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FALSUM COMMITTIT, QUI VERUM TACET

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escrevinhação n.º 739


NOTAS ESPARSAS SOBRE O RECOLHIMENTO INTERIOR
Redigido em 02 de janeiro de 2009, dia de São Basílio e de
São Gregório Nazianzeno.

Por Dartagnan da Silva Zanela

"Quando o amor de Deus obtém a vontade da


alma produz nela um insaciável desejo de
trabalhar pelo Amado".
(São João Crisóstomo)

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Virou um grande chavão, um lugar comum, a

afirmação de que devemos sempre estar bem informados para

podermos nos tornar pessoas mais críticas e conscientes do

estado em que o mundo se encontra para assim podermos agir

de uma maneira mais ativa e cidadã, não é mesmo? Putz, mas

em que medida esse dito que é repetido a exaustão é

verdadeiro? Melhor: em que se fundamenta a legitimidade

desta afirmação que está na boca e na mente de meio-mundo?

Mais do que em outras épocas de minha mísera

existência, tenho atualmente refletido muito, mais do que

em outros dias, sobre este assunto que julgo ser de capital

importância para uma pessoa que almeja obter uma

compreensão minimamente mais elevada de si.

Dito isso, vamos ponderar um pouco sobre a

seguinte situação que, em regra, é muitíssimo similar a

nossa imagem diuturna frente ao mundo. Lá estamos nós,

diante de um telejornal, ou de um programa televisivo


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qualquer, ou de um web site informativo, revista ou jornal,

acompanhando as notícias sobre os acontecimentos mais

variados.

Estamos ali nos informando sobre os conflitos

no Oriente Médio, sobre a crise econômica e seus possíveis

efeitos, sobre a vida degradada de uma e outra celebridade

que está tendo sua vida degenerada pelo uso intenso de

psicotrópicos, enfim, lá estamos nós conectados com o que

está acontecendo no mundo no último segundo do giro

terrestre.

Tudo bem, mas aí caberia a feitura da singela e

ingrata pergunta: o fato de eu estar vendo em um telejornal

ou lendo em um jornal ou revista as informações que me são

transmitidas realmente me torna uma pessoa cônscia do que

está acontecendo? Isso mesmo, o fato de ter lido uma

matéria em uma revista sobre os conflitos no Oriente Médio,

por exemplo, me torna uma pessoa apta a emitir um juízo

lúcido sobre o referido conflito? Mesmo assim, lá estamos

nós nas rodas de amigos, acompanhados de uma xícara de café

ou do velho e bom chimarrão, palpitando sobre este assunto

com aquele ar de superioridade olímpica por termos

decorados uma e outra frase sobre o referido tema.

Tratamos de todos estes assuntos que, de um

modo geral, que já são noticiados de uma maneira

superficial, como se o nosso parecer, a nossa opinião sobre


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eles fosse algo que deveria ser levado a sério, pois, o que

dissemos é algo imprescindível para compreendê-los. Aliás,

o mundo é todo turvo só porque a maioria das pessoas nunca

ouviu as nossas opiniões sobre estes assuntos que nós

opinamos tão eloqüentemente nas rodas de amigos na mesma

proporção de os desconhecemos.

Este é um vício muitíssimo significativo da

sociedade hodierna. Nos informamos não para respondermos as

questões que nos inquietam, pois, as questões já nos são

dadas pelo meios de comunicação de massa e repetidas pelos

deformadores de opinião. A nós cabe apenas repeti-las e

macaquear discussões para ocupar o nosso ócio dispersivo.

Ou você vai me dizer que a imprensa formula

suas matérias pensando naquilo que nós estamos indagando em

nosso íntimo? Aliás, quantas perguntas nós já formulamos em

nossa vida, quantas questões nós levantamos e, por conta e

risco, procuramos investigar para simplesmente compreender

aquele algo que gritava por entendimento em nossa alma?

E mais! Pari passo com este vício, de

simplesmente seguir os noticiários para “saber” o que está

“acontecendo” no mundo, junte-se um outro vício que muitas

das vezes nos leva a estar a par de tudo que é transmitido

pelos referidos meios de comunicação: o de termos algum

assunto para preenchermos o vazio existencial de nossas

rodas de conversa onde de maneira rasa conversamos sobre


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qualquer coisa com toda aquela pompa de cidadão crítico

preocupados com o destino da sociedade e do mundo ao mesmo

tempo que disfarçamos nossa incapacidade de nos

compreendermos enquanto pessoas.

Agregue a este ponto o fato de na maioria das

vezes inexistir uma questão que seja o centro gerador da

conversa nascida da própria conversa. No fundo, quando nos

reunimos assim o fazemos simplesmente para nos entreter,

passar o tempo, fingindo uma situação em que nos sintamos

diferente do que a vida cotidiana nos faz sentir, mesmo que

este momento seja uma grande dissimulação simiesca.

Não estamos aqui, nestas linhas parvas,

desejando dizer o que se deve ou não conversar ou se

devemos ou não ler jornais, mas apenas afirmando que uma

vida que tenha isso como seu centro é uma vida vazia de

sentido. Como havíamos dito linhas atrás, sabemos que há um

conflito no Oriente Médio e que muitas vezes uma pessoa “X”

está perdida no inferno das drogas, porém, de fato, sabemos

muito pouco sobre os dois casos para deliberarmos um juízo

sobre, não é mesmo? Todavia, sabemos o suficiente para

rezar e pedir pelos que sofrem nas duas situações, não é?

Mas, quantas vezes em nossas orações nós

pedimos pelas tragédias que nos são bombardeadas pela

mídia? Quantas vezes, após as nossas vazias conversas com

nossos pares, nós os convidamos para uma oração? Quantas


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vezes nos pedimos a Deus em nossas preces que Ele nos

abençoe com o entendimento?

Pois é. Falamos muito sobre o que não

entendemos, discutimos muito sobre o que não podemos

resolver e nada rezamos para pedir a interseção de Deus Pai

em nossas vidas para que sejamos abençoados pelo

entendimento e que as vidas aflitas em que não podemos nos

fazer instrumentos da resolução desta ou daquela chaga

sejam socorridas por outras pessoas que possam ser

instrumento Daquele que É.

Sei que tal prática não é chique e que é muito

pouco quista pelos defensores da criticidade cívica

reinante. Mas é o único centro digno que uma vida humana

pode ter. Ou você acha que há algo que seja mais

dignificante que ter o Verbo incriado no centro de nossa

vida?

PAX ET BONUM.

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