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A ação coletiva, o fanzine e os deslocamentos

migratórios – em busca de novos imperativos


éticos, estéticos e políticos na escola

Autores: Ubirajara
Santiago
(doutorando pela
UENF/CAMPOS/RJ
e) e Alberto Souza
(programador visual
IFF/Macaé)
“Ação coletiva”
• 1) Não se tomar isso por um dado.
• Construção política a muitas vozes e regimes de
envolvimento.
• Quadros de justiça dos movimentos sociais requerem
gramáticas públicas e se dão num cenário ora a escola, ora
voltado a outras arenas públicas.
• (Resende) Escola como arena pública: distribuição da
instrução e da escolarização. Outras gramáticas políticas
atravessam a escola que, na verdade, é compósita; outros
sentidos de injustiça são elaborados nos processos de
amplificação dos quadros da denúncia (Cefaï).
Porque ação coletiva e fanzine se relacionam com
a busca de novos imperativos éticos, estéticos e
políticos?
• Caráter experimental e expressivo de ambos. É
evidente que a escola “habitual” já comporta este
caráter expressivo e aberto, mas as gramáticas plurais
da escola não se encontram, digamos, tão manifestas
como nas ocupações, que trazem à tona o fato de que
as “organizações sociais” se compõe de envolvimentos
de temperaturas e gramáticas de geometria variável.
Deslocamentos

“Mas me conta porque eu soube de alguns episódios aqui de incorporação?


Gaia: “Todas as vezes que aconteceram foi logo depois que eu saí”.
“E falavam que iam me matar também. ”
Como assim?
Gaia: “Eu falei deixa matar, então. ”
“Era um espírito enviado para mim, para os cabeças. Para o Perseu, para mim, para não sei quem. ”
“Dizia que vinha para matar, para me matar. Mas isso é um tipo de ameaça que eu não acho que acontece
realmente, não. São esses espíritos sujos que ficam largados aí. ”
Mas como essa mensagem chegou até você?
Gaia: “Pela pessoa que incorporou, a outra pessoa que viu. Porque a pessoa que incorporou não lembra. Me
contou, me contou depois que aconteceu, aí eu preferi não me aprofundar. ”
“Eu sou candomblecista, mas eu só acredito quando eu vejo. ”
Mas isso já aconteceu aqui no funcionamento normal da escola?
Gaia: “Não. ”
É muito difícil, né? Espírito vai no terreiro, nos rituais, né?
Gaia: “Não sei, quando a energia está pesada também. Muitas energias misturadas, não sei o que aconteceu.
Não sei o que cada um trouxe para dentro da escola. Mas no funcionamento normal é diferente. As pessoas
só passam por aqui, não ficam aqui.
As arenas políticas escolares e suas gramáticas
políticas

• Cívico/autoridade/industrial. (Resende)
• Philia: reciprocidade e lealdade entre pares. (Rayou,
Resende, Caetano, Gouveia, Beirante, Dionísio,
Karsenti, Boltanski)
• Convivencial: respeito e diferença. (Resende, Dionísio,
Gouveia)
• Familiaridade/proximidade: cuidar de si e dos outros
(Foulcault, Resende, Thévenot) e o “humano”.
• Experimentação colaborativa que comporta
envolvimentos (Thévenot) convocados ao convívio.
Aluna Cassandra:
“Na verdade, agora todo mundo está bem próximo do outro.
Muita gente veio de fora. A gente acabou pegando amizade com todo mundo.”

Isadora: Sassá, entra na cozinha com a gente, aí você come. Aí ele fala: “não, não precisa
não. ” Aí eu falei: Então entra no refeitório.
Aí tinha uma mesa que estava lá fora, aí eu falei: então senta aqui Sassá, na mesa, no
claro. Aí ele foi e se sentou ali. E está comendo. Eu dei suco para ele.
Ele não fala. Parece que ele não quer incomodar. Ele sempre me pergunta vocês vão ficar
aqui por muito tempo? Nós vamos sim.
Aí ele falou: “Que bom eu gosto de vocês aqui comigo. ” Isso duas vezes já.
Eu: mas é porque vocês cuidam dele...
Isadora Quando não tem aula a gente não sabe como é que ele come. Como a gente está
aqui o dia todo, todo dia, então ele come todo dia.
Camille: Só que, por exemplo, o Sassá mora aqui e, tipo, ela dava uma
marmita com uma quantidade muita pouca de comida pra ele. Ele dormia
num local muito sujo. E, tipo, foda-se sabe... ele tá aqui, eu não sou obrigada a
cuidar dele, mas já que eu tenho que cuidar dele eu vou dar tipo o mínimo pra
ele. E, cara, tipo o Sassá, ele tá, tudo bem que de vez em quando ele meio que
surta e tal. Ele fala coisas que não fazem o menor sentido, mas ele não agrediu
ninguém, ele não fez nada. E já que ele mora aqui, porque não cuidar dele
direito? E fora que, por exemplo, os cachorros cuidam mais da escola do
que ela e... eles são tipo mais respeitados do que ela, por exemplo. Se
alguém tenta fazer alguma coisa com o Sassá eles começam a latir. Tipo, vão
pra cima, por exemplo. Ou então se alguém começar a brigar aqui na escola,
eu mesma já vi, sabe, por exemplo, os cachorros irem pra cima quando
tinha tipo uma briga aqui na escola. Tipo os cachorros vinham de lá da
frente até aqui, e assim, isso não é uma coisa muito comum, sabe? ”
P.: Isso é uma coisa que a escola, no convívio normal, vocês sentem que
oferece?
Gaia: “Não. A gente passa pelas pessoas muito rápido. Para mim a escola era
para ter esse convívio. A escola e a casa são dois sistemas diferentes. O tempo é
diferente da escola e da casa porque a gente passa seis, sete horas na escola. (...)
É uma preparação para fora, porque a escola eu vejo o papel da escola como
uma segunda, como uma segunda... Eu vejo a escola como um plano B de
casa. Na casa nós temos a educação na escola a instrução. Então é educação e
instrução, elas se parecem mas tem uma diferença e aqui no colégio, a gente
aprende, a gente sai de casa e começa a viver com outras pessoas desde
pequeno. Então a gente começa a ter aquele aprendizado social. (...)
Aqui, você chegava tinha palmatória, educação tradicional e não sei o quê. Era
mais rígido, então você não precisava criar laços com o seu aluno porque
você estava ali para ensinar. Porque a educação vinha de casa. O tempo passa
a sociedade muda, o estudo muda. E desde que isso aconteceu tem gente aí...
E isso vem acontecendo ao longo dos anos que a gente, a escola agora, os
professores tem o dever de educar e ensinar. Educar no sentido de vida”.
• Os quadros só fazem sentido se fizerem parte da
experiência dos atores (Cefaï). Assim é por exemplo o
“motivo” dos espíritos na escola que, no contexto da
experiência dos alunos do Luiz Reid, associa-se a
motivos mais gerais de justificação para ocuparem a
escola e faz parte da religiosidade de muitos deles. Por
outro lado, pode-se ver que os processos de
enquadramento, sobretudo se consideramos a sua
semântica variável também misturam motivos íntimos
que se conectam por vezes a gramáticas mais gerais.
Formas
• Aceitação/proximidade
• Aceitação/cuidado
• Relações horizontais de cuidado.

• Não-cuidado vivenciado como injustiça.


• Sassá.
Arenas públicas/ Arenas escolares
• As gramáticas relacionais da escola
• Philia, familiaridade, cuidado, respeito, autoridade
(Aluno Mathew vs. Diretora liminar do Luiz Reid).
• São importantes na aceitação, nos dilemas dos
envolvimentos e no acollhimento.
• Descentramento do professor no processo de construção
dos significados. O que não quer dizer que a identidade
do professor deixe de ser um problema em aberto.
• Experimentação e criação fora do modelo da autoridade:
há um lugar para isso na escola?
Fanzine e “ação coletiva”
• Toda escrita é uma forma de construção de si, mas nem toda escrita precisa se
dar pela sintaxe relacional da autoridade. (Foucault)
• Nem toda escrita permite a expressão de si no que tange ao íntimo.
• Nem toda escrita trabalha o pertencimento autoral, isto é, serve como
plataforma para se lidar com a diferença e a construção de afeto por meio da
autoria coletiva.
• O fanzine, e a experimentação que propicia, facilita o trabalho de dar forma
às diferentes percepções do mundo e da escola, isto é, aproxima os diferentes
– professores e alunos, alunos entre si – e, ato contínuo, a constituição de
laços de proximidade em colaborações mais simétricas que não se sobrepõem
a outras modalidades de relação nem à capacidade dos alunos de
reconhecerem nos professores pessoas mais experimentadas. Ou seja, traz um
incremento de proximidade no jogo de aproximação e distanciamento que faz
parte da convivência.

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