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A DIALÉTICA NEGATIVA ENTRE CAMPO E CIDADE EM EÇA DE QUEIRÓS

José Carlos SIQUEIRA (PG FFLCH - USP/SP)

ABSTRACT: Antonio Candido suggests an interpretation for Eça de Queirós works, which points to the
dialectical relationship country-city. Following Candido, we propose that the first phase of the works
anchors in a positive dialectics that is characteristic of the dynamics of the capitalistic system; in the last
works, a negative dialectics shapes the novels structure. Our objective is to perceive the nature of that
negative dialectics and their determinants.

KEYWORDS: Eça de Queirós; Antonio Candido; country-city; negative dialectics.

Em 1945, por ocasião das comemorações do centenário de nascimento de Eça de Queirós,


Antonio Candido empreendeu uma tentativa de interpretar, de um ponto de vista unificador, o conjunto da
obra ficcional daquele escritor. O ensaio resultante1 possui duas virtudes principais: além de contribuir
para a compreensão da produção do romancista, procura resgatar a reputação de Eça que era acusado de
“virar a casaca” em suas últimas obras ao propor soluções reacionárias para a sociedade portuguesa –
dando supostos motivos para o sectarismo salazarista usar esses livros como propaganda ideológica.
Para tanto, Candido defende que na ficção de Eça pulsa uma tensão entre o mundo urbano e
o mundo rural que, além de expressar a realidade portuguesa oitocentista, também estrutura cada livro
conforme a perspectiva adotada pelo autor. Assim, quando o foco do escritor se dá a partir de um pólo,
seja o campo, seja a cidade, essa decisão empresta uma configuração e um sentido próprio a suas obras.
Podemos afirmar que se trata de um habilidoso jogo dialético, pois do confronto entre esses
dois pólos resulta uma síntese que, simultaneamente, preserva e supera o conflito entre os dois mundos.
Que síntese é essa? O crítico brasileiro demonstra que quando a perspectiva de uma obra é a da cidade o
texto ganha uma natureza revolucionária e uma crítica mordaz, influências das características urbanas:
mobilidade, velocidade, progresso. Segundo Candido, isso ocorre nas obras da primeira fase: O crime do
padre Amaro e Primo Basílio.
A partir de Os Maias, e nos últimos romances, o ponto de vista passa a ser o do campo e
com isso o movimento de cada romance passa a ser outro. Resgatando valores históricos da vida rural
lusitana e contrapondo-os aos vícios e às vicissitudes da existência urbana, o escritor – ao assumir o
timing da pulsação do campo, as qualidades de seu modo reflexivo devidas à proximidade com a natureza
– vai substituindo a crítica por um desejo de entendimento e reflexão sobre a vida social lusitana: “A
ilustre casa é o seu romance menos proselitista e mais compreensivo”, diz Candido (op. cit., p. 45).
Dessa forma, Eça não estaria abandonando os seus ideais socialistas, mas transformando os
romances de panfletos em expressões líricas de uma realidade que possuía qualidades e potencialidades,
fazendo que “seu socialismo e sua irreverência acabassem por ser, não vencidos, que nunca o foram, mas
equilibrados, compensados, pela irrupção dos antigos valores recalcados” (p. 50). Assim o crítico afasta a
pecha de reacionário atirada contra o autor de Os Maias e abre uma linha de análise das mais instigantes
sobre o modo de produção literário desse escritor.
Se compreendemos bem a linha de pensamento de Candido, é possível afirmar que há um
movimento pendular na obra de Eça, que passa de forma contínua do pólo urbano para o rural,
produzindo assim um conjunto de obra com uma grande organicidade. Seria difícil diminuir a importância
do ensaio de Candido: todos os que se defrontam com o estudo da ficção eciana são obrigados a uma
queda de braço com esse texto – ele exige uma atenta reflexão, se o desejo for o de encontrar novas pistas
no caminho já aberto. Agindo desse modo, supomos que o movimento pendular entre o mundo urbano e o
rural, detectado por Antonio Candido no complexo da obra de Eça, corresponde ao movimento que
também se processa na vida social de Portugal no final do século XIX; melhor dizendo: esse percurso de
Eça não revela apenas uma idiossincrasia de autor, mas acompanha um ciclo da própria vida portuguesa.
Arriscamos mesmo dizer que é essa correspondência que faz a grandeza do escritor e demonstra a argúcia
do crítico. Nosso intuito é detalhar o paralelo e ampliar suas conseqüências, procurando assim ganhar
alguns passos na direção de um conhecimento maior do sentido da arte queirosiana.

A dialética campo-cidade

1
“Entre campo e cidade”, in Tese e antítese.
A relação entre o mundo rural e o mundo urbano é historicamente determinada, o que quer
dizer que se apresenta de maneiras diferentes conforme o desenvolvimento das forças sociais de uma
certa sociedade em um momento definido. Entretanto, podemos depreender da História um certo padrão
no processo de estabelecimento do vínculo que liga a cidade e o campo. Os dois pólos constroem uma
convivência tensa, em que os interesses entram em conflito. O enfrentamento tende para uma superação à
medida que um dos pólos torna-se hegemônico e domina o outro e, dessa forma, o lado dominado
submete-se aos padrões, tempos e valores do modo dominante. O nível de superação atingido passará por
outras mudanças que exigirá constantes acomodações e assim sucessivamente. Podemos denominar esse
moto contínuo de relação dialética entre o campo e a cidade.
Para os fins que temos em mente, será suficiente nos referimos a essa relação em dois
momentos definidos: durante o feudalismo e na fase seguinte, a capitalista, das sociedades européias.
O modo de produção feudal manteve sua estrutura amparada numa agricultura pouco
diversificada e de baixa produtividade, cuja sede naturalmente era o campo. Nessa situação, a cidade nada
mais era do que um apêndice desse sistema, restringindo sua participação a funções administrativo-
burocráticas, religiosas e a algum comércio2.
Na passagem do feudalismo para o capitalismo, inverteu-se a relação de forças e
gradativamente a cidade tornou-se o pólo dominador, submetendo o campo aos imperativos de sua
dinâmica industrial. O mundo rural passou a ser fornecedor de matérias-primas, alimentação e mão-de-
obra para as fábricas localizadas nos centros urbanos3. É lógico que essa transição não foi indolor e houve
uma acirrada resistência por parte das elites rurais em manter o poder social, causando os períodos em
que um equilíbrio dinâmico entre os dois modos de vida foi experimentado. Isso ocorreu na Inglaterra,
bem como na França, Holanda e demais países que se anteciparam no processo de industrialização.
Nossa rápida excursão histórica poderia nos levar a crer que é nesse momento de transição
que vamos encontrar Portugal em meados dos oitocentos. Certamente foi assim que avaliou Antonio
Candido, em seu ensaio já citado, tirando daí as conclusões sobre a obra de Eça. Ou seja, o romancista
revela em sua obra o impasse do momento de transição que a sociedade portuguesa experienciava,
passando de uma posição para outra na relação campo-cidade da mesma forma como a vida social do país
se alternava entre os dois pólos. Na verdade, não é bem isso o que acontecia naquele momento, e aí talvez
esteja uma possível contribuição para a melhor compreensão da mudança de tom ocorrida na ficção do
nosso escritor.

A otimista dialética hegeliana e sua irmã degenerada

Se concordássemos com a análise acima, Portugal em um momento de transição da


predominância do campo para o domínio urbano, pareceria evidente que as obras iniciais de Eça estariam
mais adequadas à situação – pois sabemos que é a cidade que representa o avanço social e as
possibilidades revolucionárias. E, por isso, o autor se mostraria naqueles romances mais antenado com
seu devir histórico.
Essa tentação de compreender assim o processo social e, portanto, sua expressão literária,
sustenta-se num sentimento otimista em relação ao movimento dialético, certamente uma predisposição
herdada da filosofia hegeliana que via nas contradições, nos conflitos, momentos sempre indicativos de
superações positivas, que encaminhavam a humanidade para um alegre final da História.
O marxismo e, principalmente, sua vulgarização encarregaram-se de dar matizes
revolucionários a esse otimismo, o que levou a muitos equívocos em estratégia política, senão mesmo a
várias tragédias. Por isso, o pensamento de esquerda ficou sempre na espreita de uma contradiçãozinha
para profetizar o fim disso ou daquilo, numa verdadeira fé em que o processo dialético resolveria
beneficamente os impasses, empurrando-nos para cada vez mais perto da utopia.
Foi necessário que Adorno4 colocasse um caroço de azeitona na empada dialética para que
o otimismo exagerado e, muitas vezes, infundado cedesse lugar a uma atitude mais realista. Em poucas, e
insuficientes, palavras, poderíamos dizer que em determinadas situações as contradições não se resolvem,
sustentando condições injustas e dolorosas por um tempo indefinido – processo que Adorno denominou
de dialética negativa. Sérgio P. Rouanet resumiu da seguinte maneira esse conceito: “[ela é] capaz de
manter a contradição em toda a sua virulência, uma dialética sem síntese, em que os dois pólos
permanecem inconciliáveis”5.

2
PIRENNE, H. As cidades da Idade Média.
3
DOBB, M. A evolução do capitalismo.
4
Dialéctica Negativa.
5
O sertão da dialética negativa, p. 12.
A dialética negativa dos países periféricos

Países como Inglaterra e França conseguiram realizar suas sínteses nos conflitos campo-
cidade, e suas histórias sociais revelam procedimentos para o encaminhamento de um predomínio urbano
incontrastável. Não foi isso o que aconteceu nos países de industrialização tardia. Nações européias, que
tiveram sua passagem para o capitalismo retardada, encontraram um cenário diferente para concretizarem
suas mudanças. Num verdadeiro paradoxo histórico, o fato de haver sociedades já industrializadas, com
seus sistemas produtivos plenamente capitalistas e uma burguesia definitivamente no poder, representou
uma barreira impedindo os países retardatários de alcançar o mesmo estágio. “As economias periféricas,
enquanto dependentes, são mero prolongamento do espaço econômico das economias centrais e não se
poderiam considerar como economias nacionais”6, afirma o economista João Manuel Cardoso de Mello
ao descrever a situação dos países atrasados industrialmente.
Sendo assim, os países periféricos sofrem em seu seio de uma dialética negativa, na qual a
relação campo-cidade não atinge uma síntese satisfatória, pois, de um lado, o mundo rural permanece
dominante, em virtude de sua produção estar voltada não para alimentar um parque industrial urbano
interno, mas funcionar como fonte de matérias-primas para os países centrais, amplamente
industrializados. Por isso, as cidades das nações periféricas simplesmente reproduzem cópias da vida
urbana das nações desenvolvidas, mas desprovidas de qualquer substrato numa realidade econômica que
as sustentem. A cidade assim volta a ser um apêndice do mundo rural, local elegante de convívio das
elites agrárias, cuja semelhança com as capitais dos países centrais possibilita a satisfação das
necessidades de “modernidade” dessa elite conservadora.
Ou seja, a pseudomodernidade das cidades contrasta com o arcaísmo do campo pré-
capitalista, porém não há forças dentro do país para mover o conflito entre esses pólos na direção de uma
superação que alcance um novo patamar nas relações sociais.
Em Portugal, essa condição chega a ser emblemática. Prova disso é a famosa passagem do
livro Princípios de Economia Política, de David Ricardo, economista do séc. XIX reconhecido como
sucessor de Adam Smith, na qual o autor exemplifica sua teoria das vantagens comparativas através do
exemplo do comércio entre Inglaterra e Portugal, em que o primeiro exporta tecidos ao segundo, e este
lhe fornece vinhos7. Um vende produtos industriais, o outro mercadorias agrícolas, ou: produtos urbanos
versus produtos rurais. Essa troca é amplamente desigual, pois reforça os setores mais atrasados dos
países periféricos, enquanto transforma estas nações num excelente mercado consumidor dos bens dos
países industrializados, impedindo o processo de industrialização da periferia. Idêntico processo se
repetiu no mundo todo: nos EUA, o sul agrário era presa desse esquema em suas relações com a
Inglaterra; no Brasil, importava-se até pregos para a construção civil, ao passo que se dependia
exclusivamente da venda de café para manter a balança comercial.
No entanto, nada disso se apresentava à consciência coletiva como um processo deletério.
Havia uma ideologia que encobria o caráter prejudicial dessas relações econômicas, e as pessoas em geral
acreditavam que as disfunções nacionais dos países periféricos eram passageiras e suas resoluções
dependiam somente de políticas internas e decisões governamentais. Os próprios economistas assumiam o
papel de encobridores dessa realidade, ao reputarem como naturais esses processos comerciais, como era
o caso de David Ricardo, já citado, que, com sua teoria, persuadia a todos que ambos os países, Inglaterra
e Portugal, saíam ganhando em suas trocas bilaterais.

A crítica social em Portugal no séc. XIX

A escola realista portuguesa não escapou à ideologia liberal de seu tempo, e quando assume
uma posição de combate ao atraso nacional, foca suas baterias na burguesia lusitana, vista como
responsável exclusiva dos problemas do país. É nesse contexto que podemos entender a produção inicial
da ficção queirosiana. Retornando a Candido, podemos afirmar que Eça expressa nos primeiros romances
a crença numa dialética positiva, dentro da qual a relação campo-cidade atingiria uma síntese
progressista, com a qual o país poderia caminhar para uma maior justiça social e, quem sabe, mesmo
chegar ao socialismo defendido por sua geração.
O que podemos deduzir, por meio das análises anteriores, é que essa luta é inútil: a solução
do problema português, assim como a de todos os países periféricos, não está no interior da nação, mas no
espaço globalizado das transações econômicas regidas pelos países centrais. Bater no burguês nacional
não é só contraproducente, como também é alienante, já que se perde de vista os verdadeiros fatores dos
problemas portugueses.

6
O capitalismo tardio, p. 10.
7
P. 101 e ss.
Quando Eça inicia a última fase de sua obra, ele havia sido promovido para o cargo mais
importante de sua carreira diplomática, cônsul em Paris. Era o coroamento de uma peregrinação
profissional iniciada em Cuba, e que o havia levado também aos EUA e à Inglaterra. Sem sombra de
dúvida, a experiência internacional e diplomática colocava o escritor num ponto de vista privilegiado para
compreender, ou ao menos pressentir, as articulações socioeconômicas acima resumidas. Um dos indícios
dessa afirmação em sua obra ficcional é a redação do conto Civilização, cujo sugestivo título deixa
perceber que o foco das preocupações temáticas do romancista estava se ampliando para fora do escopo
de Portugal.
Passando para uma avaliação da produção jornalística do mesmo momento, somos levados
a concluir que a atenção de Eça estava bastante inclinada para a problemática neocolonialista e suas
repercussões políticas e culturais. Em suas crônicas, de forma acentuada nas publicadas na Gazeta de
Notícias do Rio de Janeiro, parece-nos que nenhum detalhe da intrincada relação entre as potências
européias e suas pretensões imperialistas passavam despercebidas de seu crivo analítico e intensamente
crítico.
Pensando dessa forma, somos levados a alterar o movimento dialético proposto por
Candido: em vez de explicarmos as diferenças entre as duas fases da obra de Eça em termos de uma
mudança no foco de visão da vida urbana para a vida rural – em conformidade com a aceitação de uma
dialética campo-cidade –, podemos concluir que, em realidade, a obra de Eça assume na sua fase final a
compreensão de uma dialética negativa instaurada em seus país, e para a qual não havia uma solução
interna possível, nem alguma saída externa no horizonte.

O último Eça: um escritor do século XX

Se for assim, poderemos concluir que o romancista português esboçou nos últimos livros a
natureza de um processo social que só várias décadas mais tarde seria conceituado nos termos de uma
dialética negativa (Adorno, 1966), e compreendido economicamente através da teoria da dependência
(Cardoso e Faletto, 1970). Uma antecipação que não deve ser vista como algo de extraordinário, pois a
arte possui essa virtude – como declarou enfaticamente Pound: “os artistas são a antena da raça”8 –, mas
que necessariamente lança novas luzes sobre a avaliação dos dois últimos romances queirosianos.
Em primeiro lugar, afasta-se a sina reacionária sobre nosso autor: sua crítica estava mais
afiada do que nunca, revelando uma situação histórica de difícil percepção naquele momento e que
denunciava seu dramático impasse (se os contemporâneos não o compreenderam, também não é algo de
se espantar). Em segundo lugar, essa reflexão e essa crítica só puderam se expressar dentro de uma
configuração artística pertinente, uma forma literária obrigatoriamente diversa daquela dos primeiros
romances; o que nos força a analisar as últimas obras não como romances naturalistas ou pós-românticos,
como muitos já o fizeram, mas certamente como formas também antecipatórias de novos padrões de
escrita, que só amadurecerão com as novas gerações do século XX.
Sendo assim, devemos nos propor uma leitura com olhos mais modernos, até mesmo
modernistas, das duas derradeiras obras ficcionais de Eça de Queirós, procurando nelas não mais o autor
desertor das hostes radicais, e nem mesmo o acento compreensivo defendido por Candido; mas sim a
clarividência de quem, intuitivamente ou não, transcendia a capacidade analítica de sua época e
desvendava pela arte as contradições inconciliáveis de sua sociedade e, mesmo, da civilização ocidental.
Apenas para um ensaio das possibilidades de compreensão que se abrem com as propostas
de análise aqui apresentadas, poderíamos interpretar o desfecho da Ilustre Casa (a partida de Gonçalo
para a África) como uma indicação do autor de que as soluções para Portugal não se achavam dentro da
nação. Não mais no sentido que a crítica tradicional dava à passagem, de uma adesão de Eça a uma
política neo-imperialista para Portugal; mas sim como uma charada sobre a situação periférica da nação
lusa e de sua dependência ao esquema sociopolítico imposto pelos países hegemônicos. Se lembrarmos
bem o final daquele livro, o sucesso de Gonçalo é individual, não extrapola para a esfera da nação, que
permanecia estagnada, numa clara demonstração que o projeto do personagem não refletia as
possibilidades do país.
O mesmo acontece com Jacinto, em A cidade e as serras, cuja felicidade final pode ser lida
com uma síntese dialética bem sucedida para o indivíduo, o qual em sua própria vida conseguia conciliar
os pólos antagônicos da relação entre o “campo do país periférico” (Tormes) e a “cidade do país central”
(Paris), já que ele, apesar de português, configurava o burguês bem-sucedido dos países industrializados –
aquele que acumulava capital a partir da submissão do campo dos países periféricos aos interesses
centrais. Perceba-se, nada de fundamental mudou na vida das serras portuguesas, mas Jacinto, em sua

8
ABC da literatura, p. 77.
vida pessoal, pode integrar os confortos da metrópole com o modo de vida rural que sustentava sua
fortuna.
Por fim, se essas interpretações tem fundamento, elas podem explicar também a forma dos
dois romances: na Ilustre Casa, o magnífico jogo da narrativa dentro da narrativa pode ser índice da
dialética arcaico-moderna, imposta pela dominação dos países centrais aos periféricos; enquanto que nA
cidade e as serras a escolha de um narrador em primeira pessoa, único entre os romances ecianos, possa
traduzir a incapacidade do sujeito, posto num mundo administrado por forças tão amplas e anônimas, de
compreender as determinações que mantém condições sociais injustas e absurdas.

RESUMO: Antonio Candido sugere uma interpretação da obra queirosiana por uma dialética da relação
campo-cidade. Seguindo Candido, propomos que a primeira fase dessa obra ancora-se numa dialética
positiva, própria da dinâmica do sistema capitalista; nas obras da fase final, uma dialética negativa
enforma a estrutura dos romances. Nosso objetivo é perceber a natureza dessa dialética negativa e seus
determinantes.

PALAVRAS-CHAVE: Eça de Queirós; Antonio Candido; campo-cidade; dialética negativa.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ADORNO, T. W.. Dialéctica negativa. Madrid: Taurus, 1975 [1966].


CANDIDO, A. “Entre campo e cidade”. In: Tese e antítese. São Paulo, Nacional, 1964.
CARDOSO, F. H. e FALETTO, E. Dependência e desenvolvimento na América Latina: ensaio de
interpretação sociológica. R. Janeiro: Zahar, 1970.
DOBB, M. A evolução do capitalismo. R. Janeiro, Zahar, 1981.
CARDOSO DE MELLO, J. M. O capitalismo tardio. S. Paulo, Brasiliense, 1982.
PIRENNE, H. As cidades da Idade Média. Mem Martins, Europa-América, 1989.
POUND, E. ABC da literatura. S. Paulo, Cultrix, s/d.
QUEIRÓS, E. Obra Completa. R. Janeiro, Nova Aguilar, 1986.
QUEIRÓS, E. “Textos de Imprensa IV”. In: Edição Crítica das Obras de Eça de Queirós. S/l, Imprensa
Nacional-Casa da Moeda, 2002.
RICARDO, D. Princípios de Economia Política, Coleção Os economistas. S. Paulo, Abril Cultural, 1982.
ROUANET, S. P. “O sertão da dialética negativa”. Folha de S. Paulo, caderno Mais, 01/12/2002, p. 12.

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