V. Pritchett Para V. Pritchett (1900-1997), os russos e os norte-americanos precederam os ingleses na história do conto. O conto fez a América inteligível a si mesma, superando o caos, a desigualdade, a diversidade. O conto é uma forma de nações jovens – e de gente jovem. Diz-se que não há romancista com menos de 40 anos; reciprocamente, todo contista nasce/surge antes dos 40 anos, e no passado (sobretudo no século dezenove, o século da tísica), não iam muito além disso: O. Henry (1862-1910) morreu com 48 anos; Stevenson com 44, Tchekhov (1860-1904) com a mesma idade, Maupassant (1850-1893) com 43; Kafka com 41; Katherine Mansfield (1888-1923) com 35.
Em contraste, Zola (1840-1902) chegou aos 62;
Thomas Mann (1875-1955) aos 80; e Tolstoi aos 82: todos romancistas. Esses fatos estão na origem mesmo de uma das platitudes sobre o conto: a de que se trata de um embrião do romance – com o que os romancistas não concordam. Ao longo do tempo o conto tem subido e descido na bolsa das cotações literárias. No Brasil, ele já teve várias épocas áureas: nos anos setenta era um gênero bem popular e cultivado. Depois, os editores voltaram à sua característica ojeriza pelo gênero (SCLIAR, 2007, p. 124-127). COMENTÁRIOS ADICIONAIS AO TEXTO “A NOVA LITERATURA BRASILEIRA” p. 262 – SAMUEL RAWET DALTON TREVISAN Se considerarmos que a nossa sociedade é movida ao dinheiro, a falta dele também pode ser um fator sociocultural que às vezes aparece na relação escritor-público. Foi o caso de Clarice quando aceitou escrever um livro por encomenda do editor Álvaro Pacheco. Esse editor pediu histórias que “realmente aconteceram” com “assunto perigoso”. Disso resultou o livro A Via Crucis do Corpo. (ROSENBAUM, 2002, p. 86). “Os contos, escritos em três dias, abordam sexo e crime de um modo explícito e grotesco, incomum até então na escrita da autora” (ROSENBAUM, 2002, p. 86). “Os contos abordam prostitutas, travestis, mendigos e marginais que vagueiam pelas noites cariocas. A linguagem é direta, bruta, chocante. Nessa altura de sua obra, a autora, usando a pura catarse e evitando toda sofisticação de linguagem, parece purgar o que ela chama de ‘mundo-cão’. Afinal, diz a autora, ‘há hora para tudo. Há também para a hora do lixo’. Ainda assim, suas histórias parecem abraçar, mais uma vez, o sentido da vida ou a falta dele, os limites da palavra, a precariedade da existência, o encontro casual com a verdade, a crueldade e o amor inesperado.” Mesmo diferenciando-se dos demais livros, A Via Crucis do Corpo mantém-se alinhada com a “vertente realista, social”, abraçada pela autora.(ROSENBAUM, 2002, p. 87). Segundo Candido, os fatores socioculturais e a técnica influenciam na formação e na caracterização dos públicos (CANDIDO, 2006, p. 45). Quanto à técnica, os leitores que gostam de ler os livros de Clarice Lispector constituem um público específico de Clarice porque gostam da técnica de escrita dela. Quem gosta dos textos clariceanos aprecia o apreço da escritora por desnudar o íntimo psicológico das suas personagens femininas. PERSONAGENS E SOCIEDADE: Como destacou Rosenbaum a respeito de Clarice: há escritores que criam seus próprios personagens emblemáticos\inesquecíveis. (ROSENBAUM, 2002, p. 20). Em outras palavras, isso quer dizer que os escritores mais talentosos não criam UNS personagens – criam OS personagens. REFERÊNCIAS: ROSENBAUM, Yudith. Clarice Lispector. São Paulo: Publifolha, 2002. (Folha Explica) SCLIAR, Moacyr. Do mito ao conto: o fogo das histórias. In: ______ (Org.). Leituras de escritor. 2. ed. São Paulo: Comboio de Corda, 2009.p. 5- 7. (Coleção Leituras de escritor) ______. O texto, ou: a vida: uma trajetória literária. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007. LIMA, Herman. A nova literatura brasileira. In: COUTINHO, Afrânio (Org.). A literatura no Brasil. 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Global, 2004. p. 245-274.