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Devo sublinhar que nesta época existia no Peso, assim como noutras
povoações vizinhas como Alcaria, Barco, Silvares, Barroca do Zêzere etc.,
uma embarcação que ligava as duas margens do Rio Zêzere ás povoações do
outro lado, neste caso ao Pesinho, para transporte de pessoas, animais e
mercadorias. Quando chegava a Primavera e o caudal do Zêzere era mais
diminuto, eram postas umas tábuas, (passadeiras) no lugar onde hoje se
situa a Ponte, que em muitas ocasiões ainda eram levadas por alguma cheia
imprevista. No caso do Peso, esse barco e o direito de exploração pertencia
ao “ Passal” uma instituição ligada á Igreja.
Depois pela época das colheitas esse homens que tinham ficado com a
exploração do barco, iam de porta em porta, no Peso e no Pesinho, cobrar
uma certa quantidade de milho, creio que um alqueire, medida de (20 litros),
ou mais tarde, azeite, quem não tivesse milho, para assim poder usar o
barco quando fosse necessário.
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----Voltando ao título, sei que era dia e Natal, teria eu os meus 10 a 12 anos
tinha chovido bastante toda essa semana e o Rio começava a transbordar
para os “lodeiros” nome dado, ás terras de cultivo adjacentes ao Rio.
Como era dia de Natal havia gente do Pesinho e Peso em ambas as partes do
Rio e pela tarde, depois das visitas familiares, seria o regresso ás suas
terras. Entretanto como era hábito muitas dessas pessoas juntavam-se na
zona central da povoação, onde existiam as tabernas, únicos lugares onde as
pessoas da aldeia congregavam para socializar.
As Pessoas e o Barco
O Zêzere tinha sido vencido mais uma vez por este punhado de homens
destemidos e habituados aos perigos do mesmo.
Como se fazia o transporte para a outra margem
Quero recordar uma nota trágica, em que o Zêzere nem sempre era
transposto com segurança. Foi por alturas de 1958/59 em que na travessia
de Alcaria para o Dominguiso, numa segunda feira de Inverno, já noite
cerrada, um grupo de jovens raparigas dos Vales do Rio, que trabalhavam
numa fabrica de colchões em Alcaria, ao regressarem a casa depois de um
dia de trabalho, ao chegarem à margem direita o barco foi de embater um
tronco de arvore parcialmente coberto de agua e com o balanço do choque,
duas jovens foram cuspidas para as aguas e nunca mais foram vistas. A
tragédia tinha acontecido e o povo dos Vales do Rio correu aos gritos com
lampiões e outras luzes que puderam arranjar e indiferente à chuva que caía
copiosamente e tinha caído todo o dia, dirigiu-se para as margens do rio sem
saber exactamente o que tinha acontecido e quem tinha desaparecido. Já era
tarde de mais para que alguma ajuda fosse útil., pois as duas jovens tinham
desaparecido, para serem encontradas, uma, dias depois para os lados das
margens da Coutada e a outra algumas semanas mais tarde, cá para as
bandas de Dornelas do Zêzere.
Eu lembro-me... eu estava nos Vales do Rio, conhecia bem estas jovens que
o Zêzere roubou tão tragicamente na sua juventude e assisti a estes
momentos trágicos das famílias a quem estes ente queridos tinham sido
tragados pelas aguas impetuosas do Zêzere.
Este Rio que trazia riqueza a estes povos pelas terras que banhava, trouxe
também a tragédia. Aqui a refiro para que não caia no esquecimento das
gerações viventes.
Textos de:
Belarmino Batista
PESO 1945
Ainda me Lembro!
Não me lembro muito do resto da jornada, apenas que o animal comia umas
folhas de milho seco (canas, como lhe chamavam na minha aldeia) que o
meu avô tinha levado entaladas na albarda do animal. E a mim, deu-me
também qualquer coisa para comer que minha avó me tinha mandado.
B.Batista .Agosto. 78
II
Ainda me Lembro!!!
1947/48
Ainda me lembro que o Peso, era uma aldeia como tantas outras de uma
fisionomia rural e agrícola, mas com a particularidade de estar ligada á
industria de lanifícios através da tecelagem, sendo esta industria uma das
bases de sustento de muitas famílias. Não me lembro muito bem das
grandes vicissitudes da mesma, no que toca á falta de básicos géneros
alimentícios, como pão e mercearias, devido ao facto de meus pais e avós
terem mercearia e padaria. Mas ainda me lembro de ver filas de pessoas no
pátio da padaria de meus avós paternos, à espera para lhe venderem pão, o
que era feito através de um postigo com grades. Sei hoje que muitas dessas
pessoas vinham de longe, das terras do sul do Zêzere como Barco, Paul,
Ourondo e até de Silvares e S. Martinho. Chegavam durante a noite, para de
manhã poderem apanhar o precioso pão, que alguns iam vender depois nas
suas terras a preço mais elevado.
No caso de meu avô, comprou-se um “Nash” dos célebres modelo T que era
posto a trabalhar com uma grande manivela. Tiravam-se os bancos de traz,
já que a mala traseira era bastante pequena, mais parecida com um baú e
assim enchia-se o espaço, com o pão que era posto dentro de grandes cestos
de verga e em cima dos mesmos.
Esse pão era distribuído pelas aldeias do “rio”como Coutada, Barco, Paul,
Ourondo, Casegas, Sobral e para o lado norte, Erada, Unhais, Cortes e até á
isolada Bouça. Onde não havia estrada e era enviado um robusto cavalo,
pelo comerciante, que transportava 3 cestos de pão, para ser revendido no
único estabelecimento da povoação. Alguns anos depois tentava-se a zona
industrial do Tortosendo, Covilhã e as inúmeras quintas ao redor.
Existiam ainda, que eu me lembre, dois fornos de coser pão para o povo, o
da Ti Ana Poiares e outro...(?) funcionando no sistema de “maquia”.
Maquia era a forma de pagamento das pessoas pelos serviços prestados.
Assim pagava-se o uso do forno com o mesmo pão, consoante a quantidade
de pão cosido.
Já que falei na ti Ana Poiares, estou-me a lembrar do seu filho Amândio, que
trabalhava no mesmo forno e conseguia equilibrar um tabuleiro de
pão á cabeça, coisa que só as mulheres faziam. Este dedicava-se aos
domingos a engraxar sapatos, levava 1.50 (15 tostões) e era um bom
profissional. Posso dizer que com a sua ocupação contribuía para que o Peso
fosse uma aldeia onde havia um pouco de tudo. Muitos rapazes dos Vales,
Pesinho e Coutada, vinham ao Peso aos domingos, para engraxar os sapatos,
por não haver nas suas terras este serviço.
III
Segundo ouvira dizer aos meus avós desde tempos antigos que havia no
Peso quem se dedica-se á tecelagem de cobertores, lençóis de linho e
mantas de âmbito artesanal.
Assim eram trazidas grandes meadas de fio que depois eram estendidas num
grande estendedouro, (ordedouro assim lhe chamavam, a grandes barras de
ferro, não tão grandes no tamanho, das balizas do futebol) que iam desde a
estrada do Cabouco ao cimo do Carrascal, ao longo do extremo Poente da
escola da D. Blandina, assim era conhecida a mesma.
Com esta mudança para o progresso iria acabar uma indústria para as
aldeias do Rio e não só, pois outras limítrofes como o Teixoso, Aldeia do
Carvalho, Sarzedo, Ferro, Peraboa etc., haviam muita gente a trabalhar nesta
indústria.
No caso do Peso, houve outra reconversão: os que não seguiram para França
tão depressa, ou já pela idade mais avançada, lançaram mão á tecelagem de
mantas de trapos. O Peso chegou a ser a terra com mais gente a trabalhar
neste sector artesanal em todo o distrito, ou até talvez em todo o país.
De salientar que cada pessoa tinha a suas localidades, que na maioria dos
casos era respeitada, não fazendo concorrência uns aos outros.
Com o envelhecimento dos mesmos e a emigração para França, esta
actividade foi-se desvanecendo até á sua extinção. Assim se vira mais uma
página da história do Peso.
É pena que não tivesse ficado um pequeno museu com todos os artefactos
desta indústria, (tecelagem) para que as gerações vindouras pudessem
apreciar.
IV
Ainda me Lembro!!!
A vinda da electricidade
O primeiro verdadeiro café a ser aberto no Peso, foi o dos irmãos Arnaldo e
António Proença, isto já depois da vinda da Televisão. Todas as noites eram
casa cheia, principalmente para a noite de teatro. As emissões começavam
da parte da tarde acabava á volta das 11 da noite.
Uma das bebidas mais populares na altura, para os que não bebiam vinho,
era uma mistura de gasosa com café (de cevada) que fazia uma espuma
mais parecida com cerveja preta. Havia um nome próprio para esta bebida,
que não me recordo.
Ainda me lembro que a primeira televisão no Peso, foi dos Irmãos Pires e nos
primeiros dias foi posta na varanda do seu estabelecimento no Largo do
Chafariz, onde á noite um arraial de gente se reunia para ver a TV.
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Autoria do Pesense:
Belarmino Batista
Emigrante no Canadá