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Quaresma
MEDITAÇÕES EM PREPARAÇÃO
PARA A PÁSCOA

1
Sumário
Meditação 1
Entrada triunfante em Jerusalém.......... 4
Meditação 2
A última Ceia.................................10
Meditação 3
Jesus lava os pés de seus discípulos.......15
Meditação 4
Instituição da Eucaristia....................21
Meditação 5
O Salvador reza no Horto das Oliveiras....29
Meditação 6
Jesus é preso..................................36
Meditação 7
Jesus é condenado à morte.................42
Meditação 8
Jesus leva a cruz ao Calvário...............48
Meditação 9
Jesus encontra sua mãe.....................53
Meditação 10
Jesus é pregado na cruz.....................56
Meditação 11
Na cruz, o Senhor pensou em nós........62
Meditação 12
Jesus morre na Cruz........................67
Meditação 13
Jesus é descido da Cruz e sepultado......78
Q1R
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Entrada triunfante
em Jerusalém
Aproximando-se Jesus de Jeru-
salém e de Betfagé, mandou dois de
seus discípulos, dizendo-lhes: Ide à
aldeia que defronte de vós está, e
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logo achareis uma jumenta presa e
um poldro com ela, e trazei-mos. E
se alguém vos perguntar: Que fazeis?
dizei que o Senhor tem necessidade
deles, e logo vo-los deixarão trazer.
E os discípulos partiram e fizeram
como Jesus lhes ordenam (Mt 21,1).
Nestes preparativos do triunfo de Je-
sus, 1.º admiremos o conhecimento
que Jesus tem de tudo, não só do que
procede de uma causa necessária,
mas da livre vontade do homem; e
descansemos na sua Sabedoria e Pro-
vidência; 2.º admiremos a obediên-
cia dos discípulos, que sem olhar às
dificuldades em cumprir uma ordem
5
ao parecer injusta, temerária e peri-
gosa, obedecem prontamente. Con-
fiam em seu poder, e que tudo lhes
sucederá como ele determina; 3.º
não menos docilidade nos ensinam
os Betfagenses em ceder logo o que
em nome do Senhor lhes é pedido. À
imitação deles não recusemos o que
se nos pede em nome do Senhor e o
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que o mesmo Senhor nos pede.

Trecho do livro “Reflexões Evangélicas - Para uma leitura me-


ditada do Evangelho” de Alexandrino Monteiro, pág. 409.

6
Jesus entra em Jerusalém “Eis
que teu rei vem a ti cheio de mansi-
dão, montado numa jumenta, num
jumentinho, filho da que leva o
jugo” (Mt 21,5). Nosso Redentor,
avizinhando-se o tempo de sua Pai-
xão, parte de Betânia para entrar
em Jerusalém. Que humildade de
Jesus Cristo em querer entrar nessa
cidade sentado sobre um jumento,
sendo Ele o rei do céu. Ó Jerusa-
lém, contempla o teu rei, como ele
vem humilde e manso. Não temas
que Ele venha para reinar sobre ti e
apossar-se de tuas riquezas; não, Ele
vem todo amor e cheio de compai-
7
xão para salvar-te e trazer-te a vida
com sua morte. Entretanto, o povo,
que já O venerava por causa de seus
milagres e especialmente por causa
da ressurreição de Lázaro, vem ao
seu encontro. Uns estendem suas
vestes sobre o caminho em que de-
via passar, outros espalham folha-
gens de árvores para O honorificar.
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Quem diria então que esse Senhor,


recebido com tantas honras, den-
tro de poucos dias teria de apare-
cer aí mesmo como réu condenado
à morte com uma cruz às costas?
Meu caro Jesus, quisestes, pois,
fazer essa entrada solene para que
8
vossa paixão e morte fosse tanto
mais ignominiosa quanto maior fora
a honra recebida.

Trecho do livro “A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo”, de


Santo Afonso Maria de Ligório, pág. 139.

9
Q2R
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A última Ceia
“Tendo amado os seus que estavam no
mundo, amou-os até o fim. Essas pala-
vras tocam profundamente a alma.
(...) Os Doze o tinham acompanha-
do dia após dia, durante três anos;
tinham ouvido sua pregação do
10
Reino de Deus; extasiaram-se, con-
templando o resplendor divino da
sua glória no Monte Tabor; teste-
munharam curas e milagres; viram
a ternura, a compreensão, a paciên-
cia, a doação total que brotavam do
Coração humano de Cristo, inunda-
do pelo amor divino. Tinham, por-
tanto, tudo para vislumbrar o que
significava amar até o fim. Mas não
tinham visto ainda o cume máximo
desse amor. Iam vê-lo agora.
Com certeza, ficaram intrigados
ao perceber o capricho muito es-
pecial com que Jesus quis preparar
aquela Ceia pascal. Jesus falava da-
11
quela Páscoa como de coisa sonhada
desde fazia muito tempo. Direis ao
dono da casa: “O Mestre te pergunta:
onde está a sala em que comerei a Pás-
coa com os meus discípulos?” E ele vos
mostrará, no andar superior, uma grande
sala, provida de almofadas; preparai ali
(Lc 22,11-12). Falava do Cenáculo
como se o estivesse vendo.
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O Evangelho continua: Quando


chegou a hora, ele se pôs à mesa com
seus apóstolos e disse-lhes: “Desejei
ardentemente comer convosco esta Pás-
coa, antes de sofrer”. Era um sonho,
sim! Um sonho acalentado longa-
mente por Jesus, pois seria a hora
12
do amor até o fim daquele que tinha
amado tanto.”

Trecho do livro “A despedida de Jesus - Meditações em tem-


pos de confinamento”, de Francisco Faus, pp. 9 e 10.

R
“Desejais tanto, ó meu Jesus, dar
a vida por nós, vossas miseráveis cria-
turas? Ah, esse vosso desejo inflama
os nossos corações a desejar padecer
e morrer por vosso amor, já que por
nosso amor quisestes sofrer tanto e
morrer. Ó amado Redentor, fazei-nos
compreender o que quereis de nós,
que só desejamos comprazer-vos em
tudo. Suspiramos por comprazer-vos,
13
para ao menos em parte corresponder
ao grande amor que nos tendes. Au-
mentai sempre em nós esta bela cha-
ma, que nos faça esquecer o mundo e
nós mesmos, para que doravante não
pensemos senão em contentar o vos-
so amoroso coração. Põe-se à mesa o
Cordeiro Pascal, figura de nosso Sal-
vador. Assim como o cordeiro era
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comido todo naquela ceia, assim tam-


bém no dia seguinte o mundo iria ver
sobre o altar da cruz, devorado pelas
dores, o Cordeiro Jesus Cristo.”

Trecho do livro “A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo”, de


Santo Afonso Maria de Ligório, pp. 142 e 143.

14
Q3R
Jesus lava os pés de
seus discípulos
“Acabada a ceia, sabendo Jesus
que o Pai lhe pusera nas mãos todas
as coisas, que veio de Deus e volta
para Deus, levantando-se da mesa
15
começou a lavar os pés aos discípu-
los (Jo 13, 2). Esta cena tocante, de
que São João descreve todos os por-
menores com a precisão que lhe é
própria, devia surpreender os após-
tolos. E com razão! O Filho de Deus
ajoelhado aos pés de suas criaturas!
O Mestre prostrando-se aos pés dos
discípulos. O Justo, o Santo, aos pés
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dos pecadores!

Trecho do livro “Reflexões Evangélicas - Para uma leitura me-


ditada do Evangelho” de Alexandrino Monteiro, pág. 417.

16
Ao contemplar Jesus que se ajoe-
lha aos pés de cada apóstolo, pres-
tando-lhes um serviço que estava
reservado aos criados ou escravos
de menor categoria, é natural que
sintamos espanto e até repulsa. Sai
da nossa alma como que um grito:
“Como é possível? Aqui está o Filho
de Deus, o Verbo divino, a segunda
Pessoa da Santíssima Trindade, que
se encarnou no seio puríssimo de
Maria, humilhado como o último
dos servos”.
Pense que Jesus não fez esse ges-
to de maneira inconsciente, como
que movido por uma súbita emoção,
17
tocado por uma faísca sentimental
de carinho na hora da despedida dos
seus amigos. Bem claro deixa dito
São João que ele estava com a plena
consciência de quem era: sabendo que
o Pai tudo colocara em suas mãos e que
ele viera de Deus e a Deus voltava. Ele
próprio, depois, como veremos, vai
comentar a intenção totalmente lú-
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cida com que o fez.


É natural que os apóstolos tenham
ficado pasmados ao ver o seu Senhor
abaixando-se daquele modo. É pos-
sível que alguns deles se lembrassem
então das repetidas vezes em que dis-
cutiram entre si sobre qual deles se-
18
ria o maior no Reino de Cristo (cf.
Mt 20,20 ss.; Mc 9, 35; Lc 22,14-
27); e recordariam a repreensão que
Jesus sempre lhes fez, insistindo com
estas ou semelhantes palavras: Sabeis
que os que governam as nações as domi-
nam e os grandes as tiranizam. Entre vós
não deverá ser assim; aquele que quiser ser
o primeiro entre vós, seja o vosso servo. Pois
o Filho do Homem [Cristo] não veio para
ser servido, mas para servir e dar a vida
em resgate por muitos (Mt 20, 25-28).
Jesus não quer ser grande, só
quer amar e salvar. E nós? Jesus,
que é manso e humilde de coração (Mt
11,29), deseja que nós sigamos os
19
seus passos. Aprendei de mim, que sou
manso e humilde de coração, e encontra-
reis repouso para as vossas almas (ibid.).
Meu Deus! Nós, movidos pelo
egoísmo e pelo orgulho, vamos ins-
tintivamente pelo caminho contrário.
Jesus nos diz: Segue-me! E nós viramos-
-lhe as costas, brigando para ver se so-
mos mais do que os outros, querendo
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ganhar precedência sobre os demais,


esperando que eles nos sirvam e nós
não tenhamos que servi-los.

Trecho do livro “A despedida de Jesus - Meditações em tem-


pos de confinamento”, de Francisco Faus, páginas 14 e 15.

20
Q4R
Instituição da Eucaristia

“Durante a refeição, Jesus tomou o


pão, benzeu-o, partiu-o e o deu aos dis-
cípulos, dizendo: Tomai e comei, isto é o
meu corpo” (Mt 26,26). Depois do la-
va-pés, ato de tão grande humildade
21
cuja prática Jesus recomendou aos
discípulos, retomou as suas vestes e
sentando-se novamente à mesa quis
então dar aos homens a última prova
da ternura que nutria por eles, com a
instituição do Santíssimo Sacramen-
to do altar. Para tal fim, tomou um
pão, consagrou-o e, distribuindo-o
a seus discípulos, disse-lhes: “Tomai
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e comei, isto é o meu corpo”. Recomen-


dou-lhes, em seguida: “fazei isto em
memória de mim” (Lc 22,19). O mes-
mo recomendou São Paulo: “Assim,
todas as vezes que comeis desse pão e be-
beis desse cálice lembrais a morte do Se-
nhor” (1Cor 11,26).
22
Jesus procedeu então como um
príncipe que amasse muito sua esposa
e estivesse para morrer: escolhe en-
tre suas joias a mais bela, e chaman-
do a esposa, diz-lhe: “Vou em breve
morrer, minha esposa; para que não
te esqueças de mim, deixo-te esta
joia em recordação: quando a olha-
res, recorda-te de mim e do amor
que te dediquei”. São Pedro de Al-
cântara escreve em suas meditações:
“Nenhuma língua é suficiente para
declarar a grandeza do amor que Je-
sus consagra a cada alma e por isso,
querendo este esposo partir deste
mundo, para que sua ausência não
23
a fizesse esquecer-se dele, deixou-
-lhe em recordação este Santíssimo
Sacramento, no qual Ele permane-
ce em pessoa, para que não houvesse
outro penhor para lhe avivar a me-
mória do que Ele mesmo”. Apren-
damos daqui quanto agrada a Jesus
a recordação de sua missão: instituiu
propositalmente o sacramento do
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altar, para que nos recordemos con-


tinuamente do amor imenso que nos
demonstrou na sua morte.
Ó meu Jesus, ó Deus enamora-
do das almas, até onde vos arrastou
o amor que tendes aos homens? Até
vos fazerdes seu alimento! Dizei-me
24
o que mais podeis fazer para obrigá-
-los a vos amar? Vós vos dais todo a
nós na santa comunhão, sem nada vos
reservar; é, pois, justo que nos demos
também a vós sem reserva. Procurem
os outros o que quiserem: riquezas,
honras e o mundo; eu quero ser todo
vosso, não quero amar coisa alguma
além de vós, meu Deus.Vós dissestes
que quem se alimentar de vós, viverá
só por vós: “Aquele que comer a mi-
nha carne viverá por mim” (Jo 6,57).
Visto que tantas vezes me admitistes
à vossa mesa, fazei-me morrer a mim
mesmo, para que eu viva só para vós,
só para vos servir e dar-vos prazer.
25
Ó meu Jesus, eu quero colocar em
vós todos os meus afetos, ajudai-me
e ser-vos fiel.

Trecho do livro “A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo”, de


Santo Afonso Maria de Ligório, pp. 144 e 145.

R
Os apóstolos emudeceram. Seus
olhos se abriam de assombro e de
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emoção, quando Jesus pessoalmen-


te lhes deu a Eucaristia. Perceberam
toda a riqueza daquele milagre inefá-
vel? Provavelmente, não. Só depois,
com a ajuda do Espírito Santo, de-
ram-se conta de que Cristo fundiu,
no mistério eucarístico, a doação de
26
seu corpo e sangue como alimento,
e o sacrifício expiatório da Cruz:
corpo entregue, sangue derramado.
Se nós abríssemos os olhos da alma,
despertando do torpor da tibieza, se
soubéssemos enxergar aí “a maior
doação de Deus aos homens”, como
dizia São Josemaria, cairíamos de
joelhos agora mesmo, em adoração
e ação de graças. Perante essa ma-
ravilha indescritível, que Jesus quis
perpetuar na Missa, na Comunhão
e no Sacrário, não precisamos de
fazer nenhum esforço para enten-
der, como uma evidência, o que São
João escreveu na sua primeira Car-
27
ta: Aquele que não ama não conhece
a Deus, porque Deus é Amor. Nisto
consiste o amor: não fomos nós que
amamos a Deus, mas foi ele quem
nos amou primeiro e enviou o seu
Filho como vítima de expiação pelos
nossos pecados (1Jo 4, 8-10).
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Trecho do livro “A despedida de Jesus - Meditações em tem-


pos de confinamento”, de Francisco Faus, pág. 11.

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Q5R
O Salvador reza no
Horto das Oliveiras
“Depois do canto dos Salmos,
dirigiram-se eles para o monte das
Oliveiras (...). Retirou-se Jesus com
eles para um lugar chamado Get-
29
sêmani’’ (Mt 26,30.36). Tendo feito
a ação de graças depois da ceia, Jesus
deixou o cenáculo com seus discípu-
los, entrou no horto de Getsêmani
e se pôs a orar; mal, porém, come-
çou a orar, assaltaram-no ao mesmo
tempo um grande temor, um grande
tédio e uma grande tristeza, diz São
Marcos (Mc 14,33). E São Mateus
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acrescenta: “Começou a entristecer-


-se e ficar angustiado” (Mt 26,37).

Trecho do livro “A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo”, de


Santo Afonso Maria de Ligório, pp. 145 e 146.

30
Em meio aos seus pensamentos
tão angustiantes, o Salvador nos deu
um grande exemplo: recorrer à ora-
ção antes de qualquer outro meio
humano em tribulações semelhantes.
Quando a sua santíssima humanida-
de hesitou – pois também tinha a fra-
queza da nossa natureza – em beber
deste cálice tão amargo, e quando viu
que essa tempestade se levantava con-
tra Ele por causa do ódio e da inveja
dos escribas e dos fariseus, e por cau-
sa da soberba e da ambição dos prín-
cipes dos sacerdotes, não quis ir ter
com os homens antes de se apresen-
tar em oração diante de Deus, pois
31
sabia que, sem a sua permissão, nem
mesmo uma folha de árvore se move,
e que a sua vontade governa todas as
coisas para os fins altíssimos e secre-
tos de sua eterna providência. E, para
cumprir o seu próprio ensinamen-
to – que a oração deve ser feita em
segredo e com a porta fechada (Mt
6,6) –, deixou também os três discí-
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pulos que tinha levado consigo (Mt


26,39) e se afastou um pouco deles,
à distância de um tiro de pedra, com
o coração apertado por deixá-los,
e, para expressar esse sentimento, o
Evangelho usou a palavra Et ipse avul-
sus est ab eis (Lc 22,41), ou seja, afas-
32
tou-se deles, como quem se separa
da alma ao deixar amigos tão fiéis em
tempos de tanta tribulação. Mas, ain-
da assim, Ele afastou-se, mostrando
a firmeza e a constância que se deve
ter ao executar o que se julga melhor
e mais importante para o serviço di-
vino. Ele afastou-se para dar exem-
plo aos discípulos e para que pudesse
rezar com mais tranquilidade e der-
ramar o seu coração aflito com mais
liberdade na presença de Deus.
O Senhor disse: “Pai, Pai, e literal-
mente meu Pai, pois sou teu Filho natu-
ral: Se é possível (Mt 26,39) – ou, como
disse outro evangelista: Se tu queres (Lc
33
22,42), isto é, se for da tua vontade,
e, se tu quiseres, é possível –, suplico-
-te que Eu não beba deste cálice”. Era
como se dissesse: “Eu não quero nada
que Tu não queiras; o que Tu não que-
res, mesmo que seja algo fácil, é para
Mim quase impossível; e, portanto, Se-
nhor, o que te peço é com a condição
de que Tu o queiras; e, se Tu quiseres,
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podes fazê-lo: que Eu não beba esse cá-


lice tão amargo”. Ensina-nos assim que
a dificuldade, a repugnância aos traba-
lhos, a tristeza e a agonia diante deles,
e o desejar, segundo a carne, evitá-los e
fugir deles, em nada diminui a perfei-
ção da virtude quando a nossa vontade
34
está perfeitamente sujeita e conforma-
da à vontade de Deus. E assim, depois
de demonstrar ao Pai a sua tristeza e a
repugnância natural de sua santa huma-
nidade, e embora a tenha expressado
com tanta cortesia e resignação, dizen-
do se fosse possível, e se o Pai quisesse as-
sim, esforçou-se por submeter-se mais
expressamente à vontade de Deus, e,
voltando a si, disse: Verumtamen, non
sicut ego volo, sed sicut tu – Contudo, não
seja como Eu quero, mas como Tu queres (Mt
26,39; Mc 14,36, Lc 22,42).

Trecho do livro “História da Sagrada Paixão”, de Luis de la Palma,


pág. 97.

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Q6R
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Jesus é preso

“Levantai-vos, vamos: eis que


já está perto quem me há de trair”
(Mc 14,42). Sabendo o Reden-
tor que Judas juntamente com os
judeus e soldados que o vinham
36
prender já estavam perto, levan-
tou-se ainda banhado no suor da
morte, e com o rosto pálido mas
com o coração tão inflamado em
amor, foi ao seu encontro para en-
tregar-se em suas mãos, e, vendo-
-os reunidos, perguntou-lhes: “A
quem buscais?”. Imagina, minha
alma, que Jesus te pergunta do
mesmo modo: “Dize-me, a quem
buscas?”. Ah, meu Senhor, a quem
eu procuro senão a vós, que viestes
do céu à terra em busca de mim,
para que me não perdesse?
“Prenderam Jesus e o ataram”
(Jo 18,12). Ó céus, o próprio Deus
37
amarrado! Que diríamos se vísse-
mos um rei preso e acorrentado por
seus criados? (...)
Contempla, minha alma, como
uns lhe põe as mãos, outros o ligam,
estes o injuriam, aqueles o batem, e
o Cordeiro inocente se deixa atar
e esbofetear à vontade deles. Não
procura fugir de suas mãos, não
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pede auxílio, não se queixa de tan-


tas injúrias, não pergunta por que
o maltratam assim. Eis realizada a
profecia de Isaías: “Foi maltratado e
resignou-se; não abriu a boca, como
um cordeiro que se conduz ao ma-
tadouro” (Is 53,7). Não fala e não
38
se lamenta, porque Ele mesmo já se
oferecera à justiça para satisfazer e
morrer por nós e assim deixou-se
conduzir à morte como uma ove-
lha, sem abrir a boca.
Olha como, preso e circundado
por aquele populacho, é arrastado
do horto e conduzido às pressas aos
pontífices na cidade. E onde estão
seus discípulos? Que fazem? Se,
não podendo livrá-lo das mãos de
seus inimigos, ao menos o acom-
panhassem para defender sua ino-
cência diante dos juízes, ou então
para consolá-lo com sua presença!
Mas não. O evangelho diz: “Então
39
seus discípulos, abandonando-o,
fugiram todos” (Mc 14,50). Que
dor não sentiu então Jesus, vendo-
-se abandonado e deixado até por
aqueles que lhe eram caros! Jesus
viu então todas as almas que, mais
favorecidas por Ele, deveriam de-
pois abandoná-lo e voltar-lhe in-
gratamente as costas. Ah, meu
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Senhor, minha alma foi uma dessas


infelizes que, depois de tantas gra-
ças, luzes e convites recebidos de
vós, esqueceram-se ingratamen-
te de vós e vos abandonaram. Re-
cebei-me, por piedade, agora que
arrependido e contrito a vós me
40
volto para não vos deixar mais, ó
tesouro, ó vida, ó amor de minha
alma.

Trecho do livro “A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo”, de


Santo Afonso Maria de Ligório, pág. 148.

41
Q7R
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Jesus é condenado à morte

Arrastado perante Pilatos e Hero-


des, escarnecido, espancado e cuspi-
do, seu dorso rasgado de açoites, sua
cabeça coroada de espinhos, Jesus,
aquele que no último dia irá julgar
42
o mundo, é ele próprio condenado
por juízes iníquos a uma morte de
degradação e tortura.
Jesus é condenado à morte. Sua
sentença de morte é assinada. E quem
a assinou, senão eu mesmo, quan-
do cometi meus primeiros pecados
mortais? Meus primeiros pecados
mortais, quando decaí do estado de
graça em que Tu me colocaste pelo
batismo; foram eles a Tua sentença de
morte, Ó Senhor. O Inocente sofreu
pelo culpado. Aqueles meus pecados
foram as vozes que gritaram: “Cruci-
fica-o”. Na vontade e no prazer verda-
deiro com que eu os cometi, estava o
43
consentimento que Pilatos deu à mul-
tidão clamorosa. A dureza de coração
que se seguiu a eles, meu desgosto,
meu desespero, minha orgulhosa im-
paciência, minha determinação obsti-
nada para continuar a pecar, o amor
ao pecado que se apossou de mim; o
que eram esses sentimentos impetuo-
sos e contraditórios, senão os golpes
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e blasfêmias com os quais os violen-


tos soldados e a gentalha receberam
a Ti, cumprindo assim a sentença de-
terminada por Pilatos?

Trecho do livro “Via Sacra - meditações sobre as estações da


Cruz”, de John Henry Newman, pp. 11 e 12.

44
R
O amantíssimo Redentor tudo
sofre com a mais heroica resignação
e paciência. Mas quem é este ho-
mem, tão vilipendiado e tão coberto
de opróbrios? Admirai-vos, ó céus!
Este homem é o Filho de Deus, é o
próprio Senhor do Paraíso. Que ex-
traordinário contraste! No Paraíso,
o Filho de Deus está assentado em
um trono de glória; aqui, em um
trono de ignomínia. No Paraíso, co-
roado de esplendor; aqui, de agudos
espinhos. No Paraíso, cortejado pe-
los Anjos que o adoram; aqui, cer-
45
cado pelos inimigos que o insultam.
No Paraíso, infinitamente feliz; aqui,
submerso em um mar de tormen-
tos. O que levou um Deus a descer
de tanta glória a tanta ignomínia? Foi
o seu Amor! Nós estávamos caídos
no precipício de todos os males, na
abjeção e nos remorsos dos nossos
pecados. E Jesus, para nos levantar
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e para nos tornar eternamente feli-


zes, esconde os esplendores da sua
glória e desce, desce até à figura de
escravo, desce até à aparência de pe-
cador, e sujeita-se às mais profundas
humilhações, aos mais cruciantes
tormentos! Ó meu adorado Jesus!
46
Como que esquecido da vossa Ma-
jestade, descestes até ao fundo dos
desprezos e das humilhações, para
me buscardes a mim, que jazia no
abismo de todas as misérias, e para
me levantardes até ao trono da vos-
sa glória. Mas sois sempre grande, ó
meu Deus! À vossa grandeza reve-
la-se, por igual, nas humilhações e
na glória, nas fraquezas e no poder.
Humilhações que glorificam, fra-
quezas que redimem, só podem ser
de um Deus!

Trecho do livro “Alma aos pés de Jesus”, de D. Tiago Sinibaldi,


pp. 119 e 120.

47
Q8R
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Jesus leva a cruz


ao Calvário
Publicada a sentença contra nosso
Salvador, apoderaram-se imediata-
mente dele com fúria. (...) Que bar-
baridade impor nos ombros do réu
48
o patíbulo sobre o qual deve morrer.
Mas assim devia ser, ó meu Jesus,
pois vós tomastes sobre vós todos os
meus pecados.
Jesus não recusou a cruz, abra-
çou-a até com amor, sendo ela o al-
tar destinado para a consumação do
sacrifício de sua vida pela salvação
dos homens. “Ele próprio carregava
a sua cruz para fora da cidade, em
direção ao lugar chamado Calvário”
(Jo 19,17). Os condenados saíram
da casa de Pilatos, entre eles tam-
bém nosso divino Salvador. Ó espe-
táculo que causou admiração ao céu
e à terra: ver o Filho de Deus seguir
49
para morrer por esses mesmos ho-
mens que a ela o condenaram. Eis
realizada a profecia: “E eu sou como
um cordeiro que é levado para ser
sacrificado” (Lm 11,19). Jesus apre-
sentava um aspecto tão lastimoso
que as mulheres judias, ao vê-lo,
não puderam deixar de chorar: “Ba-
tiam no peito e o lamentavam” (Lc
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23,27). Meu caro Redentor, pelos


merecimentos dessa viagem dolo-
rosa, dai-me a força de levar com
paciência a minha cruz. Eu aceito
todas as dores e desprezos que me
destinais a sofrer; vós os tornastes
amáveis e doces, abraçando-os por
50
nosso amor. Dai-me força de supor-
tá-los com paciência.
Contempla, minha alma, o que
se passa com teu Salvador; vê como
de suas chagas ainda frescas escor-
re o sangue, como está coroado de
espinhos e carregado com a cruz.
A cada movimento renovam- -se as
dores de todas as suas chagas. A cruz
começa a atormentá-lo já antes do
tempo, pisando seus ombros chaga-
dos e martelando os espinhos da co-
roa. Ó Deus, quantas dores a cada
passo. Consideremos também os
sentimentos de amor com que Jesus
vai subindo o Calvário, onde o es-
51
pera a morte. Ó meu Jesus, vós ides
morrer por nós. Eu vos voltei as cos-
tas no passado e quereria morrer de
dor: mas no futuro não sou capaz de
abandonar-vos mais, meu Redentor,
meu Deus, meu amor, meu tudo.
Ó Maria, minha Mãe, alcançai-me
a graça de levar a minha cruz com
toda a paz.
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Trecho do livro “A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo”, de


Santo Afonso Maria de Ligório, pp. 301 e 302.

52
Q9R
Jesus encontra sua mãe
Ele curvou-se, mas em determi-
nado local, ao olhar para cima, Ele
vê sua Mãe. Por um instante apenas,
eles se entreolham. Ele segue adian-
te. Se fosse possível, Maria escolheria
53
ter passado ela mesma por todo o so-
frimento Dele, do que ignorar quais
eram por não Lhe estar próxima. Ele
também ganhou um alívio, como que
vindo de um sopro de ar, prazeroso e
tranquilizante, ao ver o triste sorriso
da Mãe em meio aos olhares e ruídos
que O rodeavam. Ela o conhecia belo
e glorioso, com o frescor da paz e da
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Divina Inocência em seu semblante.


Agora, ela o via tão diferente e de-
formado, que mal o reconheceria,
não fosse o olhar agudo, comovente
e tranquilizador que Dele recebeu.
Entretanto, agora Ele carregava o far-
do dos pecados do mundo e, embora
54
Santo, trazia a imagem destes em sua
própria face. Ele parecia um pária ou
um bandido sobre o qual pesava uma
grande culpa. Ele foi feito pecado por
nós, aquele que não conheceu pecado
; não um aspecto, não um membro,
mas a expressão mesma da culpa, de
uma maldição, da punição, da agonia.
Oh! Que encontro entre Mãe e Filho!
Havia um mútuo consolo, pois havia
uma mútua compaixão. Jesus e Ma-
ria. Conseguiriam, pela eternidade,
esquecer-se do momento da Paixão?

Trecho do livro “Via Sacra - meditações sobre as estações da


Cruz”, de John Henry Newman, pp. 23 e 24.

55
Q10R
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Jesus é pregado na cruz

Apenas chegou o Redentor ao


Calvário, triturado de dores e fati-
gado, arrancaram-lhe as vestes já
pegadas às suas carnes dilaceradas e
56
arremessaram-no sobre a cruz. Je-
sus estendeu seus sagrados braços e
ofereceu ao eterno Pai o sacrifício
de sua vida, rogando-lhe que o acei-
tasse pela salvação dos homens. Os
carrascos tomaram então com fúria
os cravos e os martelos e, atraves-
sando-lhe os pés e as mãos, prega-
ram-no na cruz. Ó mãos sagradas,
que só com o vosso contato curastes
tantos enfermos, por que vos prega-
ram nessa cruz? Ó pés santos, que
tanto vos cansastes para nos buscar
a nós, ovelhas desgarradas, por que
vos atravessaram com tanta cruelda-
de? (...) Ó meu doce Salvador, tanto
57
vos custou o desejo de ver-me salvo
e de conquistar o meu amor e eu, in-
grato, tantas vezes desprezei o vosso
amor por um nada; agora, porém, o
estimo acima de todos os bens.
Levantaram a cruz com o cruci-
ficado e fizeram-na cair com violên-
cia no buraco feito no rochedo. Esse
buraco foi em seguida entupido com
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pedras e madeira, e Jesus ficou pen-


dente na cruz, para aí consumar sua
vida. Estando Jesus já agonizando na-
quele leito de dores e achando-se tão
abandonado e triste, procurou quem
o consolasse, mas não encontrou.
Ao menos teriam compaixão de vós,
58
ó meu Senhor, os homens que vos
viam morrer? Pelo contrário; uns o
injuriavam, outros zombavam dele;
estes blasfemavam, aqueles o escar-
neciam, dizendo: “Se és o Filho de
Deus, desce da cruz! (...) Ele salvou
a outros e não pode salvar-se a si
mesmo!” (Mt 27,40.42). Ah, bárba-
ros, Ele já estava expirando, como é
que assim gritáveis?
Vê quanto padeceu naquele patí-
bulo o teu Redentor. Cada membro
sofria o seu tormento e um não podia
aliviar o outro. A cada momento Ele
experimentava penas mortais. Po-
de-se dizer que durante aquelas três
59
horas que Jesus agonizou na cruz, Ele
sofreu tantas mortes quantos foram
os momentos que aí passou. Não en-
controu na cruz o mínimo alívio ou
repouso. Se se apoiava nas mãos ou
nos pés, aumentava a dor, já que seu
corpo sacrossanto estava penden-
te por estas mesmas chagas. Corre,
minha alma, e chega-te enternecida
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a essa cruz, beija esse altar, sobre o


qual morre como vítima de amor por
ti o teu Senhor. Coloca-te debaixo
de seus pés e deixa que caia sobre ti
aquele sangue divino. Sim, meu caro
Jesus, que esse sangue me lave de to-
dos os meus pecados e me inflame
60
todo em amor para convosco, meu
Deus, que quisestes morrer por meu
amor. Ó Mãe das dores, que estais ao
pé da cruz, rogai a Jesus por mim.

Trecho do livro “A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo”, de


Santo Afonso Maria de Ligório, pp. 303 e 304.

61
Q11R
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Na cruz, o Senhor
pensou em nós

Devemos pensar detidamente e


com frequência no longo tempo em
que o nosso Redentor esteve na cruz,
e no seu grande sofrimento. (...)
62
Nesse momento, quando o lon-
go tormento começava a chegar ao
fim, e a escuridão, causando temor
e admiração, trouxe o silêncio, o
nosso Sumo Sacerdote fez um lon-
go memento: colocou diante de si
todos os homens e ofereceu o seu
sacrifício por nós ao Pai Eterno.
Estejamos certos de que, embora
nós não o tenhamos visto em sua
Paixão, Ele, com os seus olhos pe-
netrantes e com sua imensa sabe-
doria, viu-nos nela. O Senhor nos
viu, enquanto pendia na cruz, do
mesmo jeito que somos agora. Ali
Ele sofreu e compadeceu por nós,
63
tirou de Satanás a escritura que
nos condenava, cravou-a consigo
na cruz (Cl 2,14)186, apagou-a
com o seu sangue e nos alcançou
todos os bons pensamentos e san-
tas inspirações de Deus, e todo o
socorro da graça que recebemos
de sua mão.
Não devemos pensar que o Se-
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nhor rogou por nós coletivamente,


para que os nossos pecados fossem
perdoados e para que recebêssemos
os dons da graça; pois, na cruz, Ele
pensou em cada um de nós, indivi-
dualmente, amou cada um de nós, e
por cada um se ofereceu, como se
64
cada um de nós fosse único no mun-
do. Além disso, viu cada pecado que
cometemos e todas as suas circuns-
tâncias, assim como os vê no mo-
mento em que os praticamos, e eles
afligiram o seu sagrado Coração;
para pagar por eles, o Senhor rogou
ao Pai e ofereceu o seu sangue.
Oh, bem aventurada memória,
e bendito momento em que estive-
mos presentes no monte Calvário!
Não estávamos longe ou aos pés da
cruz, mas sim na própria cruz, no
peito do nosso Redentor, no qual
Ele nos abraçou com a sua imen-
sa caridade e nos ofereceu ao seu
65
Eterno Pai, como se fôssemos parte
Dele, para que Nele e por Ele fôs-
semos aceitos!

Trecho do livro “História da Sagrada Paixão”, de Luis de la


Palma, pp. 333 e 334.
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66
Q12R
Jesus morre na Cruz

“Jesus deu então um grande bra-


do e disse: Pai, nas tuas mãos entre-
go o meu espírito” (Lc 23,46). Foi
essa a última palavra que Jesus dis-
se na cruz. Vendo que sua alma esta-
67
va prestes a separar-se de seu corpo
dilacerado, disse todo resignado na
vontade divina e com confiança de
Filho: “Pai, nas tuas mãos entrego
o meu espírito”, como se dissesse:
“Meu Pai, eu não tenho vontade pró-
pria, não quero nem viver nem mor-
rer; se vos apraz que eu continue a
padecer nesta cruz, eis-me aqui, es-
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tou pronto; nas vossas mãos entrego


o meu espírito, fazei de mim o que
vos aprouver”. Oh! Se assim dissésse-
mos também, quando estamos sobre
a cruz, e nos deixássemos guiar em
tudo pelo beneplácito do Senhor! É
este, segundo São Francisco de Sales,
68
aquele abandono em Deus que cons-
titui toda a nossa perfeição. É isso o
que devemos fazer, principalmente
no momento da morte, mas, para
fazê-lo bem, então, é preciso fazê-lo
continuamente durante toda a vida.
Sim, meu Jesus, nas vossas mãos en-
trego a minha vida e a minha morte;
abandono-me inteiramente a vós e
desde já vos recomendo no fim de
minha vida a minha alma: acolhei-a
nas vossa santas chagas como vosso
Pai acolheu vosso espírito quando
morrestes na cruz.
Mas eis que Jesus expira. Vinde,
anjos do céu, vinde assistir à morte
69
de vosso Deus. E vós, ó Mãe das do-
res, Maria, chegai-vos mais à cruz,
levantai os olhos para vosso Filho e
olhai-o mais atentamente, pois está
prestes a expirar. Eis que o Reden-
tor já chama a morte e lhe dá licença
para se apoderar dele: “Vem, ó mor-
te”, diz-lhe, depressa, “faz o teu de-
ver, tira-me a vida e salva as minhas
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ovelhas”. A terra treme, abrem-se os


sepulcros, rasga-se o véu do templo.
Pela violência das dores faltam já as
forças ao Senhor, falta-lhe o calor
natural, falta-lhe a respiração, e Ele,
com o corpo largado abaixo, a cabe-
ça sobre o peito, abre a boca e expi-
70
ra. “E inclinado a cabeça, entregou
seu espírito” (Jo 19,30).
Sai, ó bela alma de meu Salva-
dor, sai e vem abrir-nos o Paraíso
até agora fechado para nós; vai apre-
sentar-te à majestade divina e im-
petrar-nos o perdão e a salvação. O
povo alvoroçado em volta de Jesus,
por causa do grande brado com que
havia proferido as últimas palavras,
contempla-o com atenção, em si-
lêncio, o vê expirar e, observando
que não faz mais movimento, excla-
ma: “Morreu, morreu!”. Assim ouve
Maria todos falarem e ela também
diz: “Morreu meu Filho!”. Morreu!
71
Ó Deus, quem morreu? O autor da
vida, o Unigênito de Deus, o Senhor
do mundo. Ó morte, que causastes
a admiração do céu e da natureza. O
próprio Deus, morrer por suas cria-
turas! Ó caridade infinita! O próprio
Deus, sacrificar-se todo, seus praze-
res, sua honra, seu sangue, sua vida,
por quem? Por criaturas ingratas, e
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morrer num mar de dores e de des-


prezos para pagar as nossas culpas.
Minha alma, levanta os olhos e
contempla esse homem crucificado.
Contempla esse cordeiro divino já
sacrificado nesse altar de dores, re-
flete que ele é o Filho bem-amado
72
do Pai Eterno e que Ele morreu pelo
amor que te consagrava. Vê como
tem os braços estendidos para aco-
lher-te, a cabeça inclinada para dar-
-te o beijo de paz, o peito aberto para
receber-te. Que dizes? Não merece
ser amado esse Deus tão bom e tão
amoroso? Ouve o que te diz o teu
Senhor de sua cruz: “Filho, vê se há
no mundo quem te haja amado mais
do que eu, teu Deus”. Ah, meu Deus
e meu Redentor, morrestes, pois, e
suportastes a mais infame e doloro-
sa das mortes. E por quê? Para con-
quistar o meu amor. Como, porém,
poderá o amor de uma criatura com-
73
pensar o amor de seu Criador mor-
to por ela? Ó meu adorado Jesus, ó
amor de minha alma, como poderei
amar outra coisa, depois de vos sa-
ber morto de dores nessa cruz, para
pagar pelos meus pecados e salvar-
-me? Como poderei ver-vos morto e
pendente desse lenho e não vos amar
com todas as minhas forças? Pode-
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rei pensar que minhas culpas vos re-


duziram a esse estado e não chorar
sempre com suma dor as ofensas co-
metidas contra vós?
Ó Deus, se o mais vil dos ho-
mens tivesse padecido por mim o
que sofreu Jesus Cristo, se eu visse
74
um homem dilacerado pelos açoi-
tes, pregado a uma cruz e feito o lu-
díbrio do povo para me salvar a vida,
poderia recordar-me disso sem me
enternecer? E se me apresentassem
seu retrato, morrendo na cruz, po-
deria eu olhá-lo com indiferença e
deixar de exclamar: Oh! Este infe-
liz morreu assim atormentado por
meu amor; se não me tivesse ama-
do, não teria padecido a morte. Oh!
Quantos cristãos possuem um belo
crucifixo no seu quarto, mas uni-
camente como um belo ornamen-
to: louvam a obra e a expressão da
dor, mas seu coração nada ou pouco
75
sente, como se não fosse a imagem
do Verbo encarnado, mas de um es-
tranho e desconhecido.
Ah, meu Jesus, não permitais
que eu seja um desses. Recordai-vos
que prometestes atrair a vós todos
os corações, quando fôsseis suspen-
so na cruz. Eis o meu coração, que,
enternecido com a vossa morte, não
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quer resistir mais aos vossos con-


vites; atraí-o, pois, todo inteiro ao
vosso amor. Vós morrestes por mim
e eu não quero viver senão para vós.
Ó dores de Jesus, ó ignomínias de
Jesus, ó morte de Jesus, ó amor de
Jesus, fixai-vos em meu coração e aí
76
permaneça sempre a vossa doce me-
mória, para ferir-me continuamente
e inflamar-me de amor.

Trecho do livro “A Paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo”, de


Santo Afonso Maria de Ligório., págs 171 e 172.

77
Q13R
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Jesus é descido da
Cruz e sepultado
A multidão voltou para as suas ca-
sas. O Calvário foi deixado solitário
e silencioso, exceto por São João e
pelas santas mulheres. Então vieram
78
José de Arimateia e Nicodemos, que
desceram da Cruz o corpo de Jesus
e o colocaram nos braços de Maria.
Ó Maria, enfim tens a posse de teu
Filho. Agora, que Seus inimigos nada
mais podem fazer, eles O deixam,
com desprezo, para ti. Enquanto Seus
inesperados amigos executam o difícil
trabalho, tu olhas com indizíveis pen-
samentos. Teu coração é trespassado
com a espada sobre a qual Simeão fa-
lou. Ó Mãe Dolorosa, mesmo em teu
sofrimento existe uma maior e muda
alegria. Enquanto Ele pendia na Cruz,
a alegria em vista te encorajava a es-
tar ao lado Dele. Alegria maior ago-
79
ra, sem desmaios, sem tremores, tu
O recebes em teus braços e em teu
colo. Estás agora extremamente feliz
por O ter, embora Ele venha a ti não
do modo como havia partido. Ele par-
tiu da tua casa, Ó Mãe de Deus, com
a força e a beleza de Sua humanida-
de, e volta agora desconjuntado, feito
em pedaços, mutilado, morto. Entre-
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tanto, Ó Bem-Aventurada Maria, tu


és mais feliz nesta hora de tormento
do que no dia das bodas de casamen-
to, pois naquele momento Ele estava
partindo e agora, em breve, como o
Salvador Ressuscitado, ele não mais
será separado de ti.
80
Mas por apenas três dias. Por um
dia e meio, então, Maria teve que dei-
xá-Lo. Ele ainda não havia ressuscitado.
Seus amigos e servos o tiraram de ti e
O colocaram em um honrado sepul-
cro. Fecharam-no cuidadosamente até
que chegasse a hora de sua ressurreição.
Deita e dorme em paz por um tempo
na calma sepultura, querido Senhor, e
então acorda para um reinado eterno.
Nós, como as mulheres fiéis,Te vigiare-
mos, pois todos os nossos tesouros, toda
a nossa vida, estão encerrados em Ti.

Trecho do livro “Via Sacra - meditações sobre as estações da


Cruz”, de John Henry Newman, págs 63-37.

81
Bibliografia

Alma aos pés de Jesus - orações e meditações


Tiago Sinibaldi| 14 x 21 cm | 523 pp.

Este clássico devocionário reúne orações, exercícios


de devoção e meditações para ajudar a crescer em
vida interior e viver a fé com uma profunda piedade.

A despedida de Jesus: meditações


em tempos de confinamento
Francisco Faus | 14 x 21 cm | 156 pp.

Neste livro, Francisco Faus traz 28 meditações com a


finalidade de ajudar a viver com paz, na companhia
de Cristo, os sacrifícios e limitações que tempos de
confinamento, como os vividos durante a pandemia
do coronavírus, impõem. A ideia é meditar, quase
que parágrafo por parágrafo, esses quatro capítulos
História da Sagrada Paixão
Luis de la Palma | 14 x 21 cm | 440 pp.

Esta edição, que é a primeira tradução para o por-


tuguês da obra completa de Luis de la Palma, con-
siste em uma meditação sobre a Paixão de Cristo.
Meditar a Paixão traz benefícios para as pessoas em
todos os estados. Ela esconde, portanto, um grande
tesouro, e foi por esse motivo que o autor escolheu
este tema.

A paixão de Nosso Senhor Jesus Cristo


Santo Afonso Maria de Ligório | 14 x 21 cm | 346 pp.

“O amor de Cristo nos constrange”, diz São Paulo.


Como observa Santo Afonso, não há exercício mais
próprio para se alcançar o perfeito amor do que
meditar frequentemente na Paixão de Cristo. Com
as diversas meditações reunidas neste livro, autor
nos põe diante de Cristo sofredor, e nos faz acom-
panhar, com a sua análise pungente, cada uma das
suas dores, a crueldade de cada momento.

83
Reflexões evangélicas
Alexandrino Monteiro| 14 x 21 cm | 578 pp.

Esta obra percorre várias passagens do Evange-


lho, acompanhadas por breves reflexões que pro-
curam tirar todo o néctar de verdades, consequên-
cias, conclusões e afetos que nelas se encerram. É
apenas um subsídio a mais para a leitura refletida
do Evangelho, e pode servir também como manual
de meditação para todos os dias do ano.
E-BOOK GRATUITO DA CULTOR DE LIVROS.

Via Sacra: meditações sobre as estações da Cruz


John Henry Newman | 14 x 21 cm | 72 pp.

Esta obra é fruto da intensa vida de oração do Autor.


Sua profundidade mística e precisão teológica con-
duzem-nos pelo caminho da Cruz, acompanhando
o Senhor a cada passo, fazendo radicar no coração
o firme desejo de conversão e identificação total
com Cristo.

84
E-BOOK GRATUITO

www.cultordelivros.com.br

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