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Rosimeri Jorge da Silva1

Jilvania Lima dos Santos Bazzo2


Patrícia de Simas Pinheiro3

Grupo de Trabalho: GT 3 - Políticas públicas e gestão da educação em perspectivas


interculturais/inclusivas

Palavras-chave: Formação de professores, Didática, Gestão da educação, Políticas


públicas, Interculturalidade.

1 Introdução

No esforço de investigar a dimensão política pedagógica da formação dos


professores nas políticas públicas, buscamos com Freire (1979) fundamentar nossas
escolhas, a partir da visão da metodologia crítica. A proposta apresentada nos levou à
seguinte questão: como os professores vão se constituindo no percurso profissional e
pessoal do fazer docente?
Para Carspecken (2011), a metodologia crítica nos possibilita compreender que
os documentos estudados e analisados são fruto do movimento real que se dá no
contexto real. Ao estabelecermos a relação entre o texto escrito e o discurso surgem as
possibilidades de levantarmos os níveis de consciência crítica presentes nos
documentos que superam a mera descrição de um fato ou uma realidade social.
Neste trabalho, escolhemos pesquisar o impacto da formação docente
constituída a partir da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) nº 9.394/96, publicada em 20 de
dezembro de 1996, e a Resolução CNE/CP n.º 1, de 15 de maio de 2006, e a nº 02, de

1
Doutoranda em Educação do PPGE/UFSC. Presidenta da Associação de Supervisores Escolares de
Santa Catarina (ASESC). Supervisora Escolar e membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Didática e
suas Multidimensões - GEPDiM. Contato: rosejorgesilva@gmail.com.
2
Pós-Doutora em Educação pela Universidade do Minho e Doutora em Educação pela UFBA. É professora
da Universidade Federal de Santa Catarina e líder do Grupo de Estudos e Pesquisa em Didática e suas
Multidimensões - GEPDiM. Contato: jilvania.bazzo@ufsc.br.
3
Mestre em Educação pela Udesc. Supervisora Escolar, atuando na Diretoria de Ensino da Secretaria de
Estado da Educação e membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Didática e suas Multidimensões -
GEPDiM. Contato: patriciasp_40@hotmail.com.

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20 de dezembro de 2019. O objetivo é contribuir para o debate do processo de formação
docente, buscando compreender a trajetória intercultural pela qual o professor percorre
para constituir-se como docente, na expectativa de aprofundar algumas questões em
torno da formação dos(das) professores(as).
Para tanto, traremos um breve itinerário da formação docente, com a abertura
democrática no Brasil, refletindo como nos constituímos professores inseridos em
contextos de diversidade cultural, a fim de compreender a formação de professores
vinculada com a sua práxis de ensinar e aprender com ênfase na ação-reflexão-ação e
no fortalecimento dos sujeitos e suas vozes plurais sob a perspectiva da
interculturalidade, educação inclusiva, inclusão.

2 Caminhos e descaminhos da formação docente

As políticas públicas estão fortemente comprometidas em produzir pela escola


um sujeito conectado com o mercado e a lógica do capital, explicitada por Candau
(2002) como instituição escolar que afirma valores universais assentados na cultura
ocidental e europeia. A exemplo da elaboração da Base Nacional Comum Curricular
(BNCC) que prioriza o desenvolvimento para o trabalho, desconsidera os contextos
sociais interculturais e de vida dos estudantes, retira do professor sua autonomia e
criatividade, estimula as competições, fazendo uma escola pobre para o povo pobre.
Mesmo com as investidas do Banco Mundial, as obras de Freire nos ajudam a
entender que a formação docente está no campo de disputa neoliberal e o professor
precisa reconhecê-la para construir um outro caminho, por via da solidariedade social e
política. Para Evangelista e Triches (2012, p. 279), “se queremos conhecer o mundo que
se oferece ao jovem futuro professor ou ao jovem professor - ou a qualquer outro
professor, precisamos desbravar os meandros do pensamento dominante”.
As resistências vigilantes que acontecem no Brasil sobre as políticas públicas
neoliberais e seus impactos na sociedade, na escola pública e na formação dos
professores e professoras, são forças progressistas no interior dos movimentos
educacionais. Segundo Candau (2002, p. 135), essas resistências criam possibilidades
para introduzir uma "abordagem da educação intercultural, que parte de um conceito

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dinâmico e histórico da(s) cultura(s), como processo em contínua construção,
desconstrução e reconstrução". Para a autora, "a cultura não é, está sendo a cada
momento", a formação dos professores e professoras deve estar pautada em projetos
formativos que confrontem as perspectivas diferencialistas aquelas favorecedoras de
processos radicais de afirmação de identidades culturais específicas.

3 Resultados e Discussão

Nos últimos 36 anos, o texto inicial da LDB/96, que trazia a formação em nível
superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos
superiores, e admitida como formação mínima a formação em nível médio para as
quatro primeiras séries do ensino fundamental e educação infantil, foi modificado em
2013 somente para acrescentar os cinco primeiros anos do ensino fundamental e em
2017 através da Lei nº 13.415, que altera o Art. 62, fica com a seguinte redação:

A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em


nível superior, em curso de licenciatura plena, admitida, como
formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e
nos cinco primeiros anos do ensino fundamental, a oferecida em nível
médio, na modalidade normal. (BRASIL, 2023)

Observamos que a última redação dada a este artigo retira as universidades e


institutos superiores como local de formação dos professores, deixando em aberto um
campo fértil para se instalar no Brasil as mais diversas instituições formadoras. Isso se
dá em função do projeto capitalista para a educação, com as exigências impostas para
o Brasil, principalmente pelas políticas neoliberais, com seu discurso ideológico
dominante, como estratégia do capital para recuperar e manter seu potencial de
acumulação. Neste cenário, as políticas educacionais esperam das escolas, que estas
garantam a sociabilidade dos educandos, a qualificação de mão de obra como força de
trabalho e também manter sob controle aqueles que não estão inseridos no processo
produtivo. (ROSSI, 2013).
É certo que nos últimos 36 anos os profissionais da educação estão construindo
resistências no campo da educação, disputando espaço com o poder dominante. Ao
analisar as Resoluções CNE/CP Nº1/2006 e Nº 2/2019, verificamos que havia a

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possibilidade de um itinerário curricular para a diversidade e inclusão. Mas, em 2019,
ao se estabelecer a Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da
Educação Básica e se vincular o currículo dos cursos a BNCC, torna-se pouco provável
que se cumpra os requisitos basilares para o atendimento à formação inclusiva, com
capacidade de pensamento crítico e de reconhecimento da diversidade humana.

4 Considerações Finais

Ao evidenciarmos as tendências transnacionais que se manifestam via


legislação no contexto da educação brasileira, ressaltamos que as políticas de formação
de professores em curso desencadeiam o processo de mercantilização da formação dos
professores, o que os responsabiliza pelo seu próprio processo de formação,
descaracterizando e desobrigando os sistemas de ensino em garantir no espaço de
trabalho a formação continuada e em serviço, além de todos os direitos referentes ao
espaço do trabalho e do trabalhador e suas práticas educativas.
As práticas educativas são inerentes às práticas sociais e interculturais e os
professores estão inseridos e são praticantes curriculares, constituindo-se
trabalhadores da educação, docentes, num processo de humanização que os possibilite
se apropriar dos conhecimentos científicos, artísticos, filosóficos e demais saberes
inerentes ao seu fazer pedagógico. Do campo da Didática, o professor pode mobilizar
os conhecimentos adquiridos nas áreas específicas com vistas a construir um projeto
de escola emancipador e democrático, acolher as identidades culturais, valorizar as
diversas culturas com os fundamentos das abordagens interculturais, educação
inclusiva, inclusão, o que o ajudará a romper com educação de resultados positivista e
excludente, como a que se definiu na BNCC.

Referências

BRASIL. Lei nº 13.415, de 16 de fevereiro de 2017. Altera a Lei nº 9.394, de 20 de


dezembro de 1996. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2017/lei-
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BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases
da educação nacional. Diário Oficial da União - Seção 1 - 23/12/1996, Página 27833.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm. Acesso: 20 jun
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https://normativasconselhos.mec.gov.br/normativa/view/CNE_rcp0106.pdf?query=LICE
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BRASIL. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Resolução


CNE/CP nº 2, de 20 de dezembro de 2019. DOU de 10-2-2020, Seção 1, páginas 87-
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