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A questão sinótica

Antes dos livros escritos, o evangelho


era tradição oral. Quem conviveu com
Jesus testemunhava sua ação e suas
palavras para as comunidades. Há
vestígios desta tradição já um tanto
concentrada em blocos (1Cor 11,23;
15,3; Rm 4,24s; Rm 10,9s, etc.
Inicialmente anunciava-se o crucifica-
do e o ressurreto como o Senhor. O-
corre muitas vezes nas cartas e nos
Atos dos Apóstolos (At 2,14ss; 3,12ss;
4,9-12; 1Ts 1,9s). Pregava-se também
sobre aqueles que aceitavam a Jesus
Cristo (Mc 8,38; Mt 10,33, etc).
A questão sinótica
Inicialmente o evangelho era apenas a vida de
Jesus transmitida, ou pregada. Nos Atos dos A-
póstolos, nos discursos de Pedro praticamente
só se falava do querigma: ele passou fazendo o
bem, os chefes o mataram, Deus o ressuscitou,
nele está a remissão (At 2,14ss; 3,1ss; 4,8ss;
10,34ss). Com o passar do tempo, o povo quer
saber mais e, como nos tempos de Jesus nin-
guém fez ata, resta a palavra das pessoas que
conviveram com Ele (veja Lc 1,1ss).
Os apóstolos que conviveram com Jesus começam a pregar,
além do querigma, também as palavras de Jesus. Como é fácil
de entender, sem gravador, ou qualquer outro recurso técnico,
sobravam os depoimentos das testemunhas. Nestes testemu-
nhos foi salvo o essencial. Os detalhes muitas vezes foram alte-
rados. Cada apóstolo tem sua maneira de pregar, tem sua ma-
neira de lembrar os feitos, a atitude e as palavras de Jesus.
A questão sinótica
Esta fase da pregação dos primeiros 30 ou 40
anos é chamada de Tradição Oral. Os Apósto-
los pregam sem livro, pois não havia livros do
Novo Testamento. Pregavam apenas com base
no testemunho e com a luz do Espírito Santo
que Jesus havia prometido (Jo 16,12ss). Daí se
depreende que as palavras do evangelho não
devem ser entendidas como palavras literais
de Jesus, nem como atas da vida dele, mas na-
tes, como interpretação da pessoa de Jesus.
Inicialmente existe um único evangelho, ou seja, o anúncio de
Jesus. Mais tarde surgem quatro versões deste único evange-
lho: Marcos, Mateus, Lucas e João. A redação dos evangelhos
não deve ser vista com uma precisão cronológica. Nem sequer
deve ser vista como exatidão histórica. Há muitas partes enxer-
tadas, interpoladas e completadas.
A questão sinótica
O leitor logo perceberá que Mc, Mt e Lc tem estru-
tura e conteúdos semelhantes. Quem lê Mc e a se-
guir Mt e Lc pode dizer: “Este filme eu já vi, embora
com outras cores e acréscimos, mas a grosso
modo, Mt e Lc são cópias reelaboradas de Mc”.

Esta semelhança entre Mc, Mt e Lc recebe o nome


evangelhos sinóticos, pois têm grandes
semelhanças. A palavra “inóticos” deriva do grego
syn opsis.
Syn: “junto”
Opsis: “ver”.

Então podemos afirmar que evangelhos sinóticos


querem dizer, evangelhos vistos em conjunto, ou
de um mesmo ponto de vista.
A questão sinótica
O problema sinótico: Mc, Mt e Lc têm partes em
comum, mas também têm diferenças.
a) Pontos em comum: Os três têm a mesma
estrutura.
Jesus inicia depois do batismo
Milagres
Pregação na Galiléia
Viagem a Jerusalém
Paixão, morte e ressurreição
b) As diferenças:
- Mt 1-3 e Lc 1-3 narrativas da infância de Jesus diferentes
- Mc não traz o Sermão da Montanha;
- As parábolas do Bom Samaritano, do administrador infiel e
do filho pródigo só se encontram em Lucas;
- O ressurreto aparece na Galiléia (Mt 28,16ss; Mc 16,1ss).
Mas em Lc 24,13ss isto se dá nas imediações de Jerusalém.
- Parábolas com fim diferente: Mt 22,1-14 (a veste de festa); Lc
14,15-24 (judeus se excluem).
A questão sinótica
Como isto é possível? = teoria das duas fontes:
A teoria das duas fontes reza assim: Mc é o mais Mc Q
primitivo dos evangelhos (70d.C.). Mt e Lc usam
Mc para escrever os seus evangelhos (80d.C.). Po-
rém, Mt e Lc têm acesso a outra fonte, ou seja, a
fonte Q (Quelle). A fonte Q traz quase só discursos
e ditos de Jesus.
Mc é o mais antigo dos evangelhos. Sua estrutura Mt Lc
é copiada por Mt e Lc, ainda que estes iniciam de
forma diferente e depois de Mc 16,8 eles voltam a
se diferenciar.

Mt e Lc compartilham uns 200 versículos que não estão em Mc.


Quase tudo são palavras do Senhor. Supostamente vêm da
fonte Q (logia). Lc usa o mesmo material de Mt, mas o distribui
de forma diferente.
A questão sinótica
Ora Mt e Lc seguem Mc, ora só Mt segue e Lc
diverge, ora só Lc segue a Mc. Porém, em ne-
nhum momento Mt e Lc juntos seguem outra
estrutura que não seja a de Mc. Daí concluem
os especialistas, que Mc é o mais antigo.

Mc tem 666 vers. Mt copiou mais de 600 de Mc. Quase tudo de


Mc está em Mt. Lc tem 350 vers. copiados de Mc. Tem também
bastante material que se encontra em Mc, mas formulado dife-
rente. Lc eliminou as tradições duplas de Mc e recebeu mais
material de fora do que Mt.
Mt e Lc ampliam conceitos de Mc: assim, em Mc 8,29 temos:
“Tu és o Cristo”. Mt 16,16 diz: “O Cristo, o Filho de Deus vivo”,
enquanto que Lc 9,20 traz: “O Cristo de Deus”. O mesmo em
Mc 15,39//Mt 27,54//. Talvez estas diferenças se devam ao fato
de ambos terem destinatários diferentes.
A questão sinótica
Mt e Lc compartilham uns 200 vers. que não
estão em Mc. Quase sempre palavras do Se-
nhor. Devem vir da fonte Q. Lc usa o mesmo
material de Mt, mas o distribui de forma dife-
rente:
Mt 5-7; 10; 13; 18; 23-25;
Lc 3,7-4,13; 6,20-7,35; 9,51-13,35
As concordâncias entre Mt e Lc que transcendem Mc precisam
de ser atribuídas a uma fonte que cada um dos dois evangelis-
tas utilizou independentemente do outro.
Parece que Mt se vale da Q, mas dispõe o material à sua
maneira. Lc segue mais de perto a disposição da Q. Porém Mt
preservou melhor o aspecto lingüístico semita. Lc helenizou.
Trata-se, muitas vezes, de ditos (sentenças) também comuns
na literatura helenista e nos rabinos. Falta a paixão e o sofri-
mento. Cada evangelista tem também material exclusivo, que
não está nem em Mc, nem na Q.
A questão sinótica

Bruno Glaab
CAMADAS LITERÁRIAS
Camada 1 Camada 2 Camada 3

O fato histórico: Transmissão oral: Redação final:


O que Jesus disse Como a comuni- Como o redator
e fez. dade depois da final dispôs seu
Pouco se sabe páscoa transmitiu material recebido
desta camada e interpretou: do S1 e do S2.
teologia.
Teologia de cada evangelho
• Marcos:
Como seguir Jesus num contexto de
euforia, sem esquecer o fracasso da cruz
• Mateus:
Jesus, o novo Moisés. Como evangelizar
judeus
• Lucas:
Jesus, a ruptura com o Antigo
Testamento.
EVANGELHOS SINÓTICOS
Mateus Marcos Lucas
Infância 1-2 Infância 1-2
Batismo 3,13-17 Batismo 1,9-11 Batismo 3,21-22
Tentação 4,1-11 Tentação 1,12-13 Tentação 4,1-13
O paralítico 9,1-8 O paralítico 2,1-12 O paralítico 5,17-26
Profissão 16,13-20 Profissão 8,27-30 Profissão 9,18-21

O rico 19,16-30 O rico 10,17-31 O rico 18,18-30

Zebedeus 20,20-28 Zebedeus 10,35-45 Resposta 22,24-27


Morte 27,32-56 Morte 15,21-41 A morte 23,26-49

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