َكم َإش ِاَن ك ََِ َإ‬
‫َ َِ َد ِإَ ِ ِإ‬ ‫َّ َإ‬
‫ا ِإ‬ ‫َ ََل ِإ‬
ََِ ُ‫“ َِد‬
Traduzindo, “Certamente, Deus não perdoa que alguém lhe atribua parceiros. Ele
perdoa, além disso, a quem Ele quiser. E quem atribui parceiros a Deus, comete um desvio
longínquo.” Essas passagens reforçam a ênfase islâmica na unicidade de Deus
(Tawhid) e na proibição da idolatria, ressaltando a importância da devoção
exclusiva a Deus. A interpretação dessas passagens e sua aplicação na vida
cotidiana dos muçulmanos podem variar de acordo com as tradições e escolas de
pensamento dentro do Islamismo. No entanto, de maneira geral, essas passagens
servem como lembretes da importância da fidelidade e submissão a Deus, assim
como da severidade de sua ira em relação à idolatria e à infidelidade.

Textos Hinduístas (Bhagavad Gita, Mahabharata, entre outros)

22
DIVORCIADO DE DEUS

Na tradição hindu, encontramos histórias e passagens que retratam divindades


como Shiva e Vishnu expressando ciúme em relação às suas consortes e devotos.
Por exemplo, no Mahabharata (A Grande História dos Bharatas), é uma obra
central no hinduísmo e tem grande importância cultural e religiosa na Índia e, é
uma das epopeias hindus, encontramos histórias de rivalidade e ciúme entre as
deidades e seus seguidores. Uma das histórias mais conhecidas é a rivalidade entre
os dois principais grupos de deidades: os deuses (devas) e os demônios (asuras).
Uma dessas passagens é encontrada no Livro 1, seção 5, onde Indra, o rei dos
deuses, sente ciúmes do grande sábio Bhrigu, que decidiu prestar homenagem a
Vishnu ao invés de Indra. A passagem descreve como Indra tenta interromper os
rituais de Bhrigu e, em sua raiva, é confrontado por Bhrigu com sua força e poder
espiritual, mostrando que a devoção a Vishnu é mais poderosa do que a inveja de
Indra. Essa rivalidade muitas vezes leva a situações em que divindades como
Indra, o rei dos deuses, podem sentir ciúmes dos grandes feitos realizados por
devotos ou sábios que se voltam para outras divindades, como Vishnu ou Shiva.
Essas histórias são usadas para ilustrar a importância da devoção e da busca
espiritual em detrimento do orgulho pessoal e do ego.

Além disso, os textos hindus também retratam divindades como Shiva e


Vishnu expressando ciúme em relação às suas consortes divinas, como Parvati
(esposa de Shiva) e Lakshmi (esposa de Vishnu). Essas histórias muitas vezes
enfatizam a profundidade do amor e da conexão entre as divindades e suas
consorts, bem como as complexidades das relações divinas. Uma das histórias que
ilustra esse tema é a história de Daksha Yajna, que é encontrada em várias
escrituras hindus, incluindo o Mahabharata e o Puranas. Nessa história, Daksha,
o pai de Sati (uma forma de Parvati), realiza um grande sacrifício ritual, mas não
convida sua filha e seu genro, Shiva, por considerá-lo inadequado. Sati fica
profundamente magoada com a atitude de seu pai e decide comparecer ao
sacrifício mesmo assim, contra o desejo de Shiva.

Durante o evento, Daksha insulta Shiva, desrespeitando-o abertamente. Sati,


incapaz de suportar a humilhação de seu marido, se lança no fogo sacrificial e
morre. Ao descobrir a morte de Sati, Shiva entra em uma fúria devastadora e
desoladora, expressando um ciúme profundo e uma dor avassaladora pela perda
de sua esposa. Essa história destaca a intensidade do amor e da conexão entre
Shiva e Parvati, bem como a intensidade das emoções divinas. Também mostra
como o ciúme pode surgir mesmo entre divindades, especialmente quando se trata
de questões relacionadas ao amor e à devoção. Essas narrativas são fundamentais
na tradição hindu para ilustrar aspectos da psicologia divina e das relações entre
as divindades.
No Bhagavad Gita, que é uma parte épica do Mahabharata, não encontrei
directamente a expressão de ciúme pelas divindades, mas sim um diálogo entre o
príncipe Arjuna e o deus Krishna, uma encarnação de Vishnu. Neste diálogo,
Krishna instrui Arjuna sobre seu dever (dharma) como guerreiro e a importância
da devoção a ele. Aqui, a ênfase está na busca espiritual e no cumprimento do

23
DIVORCIADO DE DEUS

dever, em vez de ciúmes ou rivalidades divinas. Em suma, as histórias de ciúme


entre divindades e seus devotos nas escrituras hindus são uma maneira de
transmitir licções espirituais e éticas aos seguidores, destacando a importância da
devoção, humildade e renúncia ao ego em busca da realização espiritual. Essas
narrativas devem ser interpretadas dentro do contexto mais amplo da mitologia e
filosofia hindu, em vez de serem entendidas apenas como manifestações de
emoções humanas.

Textos Budistas (Pali Canon, entre outros)

No Budismo, a ideia de um Deus ciumento é menos comum, pois o foco


principal está na busca pela iluminação e no caminho do desapego. No entanto,
encontrei referências ao ciúme e à inveja como emoções humanas que devem ser
superadas no caminho espiritual, tanto nos textos budistas mais antigos, como o
Pali Canon, quanto em outras obras budistas posteriores. Embora essas
referências não estejam relacionadas a divindades ciumentas, elas abordam o
ciúme e a inveja como obstáculos para o desenvolvimento espiritual e a paz
interior.
No Pali Canon, que é uma coleção de textos sagrados do Budismo Theravada,
encontrei ensinamentos do Buda Gautama sobre as “Cinco Hindranças” ou “Cinco
Obstáculos”. O ciúme e a inveja são frequentemente incluídos nessa lista,
juntamente com outras emoções prejudiciais como o desejo sensual, a raiva e a
preguiça. Esses obstáculos são vistos como barreiras para alcançar a concentração
mental profunda (samadhi) e a realização da sabedoria (prajna).
Além do Pali Canon, em textos budistas posteriores, como os sutras Mahayana
e os ensinamentos tântricos, também encontrei referências ao ciúme e à inveja
como obstáculos espirituais. Por exemplo, em algumas histórias sobre a prática
do bodhisattva, seres iluminados que buscam a iluminação para o benefício de
todos os seres, o ciúme pode ser retratado como uma característica a ser superada
no caminho para a compaixão universal.

No Budismo, a ênfase está na superação de todas as emoções prejudiciais,


incluindo o ciúme e a inveja, através do cultivo da sabedoria, da compaixão e da
meditação. Ao compreender a natureza impermanente e interdependente de todas
as coisas, os praticantes budistas são encorajados a abandonar o apego egoísta e a
desenvolver uma mente pacífica e amorosa em direção a todos os seres. Ao
analisar esses textos sagrados, é importante considerar o contexto cultural,
histórico e teológico em que foram escritos, bem como as interpretações variadas
que surgiram ao longo do tempo dentro de cada tradição religiosa. Essa análise
me ajudou a compreender melhor como o ciúme divino é percebido e entendido
pelos crentes de diferentes religiões e como influencia suas práticas e crenças
espirituais.

24
DIVORCIADO DE DEUS

Análises e Fundamentação Filosófica do Ciúme Divino

Na filosofia clássica, mergulhei em Platão (427-347 a.C.), um dos filósofos


mais importantes da antiguidade, discutiu o ciúme divino em suas obras. Em “A
República”, Platão sugere que o ciúme divino pode ser entendido como um zelo
protetor, uma manifestação do amor e cuidado de Deus por seus seguidores. Para
Platão, o ciúme divino pode ser visto como uma expressão do desejo de manter a
ordem moral e proteger os crentes de se desviarem do caminho correcto. No
entanto, Platão também reconhece os perigos do ciúme quando ele se torna
excessivo e opressivo. Ele alerta para os perigos de um ciúme divino que se
transforma em tirania, restringindo a liberdade e a autonomia dos indivíduos.
Platão argumenta que o ciúme divino deve ser equilibrado com outros aspectos
da divindade, como a misericórdia e a compaixão, para evitar abusos e injustiças.
Sendo assim, Platão busca uma reconciliação entre a noção de um ciúme
divino protetor e os perigos de um ciúme opressivo. Ele sugere que, quando
entendido correctamente, o ciúme divino pode servir como uma força motivadora
para o comportamento ético e moral. No entanto, é importante que esse ciúme
seja temperado pela sabedoria e pela justiça, para evitar excessos e injustiças.
Aristóteles (384-322 a.C.), Aristóteles, discípulo de Platão, também abordou o
tema do ciúme em sua ética e filosofia moral. Embora ele não abordou o ciúme
do divino, mas oferece e considerava o ciúme uma emoção natural, embora
potencialmente problemática, que pode surgir tanto nos deuses quanto nos seres
humanos. Aristóteles acreditava que o ciúme poderia ser justificado em certas
circunstâncias, desde que estivesse relacionado à proteção de bens e
relacionamentos importantes. Para ele, o ciúme era uma manifestação do desejo
de preservar a integridade e a segurança dos próprios interesses e das pessoas
amadas. No entanto, Aristóteles também alertava para os perigos do ciúme
excessivo, que poderia levar a comportamentos destrutivos e prejudiciais.
Para Aristóteles, a chave para lidar com o ciúme de forma saudável estava no
cultivo da virtude e no desenvolvimento do caráter moral. Ele argumentava que o
indivíduo virtuoso seria capaz de controlar suas emoções, incluindo o ciúme, e
agir de acordo com a razão e a ética. O equilíbrio entre o ciúme e outras emoções,
como a generosidade e a empatia, era fundamental para alcançar uma vida virtuosa
e bem-sucedida. Portanto, as ideias de Aristóteles sobre o ciúme são importantes
porque oferecem uma perspectiva sobre a natureza complexa das emoções
humanas e seu papel na ética e na vida moral. Sua abordagem equilibrada
reconhece tanto os aspectos positivos quanto os perigosos do ciúme, convidando
nos a considerar como podemos cultivar uma relação saudável com essa emoção
e desenvolver um caráter virtuoso. Essa reflexão pode contribuir para uma maior
compreensão das motivações por trás do ciúme e ajudar as pessoas a lidar com
ele de forma construtiva em suas vidas.
Epicuro (341-270 a.C.), filósofo grego fundador do Epicurismo, criticou a
ideia de um Deus ciumento em suas obras. Ele argumentava que os deuses, se
existissem, seriam completamente felizes e autossuficientes, sem precisar se
preocupar com questões triviais como o ciúme. Para Epicuro, a ideia de um Deus

25
DIVORCIADO DE DEUS

ciumento era incompatível com a ideia de um ser divino perfeitamente feliz e


imparcial. Para ele, a ideia de um Deus ciumento era incompatível com a ideia de
um ser divino perfeitamente feliz e imparcial. A crítica de Epicuro à ideia de um
Deus ciumento está centrada na concepção de divindade como um ser
perfeitamente feliz e autossuficiente. Ele argumentava que um Deus ciumento
contradiz essa concepção, uma vez que o ciúme é uma emoção associada à falta e
à incompletude, características que não deveriam ser atribuídas a um ser divino.
Além disso, Epicuro questiona a própria necessidade de um Deus ciumento em
um universo regido por leis naturais e impersonais.
Baruch Spinoza (1632-1677), foi um filósofo holandês do século XVII, em sua
obra “Ética”, Spinoza abordou questões fundamentais sobre a natureza de Deus
e sua relação com o mundo. Embora não tenha tratado especificamente do ciúme
divino, suas ideias sobre a natureza de Deus influenciaram debates posteriores
sobre as características divinas. Sua concepção de um Deus impessoal e imanente,
desprovido de emoções humanas, contribuiu para uma compreensão mais
racional e desapaixonada da divindade.
Voltaire (1694-1778), um dos principais filósofos do Iluminismo, criticou
fortemente as representações de Deus como ciumento e vingativo em suas obras.
Ele via a ideia de um Deus ciumento como uma projeção das fraquezas humanas
na divindade, argumentando que essa concepção de Deus era contraditória com a
ideia de um ser todo-poderoso e benevolente. Para Voltaire, a representação de
Deus como ciumento e vingativo era um reflexo das tendências humanas para
atribuir características humanas aos deuses. Ele via essa concepção como uma
forma de antropomorfismo, onde os seres humanos projectam suas próprias
fraquezas e imperfeições na divindade. Além disso, Voltaire argumentava que um
Deus verdadeiramente todo-poderoso e benevolente não teria motivos para sentir
ciúmes, uma vez que sua própria natureza transcendente o colocaria além de tais
emoções mesquinhas.
A crítica de Voltaire à ideia de um Deus ciumento está em linha com a visão
iluminista da religião como uma instituição sujeita a análise racional e crítica. Ele
via a religião organizada como uma fonte de opressão e obscurantismo,
argumentando que muitas das concepções tradicionais sobre Deus eram
irracionais e supersticiosas. Ao desafiar a ideia de um Deus ciumento, Voltaire
buscava promover uma visão mais racional e desapaixonada da natureza da
divindade, livre de preconceitos e concepções antiquadas.
Ludwig Feuerbach (1804-1872), foi um filósofo alemão do século XIX. Em
sua obra “A Essência do Cristianismo”, Feuerbach criticou a concepção de um Deus
ciumento e possessivo, argumentando que essa visão era uma projeção das
necessidades e desejos humanos. Para Feuerbach, a religião era uma forma de
alienação humana, onde os seres humanos atribuíam suas próprias características
aos deuses, incluindo o ciúme e a possessividade. Feuerbach via a ideia de um
Deus ciumento como parte de uma concepção religiosa que alienava os seres
humanos de si mesmos. Ele argumentava que a religião era uma forma de
alienação humana, onde os indivíduos projetavam suas próprias características,
incluindo o ciúme e a possessividade, nos deuses, onde ele afirma, “O homem faz

26
DIVORCIADO DE DEUS

a religião, a religião não faz o homem.” Essa frase resume a visão de Feuerbach
de que a religião é uma criação humana, moldada pelas necessidades e desejos dos
seres humanos, em vez de ser uma revelação divina ou uma expressão da verdade
transcendente. Essa reflexão destaca a ideia central de Feuerbach de que a religião
é um reflexo das condições humanas e uma projeção das características humanas
nos deuses.
Para dele, a concepção de um Deus ciumento era uma expressão das fraquezas
e limitações humanas, não uma característica genuína da divindade. Para
Feuerbach, a religião era uma forma de escapismo, onde os seres humanos
buscavam conforto e segurança em uma divindade imaginária. Ele via a ideia de
um Deus ciumento como parte dessa ilusão religiosa, que servia para justificar as
estruturas de poder e controle na sociedade.
“O ciúme é uma paixão que só pode existir onde há igualdade. O ciúme de
Deus pressupõe que ele tenha uma necessidade, uma necessidade de amor
humano, uma necessidade de ser tudo em tudo para o homem. Por conseguinte,
o amor do homem, a afeição e a devoção do homem a Deus são as coisas mais
gratas para Deus. Mas tudo isso é apenas uma projeção da relação de amor entre
o homem e o homem para a relação de amor entre o homem e Deus.”
Essa citação resume a crítica de Feuerbach à ideia de um Deus ciumento,
argumentando que o ciúme divino é uma projeção das necessidades e desejos
humanos na divindade, reflectindo as relações de amor e devoção entre os seres
humanos. Ele sugere que a concepção de um Deus ciumento é uma ilusão, b°uma
construção da imaginação humana, e não uma característica genuína da divindade.
Portanto, a crítica de Feuerbach à ideia de um Deus ciumento faz parte de uma
desconstrução mais ampla das concepções religiosas tradicionais. Ele busca
mostrar como as crenças religiosas são construídas a partir das necessidades e
desejos humanos, em vez de serem reflexos da realidade divina. Ao desafiar a ideia
de um Deus ciumento, Feuerbach convida os leitores a reconsiderarem suas
concepções sobre a religião e a divindade.
Arthur Schopenhauer (1788 -1860), conhecido por sua filosofia pessimista,
também abordou questões relacionadas à religião e à natureza de Deus. Em suas
obras, como “O Mundo como Vontade e Representação”, ele oferece uma crítica à visão
antropomórfica de Deus, sugerindo que o ciúme divino é uma projeção das
fraquezas humanas. Schopenhauer aborda o ciúme divino como parte dessa visão
antropomórfica de Deus. Ele argumenta que o ciúme é uma emoção humana,
baseada na insegurança e no medo de perder algo ou alguém que é considerado
valioso. Ao atribuir ciúme a Deus, os seres humanos estão projetando suas
próprias inseguranças e desejos possessivos no divino. Schopenhauer vê essa
representação como uma distorção da verdadeira natureza de Deus, que
transcende as limitações humanas e não pode ser compreendida através de
categorias antropomórficas.
A crítica de Schopenhauer à visão antropomórfica de Deus e ao ciúme divino
é importante porque desafia as concepções tradicionais de religião e teologia. Ele
instiga os leitores a questionar suas próprias crenças e a considerar uma
perspectiva mais ampla e não antropocêntrica sobre a natureza do divino. Além
27
DIVORCIADO DE DEUS

disso, sua abordagem filosófica ofereceu-me uma alternativa ao entendimento


convencional de Deus, baseada em uma visão mais transcendental e metafísica da
realidade.
Friedrich Nietzsche (1844-1900), filósofo alemão do século XIX, é conhecido
por suas críticas à religião e à moralidade tradicional. Em sua obra “Genealogia da
Moral”, Nietzsche analisa como as noções de bem e mal foram moldadas pela
religião e pela moralidade cristã. Ele destaca a complexidade das emoções divinas,
incluindo o ciúme, como parte de sua crítica à moralidade religiosa. Nietzsche
argumenta que a moralidade cristã, ao atribuir valores de bondade e pureza a Deus,
cria uma imagem de divindade que reflecte os ideais e tabus da sociedade humana,
em vez de representar uma verdadeira natureza divina independente das
concepções humanas. Ele argumenta que o conceito de um Deus ciumento faz
parte dessa construção moral, onde as emoções divinas são moldadas pelos
padrões morais humanos.
Por sua vez, Nietzsche destaca o ciúme como uma das emoções divinas
complexas, que são interpretadas de acordo com os valores e normas da
moralidade religiosa. Ele sugere que o ciúme divino é uma projeção das
inseguranças e ansiedades humanas, reflectindo a maneira como os seres humanos
percebem e interpretam a divindade. Neste sentido, ao analisar o ciúme e outras
emoções divinas, Nietzsche destaca a complexidade da natureza divina e sua
relação com a moralidade humana. Ele argumenta que as emoções divinas são
moldadas pela interpretação humana e reflectem as contradições e ambiguidades
da moralidade religiosa. Isto quer dizer, Nietzsche via as emoções divinas, como
o ciúme, como construções humanas, moldadas pelas interpretações e projeções
humanas sobre a divindade. Em outras palavras, Nietzsche não acreditava que se
Deus existisse realmente experimentava emoções como ciúme de uma forma
independente das concepções e interpretações humanas.
Nietzsche argumentava ainda que a moralidade religiosa atribuía características
e emoções humanas à divindade, reflectindo as necessidades, valores e
inseguranças humanas. O ciúme divino, por exemplo, era visto como uma
projeção das preocupações humanas sobre o poder, controle e possessão. Essa
interpretação humana das emoções divinas revelava as contradições e
ambiguidades da moralidade religiosa, mostrando como as concepções de Deus
reflectiam mais as características e anseios humanos do que uma realidade divina
objectiva. Portanto, Nietzsche enfatiza a importância de reconhecer a influência
das interpretações humanas na compreensão das emoções divinas, destacando a
complexidade da natureza divina e sua relação intrínseca com a moralidade
humana.
No “Gaio Ciência” sua famosa tese enigmática, “Deus está morto. Deus
permanece morto. E nós o matamos. Como nos consolaremos, os assassinos dos
assassinos? O que era mais sagrado e poderoso de tudo que o mundo já possuía,
sangrou até a morte sob nossas facas: quem nos limpará o sangue? Com que água
poderíamos nos purificar? Que rituais de expiação, que jogos sagrados deveríamos
inventar?”
Essa colocação de Nietzsche expressa sua visão radical sobre a morte de Deus

28
DIVORCIADO DE DEUS

e o colapso da moralidade religiosa tradicional. Ele desafia os leitores a


enfrentarem a realidade do declínio da religião como uma fonte de valores morais
e a encontrar uma nova forma de significado e propósito na vida após a morte de
Deus.
Bertrand Russell (1872-1970), um renomado filósofo e pensador do século
XX, foi conhecido por sua posição céptica em relação à religião e à existência de
Deus. Em sua obra “Por Que Não Sou Cristão”, Russell critica várias concepções
tradicionais de Deus, incluindo a ideia de um Deus ciumento e possessivo. Ele
argumenta que muitas das características atribuídas a Deus são inconsistentes e
contraditórias, e que a noção de um Deus ciumento contradiz a ideia de um ser
supremo benevolente e justo.
Uma citação emblemática de Russell que ilustra sua crítica à concepção de um
Deus ciumento e possessivo pode ser encontrada em seu próprio livro “Por Que
Não Sou Cristão”. Ele escreve: “Se Deus foi capaz de prever que seu mandamento
seria desobedecido, então ele queria que fosse desobedecido; e, se ele não queria,
ele não era omnisciente”. Com essa citação, Russell questiona a lógica por trás da
ideia de um Deus ciumento que deseja a obediência absoluta de seus seguidores,
mesmo que isso resulte em punição ou sofrimento para eles. Ele sugere que tal
concepção de Deus é incompatível com a noção de um ser todo-poderoso e
benevolente. Russell argumenta ainda que a ideia de um Deus ciumento e
possessivo reflecte uma projecção das características humanas na divindade. Ele
sugere que os seres humanos tendem a atribuir a Deus as mesmas emoções e
motivos egoístas que experimentam, como ciúme e possessividade. No entanto,
Russell contesta essa concepção, argumentando que um ser verdadeiramente
divino seria transcendente às fraquezas humanas e não agiria de maneira ciumenta
ou possessiva em relação a seus seguidores.
A crítica de Russell às concepções tradicionais de Deus, incluindo a ideia de
um Deus ciumento, é importante porque desafia as noções arraigadas na teologia
e na religião. Ele convida os leitores a questionar as suposições sobre a natureza
de Deus e a considerar uma visão mais racional e livre de dogmas sobre o divino.
Através de suas críticas perspicazes, Russell estimulou -me o pensamento crítico
e a reflexão sobre questões fundamentais relacionadas à fé e à existência humana.
David Hume (1711-1776), foi um filósofo empiricista escocês que questionou
as bases da crença religiosa em sua obra “Investigação sobre o Entendimento Humano”
e em “Diálogos sobre a Religião Natural”. Sua tese principal envolve a crítica à noção
de que podemos ter conhecimento sobre a natureza de Deus ou sobre questões
metafísicas por meio da razão ou da experiência. Embora não tenha abordado
especificamente o tema do ciúme divino, suas ideias sobre a natureza da crença
religiosa e a origem das concepções de Deus foram tão relevantes para essa
discussão de ciúme de Deus. Hume argumenta que as crenças religiosas são
baseadas em sentimentos, costumes e tradições, em vez de evidências racionais ou
empíricas.
Hume critica as concepções tradicionais de Deus, que muitas vezes incluem
características como omnisciência, omnipotência e, potencialmente, ciúme. Ele
sugere que tais atributos divinos são produtos da imaginação humana e reflectem

29
DIVORCIADO DE DEUS

as necessidades psicológicas e emocionais dos crentes, em vez de uma realidade


objectiva. Hume questiona a validade de se atribuir características humanas a um
ser transcendente e argumenta que não podemos ter certeza sobre a existência ou
natureza de Deus. Uma das citações emblemática de Hume que ilustra sua
abordagem crítica à religião é a seguinte: “A religião, por si só, pode inculcar o
hábito do medo, e o medo, quando exercido, em grau suficiente, será suficiente
para gerar a religião”. Com essa citação, Hume destaca a ideia de que a religião
muitas vezes é baseada em emoções como medo e ansiedade, em vez de uma
compreensão racional ou fundamentada. As ideias de Hume sobre religião e
teologia são importantes porque desafiam as noções tradicionais de fé e crença,
convidando os leitores a questionar suas suposições sobre a natureza de Deus e o
significado da religião. Sua abordagem céptica e empiricista estimulou me o
pensamento crítico e a reflexão sobre questões metafísicas e religiosas,
incentivando uma investigação mais profunda das bases da crença religiosa e da
experiência espiritual.
Emil Cioran (1911-1995), foi um filósofo e escritor romeno-francês conhecido
por suas visões pessimistas sobre a existência humana e suas críticas à religião,
também se destacou por suas críticas à religião e à condição humana. Em suas
obras, como “Breviário de Decomposição”, Cioran critica a ideia de um Deus ciumento
como uma projeção das fraquezas humanas na divindade. Ele sugere que o ciúme
divino é uma construção humana, reflectindo mais as inseguranças e neuroses dos
crentes do que a verdadeira natureza divina. Para Cioran, a religião é vista como
uma forma de escapismo que oferece consolo temporário, mas não aborda as
questões fundamentais da existência humana, isto é, é uma tentativa de lidar com
a angústia existencial, e a ideia de um Deus ciumento é mais uma expressão das
fraquezas humanas do que uma característica genuína da divindade. Cioran
escreve, “O homem só é infeliz porque não sabe que é feliz. A única coisa que me
consola é o pensar que a vida não tem sentido”. Com este dizer, Cioran destaca a
ideia de que a religião pode oferecer consolo temporário aos crentes, mas não
resolve as questões existenciais subjacentes à condição humana. As ideias de
Cioran sobre religião são importantes porque desafiam as concepções
convencionais de divindade e questionam a validade das crenças religiosas como
uma fonte de consolo e significado. Sua abordagem crítica estimulou me a reflexão
sobre as motivações por trás das crenças religiosas e convida os leitores a
considerar uma perspectiva mais cética e existencial sobre a natureza da fé e da
religião.
Richard Dawkins (1941-presente), biólogo evolucionista e crítico da religião,
também aborda o conceito de um Deus ciumento em seus escritos. Em “Deus, um
Delírio”, Dawkins argumenta que a ideia de um Deus ciumento é uma construção
humana projectada para controlar e manipular as massas, em vez de uma
representação precisa de uma divindade transcendente. Dawkins vê a religião
como uma criação da mente humana, usada para satisfazer as necessidades
psicológicas e sociais dos crentes. Dawkins critica a ideia de um Deus ciumento
como uma manifestação das tendências controladoras e manipulativas das
instituições religiosas. Ele argumenta que a noção de um Deus ciumento é usada

30
DIVORCIADO DE DEUS

para instilar medo e submissão nas pessoas, promovendo assim a obediência cega
às autoridades religiosas. Para Dawkins, a religião é vista como uma forma de
opressão que limita a liberdade individual e promove a intolerância e o conflito.
Ele, argumente, “Religião é sobre poder. É sobre controle. É sobre estrutura. É
sobre regras. É sobre seguir ordens. É sobre obedecer”. Com essa citação,
Dawkins destaca a natureza controladora e manipulativa das instituições religiosas,
que muitas vezes utilizam a ideia de um Deus ciumento para subjugar e controlar
as massas. Sua abordagem científica e cética estimula a reflexão sobre as
motivações por trás das crenças religiosas e incentiva a busca por uma
compreensão mais fundamentada e livre de dogmas sobre questões espirituais e
metafísicas.
Essa fundamentação filosófica lança luz sobre as origens antigas do conceito
de ciúme divino e sua influência ao longo da história da religião e da filosofia. Ao
examinarmos essas raízes, podemos começar a compreender melhor como o
ciúme de Deus foi percebido e interpretado em diferentes tradições culturais e
religiosas, e como isso pode ter influenciado as experiências individuais de fé e
espiritualidade. Ao se inspirar nessas ideias e explorar as diferentes interpretações
do ciúme divino ao longo da história, é natural que você como eu comecemos a
questionar e reflectir sobre nossa própria experiência de fé e espiritualidade. Aqui
estão algumas maneiras pelas quais você como eu podemos chegar à ideia de que
Deus é realmente ciumento:
Ao estudar passagens das escrituras sagradas ou textos religiosos, eu encontrei
várias referências que retratam Deus como um ser ciumento. Essas narrativas e
ensinamentos podem ter ressoado com as minhas experiências pessoais e levado
a uma maior conscientização sobre essa característica divina. Experiências
pessoais: minhas próprias experiências de vida e interações com a religião
contribuíu para minha percepção do ciúme divino. Por exemplo, situações em que
eu me senti pressionado a seguir determinada crença ou práticas religiosas, sob a
ameaça de punição ou rejeição divina, levando me a questionar a natureza de
Deus. Ao se envolver com ideias e pensamentos filosóficos sobre a natureza de
Deus e a experiência religiosa, eu comecei a considerar me as características
atribuídas a Deus, como o ciúme, são compatíveis com uma compreensão mais
ampla de divindade e espiritualidade. Conversas e debates com outros pensadores,
sejam eles religiosos, filósofos ou críticos da religião, desafiaram as minhas crenças
e levado me a explorar novas perspectivas sobre o ciúme divino e suas
implicações. Um exame crítico e reflexivo da minha própria fé e prática religiosa
pode tê-lo levado a questionar certas representações de Deus, incluindo aquelas
relacionadas ao ciúme. Esse processo de questionamento e autoexame pode ter
sido crucial para o desenvolvimento de sua compreensão pessoal da divindade.
Essas são apenas algumas maneiras pelas quais você como cheguei à ideia de que
Deus é realmente ciumento. Independentemente do caminho que o levei a essa
conclusão, é importante continuar explorando e questionando suas crenças,
buscando sempre uma compreensão mais profunda e significativa da
espiritualidade e da natureza da divindade.

31
DIVORCIADO DE DEUS

A INCONSTÂNCIA DIVINA

O Eu sujeito pensante, neste capítulo, reflecto sobre a inconstância de Deus em fornecer ajuda
e orientação quando mais necessária, deixando-me desamparado e confuso.

Mergulhamos na reflexão sobre a inconstância percebida na relação com o


divino. A jornada espiritual revelou não apenas um Deus ciumento, mas também
um ser inconstante e caprichoso, cujas promessas de ajuda e orientação pareciam
evaporar nos momentos cruciais. Esta é a narrativa de uma busca por sentido e
estabilidade em meio às incertezas da vida.

Promessas não cumpridas

A jornada ao divino me revelou não apenas um Deus ciumento, mas também


um ser inconstante e caprichoso. A promessa de ajuda e proteção divina parecia
evaporar nos momentos mais cruciais, deixando-me à mercê das tempestades da
vida.Uma das formas mais evidentes de inconstância divina é quando as
promessas feitas por Deus não se concretizam. Uma das principais inconstâncias
que experimentei foi a falta de cumprimento das promessas divinas de ajuda e
orientação. A cada momento de aflição, minhas preces eram preenchidas com a
esperança de uma intervenção divina. No entanto, muitas vezes me deparei com
a decepção quando essas promessas pareciam não se concretizar. Por exemplo, eu
orava fervorosamente por uma intervenção divina em que eu depositava toda a
confiança em situação difícil da minha vida, com uma doença grave, uma crise
humanitária, a guera que densalou a minha família e a situação financeira, apenas
para descobrir que a minha súplica não era atendida e até então não foi atendida.
Ao enfrentar esses momentos de dificuldade e necessidade, esperava encontrar
conforto e orientação divinos, apenas para descobrir que essas promessas
pareciam evaporar no ar. Isso me deixou desamparado e confuso, questionando a
confiabilidade e a consistência do divino. Reflectindo sobre as obras de
pensadores como Arthur Schopenhauer, que criticou a visão antropomórfica de
Deus e sugeriu que as promessas divinas eram projeções das fraquezas humanas,
percebi que minhas expectativas eram baseadas em uma compreensão limitada e
distorcida da natureza divina. Essa quebra de promessas me levou a sentimentos
de decepção, desilusão e abandono por parte do divino.

Falta de orientação

Outra forma de inconstância é a falta de orientação ou direcção divina nos


momentos de necessidade. Nos momentos de indecisão e incerteza, busquei
orientação e clareza divinas para me guiar. No entanto, me vi confuso e ansioso
diante da ausência de resposta ou direção do divino. Essa falta de orientação
minou minha confiança na bondade e no cuidado divinos. É que do mesmo jeito,
quando alguém se encontra diante de uma encruzilhada na vida, esperando por
32
DIVORCIADO DE DEUS

um sinal ou uma resposta de Deus, a ausência de orientação pode gerar confusão,


ansiedade e desespero. No entanto, me vi confuso e ansioso diante da ausência de
resposta ou direção do divino. Essa falta de orientação minou minha confiança na
bondade e no cuidado divinos.

Intervenção selectiva

Às vezes, pode parecer que Deus intervém selectivamente nas vidas das
pessoas, favorecendo algumas enquanto ignora outras. Por exemplo, alguém pode
testemunhar milagres ou bênçãos divinas na vida de outras pessoas, enquanto suas
próprias preces parecem cair em ouvidos surdos. Testemunhar bênçãos divinas
na vida de outras pessoas enquanto minhas próprias preces pareciam ser ignoradas
gerou um sentimento de injustiça e ressentimento. A percepção de que Deus
intervém selectivamente nas vidas das pessoas levantou questionamentos sobre a
equidade divina e o propósito de minhas próprias provações. Essa percepção de
parcialidade divina pode levantar questões sobre a equidade e a justiça de Deus,
gerando ressentimento e indignação.

Silêncio divino

Outra inconstância que me confrontou foi o silêncio aparente de Deus diante


das minhas preces e súplicas. Em momentos de desespero e angústia, clamei por
uma resposta ou um sinal do divino, apenas para ser recebido com um
ensurdecedor vazio. E me perguntei, quantas vezes clamei por auxílio em meio à
escuridão, apenas para ser recebido com o ensurdecedor silêncio do céu? A mão
divina, que deveria guiar-me com segurança pelos caminhos tortuosos da
existência, parecia recuar diante das minhas súplicas desesperadas, deixando-me
sozinho para enfrentar os horrores da solidão e do abandono.Diante do silêncio
divino, me vi confrontado com uma série de perguntas angustiantes e profundas:
Será que Deus está realmente presente e preocupado com minha situação, ou
estou sozinho neste universo vasto e indiferente? Por que minhas preces e súplicas
parecem cair em ouvidos surdos? Será que estou fazendo algo de errado, ou Deus
simplesmente escolhe não responder? Como posso reconciliar a ideia de um Deus
amoroso e compassivo com a aparente indiferença divina diante do meu
sofrimento? Se Deus é omnipotente e omnisciente, por que permite que o silêncio
e a solidão persistam em minha vida, mesmo quando busco sinceramente sua
orientação e ajuda? O silêncio divino é um teste de fé ou uma indicação de que
minha fé está fundamentada em ilusões e expectativas irreais? Será que estou
interpretando correctamente o silêncio divino, ou estou projectando minhas
próprias inseguranças e dúvidas na ausência de resposta? Essas perguntas, e muitas
outras, surgiram naturalmente da minha experiência de enfrentar o silêncio divino,
desafiando minhas crenças e convicções mais profundas sobre a natureza de Deus
e do universo.
Essa experiência de silêncio divino foi desconcertante e perturbadora,
levando-me a questionar se Deus realmente estava presente ou se importava com

33
DIVORCIADO DE DEUS

minha situação. Ao explorar as ideias de filósofos como Bertrand Russell, que


criticou a inconsistência das representações de Deus, percebi que o silêncio divino
poderia ser interpretado como uma ausência de evidência para a existência de um
ser divino que se envolve directamente com os assuntos humanos.

Flutuações de fé

A inconstância divina também pode ser experimentada como flutuações na


própria fé. Por exemplo, alguém pode passar por períodos de fervor espiritual e
proximidade com Deus, apenas para ser abalado por eventos negativos ou pela
falta de resposta divina, levando a dúvidas e questionamentos sobre a própria
crença. Experimentei períodos de fervor espiritual e proximidade com Deus,
seguidos por momentos de dúvida e questionamento. Essas flutuações na minha
fé foram desafiadoras e muitas vezes me deixaram em conflito sobre o verdadeiro
significado da minha relação com o divino. A inconstância divina não conhecia
limites. Promessas feitas com fervor e convicção eram rapidamente esquecidas
quando a necessidade se fazia presente. A palavra de Deus, que deveria ser um
farol de esperança em meio à escuridão, revelava-se tão volúvel quanto as ondas
do mar, levando-me a duvidar da própria realidade de sua presença.
Experimentei pessoalmente essas flutuações na minha fé, que foram
profundamente desafiadoras. Ao buscar compreender esses momentos de
incerteza, encontrei suporte nas reflexões de pensadores que enfrentaram dilemas
semelhantes ao longo da história. Por exemplo, Arthur Schopenhauer, em sua
filosofia pessimista, abordou questões relacionadas à religião e à natureza de Deus.
Ele sublinhou que a inconstância divina é uma projeção das fraquezas humanas,
reflectindo a instabilidade e as contradições da existência. Essa visão ressoa com
minha própria experiência de sentir a promessa divina desvanecer diante das
adversidades da vida.
Além disso, Ludwig Feuerbach criticou a concepção de um Deus ciumento e
possessivo, argumentando que essa visão era uma projeção das necessidades e
desejos humanos. Para Feuerbach, a religião servia como uma forma de
escapismo, onde os seres humanos projectavam suas próprias inseguranças e
fragilidades em uma divindade imaginada. Essa crítica ressoa com minha
percepção de que as promessas divinas eram facilmente esquecidas quando
confrontadas com as necessidades reais da vida.
Essas reflexões filosóficas ajudaram a dar forma ao meu entendimento da
inconstância divina, oferecendo uma lente através da qual pude examinar minhas
próprias experiências e questionamentos. Ao confrontar a volatilidade da fé e a
aparente inconstância de Deus, encontrei validação e consolo nas reflexões dos
pensadores que buscaram compreender os mistérios da existência humana e
divina. Enfrentar essa inconstância divina foi uma jornada desafiadora, levando-
me a buscar respostas e consolo na sabedoria dos pensadores ao longo da história,
que também enfrentaram dilemas semelhantes em sua busca espiritual.

34
DIVORCIADO DE DEUS

Caprichos da providência

Além disso, encontrei a inconstância na forma como a providência divina


parecia operar em minha vida. Havia momentos em que parecia receber bênçãos
e favores divinos, apenas para ser confrontado com dificuldades e adversidades
inesperadas logo em seguida. Essa aparente arbitrariedade na distribuição da
providência divina levantou questões sobre a justiça e a imparcialidade do divino.
Inspirado nas obras de filósofos como David Hume, que explorou a natureza da
crença religiosa e a origem das concepções de Deus, percebi que muitas das
experiências que atribuí à providência divina poderiam ser explicadas por causas
naturais ou coincidências, minando assim minha fé na intervenção divina. Essas
inconstâncias divinas, descobertas ao longo da minha jornada espiritual,
desafiaram minha compreensão anterior do divino e me levaram a questionar as
bases da minha fé. Ao refletir sobre as ideias de diversos pensadores e explorar as
diferentes facetas da relação entre o divino e o humano, pude desenvolver uma
perspectiva mais crítica e reflexiva sobre minha espiritualidade e minhas crenças.
No entanto, ao confrontar a inconstância de Deus, descobri uma fonte de
força e resiliência dentro de mim mesmo. Não mais dependeria da ajuda
caprichosa de um ser divino que parecia brincar com meu destino como um
tabuleiro de xadrez. Era hora de assumir o controle de minha própria vida e
enfrentar os desafios que se apresentavam diante de mim com coragem e
determinação. A inconstância divina não mais me deteria em minha busca pela
verdade e pela autenticidade. Era hora de trilhar meu próprio caminho, sem as
amarras da dependência religiosa.

Diante das inconstâncias divinas que experimentei ao longo da minha jornada


espiritual, fui levado a questionar profundamente as bases da minha fé e minha
relação com o divino. Ao refletir sobre as ideias de diversos pensadores e explorar
diferentes perspectivas sobre a espiritualidade, percebi que minha fé estava
fundamentada em premissas frágeis e ilusórias. O confronto com a inconstância
de Deus foi um momento de ruptura em minha vida espiritual. Ao perceber que
minhas preces muitas vezes pareciam cair em ouvidos surdos e que o divino estava
ausente nos momentos cruciais da minha vida, decidi não mais depender de uma
entidade que parecia ser tão caprichosa e inconsistente em suas ações.

Assumir o controle da minha própria vida e enfrentar os desafios com coragem


e determinação foi um acto de libertação. Em vez de esperar por uma orientação
divina que nunca parecia chegar, decidi trilhar meu próprio caminho em busca da
verdade e autenticidade. Não mais me submeteria às amarras da dependência
religiosa, que me mantinha preso a uma relação unilateral e desigual com o divino.
Meu divórcio espiritual foi uma declaração de independência e autoafirmação.
Ao renunciar à ideia de um Deus inconstante e caprichoso, pude finalmente
encontrar paz e liberdade para viver minha vida de acordo com meus próprios
princípios e valores. Minha crítica fervorosa à inconstância divina é um
testemunho da minha jornada em direção à autonomia espiritual e à busca pela

35
DIVORCIADO DE DEUS

verdade interior, longe das ilusões e amarras da religião. Não obstante, diante das
inconstâncias divinas que permearam minha jornada espiritual, deparei-me com
um profundo questionamento sobre a essência do divino e sua relação com o
mundo humano. Nesse processo reflexivo, encontrei eco nas ideias de diversos
pensadores que, de maneira similar, contestaram a constância e a coerência das
concepções tradicionais de Deus.
Um desses pensadores é Friedrich Nietzsche, cuja crítica à moralidade religiosa
e à figura divina como um ser todo-poderoso e benevolente ressoa com minha
própria experiência de confronto com a inconstância divina. Nietzsche argumenta
que a moralidade cristã, ao atribuir valores de bondade e pureza a Deus, cria uma
imagem de divindade que reflete os ideais e tabus da sociedade humana, em vez
de representar uma verdadeira natureza divina independente das concepções
humanas. Essa perspectiva contesta a ideia de um Deus constante e confiável,
sugerindo que nossa compreensão do divino é moldada por nossas próprias
necessidades e projeções psicológicas.
Além disso, o filósofo existencialista Jean-Paul Sartre também ofereceu-me
entendimento valiosos sobre a inconstância do divino. Em sua obra “O Ser e o
Nada”, Sartre argumenta que, se Deus existe, sua ausência de intervenção directa
no mundo humano é evidência de sua inconstância ou indiferença. Para Sartre, a
falta de evidência convincente da presença divina desafia a noção de um Deus
constante e confiável, sugerindo que a existência ou não do divino é uma questão
de escolha e responsabilidade humanas.
Ao reunir essas reflexões com minha própria experiência de desilusão diante da
inconstância divina, chego à conclusão de que minha busca pela verdade e
autenticidade espiritual só pode ser alcançada através da emancipação da
dependência religiosa e da aceitação da responsabilidade pela minha própria
jornada. Minha crítica fervorosa à inconstância divina é, portanto, um convite para
a autonomia espiritual e a busca por significado e propósito além das amarras da
religião institucionalizada.

36
A ILUSÃO DO AMOR DIVINOO

Aqui, o eu sujeito pensante ergo examinar a natureza ilusória do amor divino, que me
mantinha preso a uma relação desigual e opressiva.

A Natureza Ilusória do Amor Divino

A ilusão do amor divino é como uma névoa que envolve a mente e o coração,
obscurecendo a visão da verdadeira natureza do divino. Essa névoa, por tanto
tempo, acreditei cegamente nas promessas de um amor eterno e incondicional,
oferecido por um Deus que se dizia todo-poderoso e benevolente. No entanto, à
medida que os véus da ilusão se dissipavam, revelava-se uma verdade amarga e
perturbadora. Filósofos como Jean-Paul Sartre e Friedrich Nietzsche oferecem
sabees sobre a natureza ilusória do amor divino. Sartre, argumenta que a ausência
de intervenção directa de Deus no mundo humano sugere sua indiferença ou
inexistência, desafiando a noção de um amor divino verdadeiro. Nietzsche, por
sua vez, critica a moralidade religiosa, apontando-a como uma construção que
reflecte os valores humanos em vez de uma verdadeira benevolência divina.

Armadilha da Servidão e Submissão

Gestos de bondade divina podem ser interpretados como formas de controle


e manipulação quando não correspondem às expectativas de amor incondicional.
A crença na benevolência divina pode levar à aceitação passiva de circunstâncias
adversas ou injustiças, alimentando uma dinâmica de servidão e submissão. Essa
armadilha emocional é semelhante a padrões de relacionamentos abusivos, onde
a vítima se sente obrigada a permanecer em uma relação desigual e prejudicial.
No entanto, o amor divino, longe de ser altruísta e compassivo, revelou-se
como uma armadilha mortal, destinada a aprisionar minha alma em correntes de
servidão e submissão. Cada gesto de suposta bondade era tingido com a sombra
do controle e da manipulação, como um amante possessivo que sufoca sua presa
sob o pretexto de protegê-la. A alegoria da caverna de Platão pode ser invocada
para ilustrar a natureza da ilusão divina. Assim como os prisioneiros na caverna
são enganados pelas sombras projetadas na parede, os crentes podem ser iludidos
pelas promessas de amor divino que mascaram uma realidade menos benevolente.

Confronto com a Realidade

O confronto com a realidade da ausência de amor verdadeiro na relação com


o divino é um processo gradual e doloroso. Momentos de questionamento e
dúvida surgem quando as promessas de um amor divino incondicional não são
cumpridas. A experiência de sentir-se abandonado ou ignorado pelo divino pode
gerar sentimentos de raiva, ressentimento e incredulidade. Esse confronto com a
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DIVORCIADO DE DEUS

realidade pode levar à perda da fé e à busca por respostas fora do âmbito religioso.
Ao confrontar a ilusão do amor divino, deparei-me com a verdade nua e crua: não
existe amor verdadeiro em uma relação baseada no medo e na dependência. O
Deus que me prometia vida em abundância apenas servia para alimentar minhas
ilusões e manter-me acorrentado a uma fé que já não mais me sustentava.
A ilusão do amor divino pode ser comparada à alegoria da caverna de Platão,
onde os prisioneiros, acorrentados e restritos à visão distorcida das sombras na
parede, acreditam que essa é a realidade. Da mesma forma, os crentes presos na
ilusão do amor divino estão confinados a uma visão distorcida da divindade,
incapazes de perceber a verdadeira natureza do divino. Essa abordagem crítica da
ilusão do amor divino destaca a importância de questionar as crenças e buscar
uma compreensão mais profunda e autêntica da espiritualidade, além das ilusões
que nos aprisionam.
A ilusão do amor divino é severamente criticada por revelar-se uma armadilha
mortal, destinada a aprisionar as almas em correntes de servidão e submissão. Essa
crítica ecoa a ideia de que a fé baseada no medo e na dependência não pode gerar
um verdadeiro amor. À medida que as ilusões sobre o amor divino são desfeitas,
o sujeito pensante confronta a discrepância entre a fé professada e a experiência
vivida, gerando sentimentos de decepção, traição e perda.

Descoberta da Liberdade

A renúncia à ilusão do amor divino é um ato de libertação e autoafirmação. Ao


reconhecer a falibilidade das representações idealizadas de Deus, o sujeito
pensante se liberta das amarras da dependência religiosa e assume o controle de
sua própria espiritualidade. Esse processo de autodescoberta e empoderamento
permite que a pessoa trilhe seu próprio caminho em direção à autenticidade e
verdade, livre das expectativas e demandas impostas por uma relação desigual com
o divino. Ao renunciar à ilusão do amor divino, abre-se um caminho para a
liberdade e autenticidade. Essa renúncia permite ao indivíduo respirar fundo e
trilhar seu próprio caminho em busca da verdade interior, sem as amarras da ilusão
e da dependência religiosa.
A abordagem existencialista de filósofos como Kierkegaard e Heidegger pode
ser citada para enfatizar a importância da autenticidade e da liberdade na busca
pela verdade espiritual. Para esses pensadores, a ilusão do amor divino só pode
ser superada quando o indivíduo assume plena responsabilidade por sua própria
existência e busca sua própria verdade interior. A renúncia à ilusão do amor divino
representa também uma crítica contundente à dependência religiosa, que mantém
os crentes acorrentados a uma fé que não mais os sustenta. Essa crítica ressoa com
as ideias de pensadores como Karl Marx, que viam a religião como um ópio do
povo, usado pelas elites para manter as massas submissas e obedientes. Ao
desfazer-se da ilusão do amor divino, o indivíduo encontra uma nova luz em sua
própria consciência, guiando-o em direção à autenticidade e à verdade espiritual.
Essa jornada de renúncia à ilusão e busca pela verdade representa um passo crucial
rumo à liberdade interior e ao florescimento humano.

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DIVORCIADO DE DEUS

No entanto, ao renunciar à ilusão do amor divino, descobri uma liberdade até


então desconhecida. Não mais aprisionado pelas expectativas e demandas de um
Deus ciumento e inconstante, pude finalmente respirar fundo e trilhar meu
próprio caminho em direção à autenticidade e à verdade. A ilusão do amor divino
havia sido desfeita, deixando para trás apenas a luz da minha própria consciência
como guia.
A primeira ilusão desfeita foi a crença nas promessas de um amor divino que
seria eterno e incondicional. Essa ilusão sugeria que Deus oferecia um amor
altruísta e compassivo, mas na verdade, revelou-se como uma armadilha para
aprisionar a alma em correntes de servidão e submissão. Outra ilusão foi a
percepção de gestos divinos de suposta bondade como sinais de um amor
genuíno. No entanto, ao confrontar essa ilusão, percebeu-se que cada gesto de
bondade estava na verdade tingido com a sombra do controle e da manipulação,
assemelhando-se a um amante possessivo que sufoca sua presa sob o pretexto de
protegê-la. Uma das ilusões mais profundas foi acreditar que uma relação com o
divino baseada no medo e na dependência poderia ser verdadeiramente amorosa.
Ao renunciar a essa ilusão, tornou-se evidente que não há verdadeiro amor em
uma relação marcada pelo medo e pela dependência. Ao confrontar e renunciar a
essas ilusões, abriu-se caminho para uma liberdade até então desconhecida,
permitindo respirar fundo e trilhar um caminho em direção à autenticidade e à
verdade, longe das amarras da religião institucionalizada.

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LIBERDADE ALÉM DAS FRONTEIRAS DA FÉ

Neste penúltimo capítulo conclusivo, o eu sujeito pensante encontro a coragem de se divorciar


de Deus, libertando-se das amarras da religião e abraçando uma vida de autonomia e
autenticidade.

Em um domingo ensolarado, eu despertei com a habitual expectativa de ir à


missa pela manhã. Contudo, uma indagação pessoal começou a germinar em
minha mente: “Por que sou cristão?” A luz da questão de Russell, colocado no
título da sua obra, “Por Que Não Sou Cristão” publicada em (1957). A resposta,
quando finalmente surgiu, revelou uma verdade inquietante: eu era cristão
simplesmente porque havia sido ensinado a ser desde o nascimento...?
Esse momento de reflexão introspectiva desencadeou uma série de
questionamentos profundos. Se meu único motivo para ser cristão era o
condicionamento que recebi, poderia eu ter sido facilmente moldado em outra fé?
Essa constatação lançou-me a um desafio pessoal: buscar uma experiência directa
com o divino, além das influências externas. Um dia, decidi colocar Deus à prova,
com todo respeito e sinceridade. Pedi por algo concreto, algo que transcendesse
os ensinamentos convencionais, algo que pudesse fundamentar minha fé em uma
experiência única. Contudo, o silêncio divinal persistiu por meses, anos até então.
Enquanto aguardava uma resposta, mergulhei mais profundamente nas filosofias
que regiam minha fé. Ponderei sobre a aparente contradição de um Deus
omnipotente que, ao invés de entregar uma mensagem directamente aos seus
seguidores, escolheu utilizar mãos humanas falíveis para transmitir seus
ensinamentos. Aliás, busquei a Bíblia abri no livro de Jeremias capitulo 17:5-7
ecoava em minha mente, questionando a confiança no homem e destacando a
bem-aventurança daqueles que confiam no Senhor. A pergunta que se impôs foi:
Por que Deus não nos presenteou com um livro divino, livre das imperfeições
humanas? A incongruência da “salvação pela crença” também se tornou um ponto
focal de minha dúvida. A ideia de que a salvação é atingida exclusivamente através
da crença pessoal parecia injusta e arbitrária. Questionei a justiça divina em
premiar ou condenar com base na sorte de nascer em uma família que ensina
determinada fé.

Liberdade de Pensamento e Exploração Espiritual

Ao divorciar-se de Deus e da religião, descobri uma liberdade sem precedentes


para explorar diferentes conceitos espirituais e filosóficos. Não mais limitado pelas
doutrinas e dogmas religiosos, pude questionar e investigar livremente as verdades
estabelecidas, buscando minha própria compreensão da existência e do significado
da vida. Essa liberdade de pensamento permitiu-me expandir meus horizontes
espirituais e abraçar uma jornada de autoconhecimento e exploração interior. Ao
me divorciar de Deus e da religião, fui libertado das limitações impostas por
doutrinas e dogmas religiosos, permitindo-me explorar uma ampla gama de
conceitos espirituais e filosóficos. Inspirado pelo pensamento de filósofos como
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DIVORCIADO DE DEUS

Friedrich Nietzsche, que desafiou as estruturas tradicionais da moralidade e da


religião, pude questionar as verdades estabelecidas e buscar uma compreensão
mais profunda da existência humana.
A liberdade de pensamento me permitiu explorar ideias diversas, desde o
existencialismo de Jean-Paul Sartre até a espiritualidade oriental, como o budismo
e o taoísmo, enriquecendo minha jornada espiritual com uma variedade de
perspectivas. Ao desfazer os laços que me prendiam à ilusão do amor divino,
deparei-me com uma descoberta libertadora: a verdadeira liberdade reside além
das fronteiras estreitas da fé. Não mais limitado pelas expectativas e exigências de
uma divindade ciumenta e inconstante, encontrei a coragem para trilhar meu
próprio caminho em direção à autenticidade e à realização pessoal.
Ao romper os laços com a ilusão do amor divino, descobri uma liberdade para
abraçar minha autenticidade e buscar minha própria realização pessoal.
Influenciado pela filosofia existencialista de Søren Kierkegaard, que enfatizava a
importância da escolha individual e da responsabilidade pessoal na busca pelo
significado da vida, encontrei coragem para trilhar meu próprio caminho em
direção à autenticidade. Essa liberdade permitiu-me viver de acordo com meus
valores e princípios pessoais, sem a necessidade de conformar-me às expectativas
externas impostas pela religião ou pela sociedade, encontrando assim uma
sensação mais profunda de realização e plenitude. Ao renunciar à fé religiosa,
descobri a liberdade de buscar a verdade dentro de mim mesmo, em vez de confiar
em autoridades externas ou dogmas pré-estabelecidos. Inspirado pelo pensamento
do filósofo francês René Descartes, que defendia a importância da dúvida
metódica e do questionamento crítico na busca pelo conhecimento verdadeiro,
encontrei coragem para explorar as profundezas da minha própria consciência.
Essa jornada interior me permitiu descobrir o verdadeiro significado da existência
e reconhecer a divindade presente em cada ser humano, transcendentemente
conectado à essência universal da vida. A liberdade que descobri não foi concedida
por uma entidade externa, mas sim conquistada por meio da coragem de
questionar as verdades estabelecidas e buscar a verdade dentro de mim mesmo.
Não mais escravo de dogmas e doutrinas, pude finalmente abraçar minha própria
jornada espiritual, livre para explorar as profundezas da minha própria consciência
e descobrir o verdadeiro significado da existência.

Liberdade de Significado e Propósito Individual

Epicteto foi um filósofo estoico que enfatizou a importância do controle


interno e da aceitação das circunstâncias externas. Em seus “Discursos” e
“Enchiridion”, Epicteto argumenta que a verdadeira liberdade é alcançada ao aceitar
aquilo que está além do nosso controle e focar apenas no que podemos controlar:
nossas próprias atitudes e escolhas. Sua filosofia ressoa com sua busca por
autonomia espiritual, encorajando-o a encontrar liberdade interna mesmo diante
das incertezas externas
Ao renunciar à fé religiosa, encontrei uma nova liberdade para criar meu
próprio significado e propósito na vida, sem depender das promessas de um ser

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DIVORCIADO DE DEUS

divino. John Stuart Mill, um defensor do utilitarismo e da liberdade individual. Em


sua obra “Sobre a Liberdade” publicado em 1859, ele argumenta que cada indivíduo
deve ter liberdade para agir da maneira que desejar, desde que suas ações não
prejudiquem os outros. Ele enfatiza a importância da autonomia e da
autodeterminação na busca pela felicidade e pelo bem-estar pessoal. Sua defesa da
liberdade individual pode ser vista como uma inspiração para sua jornada de
libertação das amarras da religião. Descobri que a verdadeira transcendência e
plenitude vêm de dentro, ao reconhecer a beleza e a profundidade da experiência
humana e do amor compartilhado entre os seres humanos. Essa liberdade
permitiu-me aceitar a responsabilidade por minha própria felicidade e crescimento
pessoal, em vez de buscar validação externa em conceitos religiosos pré-
estabelecidos.
Martin Heidegger, conhecido por sua análise fenomenológica da existência
humana e sua busca por um sentido mais profundo de ser. Em sua obra “Ser e
Tempo” publicado em 1927, ele examina a questão do “Desain” o “ser-no-mundo”,
destacando a importância da nossa relação com o mundo e com os outros na
busca por significado e autenticidade. Sua filosofia pode oferecer uma perspectiva
única sobre como encontramos significado em nossa existência cotidiana, além
das estruturas conceituais impostas pela religião.
Ralph Waldo Emerson, um filósofo transcendentalista que enfatizava a
importância da intuição e da experiência pessoal na busca pelo significado e
propósito na vida. Em ensaios como “Autoconfiança” e “Natureza”, Emerson
defende a ideia de que cada pessoa possui uma centelha divina dentro de si e deve
confiar em sua própria intuição e experiência para encontrar o verdadeiro
significado da vida. Neste sentido, ele incentivava as pessoas a confiarem em si
mesmas e em sua própria capacidade de discernir o que é verdadeiro e significativo
para elas. Sua filosofia ressoa com sua descoberta de uma nova liberdade ao se
libertar das ilusões do amor divino. E encoraja os indibiduos a confiança na
sabedoria interna e na capacidade de cada indivíduo de criar seu próprio caminho
na vida.
Henry David Thoreau, outro proeminente transcendentalista, é mais
conhecido por seu livro “Walden”, onde narra sua experiência vivendo de forma
simples e autossuficiente na natureza. Ele enfatiza a importância de viver
deliberadamente e seguir seu próprio caminho, em vez de ser arrastado pelas
convenções sociais ou religiosas. Sua busca por liberdade e autenticidade na vida
diária ecoa sua própria jornada de libertação espiritual, ao optar por viver de
acordo com seus próprios princípios e valores, longe das amarras da religião
institucionalizada.
Henri Bergson, um filósofo francês do século XX, explorou a natureza da
experiência humana e a relação entre o tempo, a consciência e a liberdade. Em sua
obra “A Evolução Criativa”, Bergson argumenta que a verdadeira liberdade é
encontrada na capacidade de criar e se adaptar à mudança constante da vida, em
vez de ser limitada por concepções fixas de significado e propósito. A aua filosofia
pode ser vista como uma extensão da jornada de liberdade espiritual além das
fronteiras da fé, encorajando a busca pela autenticidade e pela expressão criativa

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DIVORCIADO DE DEUS

da própria existência.
Simone de Beauvoir, foi uma filósofa existencialista que explorou a questão da
liberdade e da autonomia feminina em sua obra “O Segundo Sexo”. Ela argumentou
que as mulheres devem buscar sua própria autonomia e independência, em vez de
dependerem dos homens ou das estruturas sociais patriarcais. Sua defesa da
liberdade individual pode inspirar sua busca por autenticidade e realização pessoal
além das fronteiras da fé. Ao renunciar à fé que me aprisionava, encontrei uma
nova fé, uma fé na minha própria capacidade de criar significado e propósito em
um universo aparentemente sem sentido. Não mais dependente das promessas
vazias de um Deus distante e inacessível, pude finalmente encontrar a paz e a
plenitude dentro de mim mesmo, reconhecendo que a verdadeira divindade reside
na própria essência da humanidade.

Liberdade de Autenticidade e Expressão Pessoal

A liberdade de autenticidade e expressão pessoal é um aspecto fundamental da


jornada espiritual após o divórcio da religião. Ao nos libertarmos das amarras
impostas pelas crenças religiosas, somos capazes de abraçar nossa verdadeira
identidade e expressar-nos genuinamente, sem o peso das expectativas externas.
Essa liberdade nos permite viver de acordo com nossos próprios valores e
princípios, em vez de seguir padrões ditados por autoridades religiosas.
Sartre, com sua ideia do “existencialismo”, enfatizam a importância de criar
nossa própria essência e significado na vida, em vez de seguir definições externas.
Sartre argumenta que somos livres para escolher nossos próprios valores e
propósitos, e essa liberdade é fundamental para a realização pessoal. Ao liberar-
me das amarras da religião, encontrei a coragem de viver autenticamente, sem
medo de julgamentos externos ou expectativas impostas por crenças religiosas.
Essa liberdade permitiu-me abraçar minha verdadeira identidade e expressar-me
de forma genuína, sem a necessidade de conformar-me a padrões ou normas
religiosas. Descobri que a verdadeira realização vem de viver alinhado com meus
valores e princípios pessoais, em vez de seguir regras ditadas por uma autoridade
religiosa externa.
A liberdade de autenticidade permite que as pessoas se sintam empoderadas
para abraçar sua singularidade e aceitar-se plenamente como são, sem sentir a
necessidade de se conformar a padrões externos. Isso pode ser visto como uma
jornada de autoaceitação e amor-próprio. O pensador Carl Rogers, conhecido por
sua abordagem humanista na psicologia, enfatiza a importância da autenticidade e
congruência na busca pelo crescimento pessoal. Rogers acredita que quando nos
aceitamos verdadeiramente como somos, podemos alcançar um estado de
autorrealização e plenitude. A jornada em direção à liberdade espiritual muitas
vezes é compartilhada com outros indivíduos que também estão buscando sua
própria verdade e autenticidade. Essa comunidade de buscadores da verdade
proporciona apoio mútuo e compreensão, permitindo que cada pessoa se sinta
parte de algo maior do que ela mesma.

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DIVORCIADO DE DEUS

Filósofo Nietzsche, com sua ideia do “super-homem” ou “além-do-homem”,


sugerem que a verdadeira grandeza reside na capacidade de criar nossos próprios
valores e significados, sem depender de autoridades externas. Nietzsche incentiva
os indivíduos a se tornarem autores de suas próprias vidas e a viverem de acordo
com seus próprios padrões. Para ele, a verdadeira liberdade surge quando nos
libertamos das normas e valores impostos pela sociedade e pela religião e
abraçamos nossa singularidade. Em vez disso, ele defende a ideia do "além-do-
homem", um ser que cria seus próprios valores e vive de acordo com sua própria
vontade, sem se preocupar com a aprovação externa. Sartre, por sua vez, sustenta
que a autenticidade surge quando reconhecemos nossa liberdade de escolha e
assumimos a responsabilidade por nossas ações. Ele argumenta que somos
condenados à liberdade e, portanto, somos totalmente responsáveis por nossas
escolhas, mesmo que tentemos nos esquivar dessa responsabilidade. Foucault,
defende a ideia de resistência e subversão, encorajando os indivíduos a questionar
e desafiar as estruturas de poder que os oprimem, buscando formas alternativas
de existência que permitam uma maior liberdade e autenticidade.
Neste novo caminho, não estou sozinho. Ao meu lado, encontro outros
buscadores da verdade, indivíduos corajosos que também tiveram a coragem de
desafiar as convenções e buscar a liberdade além das fronteiras da fé. Unidos pelo
desejo de autenticidade e verdade, caminhamos juntos em direção a um futuro
onde a liberdade espiritual é reconhecida como o direito inalienável de todo ser
humano. Assim, ergo-me como um divorciado de Deus, livre das amarras que um
dia me prenderam à ilusão do amor divino. Com cada passo que dou em direcção
à liberdade, afirmo minha independência espiritual e minha determinação de viver
uma vida verdadeira e autêntica, livre das garras da religião e das ilusões do divino.

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EM BUSCA DA VERDADE INTERIOR

Concomitantemente, neste capítulo conclusiv, o eu sujeito pensante exalto como mentor de


busca da verdade interior sem as garras da religião e proclamo a minha liberdade fora da religião.

A jornada em direção à liberdade espiritual não é um destino final, mas sim


uma busca contínua pela verdade interior. Ao renunciar às estruturas da religião
organizada, abri-me para a possibilidade de explorar os recantos mais profundos
da minha própria consciência e descobrir a verdadeira natureza do divino.
Neste caminho de autodescoberta, encontrei-me diante de perguntas
profundas e desconcertantes. Quem sou eu além das crenças e identidades que me
foram impostas? Qual é o meu propósito neste vasto cosmos? O que significa
viver uma vida autêntica e significativa?
À medida que mergulhei nas profundezas da minha própria alma, descobri
uma fonte inesgotável de sabedoria e verdade. Não mais limitado pelas
interpretações estreitas das escrituras sagradas, pude finalmente abrir-me para a
riqueza e diversidade do conhecimento humano, explorando as contribuições de
filósofos, cientistas, artistas e sábios ao longo da história.
Neste processo de busca da verdade interior, encontrei respostas que
transcendem as fronteiras da religião e da cultura. Descobri a beleza da
interconexão de todas as coisas, a profundidade do amor humano e a capacidade
infinita da alma humana de transcender as limitações da matéria.
No entanto, esta jornada não é isenta de desafios e adversidades. Encontrei-
me diante de dúvidas e incertezas, momentos de escuridão e desespero. No
entanto, foi precisamente nestes momentos de provação que encontrei minha
força mais profunda e minha fé mais resiliente.
Assim, continuo minha busca pela verdade interior, sabendo que a jornada é
tão importante quanto o destino final. Não mais temendo as incertezas do
desconhecido, abraço cada experiência como uma oportunidade de crescimento e
transformação, confiante de que, no final, encontrarei a paz e a plenitude que tanto
procuro.
Diante dessas interrogações, me encontro em um estado de espera. Não
abracei o ateísmo, mas tampouco posso afirmar uma fé inabalável. Estou em
STAND BY, aguardando uma resposta misericordiosa de Deus, que possa
dissipar minhas dúvidas e renovar meu caminho espiritual. A minha busca não é
pelo conhecimento de todas as respostas, mas por um toque divino que valide
minha jornada e justifique minha escolha de fé. Enquanto aguardo humildemente,
permaneço em SUSPENSE, na esperança de que, em algum momento, a quietude
divina seja rompida por uma resposta que transcenda as limitações humanas.

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SOBRE MIM

Nascido na aldeia de Mbau, no distrito de Mocimboa da Praia, Cabo Delgado-


Moçambique, John Oreste pseudonio de Kanumbo emergiu como um novo autor
cuja jornada é uma fusão notável entre a herança africana, a formação sacerdotal
e a paixão pela filosofia. Filho de dona Remitas Matias, cresceu imerso na rica
cultura de Vaiyanga variação de falante de língua Shimakonde na zona costeira de
Kwiyanga, onde as sementes do seu amor pela leitura foram plantadas.
Após trilhar os caminhos da vida sacerdotal, Kanumbo tomou a ousada decisão
de abraçar uma nova jornada da vida, deixando assim a formação sacerdotal.
Graduou-se em Filosofia e Ética no Instituto Superior Maria Mãe de África
(ISMMA) na Cidade de Maputo. Kanumbo é um participante activo em eventos
literários e debates filosóficos. Sua busca pelo conhecimento começou na infância,
mas ganhou impulso real no seminário, onde o ambiente favorável permitiu que
seus sonhos florescessem.
Actualmente, Kanumbo contribui de maneira significativa para o campo da
escrita, destacando-se em obras que reflectem sua visão única e perspicaz. Sua
participação activa em workshops e debates filosóficos o posicionou como uma
voz notável na esfera literária e política. Comprometido com a disseminação do
conhecimento e do pensamento crítico, Kanumbo continua a explorar novas
facetas da filosofia africana, a crítica contundente sobre a Religião e a Política
Contemporanea.

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