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Protocolo – um bem necessário (2007-03-14)

A vida sem regras seria, no mínimo, um autêntico caos. Em menor escala, esta constatação aplica-se com toda
a certeza aos eventos sociais e profissionais. Na verdade, as regras, ou o protocolo, servem para poupar ao
organizador de eventos muitos problemas e constrangimentos. O dossiê que se segue não pretende ser um
manual de regras, mas sim potenciar a reflexão sobre estas matérias e dar algumas pistas para quem se inicia
ou quer saber mais sobre protocolo e imagem.

Protocolo, etiqueta e cortesia são conceitos diferentes, podendo, muito embora, ter pontos coincidentes.
Comecemos pela definição dada pela Enciclopédia Verbo para protocolo: “normas de cerimonial e cortesia a
observar quer em relações diplomáticas, quer em certos actos públicos de carácter civil, militar ou religioso.”
Segundo Elisabete Andrade, em “Gestos, Cortesia, Etiqueta, Protocolo”, este último pode ser definido como
“uma linguagem universal que tem por objectivo tornar as relações interpessoais mais fáceis e prazenteiras.”
Esta linguagem tem regras e a sua aplicação é estreita, sobretudo quando se fala em actos oficiais. Já Maria
Rosa Marchesi em “O Livro do Protocolo” refere que “em sentido estrito, protocolo é o conjunto de regras
precisas que regem o cerimonial.”
Isabel Amaral, no livro “Imagem e Sucesso”, brinda-nos com uma excelente analogia para melhor se entender o
protocolo: “que outra coisa é o Código da Estrada do que um Protocolo do Trânsito? E, se toda a gente aceita,
sem fazer troça, o Código da Estrada, por que há quem torça o nariz e diga mal das regras particulares? Não se
perceberá, de uma vez por todas, que elas se destinam, por junto, a ordenar e a tornar mais fácil e agradável o
trânsito na sociedade e na vida? Não se perceberá que é para isso que o Protocolo serve, para evitar choques,
acidentes, problemas? Para resolver – e não para criar – dificuldades?”
E justamente para que a vida do organizador de eventos seja facilitada, torna-se vital que este conheça as
regras essenciais do protocolo, bem como a sua aplicação prática.
Protocolo implica naturalmente cortesia. O primeiro não existe sem o segundo, mas a inversa não é verdadeira.
A cortesia sobrevive ao protocolo, sendo em traços gerais a aplicação das regras da boa educação, a
delicadeza, polidez, urbanidade.
Etiqueta, simplificando, tem que ver com boas maneiras. A sua utilização acaba por definir a fronteira entre
quem é mais polido e quem é menos, quem é mais ou menos conhecedor das regras de convivência em
sociedade. Regras essas que são importantes, e não inúteis, como eventualmente se possa pensar.

Imagem e sucesso

A propósito de protocolo e imagem, fomos ouvir a maior especialista portuguesa nestas matérias, Isabel Amaral.
Em discurso directo, a autora dos títulos “Imagem e Sucesso” e “Imagem e Internacionalização”, analisa, entre
outras questões, a importância do protocolo e de uma imagem cuidada para o sucesso de um evento.

Festas & Eventos: De que forma a imagem do organizador influencia a imagem final do evento?
Isabel Amaral: Um dos principais objectivos dos eventos é projectar publicamente a imagem de determinada
pessoa, empresa ou instituição. O organizador de eventos tem de transmitir profissionalismo, calma e saber
estar para projectar essa imagem positiva, ao longo de todo o evento. Um organizador enervado, inseguro ou
agressivo pode estragar todo o trabalho preparatório. Perante os imprevistos, que surgem sempre, o
organizador tem de responder como se eles fossem previsíveis. Não pode haver improviso, a não ser para
resolver os imprevistos. O planeamento logístico de um evento é fundamental para o seu sucesso e o
organizador deve estabelecer um guião que lhe permita não transigir no essencial mas adaptar-se às mudanças
no que for acessório.

F&E: Quais as características/elementos-chave que se reflectem numa imagem de sucesso?


IA: Três elementos constituem a imagem empresarial: os produtos, a marca e as pessoas. Perante produtos
quase idênticos, por exemplo duas empresas organizadoras de eventos, ou marcas com igual notoriedade, o
que faz a diferença e o que leva o cliente a escolher uma delas são as pessoas que trabalham nessa empresa,
as pessoas responsáveis pelos contactos comerciais mas também as que trabalham e dão a cara no dia do
evento, assistentes, empregados, etc.. A imagem empresarial é o conjunto das imagens de todas estas pessoas
que lidam com o público. Como a imagem pessoal se decompõe em três elementos – aparência, atitude e
comportamento –, há que investir na formação e na valorização pessoal e profissional de quantos trabalham
neste sector.

F&E: Pela sua experiência, quais são as falhas mais frequentes em termos de protocolo na organização de um
evento?
IA: Um evento público deve assentar em três pilares: protocolo, comunicação e segurança. Quando não há
coordenação entre os responsáveis por estas três áreas, a imagem projectada é um desastre. As falhas devem-
se frequentemente à ausência dos chamados três Bs, em que o protocolo deve assentar: bom senso, boa
educação e bom gosto. Organizar um evento é um trabalho de equipa. Um evento público que não chega aos
media ou que, quando chega, é pelas piores razões não atingiu o seu objectivo. Mas mesmo num evento
privado como um casamento, se a reportagem fotográfica falha é quase como se o casamento não tivesse
acontecido.

F&E: Qual a importância de ter um especialista de protocolo na organização de um evento profissional?


IA: O serviço de consultoria protocolar a grandes eventos, em que a minha empresa foi pioneira, consiste em
fornecer uma espécie de «rede» para os eventos em que o risco de «cair do trampolim» e cometer gafes
protocolares é maior. Mas a pouco e pouco, sem que se tenha feito qualquer publicidade, a empresa começou a
ser solicitada também para eventos de menor dimensão, mas onde estão presentes autoridades oficiais:
inaugurações, lançamentos de produtos, conferências, entregas de prémios e galardões, etc. O protocolo
empresarial não ensina apenas a melhor forma de receber uma pessoa ou estabelecer o lugar em que ela se
deve sentar. Também ajuda muito quanto o presidente de uma empresa quer relacionar-se adequadamente
com os seus clientes, fornecedores ou colaboradores, ambicionando, sobretudo, que todos se sintam bem
tratados. E isto significa nomeadamente dar a cada um o lugar que lhe compete, segundo as funções que
exerce. Nisto consiste o protocolo.

F&E: O protocolo simplifica ou complica um evento?


IA: O cidadão comum associa o protocolo a grandes e solenes cerimónias, um pouco teatrais, em que pessoas
algo pomposas e muito bem vestidas parecem obedecer a uma «marcação» preestabelecida, que evita, quando
evita, atropelos, precipitações ou confusões. E o protocolo é de facto uma encenação do poder.
Mas, nos tempos que correm, o protocolo não se limita às normas escritas que regem o cerimonial do Estado.
Inclui também as normas que facilitam a vida no mundo empresarial e profissional. Assim como a cortesia serve
para tornar mais fácil e agradável a vida em sociedade, evitando choques, melindres e problemas, também o
protocolo serve para resolver –e não para criar – dificuldades.

F&E: No caso do nosso evento ter convidados estrangeiros, que cuidados devemos ter?
IA: Respeitar as diferenças e demonstrar consideração pelos outros deverá ser a preocupação de quem
pretende criar uma boa relação interpessoal entre todos os convidados. No caso de culturas diferentes, haverá
que fazer uma pesquisa prévia sobre restrições alimentares, tabus e superstições, usos e costumes diferentes
que possam criar uma situação de incomodidade para alguns convidados. Não levarão a mal que aconselhe a
leitura do meu livro «Imagem e Internacionalização» (Verbo), em que são analisados usos e costumes de 30
países.

F&E: Que tratamento deve ser dado aos jornalistas? Colocá-los num grupo à parte? Misturá-los com os
convidados?
IA: Depende. Os jornalistas estão presentes para trabalhar ou para conviver? Estão a cobrir o evento ou são
parte dele? Se assistem ao evento em funções, para assegurar a sua cobertura, é fundamental dar-lhes
condições para trabalhar. O que não quer dizer que devam poder perturbar o evento que é suposto cobrirem.
Eles não são parte do evento. Se são participantes não podem ser espectadores. E o que os jornalistas devem
ser, nestes casos, é espectadores – privilegiados, empenhados, comprometidos, mas espectadores. Devem ter
lugar reservado. E, para os ajudar, devem ser acompanhados por um dos elementos da organização. E deve
prever-se sempre a possibilidade de fazerem perguntas, obterem esclarecimentos e informações privilegiadas,
etc. Por mim, entendo que devem também ter acesso prévio ao guião da cerimónia ou evento para saberem,
antes dos outros, melhor do que os outros, o que se vai passar.

F&E: Como reagir a queixas e situações inesperadas?


IA: Com calma e bom senso. E de forma positiva. Dizendo sempre: «tem toda a razão, mas…», «vamos
resolver essa situação». E fazendo um esforço para a resolver, de facto…

F&E: Já começam a existir cursos de protocolo. Como avaliaria a qualidade dos cursos? Pela sua experiência,
quem os procura?
IA: Desde 1996 que venho dando cursos de formação profissional na área da imagem, comunicação e
protocolo, respondendo a uma procura crescente de formação neste domínio. Em 2003 aceitei o desafio de
coordenar uma pós graduação em Imagem, Protocolo e Organização de Eventos no ISLA de Lisboa. Tem tido
uma adesão impressionante, estando neste momento a decorrer a 8ª edição. Quero crer que, se não tivesse
qualidade, não teria tanta procura. A maioria dos alunos trabalha por conta de outrém, mas alguns acabaram de
se licenciar e pretendem lançar-se na aventura de criar uma empresa de organização de eventos. Todos estão
conscientes de que só com conhecimentos fundamentados se consegue ter sucesso neste domínio

F&E: Essa procura parte de uma decisão pessoal ou são as empresas que motivam /fomentam essa
aprendizagem?
IA: É evidente que a organização de eventos necessita de técnicos especializados neste domínio, que saibam
utilizar os seus conhecimentos como um instrumento de comunicação. Muitas empresas fomentam esta
aprendizagem. Desde 1996 que venho dando cursos internos de formação profissional na área da imagem,
comunicação e protocolo respondendo a uma procura crescente de formação nesta temática por parte das
empresas portuguesas.

F&E: Que ajudas existem para quem pretende saber mais sobre privilégios e precedências?
IA: Há doutrina mas não havia quase nenhuma legislação- Graças ao consenso dos dois maiores partidos
portugueses, visando estabelecer com clareza as regras fundamentais a que deve obedecer o protocolo de
Estado, temos agora a Lei 40/2006, de 25 de Agosto, que poderá vir a resolver muitos dos problemas com que
nos defrontamos neste domínio. São questões importantes, como se vê pela polémica que esses projectos
provocaram. E não há razões para surpresas: o protocolo não é uma questão de boas maneiras – é, como
mostram as reacções aos projectos de lei, uma questão de poder.
Em caso de dúvida, temos de nos continuar a socorrer do Ministério dos Negócios Estrangeiros e, mais
especificamente, da Direcção de Serviços de Protocolo, que se encarrega de tudo o que é cerimonial do Estado,
acompanhando todas as acções que envolvam o Presidente da República, o Primeiro-Ministro e o corpo
diplomático, e que tem competência especifica para dar pareceres àcerca das normas a aplicar em matéria de
etiqueta e de precedências.
Para quem tiver interesse em actualizar, aplicar e aprofundar os conhecimentos de protocolo, existe desde 2005
uma Associação Portuguesa de Estudos de Protocolo (APEP), cujos objectivos são o estudo e a divulgação das
normas de cerimonial e protocolo, no âmbito oficial e empresarial e a prestação de serviços de consultoria e
formação profissional nesta área.
A APEP pretende ainda congregar pessoas que executem tarefas de protocolo ou actividades conexas e
fomentar a investigação e a partilha de informações, promovendo o intercâmbio com instituições
governamentais nacionais ou estrangeiras, em áreas de conhecimento pertinentes para o cerimonial e
protocolo. Um primeiro passo será a organização em Portugal das I Jornadas Internacionais de Protocolo, no
próximo dia 21 de Novembro, na Gulbenkian (Lisboa). Outro, é a criação de um site e de um núcleo bibliográfico
especializado nestas matérias e que ficará sediado na Biblioteca Genealógica de Lisboa, recentemente
inaugurada (Calçada Marquês de Abrantes,102).

Protocolo transmite poder

Numa época em que a imagem é tudo, e em que “parecer” vale por vezes mais do que “ser”, a importância
destas matérias ganha redobrado fôlego. Há que saber utilizar todos os instrumentos de comunicação ao nosso
alcance para passar a mensagem de um evento com sucesso e prestígio. Deve prestar-se atenção ao detalhe, a
todo o instante, pois, e isto é um lugar comum, basta por vezes um descuido para arruinar uma imagem que se
demora anos a construir. Questões como o que vestir, pontualidade, conversa de circunstância, cartões de
visita, forma de cumprimentar, o que oferecer, entre outras, cabem no âmbito do protocolo. E, se quer saber
mais sobre estas matérias, pode consultar os diversos livros da especialidade, ou, se preferir, fazer uma
formação acompanhada. Além de vários cursos de Organização e Gestão de Eventos, existem instituições que
promovem cursos de protocolo. A saber: ISLA, CERTFORM, Garfos e Letras, IP-Imagem Protocolo, para citar
apenas algumas.

Texto. Cláudia Sousa


Fotos: Desafio Global
http://www.festaseeventos.net/home/ver_arquivo.asp?cont=401

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