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Intensificação do trabalho

e efeitos na saúde
A QUESTÃO DOS RISCOS PSICOSSOCIAIS
CLAUDIA OSORIO
Tópicos
Intensificação do trabalho: competição exacerbada; falta de reconhecimento (PDT); a questão do trabalho bem feito (CA);
situação na pandemia de covid19.
Organização do trabalho e riscos de estresse crônico: O que diz a OIT.
◦ Social: questões econômicas, culturais e de valores éticos; o tempo e o espaço na contemporaneidade.
◦ Organizacional: políticas de pessoal, exigências de produtividade, características do objeto e da tecnologia

Desemprego e recessão econômica:


◦ Trabalhos de Edith Seligmann-Silva
◦ Insegurança e incerteza
◦ Situação atual no Brasil

Riscos Psico Sociais X Recursos Psico Sociais


Formas de abordagem e enfrentamento:
◦ OIT: QVT – o que é participação?
◦ Gestão dos riscos
◦ Desenvolvimento de recursos para ação em situação de cooperação conflitual e valorização do orgulho do ‘trabalho bem feito’.
REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA
Resposta à crise dos anos 70 (sec. XX)
 Internacionalização e aumento das pressões da concorrência intercapitalista em nível
mundial.
 Automação e informatização.
 Flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados, dos produtos e dos padrões de
consumo.
 Terceirização do trabalho
 Utilização de subcontratação de mão-de-obra, contratos temporários de trabalho,
trabalho em domicílio, trabalho em tempo parcial e trabalho sem registro em carteira
 Intensificação do trabalho
REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA
E SUBJETIVIDADE
 Valorização da individualidade e da competitividade.

 Valoriza-se o espírito de empreendedor, vencedor de adversidades, sobrevivente em situação de


competição acirrada.

 Relação fundada em alianças entre empresa e trabalhador para vencerem juntos nesse campo
de batalha.

 Exigências de maximização das “competências” para assegurar empregabilidade.

 Exigências de maior escolarização e intelectualização.

 Exigências de excelência ou qualidade total


OIT – Riscos emergentes
Intensificação do trabalho em destaque
La economía informal y la SST
OIT – Riesgos emergentes y nuevos modelos de prevención en un mundo de trabajo en
transformación. Genebra, 2010
A economía informal e a SST
A economia informal abarca entre a metade e três quartas partes de todo o
emprego não agrícola nos países em desenvolvimento, e mais de 80 por cento
de toda a população ativa.
◦ Insegurança quanto a pagamento do salário
◦ Horas extras obrigatórias
◦ Demissão sem aviso prévio nem indenização
◦ Condições de trabalho perigosas e insalubres
◦ Em muitos países, a maioria dos novos empregos são criados na economia
informal.
Trabalho por aplicativos
Você não estava aqui (Sorry, we missed you) - De Ken Loach. Com Kris Hitchen.
Após a crise financeira de 2008, Ricky decide adquirir uma pequena van e trabalhar com entregas.

Papos de Trampos – Entregadores Antifacistas (58 min)


https://youtu.be/fefvQcndflw
Com Paulo Galo (Paulo Lima), liderança entre os Entregadores Antifascistas, com a mediação de Flávia Manuella Uchôa de Oliveira.
TraMPoS: Laboratório de Estudos e Pesquisas sobre Trabalho, Movimentos sociais e Políticas Sociais – Instituto de Psicologia – USP

GIG: a uberização do trabalho (60 min)


Filme da Repórter Brasil – Ong que tem como foco o trabalho escravo
Now, Vivoplay

CORONAVÍRUS: O TRABALHO SOB FOGO CRUZADO (Live) - Editora Boitempo - 1h52m


Ricardo Antunes e Renata Souza
https://youtu.be/ExL7KQbcqTU
Informalidade e desemprego
e os efeitos da Covid-19
Silva, Pedro Henrique Isaac. (2020). O mundo do trabalho e a pandemia de Covid19: um olhar
sobre o setor informal. Caderno de Administração, vol. 28, Ed. Esp., p. 66-70
Trabalho informal no Brasil
2013 = 37,4% (30 milhões de trabalhadores/as)
2020 – 39,9% (36,8 milhões de trabalhadores/as)
◦ Força de trabalho no Brasil = 105 milhões de pessoas
◦ Desempregadas= 12,8 milhões
◦ Trabalhando sem carteira no setor privado – 11,8 milhões

2018 – 3,6 milhões são motoristas de aplicativos; 10,1 milhões são entregadores.
Esses números aumentam assustadoramente.
Bibliografia
Antunes, Ricardo e Praun, Luci. (2015). A sociedade dos adoecimentos no trabalho. Serviço
Social e Sociedade, São Paulo, n. 123, p. 407-427, jul./set.
Goes, Emanuelle Freitas, Ramos, Dandara de Oliveira, & Ferreira, Andrea Jacqueline Fortes.
(2020). Desigualdades raciais em saúde e a pandemia da Covid-19. Trabalho, Educação e Saúde,
18(3), e00278110. Epub 29 de maio de 2020.
Silva, Pedro Henrique Isaac. (2020). O mundo do trabalho e a pandemia de Covid19: um olhar
sobre o setor informal. Caderno de Administração, vol. 28, Ed. Esp., p. 66-70.
Uchôa-de-Oliveira, Flávia Manuella. (2020). Saúde do trabalhador e o aprofundamento da
uberização do trabalho em tempos de pandemia. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, 45,
e22.
Los trabajadores migrantes y la SST
OIT – Riesgos emergentes y nuevos modelos de prevención en un mundo de trabajo en
transformación. Genebra, 2010
Os trabalhadores migrantes e a SST
Em muitos países o número de trabalhadores migrantes aumentou por motivos
tanto políticos como económicos.
◦ Estes frequentemente estão expostos a um maior risco de exploração

◦ Podem não ter aceso a atenção de saúde ou a seguridade social

◦ Com frequência no estão protegidos pela legislação sobre SST.

◦ Tendem a realizar trabalhos de alto risco , com grandes jornadas e a trabalhar na


economia informal
Fatores psicossociais
e estresse relacionado ao trabalho
OIT – Riesgos emergentes y nuevos modelos de prevención en un mundo de trabajo en transformación. Genebra, 2010
Fatores psicossociais
e estresse relacionado ao trabalho
Na atualidade, os fatores psicossociais são reconhecidos em geral como questões mundiais que
afetam a todos os países, profissões e trabalhadores.

A maior flexibilidade e precariedade do trabalho, a intensificação do trabalho, e as relações de


trabalho, em que entram em jogo o assédio e a intimidação, são alguns dos fatores que favorecem
o incremento dos transtornos causados pelo estresse relacionado ao trabalho.

Embora seja necessário realizar mais investigações para compreender plenamente suas
consequências, aceita-se que tais fatores podem ter efeitos consideráveis na saúde, no
absenteísmo e no rendimento dos trabalhadores.
Fatores psicossociais
e estresse relacionado ao trabalho

Em alguns estudos realizados na Europa e em outros países desenvolvidos se


indica que o estresse é um fator encontrado em 50 a 60 por cento de todos os
dias laborais perdidos.
O estresse é a segunda causa registrada com maior frequência de transtornos da
saúde relacionados ao trabalho, que afetou a 22 por cento dos trabalhadores na
União Europeia em 2005.
TERCEIRIZAÇÃO
Terceirização riscos
Redução da qualidade de vida: produção de insegurança de modo geral e
medo (estresse)
Redução da qualidade do trabalho: aumento do risco de acidentes
Redução da qualidade do produto: falta de sentido no trabalho

Para ler sobre terceirização  produção de insatisfação e estresse


LIMA, Maria Elizabeth Antunes. Contribuições da Clínica da Atividade para o campo da segurança no
trabalho. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, vol.32 nº 115, 2007. P. 99-107.
FIGUEIREDO, Marcelo G. e ATHAYDE, Milton. Organização do trabalho, subjetividade e confiabilidade na
atividade de mergulho profundo. Produção, v. 15, n. 2, 2005. P. 172-183.
NAVARRO Vera L. O trabalho e a saúde do trabalhador na indústria de calçados. São Paulo em
Perspectiva vol. 17 nº 2, 2003. Pp. 32-41
PRAZERES, Taísa Junqueira e NAVARRO, Vera. Na costura do sapato, o desmanche das operárias:
estudo das condições de trabalho e saúde das pespontadeiras da indústria de calçados de
Franca, São Paulo, Brasil. Caderno de Saúde Pública, Rio de Janeiro, vol. 27, nº 10, 2011. Pp.
1930-1938.
RANCAN, Maristela, & GIONGO, Carmem Regina. (2016). "Eles determinam, nós produzimos":
subjetividades capturadas pelo trabalho metalmecânico. Psicologia & Sociedade, 28(1), 135-144.
Superexplorados, vigiados e…
com direito a Yoga

https://outraspalavras.net/capa/superexplorados-vigiados-e-co
m-direito-a-yoga/
Acesso em 18/09/2018
Superexplorados, vigiados e…
com direito a Yoga
Diante da ausência de expectativas para conseguir condições de trabalho aceitáveis, estímulos ou uma
jornada de trabalho justa, somos convencidos e enganados para aceitar um trabalho com a promessa de
uma aula de yoga gratuita e a ilusão de que nos valorizam. Se damos uma espiada nas principais páginas de
emprego na web, especialmente na indústria tecnológica, temos um sem-fim de informações sobre a
cultura corporativa das empresas.
A distinção entre os períodos de “trabalho” e de “não-trabalho” praticamente desapareceu.
Já não vamos ao bar, mas bebemos no escritório; já não lemos por prazer, pegamos livros da biblioteca do
escritório para pesquisar sobre problemas que afetam nosso ambiente de trabalho.
E com os programas dedicados ao bem-estar do empregado, as empresas supervisionam o que até há
pouco não dizia respeito ao trabalho: as horas de sono, as decisões financeiras (que muitas vezes incluem
contribuições de caridade) e até mesmo a comida.
Esgotadas em razão desse compromisso excessivo as pessoas não trabalham bem, e calcula-se que entre
60% e 80% por cento dos acidentes devem-se a decisões associadas ao esgotamento.
Psicopatologia da Recessão
e do Desemprego
Estudos na década de 1980, feitos por Edith Seligmann-Silva, mostram relação
entre os processos de reestruturação produtiva e alguns efeitos sobre a saúde
mental. Há demonstração epidemiológica e clínica de aumento da depressão,
incluindo alcoolismo e suicídios.
Esses efeitos incidem tanto sobre os que ficam em situação de desemprego
intermitente ou de longa duração como sobre os que continuam empregados.
A mesma autora estuda
As síndromes da insensibilidade, como o chamado burn-out.
O assédio moral como política organizacional de pressão pelo aumento da produção.
“Quanto menor a participação do trabalhador na
formulação da organização de sua própria atividade e no
controle sobre a mesma, maiores as probabilidades de
que a atividade seja desfavorável à saúde mental”
(Seligmann-Silva)
Fatores psicossociais de risco
“A Organização Internacional do Trabalho – OIT, desde 1984, refere-se aos fatores psicossociais
no trabalho como a interação entre o trabalho (ambiente, satisfação e condições de sua
organização) e as capacidades do trabalhador (necessidades, cultura, sua situação externa ao
trabalho). De um lado, portanto, está a inter-relação entre conteúdo, organização e
gerenciamento do trabalho, entre outras condições ambientais e organizacionais, e, do outro, as
competências e necessidades dos empregados.”

Ruiz, Valéria Salek &Araújo, André Luís Lima Saúde e segurança e a subjetividade no trabalho: os
riscos psicossociais Rev. bras. Saúde ocup., São Paulo, 37 (125): 170-180, 2012
Relação trabalho saúde
O trabalho tem uma função psicológica: desenvolve o ser humano, como um ser social, já que
se trata de um cenário de relações sociais de grande importância.
Em que condições o trabalho produz saúde:
O trabalho tem sentidos importantes para o(s) trabalhador(es).
O(s) trabalhadores pode(m) ter orgulho de seu trabalho.
Há reconhecimento pelo trabalho realizado.
Há um coletivo de trabalho que tem fortes valores (de ofício) compartilhados, que compartilha
um experiência de trabalho e assim sustenta bem a cooperação no trabalho.
Portanto é possível lidar com os riscos de estresse ampliando os aspectos do trabalho que
possibilitam a sustentação de recursos coletivos para a ação.
RPS: riscos X recursos
Controvérsia central
Riscos Psico Sociais?
ou Recursos Psico Sociais?
Onde e como intervir?
Analisar riscos psicossociais
Associados à organização do trabalho, parte do RISCO
ERGONÔMICO na normatização brasileira (NR 17 item 6):
◦ 17.6.2 A organização do trabalho, para efeito desta NR, deve levar em consideração, no
mínimo:
a.as normas de produção;
b.o modo operatório;
c.a exigência de tempo;
d.a determinação do conteúdo de tempo;
e.o ritmo de trabalho;
f. o conteúdo das tarefas.
Analisar riscos psicossociais
Associados à organização do trabalho, parte do RISCO ERGONÔMICO
na normatização brasileira (NR 17 item 6):
COMO?
COM QUE DISPOSITIVO?
MAPA DE RISCO com efetiva participação daqueles
trabalhadores que atuam especificamente no território e na
situação analisada.
Centrar a atenção nos Riscos PsicosSociais
ou nos Recursos PsicosSociais?
Problemas indicados por autores diversos:
Com frequência se individualiza a abordagem, caindo na identificação dos efeitos individuais e na busca da
minimização dos efeitos, sem esforços adequados para a eliminação dos fatores que podem estar na origem
desses efeitos. Não são feitos esforços de mudança na organização do trabalho, que incide sobre todos os
trabalhadores.
Nesse caso, os efeitos negativos para a produção, como o aumento do risco de acidentes, continuam presentes.
Caminho que tem como subtexto a responsabilização – até mesmo a culpabilização - dos indivíduos afetados,
que supostamente “são mais frágeis”, “não se cuidam”, “precisam de terapias”, “não são feitos para esse
serviço”...
Caminho pouco ético, por submeter os trabalhadores a efeitos de más condições de trabalho conhecidas e
passíveis de serem transformadas.
 Lembrar o uso apontado da Yoga Laboral como “solução”.
Analisar recursos psicossociais
e buscar ampliá-los
Esses recursos estão associados à valorização dos saberes práticos,
advindos da experiência em campo. São recursos coletivos.
Os métodos participativos e de análise e debate de soluções:
Possibilitam a visibilidade e a ampliação desses saberes, incidindo na construção de soluções mais
efetivas e duradouras, em diálogo com saberes teórico técnicos.
Ampliam os diálogos entre trabalhadores sobre o trabalho, incidindo nos modos de percepção dos
riscos e nos modos de enfrenta-los.
Produzem e reforçam valores de ofício, construídos e respeitados pelos trabalhadores, ampliando a
cooperação entre eles e reduzindo riscos de acidentes.
Ampliam os diálogos entre diferentes setores e níveis hierárquicos, possibilitando a ampliação da
cooperação entre eles : cooperação conflitual.
Métodos participativos e coletivos
MAPA DE RISCO com efetiva participação dos trabalhadores que
atuam diretamente no território e na situação analisada.
Outros métodos de formação ativa e continuada no trabalho.
Métodos das clínicas do trabalho: pedagogia freiriana, ergonomia,
psicodinâmica do trabalho, clínica da atividade e outras. Métodos
dialógicos em geral.
A efetiva participação pressupõe espaço de debate e de valorização
da divergência de posições sobre problemas e soluções. Exige
tolerância e tempo para o desenvolvimento do diálogo.
Importância da identificação e análise
participativa dos riscos associados a OT
Os riscos e as cargas inadequadas de trabalho tem relações complexas entre si.
A discussão do trabalho entre os trabalhadores favorece a troca de experiências, o aumento
da confiança mútua e da cooperação na equipe.
O debate entre os próprios trabalhadores sobre o que é o melhor modo de proceder propicia
o reconhecimento que esses trabalhadores tem da importância do seu trabalho. O orgulho
pelo trabalho bem feito contribui fortemente para a saúde e satisfação no trabalho.
A discussão do trabalho pelos trabalhadores tenderá a incluir a análise dos incidentes críticos
e a mantê-los preparados para outros eventos não previsíveis.
Essa política tem obrigatoriamente que incluir a valorização, pela organização, da avaliação
que os trabalhadores fazem, buscando corrigir as más condições que essa análise aponta.
Assim se amplia a cooperação entre diferentes setores, mesmo que haja diferentes interesses
em jogo: a cooperação conflitual.
BIBLIOGRAFIA
CLOT, Yves et cols. Questions autour de la clinique de l’activité. La Nouvelle Revue du Travail, 9. 2016.
CLOT, Yves. O ofício como operador de saúde. Cadernos de Psicologia Social do Trabalho, 16 (N. especial 1), 2013. P. 1-11.
CLOT, Yves. Entrevista. Revista Mosaico: estudos de psicologia, II (1), 2008. P. 65-70.
FIGUEIREDO, Marcelo G. e ATHAYDE, Milton. Organização do trabalho, subjetividade e confiabilidade na atividade de mergulho
profundo. Produção, 15 ( 2,) 2005. P. 172-183.
LIMA, Maria Elizabeth Antunes. Contribuições da Clínica da Atividade para o campo da segurança no trabalho. Revista Brasileira de
Saúde Ocupacional, 32 (115), 2007. P. 99-107.
MUNIZ, Helder e cols. Ivar Oddone e sua contribuição para o campo da Saúde do Trabalhador no Brasil. Revista Brasileira de Saúde
Ocupacional,. 38 (128), 2013. P. 280-291.
OIT – Riesgos emergentes y nuevos modelos de prevención en un mundo de trabajo en transformación. Genebra, 2010.
OSORIO DA SILVA, Claudia. O trabalho como operador de saúde. Ciência e Saúde Coletiva 19 (12), 2014. P. 4751-4758.
RUIZ, Valéria S. & Araújo, André Luís L. Saúde e segurança e a subjetividade no trabalho: os riscos psicossociais Revista Brasileira
de Saúde Ocupacional, 37 (125), 2012. P. 170-180
SELIGMANN-SILVA, Edith. Trabalho e Desgaste Mental: o direito de ser dono de si mesmo. São Paulo, Cortez Editora, 2011.

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