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EDIÇÕES DE OURO
Todos os personagens deste livro são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas ou
acontecimentos da vida real é mera coincidência.
HISTÓRIA ou ESTÓRIA?
As Edições de Ouro e o Coquetel grafam a palavra história e não estória
por julgar a primeira forma mais correta, conforme dicionários mais
categorizados, que julgam a segunda forma imitação do inglês story, sem
correspondente com raízes em nossa língua.
EDITORA TECNOPRINT S. A.
1
***
As poucas telas que ainda funcionavam mostravam o aspecto,
sempre igual, do hiperespaço: uma estranha parede, escura e
poeirenta, sem um único ponto luminoso. Não havia estrela, nem
planeta; tudo parecia inerte. As lâmpadas da iluminação de
emergência tremeluziam. Vez por outra, ouviam-se sons emitidos
pelos alto-falantes ou ruídos produzidos pelos instrumentos. Pequenas
chamas clareavam os painéis e conexões dos comandos; finos raios
saltitavam pelos flancos dos condensadores. Os três tripulantes da
Hydra estavam tentando consertar as instalações hiperradiofônicas.
— Como é que está indo, Morris? — Lydia van Dyke ergueu-se
por trás do quadro de controle aberto.
— Mais ou menos — respondeu o telegrafista. — É claro que
ainda tenho que ajustar todas as peças e substituir os tubos e escalas.
Estão todos queimados!
Lydia respirou profundamente.
— Acredita — perguntou, pensativa — que vamos conseguir
consertar a instalação?
— Creio que sua pergunta está superada, general!
Lydia virou-se rapidamente e olhou, surpresa, para o
astronavegador que apontava para a tela circular da Hydra. Estava
fornecendo uma imagem. Lydia aproximou-se mais um pouco, num
misto de incredulidade e euforia. Mal podia acreditar que as três horas
de esforço não tinham sido em vão.
— Transferiu as ligações do radiofoto para a minha tela, Morris?
— perguntou, enquanto analisava, minuciosamente, os detalhes da
imagem.
— Não que eu saiba — respondeu Morris em voz alta.
Sua cabeça já estava, outra vez, entre os componentes mecânicos
do transmissor.
— Provavelmente, a ligação estabeleceu-se por acaso, enquanto
estávamos experimentando — acrescentou Morris, uns dois segundos
depois.
— Estou vendo uma imagem bastante clara e nítida — constatou
van Dyke.
O telegrafista reapareceu e dirigiu-se ao painel dianteiro do
transmissor. Observou os sinais luminosos e os ponteiros que
oscilavam por trás dos vidros estilhaçados.
— Tudo perfeito! — resmungou. — Não há dúvida de que
estamos recebendo impulsos hiperradiofônicos. Uma imagem foi
emitida e os rastreadores conseguiram captá-la. Isto mostra...
— ...que a emissora deve estar a uma distância; enorme, não é? —
interrompeu o astronavegador, excitado.
— Correto! Pode descobrir de onde vem essa emissão? —
perguntou van Dyke.
— Infelizmente, não!
A imagem na tela circular tornava-se cada vez mais nítida. Pouco a
pouco, as linhas difusas e áreas coloridas transformaram-se em traços
firmes, contornos bem delineados e vultos em movimento. Num
pressentimento obscuro Lydia e o astronavegador perceberam que
estavam testemunhando um acontecimento estranho, irreal.
— As ondas desses impulsos vêm de alguma parte da galáxia —
insistiu o telegrafista, e voltou a mexer nos botões dos potenciômetros
e sintonizadores. — Só as captamos porque nossos aparelhos
receptores ainda não foram ajustados. Em condições normais, jamais
usamos ou auscultamos a faixa de ondas na qual estão transmitindo
essa imagem.
A imagem que viam...
Uma superfície escura, azulada, alastrava-se pela tela; parecia o
interior de uma gigantesca caverna. Bem ao centro havia uma
plataforma inclinada, encimada por uma esfera imóvel de cujo interior
emanava a cintilação de minúsculos pontos luminosos. E na frente
desse cenário estavam dois vultos, esbeltos e leitosos. Um deles
apontava para o alto, onde um traço oblíquo atravessava a esfera.
— Ondas de impulsos... — gaguejou o astronavegador. — Mas... e
esta imagem?
— Estes são os extraterranos que a turma de McLane descobriu na
toca — sussurrou Lydia.
— Por um acaso incrível, descobrimos a sua maneira de
comunicação, ou seja lá o que for! — disse o telegrafista, abismado.
— Estamos vendo o interior de uma nave!
— O que estamos vendo, realmente — explicou Lydia van Dyke
— é o mapa do domínio terrano.
O oficial da Vigilância Espacial olhou-a de lado e admirou-se,
novamente, do autocontrole daquela mulher.
— Mas é claro! — disse. — Aquele planeta errante...
Olhou para o astronavegador. Entenderam-se sem proferir uma
única palavra.
— Extraterranos e planetas errantes... — disse Lydia com uma
estranha aspereza na voz. — Os ataques vêm de dois lados. MZ 4 está
no setor Dez/Norte 219 e o planeta desviado vem do sul!
A imagem modificou-se ligeiramente. Os dois vultos, de formas
bem humanóides, estavam, agora, diante da esfera e examinavam a
projeção do fino traço que apontava exatamente para o centro do mapa
astronômico. E nesse centro só havia uma única coisa: a Terra!
— Eu devo estar sonhando! — gemeu o astronavegador.
Fascinados, não tiravam os olhos da imagem. A nave continuava a
errar pelo hiperespaço, sem rumo, sem propulsão e sem meios de
orientação. Por uma casualidade inacreditável, o aparelho
hiperradiofônico, defeituoso, havia interceptado a comunicação dos
estranhos e estava reproduzindo o que tinham a dizer. A conclusão era
óbvia: eram eles que dirigiam o planeta.
Lydia estava atônita; sem ocultar a surpresa na voz, sussurrou:
— Será que a técnica deles não conhece limites? Já mostraram que
são capazes de arrancar um planeta de sua órbita e dirigi-lo, daí em
diante, a seu bel-prazer. E com que precisão incrível! Numa esfera
com novecentos parsec de diâmetro, conseguiram descobrir uma
órbita planetária de apenas duas unidades astronômicas! E ainda
determinaram a posição da Terra no instante da intersecção das duas
trajetórias! Mas o pior de tudo é que conseguiram transformar um
planeta num sol! Isto... beira a loucura total!
Interferências tremiam sobre a tela. Tiveram que esperar alguns
minutos antes que a imagem voltasse a ficar nítida. E tinha-se
modificado mais uma vez.
Agora apareciam as órbitas dos planetas em torno do sol terrano:
Mercúrio, Vênus, Terra e Marte. Uma reta interceptava essas órbitas e,
em três dos pontos de intersecção, encontrava-se um planeta. Ainda
não estavam lá, na realidade, mas já se dirigiam para esses pontos de
encontro...
— Três planetas: Vênus, Marte e a Terra! — disse o telegrafista,
com voz rouca.
— Vão todos três ser destruídos por um planeta em brasas. Um
plano diabólico!
— Não precisa ter receio de que isso vá passar despercebido pelo
pessoal da Terra
— disse Lydia van Dyke. — Sem dúvida, a Central de
Computação vai descobrir o perigo. Mas nós, o que podemos fazer?
Olhou para o rosto sério do astronavegador e depois para Morris.
Ambos encolheram os ombros.
— Vamos tentar consertar nossa aparelhagem. Depois,
informamos nossa posição e damos o alerta geral. Temos que esperar!
Dispomos de água, oxigênio, comida e energia. Só não podemos sair
do hiperespaço.
— OK! — disse Lydia. — E essa imagem?
— Está sendo gravada em fita há quatro minutos. Pode ser que o
resultado não seja uma reprodução de primeira, mas tudo que vimos
na tela foi registrado pela eletrônica — e o telegrafista sorriu.
Lydia lançou-lhe um olhar agradecido.
— Obrigada, Morris! — murmurou. Continuaram a observar a
estranha central de operações dos invasores; notaram as cores
diferentes e os poucos objetos cuja finalidade não sabiam explicar.
Eram, obviamente, produtos de uma técnica que diferia em tudo da
que a Terra conhecia. As próprias concepções básicas já eram
diferentes — e como eram diferentes! Uma nova interferência
extinguiu a imagem de vez.
— Continuamos sincronizados na onda que pegamos por acaso?
— perguntou o astronavegador, analisando o esquema de um circuito.
— Ou vamos prosseguir com o trabalho? Se mexermos em alguma
coisa, modificamos a ligação casual, isso é certo!
Lydia pensou por alguns segundos, com uma expressão de
silenciosa concentração no rosto. Finalmente, decidiu-se:
— Já vimos o suficiente! Vamos continuar!
— Entendido, general! — disse Morris. — Pode me ajudar? —
Lydia fez um gesto afirmativo.
Assim que calibraram e ligaram o primeiro condensador, a tela se
apagou. Trabalharam em silêncio, obstinadamente, tentando consertar
o transmissor. Sabiam que a sua sobrevivência dependia do
funcionamento desse aparelho.
Levaram duas horas para completar as conexões entre a antena e o
primeiro jogo de filtros. A Hydra continuava a boiar, desamparada, no
hiperespaço, envolvida peia matéria sem essência dessa dimensão de
ordem superior.
— Parece que a tempestade de radiação também teve uma boa
dose de culpa nisso! — disse o telegrafista, cansado, e jogou uma
chave de fenda sobre a mesa do transmissor.
— Culpa, em quê? — perguntou o astronavegador, curioso.
Também Lydia lançou um olhar surpreso a Morris. Os três tinham os
dedos e o cabelo chamuscados pelas fagulhas das soldas.
— Culpa no fato de termos conseguido captar aqueles impulsos
hiperradiofônicos. Se empregaram antenas direcionais, é provável que
a radiação tenha desviado as ondas.
Lydia consultou o cronômetro de bordo.
— Já faz seis horas que estamos no hiperespaço — constatou.
Depois, com um sorriso confiante, continuou:
— Morris, será que nossas baterias ainda dão para fazer três
xícaras de café?
— Sem dúvida! — Morris teve que rir. — Quer que eu prepare?
Sentaram-se nos cantos das mesas e tomaram o café quente. Em
seguida, registraram as gravações que Morris tinha feito, numa outra
fita e testaram a instalação radiofônica, o que lhes custou mais meia
hora.
— Será que vamos conseguir? — perguntou Lydia, apreensiva.
— Estou convencido — disse Morris e acenou com a cabeça —
que a estação hiperradiofônica mais próxima vai retransmitir nossa
mensagem; ao menos, até a Estação Avançada-IV.
— Muito bem! — respondeu Lydia. — Vamos lá!
E Morris começou:
— De Hydra para Suprema Comissão Espacial e Serviço de
Segurança Galático... urgente... urgente... por acaso nave conseguiu
captar ondas de impulsos entre duas naves ou estações inimigas...
segue-se registro na nossa fita...
O transmissor separava os impulsos da fita segundo um esquema
que os receptores utilizariam para reconstituir as imagens. Alguns
pontos fracos nos consertos realizados sobrecarregaram a capacidade
do transmissor; em conseqüência, algumas séries de radiofotos saíram
pouco nítidas e com a tonalidade das cores alterada.
— Fim! — disse Morris e desligou algumas chaves no painel.
— Resta-nos a esperança — resmungou o astronavegador — de
que nos localizaram e vêm nos apanhar!
3
MCLANE notou logo que o coronel Villa não era, naquele dia, o
homem ágil e loquaz de outras ocasiões. Falava de maneira ríspida e
lacônica e a expressão tensa do seu rosto mostrava que não conseguia
desviar o pensamento de alguma preocupação muito grave. Algo de
inédito devia ter acontecido. Flanqueado por dois oficiais do SSG,
Villa estava sentado atrás da sua mesa de trabalho, coberta de
documentos que quase escondiam os botões dos aparelhos de
comunicação. Cinco poltronas completavam a mobília do espartano
gabinete. Villa levantou um olhar atento para McLane e rompeu o
silêncio:
— Quais os cubos espaciais que percorreu durante o seu último
vôo de patrulha-mento, McLane?
Cliff virou a cabeça e estudou, por alguns segundos, o perfil de
Tamara. Depois, respondeu:
— O satélite retransmissor encontra-se no cubo Dez/Norte 219. A
Challenger vinha de Dez/Norte 360. Eu me deslocava no primeiro e,
provavelmente, também nos seis cubos adjacentes.
Cliff tinha respondido em tom irritado. Não sabia aonde Villa
queria chegar. A lâmpada cintilante no meio da mesa era prova de que
perguntas e respostas estavam sendo gravadas.
— O senhor não esteve no cubo Sul/ Dois 5112? — continuou
Villa. Os homens que o flanqueavam mantinham-se imóveis, de caras
fechadas, e observavam Cliff e Tamara com uma expressão de
interesse impessoal.
— Não estive nesse cubo! — exclamou McLane, em voz alta e
agressiva.
— Não viu nada de extraordinário, comandante? — perguntou
Villa e fez um gesto impaciente com a mão. Seus dedos começaram,
de novo, a tamborilar sobre o tampo da mesa.
McLane respondeu com a voz um pouco mais controlada:
— Claro que não vi! Sem levar em conta o que aconteceu lá em
MZ 4. Viu alguma coisa, Tamara?
Virou-se na poltrona e olhou para a agente do SSG. Sem alterar
sua expressão calma e reservada, Tamara limitou-se a responder com
um lacônico "não!".
McLane pigarreou e cravou seus olhos nos de Villa. Com voz
baixa, perguntou:
— Afinal, posso saber o que está havendo? Primeiro fomos
arrancados das nossas escassas horas de lazer e arrastados para cá; e
agora estamos sendo interrogados como bandidos com a cabeça a
prêmio... E ninguém se digna me dizer por quê!
Com voz impassível e baixa, Villa disse:
— Duas horas atrás recebemos uma mensagem hiperradiofônica.
Bastante truncada. E o registro magnético de uma radiofoto. Era um
dos dois pedidos de socorro da Hydra, que...
McLane ergueu-se de um salto e os pés da sua poltrona estalaram
no piso.
— Um pedido de socorro! — exclamou, alarmado — da Hydra?
Villa acenou, em silêncio, depois acrescentou: — ...que está
voando sob o comando de van Dyke. Sim, o que é? — olhou para o
videofone.
Tamara também se levantou e postou-se ao lado da poltrona.
— Um momento! — disse Villa e apertou o botão que extinguia a
barreira eletrônica. Um oficial atravessou a moldura, aproximou-se da
mesa do coronel e bateu continência. Villa levantou os olhos e
perguntou, com sua voz disciplinada:
— Já tem os resultados, tenente? Lançando um furtivo olhar em
direção a
McLane, o oficial disse, solícito:
— Examinamos os registros eletrônicos do livro de bordo e
também do tacógrafo.
Cliff estava a ponto de estourar de raiva.
— E os resultados? — perguntou Villa.
— Os informes do comandante McLane estão corretos!
Cliff sentou-se no braço da poltrona, cruzou as pernas e perguntou,
friamente:
— Não vai me dizer, coronel, que esperava por um resultado
diferente?
Villa permitiu-se esboçar um sorriso.
— Não, certamente que não. Afinal, o senhor tinha um oficial do
SSG a bordo, comandante.
— Será que podemos saber agora — disse Tamara, visivelmente
irritada — o que realmente aconteceu?
Villa encarou-a durante um segundo; depois olhou para o oficial e
disse:
— Está bem. Obrigado; é só!
O oficial recuou alguns passos até ficar por trás de Cliff e Tamara.
— Muito bem! — disse Villa, resolvido a falar. — Vou pô-los a
par de tudo.
— Pedimos isso, encarecidamente! — disse McLane.
— Poupe seu sarcasmo — disse Villa, impassível. — A coisa é
muito mais séria do que imaginam. Recebemos duas mensagens
radiofônicas da Hydra, que penetrou no hiperespaço mais ou menos
na altura de Sul/Um ou Dois e, desde então, não temos notícia dela.
As mensagens evidenciaram que um grande planeta está se
aproximando, com uma velocidade enorme, de três órbitas planetárias
do nosso sistema. Sua atmosfera e, obviamente, parte da sua
superfície, estão em total incandescência, como se fosse uma Nova. E
este planeta está sendo teleguiado sem sombra de dúvida. Van Dyke
conseguiu transmitir os registros magnéticos da imagem de uma
estação dos estranhos. Vou-lhes exibir esta fita daqui a alguns
instantes.
McLane olhava, incrédulo, ora para Tamara, ora para Villa e
acabou por sussurrar, atônito:
— Um planeta... transformado numa Nova? Isto não pode ser
verdade!
— Nossas estações de busca já o localizaram. Sua velocidade é
tamanha que, dentro de dez dias, vai alcançar primeiro Marte, depois a
Terra e, finalmente, Vênus. Além disso, seu envoltório gasoso em
brasas alastra-se constantemente, como numa Nova. Primeiro, os três
planetas serão consumidos pelo fogo; depois, vão colidir. Que diz
agora?
— Nada! — Cliff sacudiu a cabeça num gesto de total espanto.
— É claro que unidades da frota estão mantendo o objeto sob
constante observação. Além disso, estamos tentando destruir a
substância básica do planeta por meio dos raios laser. Destacamos
algumas baterias pesadas para essa tarefa. Só que, até agora, não
obtivemos qualquer resultado satisfatório.
— Ninguém acreditava que uma coisa dessas fosse possível,
comandante — disse o homem à direita de Villa. — Mas a realidade é
esta. O estado-maior está em reunião permanente.
— Uma Nova é algo concebível — disse Cliff, falando para si
mesmo. — Um planeta que se desvia da sua órbita, vá lá. Mas um
planeta que se transforma em uma Nova e que, além disso, é
teleguiado!... Isto é inconcebível. E quem é que controla essa
aberração?
— Seus novos amigos de MZ 4. Não estão apenas na fronteira
Norte; este novo ataque vem do Sul. E apontaram uma arma mortal
para o coração do nosso domínio: para a Terra.
— Posso ver a gravação? — perguntou Cliff girando em sua
poltrona.
— Claro! Só um momento, por favor! Na parede dos fundos do
gabinete havia dois objetos que chamavam a atenção: a enorme
projeção do domínio terrano e um anel metálico, gigantesco e vazio,
sem finalidade aparente. De súbito, todas as luzes se apagaram.
Dentro do anel apareceu uma imagem. A projeção do relatório
gravado era realizada no curioso aparelho. Inicialmente, ouviram a
voz de Lydia van Dyke. A maneira como falava revelava o seu estado
emocional e Cliff sentiu que um medo gélido lhe apertava o coração.
Depois, reconheceu as imagens. Lá estavam as cores embotadas, as
silhuetas difusas dos extraterranos... Após o incidente em MZ 4, Atan
havia-os apelidado de sapos; mas, para McLane, eram mais estranhos
que qualquer sapo gigante da Terra. E sua inteligência e recursos
técnicos eram assustadores.
De repente, a superfície no interior do anel-projetor ficou vazia, as
luzes voltaram a se acender e iluminaram seis rostos pálidos e
apavorados. Os três homens do SSG, Tamara e Cliff viraram-se e
concentraram os olhares sobre a face esgotada do coronel Henryk
Villa.
Com um tremor incontrolável na voz, McLane perguntou:
— O general van Dyke foi o meu superior imediato durante seis
anos. Resta ainda uma esperança de salvar Lydia van Dyke?
Villa ergueu-se; parecia um homem velho, alquebrado.
— Não sei dizer, McLane. A nave de van Dyke está no
hiperespaço. Tudo indica que todos os sistemas entraram em colapso,
com exceção do aparelho hiperradiofônico. Não sabemos se podemos
entrar em contato com a Hydra.
— Ainda há esperança para Lydia? — insistiu McLane.
— Esperança, ainda há! — respondeu Villa. — Mas não muito
mais do que isso!
— O que está em jogo é o destino da Terra, Cliff! — disse
Tamara. E olhou para McLane, passando a mão pela testa suada. Villa
parou diante do tenente que tinha entrado por último.
— Sim, coronel? — perguntou o oficial, com voz quase inaudível.
— Chegou a hora! — disse Villa cheio de amargura. — Plano:
DX-Alpha... Salvem a Terra!
As palavras pareciam ecoar no silêncio. Lado a lado, Cliff e
Tamara deixaram o gabinete, atravessaram, calados, a ante-sala e,
minutos depois, pegaram o expresso subterrâneo que os levou para
Wyangala. De lá, retornaram a Groote Eylandt.
***
***
A reunião estava se realizando sob o signo da indisfarçada ameaça.
Com base nos dados fornecidos pela Central de Computação, havia se
marcado um traço no interior da projeção tridimensional; um dos
pontos extremos aproximava-se do centro da esfera espacial: da Terra.
Os representantes de todas organizações que tinham algum vínculo
com a navegação espacial estavam sentados em volta da mesa de
conferência. A voz incisiva de Kublai-Krim fez-se ouvir:
— Comandante McLane! O senhor afirmou que não viu o planeta,
ou a Nova. Isto corresponde aos fatos?
Cliff encolheu os ombros e respondeu:
— Nem Tamara Jagellovsk, nem eu e menos ainda a minha equipe
ou os instrumentos notamos algo de incomum ou captamos o mais
leve sinal. Por que razão não acredita no que digo?
Um astrônomo, que exercia a função de consultor junto à
Comissão de Defesa, levantou a mão e interrompeu Kublai-Krim com
um gesto brusco.
— Nem o comandante McLane nem outra nave qualquer, que não
se encontrasse, casualmente, no setor Um/Sul 008 poderia ter visto
essa Nova. Foi avistada há exatamente trinta e seis horas pela nave
Hydra. Não falta um único sol sequer nesta região do espaço. Isto nós
verificamos em todos os catálogos existentes.
— E isso leva a que conclusão? — perguntou Kublai-Krim.
Com a empáfia que, em todos os tempos, caracterizou o tratamento
dispensado pelos cientistas aos leigos, o astrônomo respondeu:
— Somente uma estrela pode se transformar em uma Nova.
Acontece, porém, que até uma distância de quatrocentos e cinqüenta
parsec não há um único sol nesta região que tivesse mudado de
posição. Afinal de contas, essas estrelas já permanecem nos seus
lugares há alguns milhões de anos. O que aconteceu foi que
arranjaram um outro planeta e o colocaram lá. Eis a solução do
enigma!
— Outro planeta!... Arranjar um planeta!... Simplesmente
arranjar...! — Sir Arthur gemeu.
— Isso mesmo! — confirmou o astrônomo. — Sem que os nossos
aparelhos de busca o percebessem, os estranhos colocaram um outro
planeta naquele ponto. E um planeta com um diâmetro duas vezes
maior que o da Terra e cuja existência nenhum instrumento acusou...
Não me perguntem como o fizeram; se o empurraram ou puxaram, se
o tiraram à força da sua órbita e, depois, o aceleraram... Eu não sei.
Nenhum de nós sabe. E, em seguida, desencadearam uma reação
atômica que transformou o corpo inteiro em energia pura. Mas, antes
da Hydra, ninguém conseguiu ver o planeta chamejante. Suponho que
não duvidam da minha competência.
Sir Arthur e Kublai-Krim sacudiram a cabeça, mudos.
— Neste caso — prosseguiu o astrônomo — o comandante
McLane deixa de ser suspeito!
O coronel Villa meteu-se na conversa.
— Os registros no livro de bordo e o tacógrafo foram
cuidadosamente analisados. Fizemos o mesmo nas naves de outros
comandantes e nenhum desses homens viu coisa alguma dessa Nova.
E eu não creio que haja um único tripulante em toda a esquadra
terrana que, descobrindo um planeta incandescente, não comunique o
fato imediatamente.
Villa sentou-se e viu o olhar agradecido de Cliff.
Uma infinidade de fotos, diagramas, mapas astronômicos, blocos
de apontamentos e canetas estavam esparramados pela mesa. Os
videofones, ligados, comunicavam os homens com seus gabinetes e
seus secretários. Com o enorme torso inclinado por cima da mesa, o
marechal Wamsler parecia um Buda negro. Estava pensando e os seus
olhos não paravam, analisando as imagens coloridas que estavam
sendo projetadas sobre telas na extensa parede em frente à mesa. E em
todas elas aparecia a mesma coisa: o planeta em chamas.
Tamara estava sentada ao lado de Cliff. Durante o vôo, Cliff havia
lhe explicado porque o mistério parecia tão insolúvel. Agora ela sabia
qual era a diferença entre uma Nova, uma Supernova e um planeta que
ardia. Conhecia, também, o perigo que ameaçava a humanidade. A
voz de Wamsler soava como um trovão distante.
— As nossas intenções eram as melhores possíveis e, até certo
ponto, ainda são válidas. Queríamos tentar estabelecer contatos
amistosos com os estranhos. Tudo indica que eles sabem disso, por
absurdo que possa parecer. Agora, porém, estou convencido de que
eles não têm a menor intenção de manter relações amigáveis com a
Terra. Meu amigo, o coronel Villa, sabe do que estou falando. E,
tenho certeza de que também vai aconselhar a adoção de uma atitude
mais enérgica. Afinal, não se pode considerar planetas em chamas
como saudações intergaláticas. Porém, antes de pensarmos em
vingança, retaliação ou coisa que o valha, precisamos descobrir, e já,
um meio de eliminar o perigo que nos ameaça.
Kublai-Krim fez um aceno de aprovação.
O representante do governo terrano pediu a palavra. Von
Wennerstein era um homenzinho magro, com o corpo de um
adolescente espichado. Um solitário tufo de cabelo grisalho,
cuidadosamente penteado, adornava-lhe a testa calva.
— Não vamos perder tempo com discussões infrutíferas a respeito
da competência deste ou daquele! — disse, quase gritando. — Nossas
preocupações imediatas são de outra natureza. Que vai acontecer,
afinal? Alguma coisa precisa ser feita!
Kublai-Krim largou o punho sobre a mesa.
— Fala como um principiante, Wennerstein! — disse,
asperamente. — É claro que precisamos fazer algo. Mas, o quê,
homem! Até hoje ainda não lutei contra um planeta!
O sangue começou a afluir ao rosto de Wennerstein. Largou o
bloco de apontamentos sobre a mesa e disse:
— O que não podemos é ficar sentados, discutindo, e esperar pela
hora do grande estouro! O governo aguarda, com urgência, as
sugestões do Serviço Secreto e da Suprema Comissão Espacial, sem
falar nos planos das Forças Armadas Espaciais! Villa pigarreou,
sarcástico.
— O governo aguarda estas sugestões com a máxima urgência! —
repetiu Wennerstein. — Com urgência urgentíssima, se me fiz
entender!
Sir Arthur levantou as sobrancelhas e respondeu:
— Até parece que o senhor acredita poder eliminar uma ameaça
cósmica de tais proporções com meia dúzia de tiros de uma pistola
energética! Infelizmente a nossa técnica ainda não atingiu este ponto
de evolução!
Wennerstein deu um sorriso e respondeu, com um ar de
superioridade:
— O seu negócio, meus senhores, é exatamente este: dar tiros e
coisas do gênero. Portanto, o problema é seu! A propósito: pelo que eu
soube, o planeta é teleguiado. E pelos extraterranos, se não me
engano. Como e quando as Forças Espaciais vão lançar um ataque ao
inimigo? Ou será que ninguém sequer cogita de um ataque?
Wamsler fez um gesto desdenhoso com a mão; McLane ia se
manifestar mas não acreditou que sua opinião pudesse ter algum peso
nessa roda. Sir Arthur virou-se para o marechal:
— De quantas naves espaciais dispõe, Wamsler?
Wamsler sabia os números de cor:
— Cinco mil seiscentas e noventa naves: das quais dez só podem
participar de missões de apoio e outras trinta foram avariadas durante
as primeiras ações contra o planeta.
— O que dá um total de cinco mil seiscentas e cinqüenta naves! —
finalizou Sir Arthur.
— E quando podem entrar em ação? — perguntou Von
Wennerstein.
— Pouco menos da metade até hoje de noite. O resto, dentro de
quatro dias, na melhor das hipóteses.
4
***
Tinha chegado a vez dos geradores antigravitacionais. Entraram
em colapso. A imponderabilidade artificial a bordo da Hydra deixou
de existir e os três tripulantes na cabine de controle semidestruída
começaram a escorregar pelo piso agora transformado em parede com
inclinação de noventa graus. Tinha cessado a perfeita ilusão que o
campo de gravitação artificial no interior da nave vinha transmitindo
aos ocupantes, permitindo-lhes ocupar qualquer posição com a
sensação de estarem com os pés no chão. A Hydra e sua tripulação
estavam, novamente, sujeitos à ação do campo gravitacional externo.
O transmissor hiperradiofônico estava em operação, mas não
funcionava a contento. Ninguém conseguia descobrir o defeito,
ninguém sabia por que a Hydra nada ouvia e nada podia emitir. Havia
um vago pressentimento a bordo que também a última mensagem não
tinha alcançado a Terra; aquela mensagem com o relato da descoberta
dos estranhos...
Inúmeros instrumentos estavam quebrados.
— General van Dyke?
Lydia girou sua poltrona com esforço; estava esgotada. Todos três
já vestiam os trajes espaciais.
— Descobriu alguma coisa?
Morris apontou para a tubulação da instalação renovadora de ar.
— Descobri, sim. O casco foi avariado em alguns pontos; por
causa disso houve o rompimento de quatro condutores e a conseqüente
destruição de quatro tanques. O oxigênio escapou, só que para o
cosmos, não para dentro da nave.
— Verificou os manômetros?
— O suprimento dá para oitenta e duas horas. Mas temos uma
certa reserva a bordo. Como último recurso, dispomos das baterias dos
trajes espaciais.
Morris aproximou-se lentamente e observou as escalas coloridas
do transmissor inútil. Depois, olhou para Lydia van Dyke que estava
encolhida na sua poltrona semi-inclinada.
— O que está fazendo? — perguntou Morris.
— Estou tentando determinar a nossa posição — respondeu Lydia,
fazendo algumas anotações num mapa astronômico.
Ao menos a iluminação de emergência ainda estava funcionando,
criando ilhas de luz no meio da escuridão da cabine.
— É muito bom quando a gente pode se ocupar com alguma coisa
— disse Morris. O astronavegador havia espalhado as peças
componentes do comando manual e começou a examiná-las à procura
de algum defeito. Ao fim de alguns minutos, levantou o olhar e
estendeu os braços.
— Estou em condições de consertar tudo — disse, com resignação
— mas, de que adianta isso, se a cada minuto descobrimos novas
avarias na nave?
O telegrafista encolheu os ombros. A Hydra ainda pairava em
algum lugar do hiperespaço. Ninguém sabia quando e em que ponto
podiam sair desse meio. As máquinas estavam desligadas, o nível da
energia caía constantemente. E o fato de conhecerem o terrível perigo
que ameaçava todo o sistema solar tornava a situação mais
desesperadora.
— Não podemos abandonar a Hydra com auxílio de uma das
Lancet e retornar ao espaço normal? — perguntou Lydia van Dyke.
— Não! — respondeu Morris, laconicamente, e caminhou a passos
curtos pelo convés inclinado até que pôde agarrar-se na escora que
prendia o chassis do transmissor ao teto da cabine.
— O que houve? — perguntou o astro-navegador. Morris fez um
gesto com a mão, pedindo silêncio. Um pequeno sinal luminoso
piscava em intervalos irregulares. Era um indício que ondas
radiofônicas estavam alcançando a Hydra. Morris girou o botão de um
amplificador e ligou os alto-falantes.
— General! — disse, com um tom de esperança na voz. —
Impulsos!
Lydia levantou-se e, escorregando em cacos de vidro, cambaleou
até o transmissor, agarrando-se ao braço de Morris para não cair. O
astronavegador juntou-se a eles; trazia um complicado aparelho de
teste nas mãos sujas.
— É a Estação Avançada-IV? — perguntou Lydia.
— Não é, não!
Ruídos emanavam dos alto-falantes; impulsos duros em altas
freqüências. Os sinais eram transmitidos em grupos de três, os
intervalos entre os grupos e entre os próprios impulsos eram variáveis.
— Que barulheira mais esquisita! — exclamou Morris. —
Escutem só...!
Lydia van Dyke e o astronavegador ouviam em silêncio e
aproximaram a cabeça dos alto-falantes. Os estranhos sinais
martelavam o silêncio da cabine destruída como chuva de granizo. O
telegrafista girou o botão do volume; os sinais tornaram-se mais
intensos e mais ameaçadores.
— Não — disse Lydia — não são sinais de um transmissor
terrano. Isto aí são os impulsos dos inimigos! Morris, quer tentar
localizar a emissora deles?
— Provavelmente não está no hiperespaço — respondeu Morris.
— Se esses forem os sinais com os quais dirigem o maldito planeta,
então a emissora não pode estar no hiperespaço; vou tentar localizá-la,
general!
— Por favor! — disse Lydia.
Morris sentou-se e puxou o pequeno computador para perto, ligou
a alimentação de emergência e a máquina começou a funcionar,
emitindo um débil matraquear. Morris estava mais do que descrente.
Ainda faltavam duzentos e trinta e uma horas...
5
***
Um poliedro de rocha negra destacava-se na escuridão da noite do
universo pela fraca iluminação que recebia de uma esfera em brasas a
dez unidades astronômicas de distância... Um bilhão e meio de
quilômetros terranos...
Nove saliências, em forma de cúpulas, erguiam-se de outras tantas
facetas desse corpo de muitas arestas que seguia o planeta
artificialmente incandescido e o dirigia com mão de ferro. Gigante e
anão lançavam-se em direção ao sistema da Terra com uma
velocidade de cento e cinqüenta mil quilômetros por segundo. Os
sistemas propulsores já tinham sido desligados...
Nove cúpulas... Seu diâmetro media, no máximo, dez metros. Por
cima delas, uma antena parabólica de forma bizarra. Parecia uma flor
metálica provinda de um mundo que olhos humanos jamais
avistariam. Havia luz por trás das abóbadas. Difusas formas azuladas
permeadas de saltitantes impulsos cor de laranja. E ninguém via esta
estação de controle...
Uma vida estranha pulsava no interior do asteróide. Havia sido
capturado para servir de posto de comando e. de lá, os invasores
dirigiam o avanço de sua imensa e devastadora arma. Após o fracasso
da primeira tentativa de abrir uma brecha no cinturão do domínio da
Terra, iniciaram esta nova operação que tinha um só objetivo: eliminar
toda e qualquer resistência e conquistar a esfera espacial terrana. A
infiltração silenciosa em MZ 4 tinha resultado em derrota; agora,
aplicariam a violência.
O asteróide era uma mostra impressionante da técnica daqueles
invasores implacáveis. No seu interior... Numa parede de fraca
autoluminescência estava a projeção bidimensional de um sistema.
Um sol central e nove órbitas planetárias. E três pontos luminosos que
representavam as posições de outros tantos planetas. Se não se levasse
em consideração o centro absoluto do sistema, os três pontos eram
colineares. O traço do curso interceptava duas das órbitas e
tangenciava a terceira. Marte... Terra... Vênus...
A continuação do traço passava ao largo da órbita de Mercúrio e
do Sol e penetrava no espaço interplanetário onde terminava sem
transição. Na frente desse mapa, em toda extensão da sala, havia um
painel de instrumentos e quatro dos estranhos estavam manipulando
os controles...
Seres esbeltos, elásticos, feitos de uma substância leitosa,
transparente e nervurada por veios negros que pulsavam
incessantemente. As cabeças redondas estavam enfiadas em capacetes
que consistiam de uma malha de fios metálicos, coberta por finos
retângulos prateados e eram encimados por uma antena que irradiava
uma ofuscante luminosidade.
Uma segunda projeção encerrava, em escala fortemente reduzida,
o sistema planetário da Terra. Um ponto amarelado deslocava-se,
lentamente, ao longo de uma fina linha: o planeta chamejante. E em
torno desse ponto vagueavam minúsculos pontos luminosos: as naves
espaciais terranas. Mas havia um outro ponto luminoso nessa
projeção. Este movia-se paralelamente àquela reta da destruição, em
direção ao asteróide que seguia o seu escravo flamejante a uma
distância de dez unidades astronômicas. Era a Orion VII.
Grupos ternários de sons estridentes e trancados enchiam o interior
do asteróide com um martelar frenético. Os estranhos deviam se
comunicar por ondas radiofônicas ou alguma onda sonora fora da
faixa dos 40 aos 16000 Hertz. Seu metabolismo era capaz de
armazenar substâncias vitais por longos períodos de tempo, o que os
tornava ainda mais invulneráveis.
O volume das seqüências de sons aumentou de súbito. Talvez
estivessem recebendo uma mensagem... Um dispositivo circular
deslocou-se sobre a projeção e acabou por emoldurar o minúsculo
ponto que se deslocava ao lado da trajetória do planeta: o objeto veloz
havia sido localizado. E a insistência com que se aproximava do
asteróide não deixava dúvidas quanto às suas intenções hostis. Pontos
luminosos começaram a se deslocar sobre as telas, rastejando em
direção ao objeto. A Orion estava sendo cercada...
Uma flagrante inquietação apoderou-se dos cem extraterranos. As
antenas tremiam nervosamente no alto dos estranhos capacetes. Um
adversário decidido havia aparecido no campo de batalha.
***
Apenas dez unidades astronômicas ainda separavam a Orion do
planeta errante. A gigantesca bola de fogo expandia-se no espaço,
aumentando o seu diâmetro à razão de 9 mil quilômetros por segundo
e transformava hidrogênio em chamas com uma temperatura de 5 mil
graus Kelvin. Encolhido na sua poltrona, Cliff observava,
atentamente, o fulgurante espetáculo na tela à sua frente.
— Estamos cada vez mais perto, Cliff — disse o astronavegador.
— E, se não me engano, a estação de controle deles está na esteira do
colosso; visto daqui, é claro! — os olhos de Atan fuzilavam.
— Que armas empregamos primeiro? — perguntou De Monti.
— Os lançadores de energia. Apronte-os, sim?
— Entendido!
Mario levantou-se e atravessou a cabine de comando a caminho do
posto de combate. Observando a gigantesca bola de fogo, Cliff
começou a acreditar que a catástrofe não podia mais ser evitada. A
incontida brasa já estava encobrindo as estrelas. Bem fundo, no
interior da Nova artificial, aparecia o núcleo: o planeta primitivo.
Como a misteriosa energia necessitava de um constante suprimento de
matéria, ela consumia a crosta do planeta de fora para dentro. Helga
Legrelle tinha colocado os audiofones e girava os botões do
transmissor. Estava tentando ouvir alguma coisa na faixa das ondas
longas. De repente: palavras! Truncadas e distorcidas; pouco nítidas e
difusas. Mas indiscutivelmente proferidas por vozes humanas.
— ...sição ignorada... boiamos no hiper-espaço... Hydra...
suprimento de oxigênio... escasseando...
Helga fixou o sintonizador, acoplou os amplificadores e tentou
filtrar os ruídos da estática e da interferência do planeta. Depois, ligou
os alto-falantes.
— Aqui fala a nave espacial Hydra! — ribombava a voz pela
cabine. — Pedimos resposta!
Cliff quis saltar da poltrona, mas foi retido pelo cinto de
segurança. De um só golpe, abriu o fecho e, em um segundo, estava ao
lado de Helga, escutando.
— O general está vivo! — exclamou Helga, atônita. —
Descobrimos a Hydra!
— Ligue o registro de bordo, Atan! Novamente a voz cansada,
mas ainda enérgica, de Lydia van Dyke ressoou dos alto-falantes:
— Aqui fala a nave espacial Hydra. Estamos irradiando no
hiperespaço e esperamos que alguém possa captar o nosso pedido de
socorro. Sofremos pesadas avarias e ignoramos a nossa posição.
Solicitamos resposta imediata.
— Ligue a radiofonia hiperespacial, Helga! — disse Cliff e
agarrou o microfone.
— Pronto, chefe! — avisou Helga.
— Orion chamando nave espacial Hydra! — gritou Cliff.
Seguiu-se uma pausa, durante a qual só se ouviam os ruídos da
estática e o crepitar da irradiação do planeta em chamas. Depois, a voz
de Lydia van Dyke voltou, fraca e distorcida:
— Hydra chamando... quem respondeu, foi a Orion?
— Comandante McLane ao microfone — disse Cliff, nervoso. —
É a senhora, general van Dyke?
— Sim, sou eu. Parece que não estamos longe da Orion, se bem
que no hiperespaço. Não sabemos se nosso transmissor está com
defeito. Aparentemente, está funcionando bem. Qual a sua missão,
McLane?
— Missão de ataque, general — respondeu McLane, falando
rapidamente. — Está correndo sério perigo?
— Ainda não. Aquele... planeta está nas imediações?
Cliff virou-se, lançou um olhar para a tela circular e disse:
— Está, sim. A oito unidades astronômicas.
— Que veio fazer aqui? — a intensidade da voz aumentava para
depois decrescer de novo. A potência de emissão do transmissor
hiperradiofônico da Hydra parecia ser muito fraca.
— Estamos à cata do posto de controle do qual os estranhos estão
dirigindo o planeta.
Silêncio. Mais uma vez a cascata de ruídos do universo lançou
seus silvos e crepitações pelos alto-falantes.
— Prossiga, McLane. Ainda está falando?
— Temos ordens expressas de localizar e destruir o posto de
comando. O estado-maior acredita que aquele monstro possa passar ao
largo do sistema se deixar de ser dirigido.
— Não quero ofender os cavalheiros do estado-maior — disse
Lydia — mas parecem ter esquecido que um corpo com tamanho
impulso cinético a partir deste momento não vai mais errar o alvo.
Mesmo assim, ainda há uma chance.
— Duvido que seja tão simples assim — respondeu McLane. —
Não consegue retornar ao espaço normal?
— Por enquanto, não — disse Lydia. — Acredita que a tal estação
possa ser destruída?
— Não sei dizer, general. Sabe de uma coisa? Vou apanhar a
senhora e sua tripulação.
A voz de Lydia tornou-se gélida.
— Não vai fazer nada disso!
Tamara afiou o ouvido e aproximou-se. Helga olhava ora para
Cliff, ora para Tamara; pressentia a tormenta que iria desabar dali a
instantes. McLane insistiu:
— É claro que vou buscar todo mundo aí... Só leva alguns
segundos, não mais do que isso!
Apesar da recepção mais que deficiente, era possível ouvir que
Lydia van Dyke enrijecia a voz, francamente contrária à proposição de
McLane.
— Proíbo-lhe terminantemente, McLane, de preocupar-se com a
Hydra enquanto não cumprir a sua tarefa. O senhor sabe o que está em
jogo?
McLane não deu resposta. Tamara Jagellovsk parou a um passo do
comandante e disse, em tom severo:
— McLane!
Uma advertência clara e inconfundível. Após alguns segundos,
McLane chamou novamente:
— General van Dyke?
Antes que McLane pudesse proferir outra palavra, Lydia van Dyke
disse:
— Se o estado-maior estiver certo nas suas suposições, então a
única chance de sobrevivência do sistema reside no êxito da sua
missão, McLane. Ou será que isto não entra nessa sua cabeça teimosa?
Contrafeito, McLane respondeu:
— Entendi, sim, general.
A Orion aproximava-se cada vez mais do planeta. Seu aspecto era
aterrador. A incandescência igualava-se à da capa de uma estrela do
tipo G, irradiando uma ofuscante claridade amarela, ligeiramente
alaranjada. Um planeta em brasas...
***
Hiperespaço, eterna penumbra. A nave adernava fortemente. A
instalação antigravitacional estava defeituosa e gerou um campo mais
intenso e, depois, entrou, repentinamente, em colapso. Em
conseqüência disso, todos os objetos tornaram-se, de súbito, mais
pesados e os homens torciam-se nos seus assentos. Um único
movimento irrefletido os levaria até o teto da cabine. Ofegante, Lydia
van Dyke desabou sobre a mesa do transmissor.
— McLane! — sussurrou com dificuldade, os lábios quase colados
ao microfone. — Tem que destruir aquela estação de controle de
qualquer jeito. Não tem um segundo a perder. Com toda certeza está
sendo rastreado por eles!
A voz de McLane ressoou nos maltratados alto-falantes da Hydra.
— Eu sei. Já determinei a distância, mas preciso de um outro
ponto de referência. Ninguém sabe onde essa maldita estação se
encontra. É impossível vasculhar todo o trajeto!
— Escute, McLane... — disse Lydia. — A intensidade do campo
gravitacional começou a baixar — e Lydia agarrou-se no painel. — Eu
também captei aqueles sinais, são audíveis mesmo no hiperespaço.
Vou lhe dar as coordenadas.
— Formidável! — berrou McLane.
O oficial da Vigilância Espacial ergueu-se, desajeitadamente, da
sua poltrona e apanhou a larga fita na qual estavam anotadas as
coordenadas. Depois cambaleou até a mesa do transmissor e estendeu
a fita em frente ao microfone de Lydia.
— Atenção, McLane! — disse van Dyke. — Está pronto?
— Estamos ouvindo! — confirmou McLane. — O gravador está
ligado. — Pode falar!
Uma onda de esperança invadiu a mente de Lydia. Talvez McLane
pudesse destruir o posto de controle dos estranhos e depois salvar a
tripulação da Hydra...
Lydia respirou profundamente. Seus pulmões doíam. Depois, com
voz clara e pausada, começou a ler as colunas de algarismos. Mais um
impacto gravitacional abalou a nave. Lydia foi arrancada da mesa do
transmissor e atirada ao piso. Vidros estalaram e ruídos indefiníveis
vieram de vários pontos na parte inferior do disco. Parecia que o fim
da Hydra era iminente.
***
— Atenção, Atan! — avisou Cliff. — Capriche nessa gravação!
Atan acenou com a cabeça sem desviar os olhos dos instrumentos.
Seus dedos estavam prontos para mexer nos comandos e reguladores.
— Não há necessidade de código — disse a voz distorcida de
Lydia van Dyke nos alto-falantes. — Calculamos o atraso que os
impulsos sofrem no hiperespaço. Atenção que vou dar as coordenadas:
Cubo Um/Sul 008. Quatro M elevado a sete... barra 196... oito gama
vírgula dois... Entenderam? Orion, responda...
Notaram que a energia da Hydra esvaía-se rapidamente. Os dois
pequenos tambores na mesa de Atan giravam lentamente. O
astronavegador controlava o nível de registro dos débeis impulsos que
Lydia ainda conseguia transmitir. Sua voz tornava-se cada vez mais
baixa e distante.
— McLane?... Está me ouvindo?... Minha ordem expressa... atacar
imediatamente... posto... controle... inimigo...
— Primeiro eu vou salvá-los, general! — gritou McLane.
Neste instante, a comunicação com a Hydra foi interrompida. Por
alguns segundos, McLane ficou parado, imóvel, absorto num
profundo pensamento. Depois, entregou o microfone a Helga e
dirigiu-se à sua mesa. Sentou-se e girou uma pequena chave até o
batente.
— Hasso! — chamou, com voz decidida. Olhou para o rosto do
engenheiro na
tela do videofone e ordenou:
— Propulsores com carga total. Aprontar para salto no
hiperespaço. Ativar geradores antigravitacionais!
Tamara Jagellovsk reagiu com rapidez incrível. Agarrando-se com
a mão esquerda numa escora, girou-se em direção a McLane enquanto
a direita arrancava a pesada HM-4 do cinto. Apontando o projetor para
a peça central do painel de controle, Tamara disse, em voz baixa, mas
incisiva:
— Comandante, tente rumar para a Hydra e eu derreto a sua
instalação de comando todinha!
McLane ergueu-se, lentamente, respirando com dificuldade. Com
os olhos quase fechados, avançou para Tamara.
— Está querendo me impedir de salvar a tripulação da Hydra,
sua...
Tamara acenou, impassível.
— É exatamente o que vou fazer! — disse, em tom gélido.
— Eu vou mergulhar no hiperespaço — disse McLane por entre os
dentes cerrados
— e a senhora, tenente Jagellovsk, não vai me impedir de fazê-lo.
— Estou lhe advertindo, comandante!
— disse Tamara calmamente. — Não tenho o menor escrúpulo em
tornar realidade a minha ameaça!
McLane sacudiu a cabeça, estupefato e incrédulo.
— Ficou doida? — conseguiu sussurrar, com voz rouca.
— Doida? Eu? — respondeu Tamara. — Não, comandante, quem
ficou louco não fui eu!
Os olhos de McLane fuzilavam mas Tamara não desviou o olhar
um instante sequer. Apesar de sua raiva, McLane não pôde deixar de
admirá-la: essa moça não tinha medo, nem dele, nem de perigos reais.
Com voz controlada, perguntou:
— Faz idéia do que vai acontecer se derreter meu painel?
— Faço, sim. É suicídio puro, embora meio complicado, eu sei!
6
BAIXO, porém em tom firme, McLane advertiu:
— Não vá longe demais, tenente Jagellovsk!
Tamara encarou-o com uma expressão de indiferença. A ponta da
sua arma não se mexia. Suas palavras chegaram aos ouvidos de todos.
— Nessa altura dos acontecimentos — disse, em voz alta e clara
— não ligo a mais nada. Nada mesmo. Não ligo se morremos porque
a nave ficou sem controles ou se o planeta em chamas destruir o
sistema todo. Para mim, tanto faz que fiquemos boiando no espaço
sem saber quando e onde podemos pousar, ou quando o nosso
oxigênio vai acabar. O resultado é sempre o mesmo. Não estou mais
ligando a nada, comandante.
Uma longa pausa seguiu-se às palavras de Tamara; o clima de
tensão tornava-se insuportável. Enquanto isso, a Orion aproximava-se
cada vez mais daquela bola de fogo...
— Eu vou saber me defender, tenente — disse Cliff, em tom
ameaçador. — E eu tenho tão poucos escrúpulos quanto a senhorita!
Tamara largou a mão esquerda da escora e fez um gesto
conciliatório. Sua voz continuou calma e extremamente controlada.
— Comandante — disse, em tom que denotava decepção. — Que
o senhor é um cabeça-dura, é público e notório! Mas jamais eu poderia
sequer sonhar que o senhor fosse tão simplório, inescrupuloso e
irresponsável. Não está à altura do seu posto.
Cliff deu um passo para o lado. A arma continuou apontada para o
painel.
A luz cintilante do planeta em chamas iluminava o confronto. De
um lado, o comandante, o astronauta que queria salvar o seu superior;
do outro, a agente do Serviço de Segurança Galático, que o obrigava a
obedecer às suas ordens. Como centelhas de uma descarga invisível, o
ódio irreconciliável chispava dos seus olhos. Helga pressentia o
desfecho desse áspero diálogo. No momento, estava determinando a
posição da estação de controle dos estranhos, valendo-se dos dados já
armazenados e daqueles que Lydia havia há pouco fornecido. Não era
uma tarefa fácil, uma vez que os dois sistemas de referência estavam
em movimento: tanto a Orion quanto a estação dos inimigos.
Aproximavam-se com velocidade um pouco inferior à da luz.
— E tem a coragem de me dizer isso na cara, com a arma na mão?
— perguntou Cliff, tentando sufocar sua raiva.
Tamara respondeu, com voz amarga:
— Recebeu, claramente, uma única missão: tentar salvar a Terra e
seu sistema mediante a destruição da estação de controle. Mas não
recebeu ordem alguma de salvar a Hydra. O sistema solar vale mais
que a vida de três seres humanos. Não há opção; a escolha é óbvia!
— Mas... — começou Cliff, procurando as palavras certas.
— Enquanto estiver empenhado nessa missão, pode continuar com
seus gracejos bobos; não me atingem. Mas, de qualquer forma, leve a
sua missão a cabo. É o que eu tenho que exigir do senhor como
tenente do Serviço de Segurança Galático.
— Mas, o general van Dyke... — disse Cliff.
Tamara cortou-lhe a palavra.
— Está querendo contornar o problema, comandante. Acabamos
de determinar a posição daquele posto de controle e a sua obrigação,
agora, é destruí-lo. No momento, não tem a menor importância o que
acontece com a tripulação da Hydra.
— Mas...
Cliff estava cada vez mais na defensiva e começou a se
conscientizar disso.
— A Terra corre perigo. Não lhe resta muito tempo, comandante.
Cliff engoliu uma imprecação expressiva e baixou a cabeça.
— A propósito: pretende continuar aí, em pé, a... discutir comigo?
Porque, nesse caso, está se arriscando a ser aniquilado pelos estranhos
antes de emitir uma única ordem. É isso que quer?
Cliff cravou os olhos em Tamara; sua mente desanuviou-se.
Raciocinou por um instante e deu-se por vencido. Ela tinha razão.
— Guarde sua arma, tenente! — disse, baixinho.
— Com prazer! — respondeu. Tamara em tom normal. — Se fizer
o que pedi.
Com passos lentos, Cliff deu a volta pela sua mesa e tornou a
sentar-se. Seus dedos trabalharam mecanicamente, prendendo o cinto
de segurança.
— Já calculei as coordenadas da estação, Cliff! — disse Helga e
conectou o painel do comandante à sua mesa.
— Obrigado, garota! — disse McLane e começou a analisar os
valores. — Caramba!
— exclamou. — Só estão a doze unidades astronômicas de nós; e
dez UA atrás do planeta!
Com auxílio do comando manual, mudou o curso da nave. A Orion
não mais se dirigia diretamente àquele sol, mas passava ao largo,
longe da perigosa camada ígnea.
— Do comandante para máquinas — disse Cliff. — Tudo pronto?
— De máquinas para comandante — respondeu Hasso, com um
sorriso confiante.
— Tudo na mais perfeita ordem!
— Ótimo! Do comandante para posto de combate: pronto para
disparo dirigido?
— Tudo pronto, comandante! — respondeu Mario. — Fogo
cerrado?
— Vamos atirar até destruir a estação. Só tem uma coisa...
Precisamos, primeiro, encontrá-la!
Lembrou-se da sua guardiã, sorriu meio encabulado e perguntou:
— Está satisfeita agora?
Sem mudar de expressão, Tamara murmurou:
— Inteiramente, comandante! — e prendeu o cinto de segurança.
O capacete estava no piso, ao lado do assento.
Em constante aceleração, o disco descreveu uma curva, voltando a
se aproximar do gigantesco planeta chamejante. E algo mais apareceu
nas telas de radar.
— Vejam só isso aí! — exclamou Cliff, apontando para sua tela
circular.
Diante do fundo estrelado do universo, pairava uma minúscula lua,
um asteróide. Pouca coisa distinguia-se dentro daquele contorno
irregular. Os instrumentos determinaram a velocidade e o diâmetro do
objeto poliédrico. Todavia, segundos mais tarde, Cliff viu a grade da
antena parabólica apontada para o planeta errante.
— Aí está o nosso alvo! — exclamou Cliff e apertou uma série de
botões. Os minimotores, espalhados por toda a nave, se acenderam,
reproduzindo a imagem que se apresentava na grande tela do
comandante. Hasso e Mario também viam o bólido.
— Vou iniciar a manobra de aproximação e dar as ordens! —
avisou Cliff. — O registro de bordo está ligado?
— Ligado! — confirmou Helga Legrelle.
Os minutos passavam lentamente, enquanto Cliff mantinha
constantes a velocidade e o ângulo de ataque da Orion.
— Do comandante para todos — disse. — Espero encontrar forte
resistência.
— Anteparos protetores estabilizados — respondeu Hasso,
calmamente. Por um momento Cliff pensou em como apreciava a
presença a bordo de Hasso, sempre alerta, sempre prudente... Não
conseguia imaginar uma missão sem a companhia do amigo. Agora a
distância era de apenas uma UA. E faltavam 229 horas...
Os estranhos tinham cometido um único erro. Observaram a
mudança de curso daquela nave solitária e pressentiram, vagamente,
que representava uma ameaça muito maior que todas aquelas outras
que circulavam incessantemente em torno do planeta tentando destruir
a sua matéria. O minúsculo ponto aproximava-se cada vez mais.
Provido de um forte escudo magnético, que o deveria defender de
ataques e casuais encontros com pequenos meteoros, o asteróide-guia
não dispunha, porém, de qualquer arma ofensiva. E não conheciam as
armas do inimigo. Os estranhos tinham confiado na rapidez da sua
operação. Apesar disso a gigantesca bola de fogo continuava no seu
inexorável e mortal avanço. Ao mesmo tempo, os estranhos
trabalhavam, nervosamente, nos seus instrumentos. Reforçaram o
anteparo magnético e viram que o adversário estava cada vez mais
perto.
Crepitações e zumbidos emanavam dos incontáveis aparelhos do
bólido. Um dos seres levantou-se e dirigiu-se, com movimentos
felinos, a uma das projeções nas paredes. Efetuou uma série de
manipulações num estranho painel e mais uma vez um dispositivo
circular enquadrou o ponto luminoso que se aproximava. Neste
instante, um possante aparelho começou a emitir intermináveis
seqüências de sons, sempre em grupos de três impulsos. Um estridente
alarma ressoou pelo asteróide.
Uma expectativa febril apossou-se dos seis ocupantes da Orion.
Observavam os números constantemente alterados que indicavam a
distância, cada vez menor, entre a nave e o asteróide.
— Comandante para posto de combate — disse Cliff, em voz alta
e controlada, apesar dos nervos tensos. — Objeto claro e nítido.
Atenção, Mario!
— Alvo enquadrado! — respondeu Mario, calmamente.
O bólido deslocava-se, veloz, em linha reta; e a Orion ia
diretamente no seu encalço. Ao calcular o curso a seguir, Cliff tinha
levado em consideração uma possível manobra de desvio dos
estranhos. Colocariam em ação seus agregados? Por que não
atiravam? As objetivas da tela central já focalizavam o objeto sem
necessidade de qualquer ampliação e forneciam uma imagem nítida no
disco fosco.
— Hora H menos 20 segundos, Mario! — disse Cliff, com o olhar
cravado naquele pedaço de rocha negra que parecia se lançar em
direção à Orion.
— Grupos de lançadores Um e Dois prontos! — comunicou
Mario.
— Hasso? Daqui a dezoito segundos, ativar neutralizadores do
campo gravitacional. O curso vai seguir por uma curva um bocado
apertada ou por uma linha senoidal, ainda não sei!
— Unidades em ordem; prontas para ativação! — respondeu o
engenheiro.
— Só mais quatorze segundos!
Os dois corpos aproximavam-se num segundo um curso de
colisão. Se um deles não mudasse de direção, o choque frontal seria
inevitável. Os dedos de Mario estavam pousados sobre os botões dos
disparadores. As linhas nos dois dispositivos de mira cruzaram-se
sobre a imagem do bólido. Um silêncio irreal alastrou-se pela Orion.
Tamara mal ousava respirar.
— Mario... fogo!
Mario de Monti apertou os botões. Grossos jatos de fogo jorraram
dos dois projetores na parte superior da Orion. Os jogos giratórios dos
canhões energéticos lançaram os raios contra o bólido. Um espetáculo
pirotécnico formou-se sobre o asteróide quando seu anteparo desviou
a torrente de energia projetada pela Orion. Segundos depois, o escudo
protetor rompeu-se e uma língua de fogo penetrou pela fenda e
derreteu a possante antena parabólica. Os dois corpos enfrentavam-se
a uma distância de nove mil quilômetros, que se reduzia a cada fração
de segundo. Mario não tirou os dedos dos disparadores até que o
bólido se desfez num turbilhão de escombros negros, descargas
ofuscantes e extensas tochas energéticas. Por fim, uma violenta
explosão estraçalhou a central de energia alojada em um dos
fragmentos. Cliff puxou o manete. A Orion passou por cima dos
pedaços de rocha em brasa, inclinou-se ligeiramente e entrou numa
curva apertada. Logo, os dispositivos antigravitacionais entraram em
ação, neutralizando os efeitos da atração aumentada.
— Não consigo mais captar qualquer impulso — disse Helga.
— É o que eu esperava — respondeu Cliff. — Destruímos o bólido
e o planeta deixou de ser controlado pelo inimigo. Talvez ele agora
mude de curso.
— Pode ser! — disse Mario, que estava ao lado da mesa de Cliff e
esfregava as mãos. — É possível, mas altamente improvável. Em todo
caso, o bólido já era!
— Temos que voltar e tentar deter, desviar ou destruir o planeta —
disse Cliff. — Só que a Orion VII não tem poderio suficiente para
realizar qualquer dessas três alternativas.
— Hiperespaço? — sugeriu Mario.
— Sim. Programe um curso que nos leve até 3,6 UA do seu
envoltório gasoso. Entre o planeta e a Terra, compreende?
— Atan, por favor, os dados para a nossa posição! — pediu Mario,
já sentado diante do teclado da unidade de entrada do computador.
Em questão de segundos, os dois homens calcularam as
coordenadas. A velocidade da nave era ainda suficiente para arriscar o
grande salto. Instantes após, a Orion mergulhou no hiperespaço.
— Vamos permanecer vinte minutos no hiperespaço — disse
Mario. — Será que o nosso tenente do SSG arruma um café? Parti em
jejum esta noite e não estou sendo pago para fazer regime alimentar a
bordo... Já que estamos salvando a Terra...
— Pare com essas piadas de mau gosto, tenente! — disse Tamara,
abrindo o fecho do cinto de segurança. — Ainda estamos longe disso!
— No entanto — disse Cliff, e recostou-se confortavelmente —
fizemos uma estréia auspiciosa. A estação de controle foi-se para todo
o sempre.
— Pode contar com os efusivos agradecimentos de Wamsler —
retrucou Tamara; e recebeu um contundente olhar de Helga. — Isto, se
ele conseguir sobreviver! — finalizou Tamara e pôs-se a caminho para
tratar do café.
— E agora, o quê, Cliff McLane? — perguntou Helga Legrelle.
"Não sei!", pensou Cliff, atormentado. "Mas tenho que dar a
impressão de que tenho a resposta."
Começou a raciocinar febrilmente. Voltaram ao espaço normal e lá
estava aquele sol artificial, visível a olho nu... Ainda longe, mas com
uma auréola branca.
— Vou calcular o curso desse monstro — disse Atan e pôs-se a
trabalhar. Alguns minutos depois, atirou a caneta para longe e soltou
um palavrão.
— Essa maldita Nova... Não se ressentiu da falta de controle; a
massa e o impulso cinético são grandes demais. Mantém o curso sem
o menor desvio. Está se dirigindo direitinho para a órbita de Marte!
Tamara estava removendo as xícaras vazias. Parou entre as mesas
e arriscou um palpite:
— Como pode ter tanta certeza disso, Atan? Afinal, para se desviar
da sua rota, o planeta não precisa dar uma guinada violenta.
Atan lançou, para Tamara, um olhar que exprimia muitas coisas.
Lembrou-se das suas respostas e retrucou:
— Também me incluiu no rol dos idiotas?
— Não fiz nada disso! — disse Tamara.
— Não entendi sua observação.
— É que nem desconfia da quantidade de cursos que já calculei na
minha vida! É maior que o número de planetas que a senhorita vai
conseguir ver na sua!
— Portanto você não notou qualquer alteração no curso, Atan? —
perguntou Cliff, calmamente.
Atan sacudiu a cabeça e franziu as sobrancelhas. Apontou para a
tela em frente a Cliff e disse:
— Absolutamente nada!
— Helga? — disse Cliff. — Chame a Estação Avançada-IV! Tente
estabelecer contato com aquele astrônomo que prometeu verificar a
possibilidade de produzirmos antimatéria, entendido?
— Entendido, chefe.
— Muito bem! Confio em você!
A nave estava numa posição de espera, deslizando em baixa
velocidade. Dentro de sessenta minutos, o planeta atingiria o ponto
onde agora se encontrava o reluzente disco hipermoderno. Mario fitou
o rosto de Cliff com olhos alarmados.
— Chefe, quanto tempo você pretende... — perguntou.
A face sulcada de Cliff estava pálida, o suor cobria-lhe a testa.
— Por favor, Mario, fique quieto! Estou pensando!
Mario ignorou o apelo e prosseguiu:
— Quanto tempo você ainda pretende ficar aí, sem fazer nada?
Tem que compreender que a nossa ação, em si, foi um sucesso, mas
não serviu ao fim proposto! O planeta continua a se lançar contra o
sistema solar e é preciso que alguma idéia nova nos ocorra. Se não, era
uma vez Terra, Cliff!
— Helga? — perguntou McLane e acenou para Mario. —
Estabeleceu a comunicação?
Helga virou-se e apontou para uma faixa luminosa.
— Estou falando com a Estação Avançada, mas ainda estão
tentando localizar o cientista.
— Está bem! — respondeu McLane. — Continue, por favor. Eu
vou empregar tudo que temos: bombas, lançadores e barreiras
magnéticas. Só que... vai dilapidar um bocado nossas reservas de
energia!
— Se está tão descrente assim — perguntou Tamara — por quê,
então, vai empregar todo este arsenal? — estava olhando, pensativa,
para a imagem na tela.
— Quer que eu assista de braços cruzados ao avanço daquele
monstrengo? — Cliff pegou um bloco de apontamentos e começou a
rodar a caneta entre os dedos. — Ou tem algo melhor a propor,
Tamara? — perguntou, em tom agressivo.
Tamara baixou a cabeça.
— Não tenho, não! — respondeu.
— Infelizmente, eu também não tenho! — disse a voz de Hasso do
videofone.
— Então me deixem pensar um bocadinho — disse Cliff, com voz
baixa e meditativa. — Não temos alternativa! Precisamos correr o
risco.
Começou a desenhar. Primeiro, um ponto dentro de um círculo: o
planeta e sua capa incandescente", depois, traçou uma reta oblíqua,
passando pelo ponto.
— Este é o planeta e seu curso em direção a Terra — explicou.
Desenhou mais três circunferências, com o ponto por centro e que
interceptaram a reta.
— Cada circunferência eqüivale à distância de um minuto-luz —
continuou a explicar pacientemente e anotou os respectivos valores.
— São três minutos-luz do planeta até a linha mais próxima, tempo de
sobra para aprontar as armas.
Desenhou um asterisco numa das extremidades da reta.
— A grosso modo, esta é a nossa posição atual. Vamos designar a
linha extrema por alfa, a do meio por beta e a mais próxima ao planeta
por gama.
Atan Shubashi observou o desenho esquemático com ar pensativo.
— Está tudo muito bem — disse. — Mas para que as três zonas de
distância?
— Vamos empregar quinze bombas de Theknita ao longo da linha
alfa! — elucidou McLane e marcou as quinze posições.
"Vamos espalhá-las e esperar que o planeta as atinja. Não vamos
ativar a ignição porque são capazes de resistir algum tempo ao
hidrogênio incandescente e com isto, é possível que algumas só
detonem rente à superfície, o que aumenta nossas chances de êxito."
— Aliás — disse Mario de Monti. — De qualquer forma, será o
hidrogênio incandescente que vai se encarregar da ignição.
— Certo! — respondeu Atan. — E o que vamos empregar na linha
beta?
Um pouco inseguro, Cliff disse:
— Uma barreira energética. A mais potente que as máquinas
podem gerar. Talvez os projetores fiquem inutilizados, mas isso já não
vai fazer a menor diferença. — desenhou a extensão da barreira junto
à linha central. — E Hasso vai erigir um campo magnético em posição
oblíqua à linha alfa.
— Com o maior prazer! — disse Hasso e exibiu um sorriso
sombrio.
— Vamos tentar desviar o planeta por meio dessa barreira. Talvez
possamos alterar ligeiramente o seu curso, o que já seria o suficiente.
Se formos bem sucedidos, repetimos a história toda em conjunto com
algumas outras naves. Entenderam a coisa?
Cliff girou a poltrona e examinou, uma por uma, as expressões da
tripulação. Os homens mostraram-se decididos, calmos e confiantes,
sem entusiasmo exagerado; e mesmo Tamara e Helga só deram
mostras de uma ligeira inquietação.
— O que vocês acham desse plano? — perguntou Cliff,
preocupado. Tinha um forte pressentimento de que nenhuma das três
medidas traria o resultado almejado.
— É o melhor que podemos fazer! — disse a voz de Hasso nos
alto-falantes. — E talvez possamos contar com um pouco de sorte.
Atan Shubashi finalizou, em tom peremptório:
— Seja como for, vamos tentar tudo isso!
Cliff deu uma risada seca, sem alegria.
— E se nada disso der certo, perdi o meu latim! Completamente!
Entreolharam-se em silêncio. Depois, quase ao mesmo tempo,
levantaram o olhar e fitaram a estrela alaranjada que aparecia na tela
do comandante. Distava apenas 3,3 unidades astronômicas.
A Orion parou, girou cento e oitenta graus e disparou no sentido
contrário com velocidade pouco inferior à da luz.
— Se entendi direito, comandante McLane — disse Tamara,
baixinho — pretende, primeiro, voltar para espalhar as bombas?
Cliff respondeu com um aceno da cabeça.
— Mas as duas barreiras exigem a presença da nave, não é? E isto
aumenta o perigo?
— É isso mesmo — respondeu McLane, lacônico.
— E qual o curso que a Orion vai seguir após a linha alfa? —
insistiu Tamara.
— Lançamos mão do que nos resta de energia e tentamos escapar
da camada gasosa.
Tamara empalideceu; sabia o que significavam estas poucas
palavras.
— Não receia que trechos do casco possam ser afetados pelo
tremendo calor?
— Claro que receio isso! — respondeu McLane. — Mas se não
tentarmos pôr em prática o nosso plano, acabamos com a única chance
de sobrevivência do sistema solar, por ínfima que seja!
Atan estava furioso e largou a palma da mão sobre a mesa.
— Calculei e recalculei e o diabo do curso desse planeta não
mudou um milímetro sequer! A destruição daquela estação de controle
não teve a menor influência.
Com voz calma e quase fatalista, McLane perguntou:
— Tem certeza absoluta disso, Atan? Não há a mais remota
possibilidade de um erro?
— Não, Cliff, não há!
Cliff encolheu os ombros, sem saber o que dizer. Reparou que
Helga estava olhando para eleja há alguns segundos.
— Sim? O que é, garota? — perguntou e fitou o rosto deprimido
da telegrafista.
— Mantive contato com o astrônomo. Ele analisou todas as
possibilidades mas só chegou a conclusões negativas. Não há
condições de carregar a Orion a ponto de transformá-la em
antimatéria. E isto é ponto pacífico, disse ele.
Os lábios de McLane estreitaram-se numa expressão dura,
amargurada.
— Muito bem! — disse. — Então vamos tentar o que propus.
Nada mais nos resta a fazer.
A Orion parou diante do planeta em brasas. Na linha gama. E só
faltavam 228 horas...
7
***
— Com mil diabos! — gritou Mario. — A instalação magnética
está emperrada!
Estavam nervosos diante da instalação que se deformava e retorcia
em brasas. Hasso agarrou a alavanca do disparador e puxou-o para
baixo. Imediatamente, sua luva começou a derreter, fumegando. O
rosto de Hasso contorceu-se numa careta de dor.
— Partida manual! — gritou Cliff. — Arranquem os ímãs!
Virou-se apressadamente e agarrou um dos pesados pés-de-cabra
do encaixe na parede. Correu em direção ao mais próximo dos três
ímãs que ligavam a Lancet aos trilhos do poço de partida. O primeiro
golpe separou o ímã do casco da nave, mas o ímã já estava soldado ao
trilho. Cliff reparou que o pequeno trecho do hiperespaço, visível no
alto do poço, irradiava agora uma luminosidade bem mais intensa. Ao
que parecia, também esta dimensão era afetada pelas forças capazes de
transformar matéria sólida de um planeta em hidrogênio. O segundo
ímã despencou.
Como não havia atmosfera no ambiente, tudo se processou no mais
absoluto silêncio. Somente a respiração ofegante dos homens e as
palavras que trocavam eram transmitidas pelos fones dos capacetes.
Conseguiram arrancar o terceiro ímã. Hasso estava por baixo da
Lancet e arrancou o selo de uma pequena alavanca. Uma dor
lancinante atravessou-lhe as mãos queimadas quando empurrou a
alavanca para a frente. Conseguiu encaixá-la na endentação do
dispositivo de ignição e, então, uma labareda, envolta em fumaça
branca, lançou-se para o interior da câmara. Os foguetes
convencionais arrancaram a Lancet para o alto. A nave elevou-se,
cambaleante, atritando as arestas contra os trilhos. A chama reduziu-
se. A Lancet estava livre.
Um registro na tubulação de óleo sob alta pressão começou a
vibrar. Instantes após, a carcaça estourou e um jato de óleo fervente
impeliu Cliff contra a parede. Só o traje espacial salvou-o da morte
certa.
— Liguem os ejetores individuais! — gritou Mario.
Ficou parado no meio do poço, até certificar-se de que Cliff estava
firmemente agarrado por Hasso. Em seguida, ligou a ignição do
pequeno ejetor nas costas do traje e foi projetado para cima com uma
aceleração de 5 g que parecia dilacerar os músculos e nervos. Uma dor
aguda varou-lhe o peito. Segundos depois, Mario emergiu da Orion e
desapareceu no meio amarelado do hiper-espaço, a exemplo da
Lancet. Cliff e Hasso estavam sozinhos no piso do poço de
lançamento e a Orion prosseguia rumo ao planeta que já estava bem
perto. Perto demais!
— Cliff — gritou Hasso. — Ligue seu ejetor individual!
Os dedos de Cliff procuraram o botão de ignição no cinto.
Encontraram-no. Juntos, os dois homens foram projetados para fora
do poço; a mão de Hasso firmemente agarrada ao cinto de Cliff.
Pouco depois, estavam livres. Abaixo deles, a Orion afastava-se
velozmente, dirigida pelo computador. Quatro corpos flutuavam na
difusa escuridão: a Lancet e três membros da tripulação. Helga
mostrou, então, que sabia agir com rapidez e decisão. De súbito, os
três homens ouviram uma voz nos fones do capacete:
— Aqui fala Helga, na Lancet. Vejo vocês três na tela.
Respondam, por favor!
— Até que enfim! — ofegou Mario De Monti. — Está na horinha
de nos apanhar, garota! Daqui a segundos, um pedaço do universo vai
explodir e vai ser aqui por perto! Depressa!
— Hasso falando! — disse Sigbjörnson com sua calma
costumeira; apesar de um ligeiro tom de apreensão na voz. — Agarrei
Cliff pelo cinto. Parece que vai desmaiar.
— Desliguem os ejetores individuais! — comandou Helga. —
Vamos buscar vocês! Hasso e Cliff primeiro.
As minúsculas chamas dos três propulsores extinguiram-se. As
esferas de vidro na parte superior da Lancet aproximavam-se através
da luminosidade difusa. A comporta estava escancarada. Hasso
agarrou-se a um travessão e içou-se para dentro, sem largar o cinto de
Cliff, apesar da mão queimada.
— Estamos a bordo! — disse Hasso e sentiu que Helga acelerava a
Lancet.
Instantes depois, Mario alçou-se para dentro da câmara e fechou a
comporta, empurrando os trincos de segurança com as duas mãos.
— De Monti a bordo! — anunciou em voz alta. Imediatamente, a
comporta interna foi aberta. Hasso reparou que Atan já estava sem o
capacete e começou a desatarraxar o de Cliff. O rosto do comandante
estava lívido. Seus lábios estavam ficando azulados.
— Oxigênio! — disse Atan, que reconheceu logo os sintomas da
asfixia.
— Mas foram apenas alguns segundos! Hasso abriu a válvula do
seu pequeno tanque e enfiou a extremidade do tubo na boca de Cliff.
Os pulmões do comandante encheram-se de oxigênio puro.
— Vamos, garota! — disse Mario. — O negócio agora é cair fora
o mais depressa possível!
O propulsor da Orion acelerava a Lancet sem cessar. Atan tinha
calculado em que direção teriam que fugir e Helga manteve a nave
auxiliar nesse rumo. A explosão ainda não havia ocorrido, mas a
qualquer momento iria rachar aquela esquisita penumbra. Cliff
recobrou os sentidos. Ao abrir os olhos, viu o rosto preocupado de
Hasso.
Enquanto Cliff estava desmaiado, Hasso descobriu que o jato de
óleo fervente havia destruído o tanque de oxigênio do comandante.
— Onde é que estamos? — perguntou Cliff, respirando
profundamente.
— Estamos na Lancet e fugindo a todo vapor! — explicou Mario,
também já sem o capacete.
E, de repente, desapareceu aquela cintilação clara que tinha
inundado o cinza do hiperespaço. A Lancet ainda se encontrava nesse
meio sem limites e sem estrelas e se deslocava com uma velocidade
que não podia ser medida com os instrumentos disponíveis. A fuga
transcorria em profundo silêncio. Quase não ousavam respirar. Seis
olhares aflitos furavam as pequenas cúpulas de Plexol, tentando
enxergar alguma coisa naquele meio insondável...
Nada estava resolvido. Tudo ainda podia acontecer. A Lancet seria
atingida pela violenta explosão? E também a Hydra, que estava
vagando pelas proximidades? Ninguém o sabia. E os últimos segundos
se passaram...
***
Cento e cinqüenta mil quilômetros por segundo...
Esta era a velocidade de uma esfera constituída de matéria
planetária que possuía uma circunferência equatorial de uns 80 mil
quilômetros e, aproximadamente, a densidade do planeta Terra. E
estava envolta num halo de hidrogênio. Hidrogênio luminoso e
quente. Hidrogênio com uma temperatura de 5 mil graus Kelvin. E
esta esfera se projetava através do espaço tridimensional. Um sol
irradiante que se expandia 9 mil quilômetros em cada segundo. O gás
incandescente alastrava-se sem cessar. Nas telas das estações de
controle e nos telescópios da Terra o sol crescia sem parar. E
representava o fim do sistema terrano.
Duzentos e sessenta mil quilômetros por segundo...
Esta era a velocidade de um disco feito de aço, vidro e matéria
plástica e repleto de máquinas, aparelhos e suprimentos de todos os
tipos. E este disco cruzava o hiperespaço, dirigido pelo piloto
automático, em direção a um ponto fixado por cálculos matemáticos.
Para o mesmo ponto dirigia-se, também, aquele sol... ou planeta.
Aquela Nova. Era o ponto de encontro de dois objetos, provenientes
de mundos com sistemas de referência diferentes.
O planeta errante e a Orion VII...
Caso se chocassem, um destruiria o outro. E era isso que se
almejava. Mas ninguém sabia quais seriam as conseqüências
secundárias. O universo seria estraçalhado? Ou o hiperespaço seria
consumido pelas chamas? O choque libertaria forças cósmicas
inconcebíveis? Ou aniquilaria outras? E o diâmetro da explosão, que
magnitude alcançaria? Só mais quatro segundos... só mais três... dois...
um segundo... E então um relâmpago ofuscante rompeu a escuridão.
Um tremendo trovão parecia percorrer o universo de ponta a ponta
através do hiperespaço. A fenda luminosa fechou-se novamente e uma
esfera rubra apareceu no local do choque. Como num movimento em
câmara lenta, a esfera esfacelou-se em centenas de pedaços, alguns
dos quais permaneceram no espaço normal, enquanto outros
mergulharam no hiperespaço, vagueando em todas as direções e
soltando descargas fulgurantes. E todas as naves que se encontravam
no hiperespaço, num raio de cem anos-luz, sofreram as mais variadas
avarias. Eram poucas, mas a Hydra e a Lancet contavam-se entre elas.
E, como todas as regiões do universo desembocavam,
simultaneamente, no hiperespaço, ocorreram fatos inacreditáveis no
sistema solar, no setor da Terra. Porém, estes só foram constatados
depois de algum tempo e causaram a maior estranheza.
Assim, verificou-se que Phobus, uma das duas luas de Marte,
estava coberto por uma camada vitrificada de Samarium. A camada
tinha uma espessura de 192 mícrons e era ligeiramente radioativa.
A energia da detonação estendeu seus tentáculos em direção à
Lancet...
O pequeno esferóide começou a balançar e arfar ao mesmo tempo.
A violência da explosão estava começando a fazer sentir seus efeitos.
— Mario! — alertou Helga, que operava os manetes da direção
manual. — Os estabilizadores!
Mario calcou uma série de botões vermelhos. O propulsor que
tinham retirado da Orion começou a uivar numa cadência irregular.
Uma tela fosca e alguns mostradores estouraram, flamejando. Os
tripulantes agarraram-se aos assentos. Um relê foi expelido do suporte
e atravessou a cabine, zumbindo, arrancando uma apara metálica junto
ao encaixe de uma das cúpulas no teto. Mario inclinou-se sobre o
velocímetro e recuou bruscamente. No mesmo instante, a lâmpada
estalou e um estilhaço da rosca metálica atingiu o rosto do
subcomandante, cortando a pele da têmpora ao queixo. Mario soltou
um forte gemido, cobriu o rosto com as duas mãos e desabou. Helga
recorreu a um método simples para minimizar os efeitos da explosão:
determinou a direção das ondas de choque e manobrou a Lancet até
que o seu deslocamento coincidisse com essa direção. Agora, a
pequena nave era impelida para a frente pelos sucessivos impactos e
os esforços verticais eram absorvidos com facilidade.
— Que droga, também! — gritou Cliff e levantou-se de um só
pulo para socorrer Mario. Mas cambaleou sob o efeito do abalo
seguinte.
— Acelere, Helga! Acelere! — gritou Hasso, agitado.
A Lancet deu mais um salto. A força normal voltou a atuar de
repente, anulou-se e não retornou. Mas uma tremenda compressão
vertical imprensou os seis tripulantes contra as poltronas e os
pequenos painéis. Fenômenos luminosos apareceram nas telas,
instrumentos fundiram-se e vários ponteiros estavam loucos. Por cima
do caos pairava um gemido cavernoso, animalesco.
— Desligar a propulsão! — ordenou McLane, apressadamente. —
Fechar registros das baterias! Cortar energia latente... ou a nave vai
explodir!
Um novo impacto lançou Helga contra o braço da poltrona. Ela
ficou sem fôlego, incapaz de se mexer. Num esforço sobre-humano,
Hasso ergueu-se, espalmando as mãos queimadas e, com duas
pancadas do cotovelo direito, empurrou as duas teclas largas para
dentro do painel. Imediatamente, o gemido das máquinas
sobrecarregadas transformou-se num silvo estridente cuja intensidade
diminuía aos poucos. Gradativamente, a pressão normalizou-se. Ainda
havia tinidos de vidros. Depois, silêncio!
McLane lançou um olhar cansado para sua equipe e para Tamara
que estava sentada ao lado de Atan e Helga e tinha observado aquele
inferno com olhos apavorados. O olhar de McLane exprimia, ao
mesmo tempo, resignação, esgotamento e a euforia do vencedor.
Com voz grave, Tamara perguntou:
— Que foi que aconteceu, Major? Cliff baixou as mãos.
— Estávamos perto demais do local da explosão para escapar
ilesos. Um pouco mais de distância e tudo teria sido mais brando.
Atan desatarraxou o capacete de Hasso, enquanto Helga mexia na
bateria de oxigênio para aumentar a concentração na cabine. O rosto
de Mario estava ensangüentado. Havia sangue, também, em algumas
telas e em trechos do painel de controle. McLane virou-se.
— Eu tive culpa, Cliff? — perguntou Mario, falando com
dificuldade. — Eu me refiro à fracassada ejeção da Lancet!
McLane deu um sorriso cansado e respondeu:
— Não teve, não, Mario! Ninguém podia prever que a energia
invadisse o hiperespaço. Menino! Desconfio que a Orion estava
pertinho do núcleo do gigante! Depois, descreveu aquele arco enorme
e colidiu. Nós só sofremos os efeitos do gás.
Tamara abriu o estojo de primeiros socorros e retirou um objeto
em forma de pistola. Depois, umedeceu um tufo de algodão com
desinfetante e aproximou-se de Mario, que fez um gesto de
inconfundível desaprovação, olhando desconfiado para o objeto.
Impassível, Tamara limpou a extensa ferida. A pistola emitiu um leve
zumbido e uma tênue película transparente cobriu toda a parte
atingida que parou de sangrar na hora. Uma agradável sensação de
frescor fez o resto. Mario exibiu um sorriso de agradecimento.
Tamara virou-se para Cliff e perguntou:
— E a Terra? Que fim terá levado?
— Suponho — respondeu McLane, bastante preocupado — que o
nosso planeta foi estraçalhado.
Nas imediações, mas a uma distância que não oferecia perigo,
flutuava um dos escombros azulados, girando lentamente. A Lancet
deslocava-se em vôo calmo. Só vez por outra algum vidro tinia ou
uma interferência crepitava nos alto-falantes.
— E a Hydra! — quis saber Hasso e olhou para as mãos
queimadas. Tamara pôs-se a medicá-las.
— Os pobres-diabos! — disse Atan. — Se a nave deles já não
estava intacta e teve que permanecer no hiperespaço, essa tempestade
deve ter acabado com eles de vez. Devíamos tratar de encontrá-los.
— É exatamente isto que vamos fazer agora — disse Cliff, em tom
decidido. — Eu assumo os controles, Helga, e você vai procurar
estabelecer contato com Lydia van Dyke.
Helga fez um gesto afirmativo e entregou os controles a McLane.
10
***
— Estou ouvindo algo! — gritou Kensigtoon. No mesmo instante,
uma breve pancada abalou a nave. Os cacos de vidro no piso tiniram.
O ar na cabine já estava quase irrespirável e malcheiroso. A instalação
renovadora também tinha entrado em colapso.
— Alguém acostou à Hydra! — disse Lydia van Dyke. — Quando
repararem o aspecto da nave vão tentar abrir caminho até aqui. Vamos
fechar os trajes e ligar os rádios.
Auxiliaram-se mutuamente. Depois, os alto-falantes estalaram e no
mesmo momento ouviram a voz de McLane:
— O que eu vejo dá até para desanimar! Ajude-me aqui, Mario!
— Não tenha receios, major! — disse Lydia, com voz áspera e
controlada. — O conteúdo desta lata ainda está intacto!
Durante três segundos só se ouvia a respiração ofegante dos três
homens. Depois, McLane respondeu:
— Estou cansado demais para gritar.
Não acreditava mais em encontrar alguém com vida nessa
desgraça. Quantos são?
— Somos três, McLane. Onde você está?
— No pé do acesso ao lado do elevador. Ainda tem oxigênio?
— Temos, sim!
— Mas acabamos de fechar os trajes — disse Morris. — Vamos ao
seu encontro. Aqui nada mais nos prende!
A voz de Atan soava rouca. O alívio havia lhe secado a garganta.
— Então, desçam! — disse. — Pousamos a Lancet no poço um.
Os tripulantes da Hydra levantaram-se e dirigiram-se a um alçapão
rente à porta circular do elevador. Morris acionou uma válvula de
compensação e levantou a tampa que vedava a abertura. Viram um
túnel circular com uma escada vertical. E, sete metros abaixo, luzes
que se mexiam.
Morris foi o primeiro a descer. Atan e Mario receberam-no ao pé
da escada, sorrindo. Três homens fatigados entreolharam-se.
— Atenção, lá vem a chefe! — murmurou Morris.
Lydia pulou do último degrau e apertou a mão de McLane.
— Obrigada, Cliff! — disse, controlando a emoção. — Vocês são
formidáveis!
— É uma constatação que eu aceito! — respondeu Cliff, não
menos emocionado. — Há mais alguém na escada?
— Tem sim; eu! — disse Kensigtoon e saltou.
— Então, vamos depressa! — ordenou o comandante. — E já para
dentro da Lancet! Não estou me sentindo nada bem a bordo desse
balde furado. Pode acontecer algo a qualquer momento!
Corram o mais que podiam. Era um verdadeiro milagre que os
dispositivos antigravitacionais ainda estivessem funcionando. De
outra forma, haveria mais um empecilho a vencer. Por fim, a comporta
interna da Lancet fechou-se pela última vez e Cliff ligou a ignição. A
Lancet projetou-se para fora da nave destruída e estava novamente no
hiperespaço. Imediatamente, Helga começou a emitir uma série de
comunicados. Um minuto mais tarde chegou a resposta.
— Aqui fala Wamsler das F.R.E.T. Vamos resgatá-los
imediatamente. Dez naves estão recebendo, neste momento, ordem
grau alfa para se dirigirem para sua posição. Favor emitir sinal-piloto
nítido. Ao que parece, encontram-se nas imediações da Estação
Avançada-III. Desempenho magnífico, McLane. Tripulação, idem.
Volto a falar mais tarde.
Cliff desligou todas as máquinas.
— Muito bem! — disse. — Meu papel nesse drama acabou. A
partir deste momento considero-me apenas um passageiro
necessitando demais de repouso.
Lydia van Dyke não desviava o olhar dos olhos de Cliff.
Finalmente, disse:
— Eu não tinha certeza, comandante, de que ia obedecer à minha
ordem.
Com total falta de respeito, Cliff pendurou as pernas por cima do
braço da poltrona.
— A que ordem se refere, general? — perguntou, já bastante
distraído.
— De se preocupar com a Hydra somente após ter levado a cabo
sua tarefa, desde que ainda houvesse oportunidade para isso.
Cliff apontou um dedo acusador em direção a Tamara.
— Nisso, eu contei com a colaboração eficaz do tenente
Jagellovsk. Senão teria buscado a senhora antes. E, nesse caso, teria
tido a oportunidade de participar das fantásticas aventuras da nave
espacial Orion. Mas, por razões notórias, ficou privada desse
privilégio. Não é mesmo, camarada Tamara?
— Tamara basta, camarada comandante, poupe sua ironia! —
respondeu Tamara com voz gélida.
— Agora, posso voltar a ser alegre e contente! — resmungou Cliff.
— Uma nave virá e aí eu vou me deitar e dormir até dizer chega!
— Aquele episódio — disse Tamara — foi a pior coisa que já
passei com você!
— Coisas piores virão! — prometeu Atan, arreganhando os dentes.
Seu auditório tinha aumentado.
— E nunca falei mais sério na minha vida — continuou Tamara.
Lydia van Dyke divertia-se com o diálogo. — Porque, se eu não
tivesse interferido, aquela estação de controle ainda existiria.
Cliff acenava com a cabeça a cada palavra de Tamara; no
momento, tudo aquilo o deixava indiferente.
— Esta foi a sétima Orion, que o senhor conseguiu transformar em
sucata — disse Lydia van Dyke. — Agora, deve ter chegado a vez da
oitava.
— Se soubesse o quanto isso me emociona! — respondeu Cliff,
lentamente. A força de vontade que o tinha mantido em pé até este
momento começou a se evaporar.
"Se ao menos as pessoas não falassem tanto" — pensou McLane
— "principalmente as mulheres... Parecem gravadores defeituosos!"
— Provavelmente será a primeira vez que ninguém vai censurá-lo.
— É, parece!
A resposta de Cliff não passava de reflexo condicionado. E como
se tudo isso não bastasse, Helga também entrou na conversa. A
pequena cabine da Lancet não oferecia o menor conforto. Fazia calor e
o ar, apesar de filtrado, cheirava mal.
— O que é, Helga? — perguntou Cliff.
— Mensagem do Comando Operacional — disse Helga.
— Não estou a bordo! — disse Cliff. — Diga que eu saí!
Helga balançou a cabeça, num aceno compreensivo.
— Deve ser para você — disse van Dyke, com extrema
cordialidade. — As primeiras congratulações estão chegando.
— É! — disse Cliff.
Atan soltou uma gargalhada.
— Vai ver que é o chefe do Departamento de Logística exigindo
uma comunicação de perda total em dez vias manuscritas e assinada
por toda a tripulação...
— ...e com um extraterrano servindo de testemunha! — completou
Hasso.
— Nada disso! — avisou Helga. — São os nomes das naves que se
dirigem para cá. Quer que leia em voz alta?
Cliff levantou a cabeça um centímetro da tela na qual havia
estendido os braços.
— Não! — gritou com o que lhe restava de força.
— Pobrezinho! — disse Tamara. — Deve estar muito cansado,
não é?
Cliff arregalou os olhos para Tamara, espantado.
— Cansado? Eu? De forma alguma! — respondeu. — E logo a
senhorita achou isso?
A gargalhada das oito pessoas quase abalou as paredes da Lancet.
Trinta minutos depois, a primeira das dez naves apareceu na
monotonia cinza do hiperespaço. Todas as luzes de pouso estavam
acesas.
— Assumimos a manobra, McLane! — disse a voz do telegrafista.
— Por favor, imobilize a Lancet.
Cliff já estava a sono solto.
— Entendido! — disse Mario e soltou o microfone.
A Lope de Vega colocou-se por baixo da pequena nave auxiliar,
abriu o poço de pouso e acionou os campos magnéticos. A Lancet foi
sugada para dentro do poço e baixou suavemente até o fundo. De
repente, os nove tripulantes estavam envoltos em claridade, calor e
vozes.
A segunda nave a chegar tinha ordens de destruir a Hydra. Um
destacamento de sapadores ativou uma reação atômica retardada.
Depois, as dez naves partiram em formação rumo à Terra. Distância:
três unidades astronômicas.
Cliff enganou-se redondamente ao supor que a operação estivesse
encerrada. Nos próximos dias, ainda iria se aborrecer com ela.
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