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onde todo mundo jogava o que queria, omega 8 constraira prac, Cometou: porque conelir mes smo, #80 pefeto seguinte conch, Ou sea én: auele daft ate a construgi da praga ma “de des anos 8 passeram.. ri A praga € bonita ela disse, passed os hos os redo —E, bonita ela 6, ndo posso dizer que no. Mas. de io termina, astra oreo da reno at Cthow as hora no relgio. —Acho que é bom a gene ir dando — dis- s6.— Aindatemos de atrumar as nosis coisas no hotel, e até sida do Gnibus 0 tempo jimbo Hesse evantaram foram, devagn fazendoo enninho de vl, ‘s primeirassombres da nite jévinham che- sando—e o sabi, incanvel, contnsava a cantar “tase sabi etd animado ~elacsse, Ginou,sunpreso, para ela — e, num impale, abraqona. 0 que foi? — ela perguntou. — Nada ~ ele disse, e que eu te amo. ‘onal da alameda, le paroue vltow ce: teve vontade de fazer um gesto de denpedids — dspe- did do veho campo, do mening ¢ de um tempo aque de havia mato «para sempre se fra — mae chou que o gest seria meioricculo, endo fez. (© que cada um disse "Sei, sel, claro, Bom sujeito, Ele vem sempre i, banca, Amanhi mesmo ee... Como. er- fe. Santo Deus.” *Caridoso, muito carideso. Tanto ele quanto a Um casal de comunhio frequente Eles vi- jam squi,& capela da irmandade; eles preferiam aqui air catedral. Ee era um sujeto humilde, ar de rice. Os dois sempre mandavam rou- i usadas para distribulrmos entre os mais ne- jtados; roupas dees, do casa, e também das jancas, do mening e da menina, A gente nunca ria imaginar uma coisa deseae. Estamos mui iehocadas” "A gente no conhece ninguém: essa é a con- jo que eu tio, A gente nfo conhece ninguém. eves nem a prépria pessoa se conhece. Somos ybando de desconhecidos —uns para os outros fa um para si mesmo." 9 "Vela 6: ele era a pessoa mais equilibrada aqui, nna empresa; a mais equilibrada. A gente nlo dava "um passo sem ouvir a opinido dele. agora... NZo pra acreditar, né2.." "Bes sempre me trataram bem. Eles me tr tavam como se eu fosse uma pessoa da fami fe ndo uma empregada, Fra um casal que vivia fem harmonia, Nunca vi um casal combinar tio bem. Parecia que eles tinham nascido um para o ‘outro. N5o vou dizer que eles nio tinham de vez fem quando uma rusguinha, Tinham. Mas qual o casal que no tem? Vocé — eu estou vendo que vocé também & casado—, voe@ vai me dizer: no 6 assim?" "Quem? Como é? Voce estébrincando. eu Tia noticia no jornal. No, eu nio sei dizer muita coisa. Fle nfo vinha tanto aqui, 20 restaurante; uma ver ou outra s6. Educado, isso eu posso dizer que ele ers; uma pessoa educada, ‘Mas nfo era de muita prosa; no, isso ele nfo era. Era um cara meio fechado, entendeu? Um cara." “sabe, meu querido? Vocé éjovem ainda, mas aprenda uma coisa: oser humano é como uma flo- testa: vocé olha de fora, ea floresta é aquela ma- 20 ha; mas voot entra, e 1 dentro voc® da com 5, cobras, escorpides... assim, meu fitho, ¢ Jhumano é assim. For fora, uma coisa amével deptro, uma coisa temivel, Ou, como dizia a Jha na escola, nos meus tempos de menina: foro, bela viola; por dentio, po bolorento, De a que esse acontecimen:o nio me surpreen- tanto. Pis eu sei que do ser humane tudo se ye esperar: das melhores és piores coisas, Gra- ‘ye isso, Voc’ ainda val se lembrar disso muitas eres em sua stividade. “f, sim, nés fomos colegas de faculdade, Con- fesso que eu estou pasmo. Um sujeito como ele, lum sujeito que tinha tudo na vida, tudo 0 que luma pessoa pode desejar:dinheiro, mansio,car- 10 importado, uma linda mulher, dois flhinhos ‘adordveis.lso, além das amizades, do prestigio, das honrarias.” “Bu fiquel sabendo, me contaram. Limpel, eu limpeiojardim algumas vezes, € de admirar, né? Por que um cara desses far uma coisa dessa‘? Bom: nfo vou dizer que eu sel; quem sou eu pra dizer isso... Nem quero falar mal de ninguém, Mas... Deus que me perdoe, mas uma mulher como aquela, uma mulher... vou te contar uma coisa, mas voc8 nio vai pér isso no jomal, nlo, 2 hhem?.. Um dia eu estava lé, arrumando o jardima, ea eu cheguel perto da janela. Ela estava lé den- tuo, sozinha, de camisola, uma camisola trans- ‘Parente e sem soutien: e af deu pra ver tudo, o8 peitos.E vou tecontar...Rapaz... Fu nunca vi nada ‘to bonito assim... Mas af, esa hora, ela me vit; € vocé acha que ela procurou sair ou virar para outro lado? Acha? £ 0 que ela devia ter feito, né? ‘Mas nao fol isso o que ela fez: ela deu um sortiso, la deu um sorriso para mim. Eu fiquei sem saber conde esconder a cara, Figuel morrendo de vergo- nha, Af eu ful culdar do meu servico, Mas de noi- te, em casa, eu fiquei pensando naquilo, na mu: Ther, naquele sorriso... Fiquei pensando e... Cara, te juro: aquela mulher estava a fim de uma... Juro que estava... Com um jardineio?, vocé pode dizer Por que nio? E essas madames ai que pagam 03 tubes para esses caras de programa, esses que ‘vdo em casa, esses dos clasificados? Mas af, dro 2, af eu no veltei mais lée ai eu néo vi mais a ‘mulher; nem ela, nem o marido, nem ninguém. E ‘ontem eu fiquel sabendo do que aconteceu. £ isso. ‘Mas no vai pér isso no jornal, nfo, hem? S6 es- tou te contando, Pra mim... Nio sei, nio, mas pra ‘mim 0 que ha por trés disso, do que aconteceu, & sso aqui, otha: chifre, cara. T& entendendo? Chi- fre. Daqueles bern grandes e tortos” 2 “Eros e Ténatos: as pulsdes da vida e da morte, estéo no amago de nosso ser, em toda e qual- er pessoa. O assunto é muito complexo para eu senvolver aqui agora, nesta entrevista, mas eu bordo em profundidade no meu novo ivro, que devo langar no segundo semestre, provavel- pte em agosto. Als, eu ficaria muito grato se jornal pudesse dar, desde jé, uma nota” "Por qué? Seilé, meu chapa, Isso acontece todo 1 no meu bairro e ninguém diz nada nem saber por qué, Nem nenhum repérter vai 14 fazer perguntas. Se vai, € xepérter de policia, ‘yer um bacana e faz 0 que fea e fica todo lo ai: por qué? por qué? Ora, por qué... Foda- porta. Foda-se o cara e a familia dele e tudo 0 is. A gente tem mais é que comemorar. Esses 8 86 sabem explorar a gente. Eles ld no bem- fea gente aqui pastando, comendo capim.” *Meu amigo, vou s6 te contar uma histéria: a ria do Tidido, meu querido Tio Experidio,1é Interior, na rosa, O Tio morava numa fazenda, mulher, Depois que a minha tia morreu, ‘eontinuou morando Is, morando sozinho. Isto fe um empregado. A fazenda ndo era grande, 8 alqueites. Foi o empregado que testemu- fa cena e contou depois para os flhos do Tio, a dois rapazes, que moravam na cidade, Homem pacato sujeto de boa paz estavaléo Tio uma tar de, na fazenda, Ai, de repente, o empregado, que se achava no quintal, ouviu uns estampidos, se assustou e foi correndo ver o que era. Escondido. atrés de uma mangueira, ele pide testemunhar, apavorado, a sequéncia da cena, Pra reeumir: meu tio pegara a espingarda, carregara e saiu dando tiro em tudo o que viu pela frente: vaca, porco, ‘© cavalo, o cachorro, Nem o gato escapou. Nem © galo. Ele deu tiro até em passarinko na érvo- re, ‘Parecia que ele queria acabar com o mundo’ ‘como disse o empregado, Foi um morticinio, uma coisa que ninguém na regio nunca vira © que até hoje eles comentam. Por qué? Por que mes to fez ‘sso? Ninguém soube, nem ninguém até hoje sabe, ‘Meu tio nunca deu nenhums explicaglo, Aquele dia, no nal da tarde, quando meus primos,avisa- os pelo empregedo do que acontecera, chegaram 8 fazenda, encontraram o pal sentade no slpendre da casa, pitando tranquilamente seu cigarrinho de palha, como se nada, absolutamente nada ti- ‘vesse acomtecido. Esté certo, vocé pode dizer que ‘esse sujeito agora ndo matou bichos: ele matou a rulher e os dois filhos, e, sinda por cima, suici- dou-se, Mas, pensando bem, eu née veja muita Gliferensa, Vooe ve?" Céu estrelado ‘Mesmo sabendo que naquela noite — véspera ‘Ano-Novo — a estrada nao teria muito movi fo, admirava-se do tanto que ela estava cal- | A propria noite, carregada e atmeagadora de os dias anteriores, irradiava agora a mes: jealma, com seu limpidoe estrelado céu. bom dirigir assim, tranguilo, sem pressa, is de mil correrias para saira tempo de che- Antes da meia-noite, quando todos os da fa- se reuniriam em sua casa para comemorar sagem do ano, (Olhou as horas: quinze para as dez. Naquela icha, devia chegar as onze e meia, mais ou 8 Podia chegar até antes, se acelerasse; mas, io ia acelerar, no ia carrer. *Ghege’, disse para si mesmo, “chega de correx" ‘ropésitos de Ano-Novo? Pois ali estava um j io correr. Ej comecara agora, na véspers, hhores do novo ano, ino assim, bem de- if contemplando a noite, a estrada —e I es- a frente, um... Veja 6, um tatulParecia pa- 24 = "Vamos entrar’, eu o convidel. ‘NGG’, ele disse; “eu quero ver se ainda pego @ resto da novela. Uma parte eu jé perdi, por culpa aquele descabeceado.." ‘ gamba?" eu lembrei de perguntar, quando ‘Tilo jin se afastando, *O gambi?”, ele respondeu. “Sei lé. 0 gambé uma hore dessas deve estar escondide em algum lugar, né? Deve estar escondido dando garga- hada." 104 Voca vera ego um tix no hotel. Sfo quatro e quinze; 0 dia ainda esta escuro, Nas russ, dlaminadas, nao znd quase nenlum movimento: nem de gente, nem de carros. A cidade dorme. © taxi me deixa na rodoviéris, que também, a essa hora, esté quase deserta, com quase tude fechado. Mas eu descubro um barzinho aberta e vvou até ele, (© dono —um simpitico senhor de meis-idade, cabelos grisalhos, bigode — faz uma expressio de surpresa 20 me ver entrando. Eu explico: meu ‘nibus era seis, mas eu no tinha ainda com- prado a passagem, e entdo.. Ele sacode a cabeca, ‘concordando, Pergunta 6 que eu quero. “Um cafeainho” “Cafezinko ainda néo tem”, ele diz; vou fazer” “bu espero’ eu digo. Deixo a minha mala, pequena, no chéo, em- poleiro-me no banquinho, diante do balcia, e ico esperando. No bar — um cémodo onde, além do essen para o bar funcionar, mal cabem as duas mes ‘com cadeiras que nele estio — s6 hi nés doi, ‘enum de nés diz nada enquanto ele faz 0 café, Pendurada na parede, num quadro, haw {foto da cidade, uma vista aérea, A foto € grande fest numa moldura caprichada Ele despeja a gua fervente, e uma fumaci sobe, espalhiando pelo ar 0 cheiro bom de condo, Pega entio uma xlcara e um piees, brancos, Jouga, «08 pde na minha frente. Em segulda, para msis perto de mim o acucareiro e um ct tho de vidro com as colherezinhas. ‘Tomo. primeiro goe. Ele fice & espers, me o servando. Entéo pergunta: “esta bom?” “Hota, eu digo; “esta timo” Ele sorr,contente. “Mais alguma coisa?” Oho, através do vidro do baleto, os doces ‘salgadinhos. Néo ha muito o que escolher. “Um pio de quejo", digo. He pega, com o pegador de metel, um pio quello —o maior, eu noto —e me d. *Voc8 é mineiro?, pergunta. "Por causa do po de queljo?™ "No, no € por causa do pao de quel", ele di *é porque mineiro nfo perde o trem.” 106 ‘Euro erepito a minha explicagio sobre apas- sagem. “voct est cert’, ele diz, amdvel, "E 0 senor, pergunto, para ser educado. “O senor é daqui?” "Daqui no tem ninguém, meu fiho’, ele diz. “aqui todo mundo é de fora” Eu balango a cabeca, meio envergonhado da pergunta que fizera, pois “Eu vim do norte’ ele continua. "Fu deixel tudo ce vim para aqui. Eu deixelatéa minha familia” “sel. *Voo8jé conhecia Brasilia", ele pergunta, “No; eu vim conhecer agora” *scostour" ‘Coste. Acheia cidade bonita” "Voce foi a0 Palécio da Alvorads?” i *£.g Palécio do Planalto?™ spur “EaCatedral?” “Também." isso, ¢ aquilo cle segue perguntando, sem nem me dar tempo de responder — 0 que eu acho ‘bom, porque algumas coisas sobre as quais ele me pergunta eu nem sabia que existiam... "0 futuro esta aqui, ele diz, enchendo o peito. “Um novo pais estd nascendo nesta cidade” 107 Eu alango a eabega, enquanto como o meu pio de queljoe bebo o meu café. "Umm pais onde todos terio oportunidade, onde nninguém mais passaré fome, ninguém mais pre- cisard pedir esmola nas ruas, Um pais de gente feliz, um pais de paz e de prosperidade. Um pais, fenfim, que € 0 pafs com o qual todos nés, 08 bra: sileiros, um dia sonhsmos.” Bu balango a cabeca "Bu talvez no vé ver tudo isso, porque ‘com sessenta anos e porque isso nio é uma coisa (que se faz de um dia para outro; nem de um dia para outro, nem de um ano para outro, Deus, que Deus, no fer o mundo em seis dias?” “EY eu digo, “Entio?" Eu balango acabeca, “Eu talvez ndo verei; mas vocé, vocé, que é mul to mais novo do que eu, vocé verd. Quantos anos ‘voce tern?” *vinte.* “Vinte. Pois 6; daqui a quarenta anos, quando: vvocé estiver com a minha idade, quando vocé es tiver com sessenta anos, vocé vai se lembrar deste diae de tudo o que eu disse” u balanco a cabega de modo mals enfética, ‘como a dizer que sim, vou, sim, eu vou lembrax, “Serd um outro Brasil, ele prossegue, entusi ‘mado, “um Brasil.” 108 le seinterrompe com a chegeda de uma mulher. “Pois néo, minha senhora... diz, gentilmente Eu olho as horas: jé slo quase cinco, Mastigo e tengulo 0 ultimo pedaco do pio de queljo —o café jiacabara — limpoa boca com o guardanapo de papel, eentéo pego no bolso a minha cartera, "Nao" ele diz, espalmando a méo & minha fren- te: "voo8 nao vai pagar nada” “Por que." eu pergunto. “E uma homenagem minha’, ele diz, sorrindo alegremente; “uma homenagem que eu faco 208 ‘mineitos,e principalmente so maior deles 0 ho- ‘mem que construiu esta cidade” Eu agradeco muito e digo que nunca me esque- ccerei daquele dia — do cafezinho, das palavras dele e daquele gesto de generosidade, ego ento a minh malinha e despego-me dele com um forte aperto de mio. "Boa viagemn”, le diz No saguio, outras portas ja se abriram, slgu- ‘mas pessoas passam com malas, um dnibus che- g8 —2 rodovisria comeca a se movimentar, Subo entéo para aparte de cima, Nela, vejo que (0 guichés jé esto funcionando e que, felizmente, no ha fl ‘Compro @ minha passagem. CConfiro 0 meu relégio com o da rodoviéris: 03 dois marcam a mesma hora, cinco e vinte. Falta mais de meia hora ainda para o meu énibus ‘Tranquilo, com tudo certo, sento-me numa cadeira e acendo um eigarro, E ali fco, pensando ‘em muita coisa e ao mesmo tempo no pensan- do em nada, enquanto lé fora o céu fa} devagar- zinho, elareando, naquela segunda-feira de abril de mil novecentos e sessenta e tr. Autor e Obras Den CRA BES SRE os epee ‘Copyright tue en, 2013 ‘opt ona acre ‘eo er segue novo Acedo Ogi dings ios eluor devs eho eras ple From nEcOnD Lib prt co Bac ‘ja um tor preface, CGadescee et formic ee ‘woe nner neat promos _Aendent wands dts tor ‘etaresord ont 205 Zojuda, 7 ra aqui, 12 O que cada um disse, 19 Céu estrelado, 25 Todos os anjos, 36 Oem, 46 Quando fiz sete anos, 78 \corpos, a5 | Noite feliz, 92 Mataram o rapaz do posto, 95 Vocé verd, 105 Autor e Obras, 111

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