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‘Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 21): 49-74, 1? sem. 1990 MODERNIDADE COM FEITIGARIA: CANDOMBLE E UMBANDA NO BRASIL DO SECULO Xx* Reginaldo Prandi** RESUMO: A umbanda € considerada a mais genufna religigo brasileira de origem africana. Neste artigo procura-se mostrar como a formacao da umbanda no Rio de Janeiro dos anos 30 deste século est estreitamente ligada ao proceso de mudanga social em cur- so. Por volta de 1950, a umbanda jé se encontrava difundida por todo o pais como uma re- ligiéo para todos, a despeito de cor, classe social e origem geogréfica, enquanto 0 candom- bié, religido da qual a umbanda se formou, mantinha-se limitado a grupos negros, sobretu- do no Nordeste. A partir dos anos 60, entretanto, parcelas significativas de umbandistas passaram a professar o candomblé, sobretudo nas cidades grandes ¢ desenvolvidas do Su- deste. Encontrar sentido para esses movimentos, como elementos das préprias mudancas que se dao na sociedade brasileira, é objetivo do presente trabalho. UNITERMOS: Brasil, re africanas, umbanda, candomblé, mudangas sociais. Prélogo & umbanda na velha capital federal Rio de Janeiro, 1900. Anténio guia Jo&o do Rio por velhas ruas da capital fede- ral: So Diogo, Baréo de Séo Félix, do Hospicio, do Nuincio e da América. Ruas, * Este artigo apresenta, de forma pouco modificada, trés dos dezesseis capftulos da tese de livre- docéncia em Sociologia, Os Candomblés de Sdo Paulo, que 0 autor defendeu na Faculdade de Filosofia, Letras ¢ Ciéncias Humanas da Universidade de S80 Paulo, em novembro de 1989, tese baseada em pesquisa realizada em 60 terreiros de candomblé situados na regio metropoli- tana de Sao Paulo. * Professor do Departamento de Sociologia da FFLCH-USP. 50 PRANDI, Reginaldo. Modemnidade com feiticaria: candomblé ¢ umbanda no Brasil do século XX. ‘Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 2(1): 49-74, 1.sem. 1990. seguindo 0 relato de Joao do Rio, “onde se realizam os candomblés e vivem os pais de santo”. Dos antigos escravos, ele escreve, “restam uns mil negros. Séo todos das pequenas nagées do interior da Africa, pertencem aos igesd, oié, ebd, aboun, haussé, itagua, ou se consideram filhos dos ibouam, ixdu dos gege ¢ dos cambindas. Alguns ricos mandam a descendén- cia brasileira A Africa para estudar a religido, outros deixam como dote aos filhos cruzados daqui os mysterios e as feiticarias. Todos, porém, fallam entre si um idioma commum: — 0 eubd. (...) S6 08 cambindas ignoram 0 eubd.” (Rio, 1906, p. 1-2). Joao do Rio fica sabendo por seu informante Ant6nio que os orixés s6 falam ioru- ba (eub4). E nos conta sobre sua presenga no Rio de Janeiro na virada do século’ “Os negros guardam a idéia de um Deus absoluto como 0 Deus catholico: Orixd- aliim. A lista dos santos € infinddvel. Ha 0 orixald, que € 0 mais velho, Axwn, a mae d’agua doce, Ye-man-jd, a sereia, Exii, 0 diabo, que anda sempre detrés da porta, Sapanam, o santissimo sacramento dos catholicos, 0 /rocd, cuja apparicéo se faz na arvore sagrada da gameleira, 0 Gunocd, tremendo € grande, o Ogun, S. Jorge ou o Deus da guerra, a Dadd, a Orainha, que sio invis(veis, € muitos ou- tos, como 0 santo do trovdo e 0 santo das hervas.”’ Jodo do Rio cita também os “heledas ou anjos da guarda” (Rio, 1906, p. 2-3). © candomblé nessa cidade € um culto organizado. Continuemos a ler mais um pouco de Joao do Rio. Ele conta sobre os “babalads, mathematicos geniaes, sabedores dos segredos santos ¢ do futuro da gente”, que jogam 0 “opelé”, ¢ fala dos “babds, que atiram 0 endilogum; sto babaloxds, pais de santos veneraveis. Nos lanhos da cara puzeram o p6 da salvacdo e na bocca tém sempre 0 obi, noz de kola. (...) Ha os baba~ lads, 08 acoba, 0s aboré, grfo maximo, as mais pequenas, os ogan, as agibonam..." € as iaud, evidentemente, a quem Joao do Rio dedica muitas paginas de deliciosa preci- sio e explicitissimo preconceito. Pais ¢ mées-de-santo citados por Jofo do Rio séo muitos: Oluou, Eurosaim, Alamijo, Odé-Oié, os babalaés Emygdio, Oloé-Teté, Tor- quato, Obitaié, Vag6, Apotijé, Veridiana, Crioula Capitio, Rosenda, Nosuanan, Xica de Vavé, Josepha, Henriqueta da Praia, Maria Marota, Flora Céco Podre, Dudu do Sa- cramento, ¢ “‘a que est agora guiando seis ou oito filhas, a Assiata”, moradora da rua da Alfandega 304, a quem o informante do jomalista acusa de farsante. Diz que ela “ndo tem navalha (ndo iniciada), finge ser mdi de santo e trabalha com trez ogans PRANDI, Reginald. Modemnidade com feitigaria: candomblé ¢ umbanda no Brasil do século XX. 51 ‘Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 2(1): 49-74, 1.sem. 1990. falsos” (Rio, 1906, p. 19-20). Este mesmo autor conta do grande trénsito entre o Rio € a Bahia, de gente que vai e vem para tratar de questées dessa religiao. Os elementos descritivos (pantedo, hierarquia, préticas rituais) que temos de Joao do Rio sobre 0 candomblé no Rio de Janeiro no comego deste século coincidem em muito com aqueles de Nina Rodrigues ¢ Manuel Querino para a Bahia, ¢ com os de Vi- cente Lima e Gongalves Fernandes para Pernambuco de alguns anos depois (Rodrigues, 1935 ¢ 1976; Querino, 1938; Lima, 1937; Fernandes, 1937 ¢ 1941). Esses elementos constitutivos descrevem perfeitamente tragos importantes dos candomblés de hoje, cujo modelo ideal est4 descrito no livro de Bastide, O candomblé da Bahia (Bastide, 1978). Grandes pais ¢ mAes-de-santo da Bahia passaram parte de suas vidas religiosas no Rio, como Aninha, fundadora dos Axé do Opé Afonjé de Salvador € do Rio de Janeiro (Santos, 1988, p. 10-11; Lima, 1987, p. 61). Mae Aninha, Eugénia Ana dos Santos (1869-1938), baiana, foi iniciada em Salva- dor, em 1884, por Maria Jilia, do candomblé da Casa Branca do Engenho Velho, con- siderado mais antigo terreiro de candomblé de que se tem registro no Brasil, tendo participado de sua iniciagao o africano Bamboxé Obitiké, trazido da cidade iorubana de Keto (no atual Benin) para a Bahia por Marcelina Obatossi, ambos pilares fundantes do candomblé brasileiro. Saida da Casa Branca do Engenho Velho, Aninha ficou algum tempo no terreiro de Tio Joaquim, sacerdote de origem pernambucana. Em 1910, jé se- parada de Tio Joaquim, funda em Salvador 0 Centro Cruz Santa do Axé do Op6 Afon- |j4. Segundo pesquisa de Monique Augras e Joao Batista dos Santos (Augras € Santos, 1983), Aninha teria estado no Rio antes de 1910, onde teve intensa atividade religiosa junto a um grupo de familias baianas residentes na Pedra do Sal, perto do cais do porto. Nessa época circulavam pelo Rio figuras importantes como o proprio Tio Joaquim. Jodo do Rio tem um capitulo de seu livro, aqui tantas vezes citado, dedicado aos feiticeiros da cidade (Rio, 1906, p. 25-35). Entre eles inclui Alabé, 0 Joao Alabé da rua Bardo de Sao Félix, onde ele chefiava um candomblé nag6, ponto de referéncia para os baianos que chegavam a0 Rio. E citado também Abedé, que nada menos € que 0 baba- 1a6 Cipriano Abedé, que inicia o professor Agenor Miranda para a deusa Eué; Agenor Miranda que ja antes Aninha iniciara para Oxalufa. Isso no Rio de Janeiro por volta de 1910. O professor Agenor Miranda, nascido na Africa onde seu pai se encontrava a servigo do corpo diplomAtico brasileiro, criado e sempre residente no Rio, até hoje € considerado uma das maiores autoridades vivas na prética do oréculo nagé (Silva, 1988, p. 16-17). Foi ele, por exemplo, que fez 0 jogo de biizios que indicou para 0 trono do Opé Afonjé baiano sua atual ialorix4, Mae Stela de Oxéssi. £ assim muito antiga essa presenga de tantos sacerdotes de candomblé no Rio, fa- zendo filhos-de-santo, mantendo casas. Entre eles também era freqiiente no Rio 0 ba- balaé Felizberto Américo de Souza, o Benzinho Sowzer, que dividiu com Martiniano 52 PRANDI, Reginaldo. Modernidade com feitigaria: candomblé e umbanda no Brasil do sfculo XX. Tempo Social; Rev. Sociol. USP, 8. Paulo, 2(1): 49-74, 1.sem. 1990. do Bonfim, nos anos 20 e 30, o papel dos dois tiltimos babalads da Bahia. Benzinho era neto carnal de Bamboxé de Obitik6, atrés referido. O tansito de sacerdotes e aspirantes das religides dos orixés e encantados entre Bahia Rio tem-se mantido constante desde esse passado até os dias de hoje. Como entre Bahia e Recife, menos intensamente. Como mais tarde na rota triangular Bahia- Rio-Sdo Paulo. Como f6ra antigamente entre Bahia e Lagos, capital nigeriana, por na- vios. Como veio a ser nos dias de hoje entre Sao Paulo e a mesma Lagos, nas asas da Varig. Curioso o fato da tia Ciata, a figura legendéria dos tempos primeiros das escolas de samba (Moura, 1983, p. 57-70), ser citada por Jodo do Rio como “falsa me”, ou seja, pessoa nao iniciada conforme o rito nag6 de Salvador, segundo explica o infor- mante de Jodo do Rio. Esse tipo de alusdo a uma possfvel néo feitura deste ou daquele sacerdote € até hoje pritica desmoralizadora corrente nos candomblés. J4 existia, pois, na capital federal do fim do século uma “‘cultura peculiar” do povo-de-santo. Tia Ciata 6 a mesma baiana que reunia em suas festas a mocidade que daria & luz a misica popu- lar brasileira moderna, como Pixinguinha e Joao da Baiana (Pereira, 1983). A pesquisa da origem religiosa de muitas casas do Rio nos conduz de volta a Ba- hia dos anos 10 aos anos 40, mas essa hist6ria no tem sido documentada, com excecdo do terreiro do Opé Afonjé do Rio de Janeiro, nascido, como vimos, das andangas de Mae Aninha. © candomblé que mais tarde surgiré em Séo Paulo guarda profundas rela- Ges tanto com a Bahia quanto com o Rio de Janeiro (Prandi e Goncalves, 1989a) Pernambuco em menor grau (Motta, 1980). E muito provavel que os iorubanos de Joo do Rio tivessem descido da Bahia jé libertos ¢ em busca de ocupacées urbanas na corte imperial e depois capital da Repsbli- ca. Eles foram praticamente um dos tltimos grupos negros trazidos como escravos no final do século XIX, destinados sobretudo Bahia para o trabalho urbano, as artes oficios. E a macumba carioca, portanto, pode bem ter se organizado como culto religioso na virada do século, como aconteceu também na Bahia. Nao vejo, pois, razéo para pen- sé-la como simples resultante de um processo de degradacdo desse candomblé visto no Rio no fim do século por Joao do Rio, essa macumba sempre descrita como feiticaria, isto €, prética de manipulacéo religiosa por individuos isoladamente, numa total ausén- cia de comunidades de culto organizadas. Arthur Ramos fala de um culto de origem banto no Rio de Janeiro na primeira metade do século, cultuando orixés assimilados dos nagés, com organizacéo prépria, com a possessio de espfritos desencarnados que, no Brasil, reproduziram ou substitufram, por razdes ébvias, a antiga tradic&o banto de culto aos antepassados (Ramos, 1943, v. 1, cap. XVIII). So cultos muito assemelhados aos PRANDI, Reginaldo. Moderidade com feitigaria: candombié ¢ umbanda no Brasil do século XX. 53 ‘Tempo Social; Rey. Sociol. USP, S. Paulo, 2(1): 49-74, L.sem. 1990. candomblés angolas ¢ de caboclos na Bahia, registrados por Edison Cameiro, que j4 os tratava como formas degeneradas (Carneiro, 1937). (Para uma andlise atual da questio da pureza nag6, ver Dantas, 1982 € 1988). Macumba, portanto, deve bem ter sido a designagao local do culto aos orixés que teve o nome de candomblé na Bahia, de xang6 na regio que vai de Pernambuco a Ser- gipe, de tambor no Maranho, de batuque no Rio Grande do Sul. Dificil sabermos 0 que foi e como se originou essa antiga macumba carioca, na qual Bastide, precedido ¢ se- guido por outros, enxergava formas degradadas (no sentido de desorganizacio e desa- gregacao cultural) das antigas religides negras (Bastide, 1975, v. 2, cap. V). Macumba que teria sido religiaio de pobres e marginalizados, explica Bastide, em oposigéo aos cultos similares baianos, onde se enxergou uma tradigéo originalmente africana, como se ali também nao fosse praticada por adeptos menos pobres e marginalizados do que os. do Rio, como mostra a histéria dos negros das classes sociais no Brasil (Fernandes, 1965; Jani, 1972; Hasenbalg, 1977). Macumba que, de qualquer modo, nos levaré ao surgimento da umbanda como religiéo independente no primeiro quartel deste século, mas que poderia ter sido perfeitamente denominada candomblé, desde que se deixassem de lado os modelos dos minoritérios candomblés nagés da Bahia, que monopolizaram a atencao dos pesquisadores desde 1890. De todo modo, macumba € termo corrente usado em S40 Paulo, no Rio, no Nordeste, quando se faz referencia as religides de orixés. E é uma autodesignacao que j4 perdeu o sentido pejorativo, como pejorativo foi, na Bahia, 0 termo candomblé. Mas a rota da formacdo da umbanda passaré também pelo espiritismo europeu, justamente uma religido gestada por ¢ para uma sociedade moderna (Camargo, 1961; Camargo et alii, 1973). Rio de Janeiro, ainda 1900. Continuemos a ler Jodo do Rio, agora falando do es- piritismo kardecista: “... 0 Sr. Catéo da Cunha diz que os primeiros espfritas brasileiros appareceram no Ceara ao mesmo tempo que em Franca. A propaganda propriamente sé come- ou na Bahia, no anno de 1865, com o Grupo Familiar do Espiritismo.”” Mais adiante ele diz: “Era o espiritismo em familia, ab ovo, porque aos quatro annos depois surgiu 0 primeiro jornal, dirigido pelo Dr. Luiz Olympio Telles, membro do Instituto His- t6rico da Bahia. Esse jornal intitulava-se O Echo de Além Tumulo. A propaganda 54 PRANDI, Reginaldo. Modernidade com feiticaria: candomblé © umbanda no Brasil do século XX. ‘Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 2(1): 49-74, I.sem, 1990, tem sido rapida. Ainda em 1900 no seu relat6rio ao Congresso Espirita e Espiri- tualista de Pariz, a Federaco (do Rio de Janeiro) accusava adhesdes de setenta € nove associacées € 0 apparecimento de trinta e dous jornaes e revistas de propa- ganda, entre os quaes 0 Reformador, que conta vinte e quatro annos de existen- cia" (Rio, 1906, p. 216-217). primeiro movimento espfrita organizado no Rio de Janeiro data de 1873, cujo ema j4 era entdo “Sem caridade no ha salvaco”. Mas antes desse ano, o espiritismo 4 era praticado no Rio, como em outros estados, como meio de comunicacéo com 0 mundo dos mortos. Agora inicia-se sua implantacao como religiéo e como ciéncia, co- mo queria Kardec — 0 sagrado da religiao dessacralizado pela idéia de ciéncia. Essa forma de conceber a religiao atrairé muitos intelectuais brasileiros, anti-clericais porém cristéos. E neste comego que se firma a figura do médico Adolfo Bezerra de Menezes (1831-1900), que se converte a terapéutica espirita depois de ter praticado a medicina oficial por 30 anos (Warren, 1984). Em 1875 a livraria Garnier publica no Rio os livros fundamentais de Allan Kar- dec. Em 1900 jé existem federagées espiritas em quase todos os estados do pais. Mais adiante, sob a lideranca de Francisco Candido Xavier, se deixard de lado a i¢ia de expe- rimentagao cientifica, reforgando-se a caridade como condigao de salvacdo ¢ o principio kérmico-evolucionista. Desde logo acreditou-se que 0s espiritos de maior luz, mais evolufdos, eram os dos mortos que, em vida, foram virtuosos, ilustres, competentes: os que teriam melhores condigées, portanto, de intervir neste mundo para a prética da cura ¢ da doutrinaco caridosas. Primeiro movimento: Do candomblé @ umbanda Rio de Janeiro, meados dos 1920. Funda-se o primeiro centro de umbanda, que te- ria nascido como dissidéncia de um kardecismo que rejeitava a presenca de guias ne- gros ¢ caboclos, considerado pelos kardecistas mais ortodoxos como espiritos inferio- res. De Niterdi, este centro vai se instalar numa rea central do Rio em 1938. Logo se- gue-se a formag4o de muitos outros centros desse espiritismo de umbanda, os quais, em 1941, com o patrocinio da Unidio Espirita Brasileira, promovem no Rio o Primeiro Con- gresso de Umbanda, congresso ao qual comparecem umbandistas de So Paulo (Brown, 1987). PRANDI, Reginaldo. Modernidade com feiticaria: candomblé ¢ umbanda no Brasil do século XX. 55 Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 21): 49-74, 1.sem. 1990. ‘Nina Rodrigues relata na virada do século o caso de uma mée~de-santo que, em Salvador, mantinha um terreiro de candomblé onde também realizava sess6es espiritas, cada culto funcionando autonomamente (Rodrigues, 1935). Esse tipo de combinagéo, entre outros, pode ser encontrado ainda hoje tanto em Sao Paulo como no Nordeste, onde € comum a manutengio de cultos de xang6 e de toré pela mesma mie~de-santo, como presenciamos em Recife e Natal. Como € comum, hoje, a pratica conjunta da um- banda e do candomblé nos mais diversos pontos do pais. Em Havana, Cuba, em 1988, conhecemos uma casa em que se praticavam 0 culto lucumi, equivalente a0 nosso candomblé nag6, 0 culto palo, banto como nossa angola, © 0 kardecismo, sob a lideranca de um santeiro e sua esposa. Dias depois o reencontra- mos na igreja catdlica da Virgem da Caridade do Cobre, Oxum em Cuba, onde apés a missa o vigdrio benzeu uma boneca de Oxum trazida por ele (ver bibliografia sobre Cu- ba em Moura, 1935). E muito provével que no Rio dos anos 20 candomblé e espiritismo fossem assim praticados conjuntamente por certos grupos de fiéis. ‘A fundaco nos anos 20 daquele primeiro centro de umbanda no Rio de Janeiro como dissidéncia publica ¢ institucionalizada do kardecismo num proceso de valoriza- cdo de elementos nacionais — 0 caboclo, o preto velho, espiritos de indios e escravos — deve ter representado uma forma de acomodacéo seletiva entre os dois pélos fundantes. Um movimento de rearranjo entre duas alternativas nao conflitantes, embora uma mais rica em contetidos doutrindrios € a outra mais centrada em priticas rituais. O kardecis- mo como religiao de salvacéo, religido da palavra, 0 candomblé como religido ritualisti- ca, de manipulagao do destino, como poderia té-las classificado Max Weber (Weber, 1963). ‘A umbanda que nasce retrabalha os elementos religiosos incorporados & cultura brasileira por um estamento negro que se dilui e se mistura no refazimento de classes numa cidade que, capital federal, € branca, mesmo quando proletéria, culturalmente eu- ropéia, que valoriza a organizacao burocrética da qual vive boa parte da populaco re- sidente, que premia o conhecimento pelo aprendizado escolar em detrimento da tradico oral, € que jé aceitou o kardecismo como religiao, pelo menos entre setores importantes fora da igreja catélica. impar” a religiao nascente de seus elementos mais comprometidos com a tradi- cdo inicidtica secreta e sacrificial € tomar por modelo o kardecismo, capaz de expressar ideais e valores da nova sociedade republicana, ali na sua capital. Os passos decisivos foram a adogao da lingua vernécula, a simplificagdo da iniciagdo, com a eliminacdo quase total do sacrificio de sangue, iniciagdo que ganha, ao estilo kardecista, caracte- risticas de aprendizado meditinico publico, o desenvolvimento do médium. Mantém-se 0 rito cantado ¢ dangado dos candomblés, bem como um pantedo simplificado de orix4s, j4 porém havia muitos anos sincretizados com santos cat6licos, reproduzindo-se, por- 56 PRANDI, Regi Tempo S« jo. Modernidade com feiticaria: candomblé ¢ umbanda no Brasil do século XX. Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 2(1): 49-74, 1.sem, 1990, tanto, um calendério litiirgico que segue o da igreja cat6lica, publicizando-se as festas a0 compasso deste calendério. Entretanto, 0 centro do culto no seu dia a dia estaré ocu- pado pelos guias, caboclos, pretos velhos ¢ mesmo os “‘maléficos” ¢ interesseiros exus masculinos ¢ femininos j4 cultuados em antigos candomblés baianos e provavelmente cariocas. (Ver Landes, 1967. Sobre 0 caréter trickster de Exu, consultar Trindade, 1985; Pemberton, 1975; Idowu, 1982). Na umbanda que se consolidaré a partir de entao, a presenca da entidade no transe ritual volta-se mais para a cura, limpeza, aconselhamento dos fiéis e clientes, afastando- se de outro ideal kardecista: 0 de comunica¢éo com os mortos com o fim de estender a0 mundo dos espfritos atrasados e sofredores a doutrinacdo evangélica caridosa; ¢ receber dos espfritos de luz orientacao para o desenvolvimento de virtudes na terra, curas do corpo e da alma, evolugao espiritual dos vivos e dos mortos. J4 no seu primeiro momento, a umbanda no é simplificagéo do candomblé, mera “limpeza’’. Nem apenas a ritualizacao do kardecismo com elementos dos candomblés. E uma enorme transformacéo. ‘Sao Paulo, 1930. E deste ano o surgimento do primeiro centro umbandista de Sao Paulo registrado em cartério, com 0 nome de Centro Espirita Antonio Conselheiro. Até 1952, os registros cartoriais acusam a criacdo de mais de 70 centros de umbanda, mas é apenas entao, 1952, que o termo umbanda vai aparecer no titulo da casa. Trata-se da ‘Tenda de Umbanda Mae Gertrudes. Ao final da década de 40 teréo sido registrados 85 centros de umbanda, menos de 10% dos 1.097 centros kardecistas para 0 mesmo perfodo (Concone ¢ Negrio, 1987). Mudancas profundas estavam em curso. So Paulo, 1940. Aqui vivem um milhao e trezentas mil pessoas, ocupando uma rea que hoje praticamente delimita o centro nobre € o cinturdo hist6rico do Tieté com as ferrovias: da Sé até a Moéca, Bris e Pari, no leste. Em direcdo ao norte até os bair- ros que acompanham a margem esquerda do Tieté. Para quem vai para o sul, o Jardim ‘América até Vila Mariana, que se junta em diregdo ao sudeste com 0 Cambuci ¢ 0 co- meco do Ipiranga. Para o oeste a cidade vai até Perdizes ¢ Pinheiros. Para além desse perimetro esto se formando bairros entdo distantes. De Pinheiros até o Butanta. Do Belém até Penha. E Vila Matilde e Vila Prudente jé para os lados do Ipiranga. Os bair- ros do sul espraiam-se até Satide € Jabaquara € no outro lado do Tieté ganham forma Santana, Freguesia do O, Casa Verde, Tucuruvi. Ao longo das ferrovias esto 0s su- buirbios. Uma cidade que j4 deixou de receber imigrantes europeus e do oriente préximo para vir a ser nos anos seguintes 0 maior centro de atragéo da migracao interna do pais: PRANDI, Reginaléo. Modernidade com feiticaria: candomblé ¢ umbanda no Brasil do século XX. 57 Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 2(1): 49-74, L.sem. 1990. primeiro as migragdes de pequena distancia, a migragéo rural-urbana, depois as migra- Ges que vém de Minas e do Nordeste. Os migrantes nordestinos, que representam me- nos de 3% da populagao paulista em 1940, chegardo a 10% nas décadas de 60 ¢ 70¢ a 13% em 1980. Dentre eles, os maiores contingentes so 0s baianos, seguidos dos per- nambucanos, desde 1940 até hoje, grupos suplantados, juntos, apenas pelos mineiros. Em 1980, quando a regio metropolitana da Grande Sao Paulo ultrapassa os 12 milhées de habitantes, nada menos de um milhdo s4o nodestinos chegados hé menos de dez anos, sem contar os que aqui residem por mais tempo (Cf. Censos Demograficos). Ainda nessa cidade dos anos 40, os servigos piblicos séo extremamente limitados. O bonde eléirico é o principal meio de transporte dentro da cidade, o trem € 0 meio de transporte de carga ¢ passageiros para o interior ¢ o litoral. $6 ao final da década o 6ni- bus urbano tomard o lugar do bonde, que melancolicamente faz sua ultima viagem em 1965, saindo da praca Ramos de Azevedo, subindo a avenda Liberdade ¢ a rua Ver- gueiro para depois rumar, através da avenida Conselheiro Rodrigues Alves, em diregio a Santo Amaro, percorrendo a avenida Ibirapuera. O trem, igualmente, perderd o lugar para os énibus interurbanos ¢ interestaduais, inaugurando-se a era das rodovias, primei- ro de concreto ¢ depois de asfalto. Mas nem hé ainda uma estagao rodovidria. Os termi- nais séo as calcadas na frente dos prédios das companhias. O leite que se bebe, ndo pasteurizado, € tirado nas granjas que rodeiam a cidade e sua distribuicdo se faz por carrocas, que também distribuem 0 carvéo com que se cozi- nha. Nao hé centrais de distribuicdo de vegetais além do mercado central, nem super- mercados, nem magazines. Os artigos de Iuxo e 08 maquinérios so importados. Com o prefeito Prestes Maia, gestio de 1938 a 1945, Sao Paulo se prepara para vir a ser grande metr6pole. Planeja-se a construgao e ampliagSo de avenidas para o flu- xo automotive, éreas centrais séo reurbanizadas, adota-se a politica de verticalizacio adensamento populacional (Langenbuch, 1971). Por essa época, a populacéo mais po- bre inicia sua caminhada em direco ao que viria ser a periferia de Sao Paulo, ainda que uma periferia préxima. Esta mesma periferia que levaria Jénio Quadros & prefeitura em 1953. A partir deste ano a periferia, que depois se estenderd geograficamente para muito além, entrard definitivamente no dicurso politico-eleitoral, e ser o grande palco dos movimentos sociais urbanos dos anos 70 e 80. No govemo do Estado, Ademar de Barros, interventor de 1938 a 1941, depois go- vernador eleito em 1947 e 1965, faz construir o Hospital das Clinicas, trazendo para © Ambito do Estado servicos de saide tocados antes pelas misericérdias religiosas € ci- vis. Consiréi a Via Anchieta, ligando a capital ao litoral, e que no final dos anos 60 praticamente propiciar4 a instalago da indistria automobilistica no corredor do ABC. O governo federal constréi a Via Dutra, ligando Sio Paulo ao Rio, e a Régis Bitten- court, em diregéio ao Sul. O processo de metropolizacio que seguia os eixos ferrovisérios seguird agora margeando as modernas rodovias. 58 PRANDI, Reginaldo. Modernidade com feitigaria: candomblé ¢ umbanda no Brasil do século XX. Tempo Socials Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 211): 49-74, 1.sem. 1990. No plano federal, com 0 Estado Novo e a politica de oposigao as classes burgue- sas fundirias num projeto nacionalista que busca apoiar-se nas novas classes urbanas, trata-se de criar condigGes de infra-estrutura para 0 desenvolvimento industrial. Volta Redonda é exemplo e marco. No final dos anos 40, a industrializagdo é acelerada pelo que se conhece como substituicdo de importacées. Em 1950 a populacdo da cidade ul- trapassa os dois milhées, para chegar a mais de trés milhdes dez anos depois. Neste pe- riodo, j4 com a politica econémica do presidente Juscelino (1956-1961), 0 pais se abre para capital estrangeiro, instalam-se as grandes indtistrias multinacionais no que agora |j6 € de fato a regiao metropolitana da Grande Sao Paulo. A migracdo j4 nao é de curta distncia. A metrépole paulista vai se transformando no maior aglomerado urbano do continente e centro econémico mais importante do pais, com um deslanchamento indus- trial que demanda incessantemente méo-de-obra migrante, que vem primeiro do interior paulista, depois de Minas e do Nordeste. Anos 40 ainda. HA 0 rédio, mas muito longe estamos ainda da televisdo, essa sur- da mater et magistra da nossa contemporaneidade. $6 com a década dos 60 a escola deixaré de ser extremamente restritiva para além dos quatro anos do grupos escolar. A primeira universidade paulista nem completara cinco anos de idade, ¢ a rede de gindsios estaduais s6 teria significativa implantacdo vinte anos depois. Pequena € a participagéo da mulher no mercado de trabalho urbano ¢ a igreja ca- t6lica ainda tem em Santa Inés, a virgem, o ideal de vida feminina (Prandi, 1975). Essa ‘mesma igreja, com suas procissées de demonstracao de forca, ataca abertamente 0 espi- ritismo e o protestantismo, mas nessa mesma época j4 desistira do milagre, ja rejeitara a cura religiosa, “num pacto silencioso com a medicina e a intelectualidade”’, como gosta- va de repetir Procépio Camargo. Até 0 final dos anos 40, j4 romanizado, j4 derrotados os movimentos surgidos com um catolicismo tradicional pré-ultramontano e que motivaram a chamada “Questo Re- ligiosa” (Monteiro, 1978), 0 clero catélico esta ajustado e acomodado as orientagdes do Vaticano, repetindo pura e simplesmente o discurso ¢ a politica pastoral da Santa Sé. A partir dos anos 50, entretanto, com 0 adensamento urbano ¢ a formacao de um novo proletariado ¢ de novas classes médias, ver-se-é forcado a mudar suas estratégias pasto- rais. Se de um lado seu discurso normativo vai se esvaziando de valores tradicionais de cunho religioso, de outro inicia-se a preocupacéo com as questées sociais. A igreja ca- t6lica anda as voltas com novas expectativas populares nascidas de uma nova sociedade que se redemocratiza, se diversifica, se pluraliza, expandindo-se em termos no sé de classes, mas da mobilizagdo que essas novas classes implicam no processo acelerado de constituicéo de um capitalismo agora industrial. A igreja passa, nessa década, a ter que assumir um enfrentamento com movimentos ideolégicos concorrentes, profanos e reli- giosos. Mas € no plano da religiao que ela visualiza seus grandes concorrentes: 0 pro- PRANDI, Reginaldo. Modernidade com feitigaria: candomblé e umbanda no Brasil do século XX. 59 Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 2{1): 49-74, 1.sem. 1990. testantismo de converséo € 0 espiritismo kardecista e umbandista. Sao anos de intensa propaganda dessas religiGes, e de intensa contrapropaganda por parte da igreja (Pierucci et alii, 1984). Em 1957, os bispos latino-americanos, reunidos no Rio, proclamam os quatro maiores inimigos da Igreja na América Latina: 0 protestantismo, o comunismo, o espiri- tismo e a magonaria. Esse protestantismo que preocupava os prelados catélicos era 0 protestantismo agressivo das denominacées pentecostais; o espiritismo inclufa a umban- da, na época considerada o ramo “‘baixo” do espiritismo. E no curso dos anos 50 que 0 catolicismo cada vez mais abriré mao de valores re- ligiosos tradicionais na orientagéo da conduta, cedendo abertamente espaco para as ciéncias humanas ¢ o pragmatismo (Prandi, 1975). Com 0 Concflio Vaticano II, nos anos 60, abriré mao da pompa e circunstncia, simplificando 0s ritos, adotando o verné- culo, dessacralizando-se para adaptar-se a0 mundo modemo, assumindo para com as outras religides postura liberal, ou pelo menos tolerante. Deixaré com certeza muitos ér- fos, apegados a uma visio de mundo em que a sacralidade € uma necessidade na expe- riéncia da vida em uma sociedade heterogénea e desnorteadora. Em Medellin (1968) os bispos latino-americanos legitimario uma postura de vanguarda, e daf se chegaré ao catolicismo internalizado da teologia da libertacao e das CEBs (Pierucci et alii, 1983), reproduzindo nos anos 70 e 80 nos bairros pobres da agora Metrdpole a contraparte, formada sobretudo de mulheres, do movimento sindical dos assalariados, majoritaria- mente de homens (Singer, 1983). Vitima das contradigées sociais e culturais dessa sociedade em mudanga, ao che- gar no terceiro quartel dos anos 70 a igreja teré pouco a dizer para aquele catdlico inca- paz ou desmotivado, por vérias razdes, de pensar a vida cristd a partir de interesses co- letivos dos mais pobres, que implicam a militancia, a organizagao comunitéria e a parti- cipaco politica frente ao Estado e seus governos, ainda que se trate de elementares rei- vindicagdes de Agua e luz ao poder piiblico local. Se o velho catolicismo vinha desde os anos 40 esvaziando-se de valores e orienta- g6es fundados nos principios estritamente religiosos (Pierucci, 1978), essa nova manei- ra de expressar-se como cat6lico, no interior de uma nova igreja, € vivida como aco revestida de uma concepcdo diferente de sacralidade e comunhio que substituem, para este catélico, 0 sentido das celebragées sacramentais ex opere operato da Igreja pré- conciliar. Ecuménica, dessacralizada, desritualizada, politizada, ela delega solucdes das aflig6es individuais do corpo ¢ da alma as priticas cientifico-profissionais correntes ¢ & pritica politica. Conseqiiéncia do processo de aggiornamento que 0 Concilio s6 fez ofi- cializar. Essa igreja — que de um lado é a velha Igreja que hoje j4 nao cura e de outro é ‘a nova igreja dos movimentos sociais, entre os quais os de saiide — verd suas bases rof- das constantemente pela expansdo do pentecostalismo (Souza, 1969; Rolim, 1985) e da 60 PRANDI, Reginaldo. Modernidade com feiticaria: candomblé ¢ umbanda no Brasil do século XX. Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 2(1): 49-74, I.sem. 1990. umbanda, essas duas formas opostas de redefinico, por vias estritamente sacrais e ri- tuais, da pessoa e da vida pessoal individual (Fry, 1975). Mas isto € hoje. Quando a umbanda nascia, a igreja lutava pela reiteragao da auto- ridade da hierarquia romanizada, proclamava-se a religiao brasileira tinica, ou tinica via de didlogo ¢ intermediacdo entre 0 “povo”’ e o Estado da ditadura Vargas e dos anos seguintes (Pierucci et alii, 1984), como viria depois, na ditadura militar, a proclamar-se, agora j4 convertida A “opcio pelos pobres”, a voz dos que nao tém voz (Pierucci, 1986). Nunca tendo aceitado o espiritismo kardecista, cuja base de prest{gio firmava-se ‘sobre enorme rede de filantropia e adesao de uma intelectualidade da pequena-burgue- sia tradicional urbana, a igreja cat6lica sequer se pronunciava sobre a umbanda em seu perfodo inicial, tratada por ela, como por intelectuais leigos da época, como baixo espi- ritismo, portanto forma degenerada do kardecismo. 'S6 no final dos 40 a igreja cat6lica iria declarar-se abertamente contra a umbanda (Brown, 1987, p. 31), reconhecendo-a ipso facto como religido, e religido inimiga, e importante inimigo. Desligado da igreja catélica desde a reptiblica, o Estado, na prética, funcionou por muito tempo como uma espécie de braco armado da igreja contra os cultos e praticas de origem africana, indigena e mesmo do catolicismo de cura pré-ultramontano. Até o final da ditadura Vargas, assim como antes e pouco depois, a umbanda experimentou amar- gamente sistemAtica perseguicdo por parte dos érgdos policiais, como j4 experimentara © candomblé da Bahia durante a primeira metade do século, o xang6 pernambucano nos anos 30 e o xangé alagoano praticamente dizimado nos anos 20. Mas quando os anos 50 terminam, a umbanda em Sao Paulo ja disputa com o kar- decismo em quantidade de novas casas. Suas taxas de crescimento se aproximam. Se no decorrer do periodo que vai de 1930 até o final dos 40 registravam-se em Séo Paulo 92 centros kardecistas para cada 8 umbandistas, depois de 1960 o quadro é exatamente 0 inverso (Concone e Negrao, 1987). Vinda do Rio de Janeiro, a umbanda instala-se e se expande em Sao Paulo rapi- damente. Trés décadas depois seré analisada ¢ festejada como a religiao brasileira (Concone, 1987). A adog&o da umbanda por Sao Paulo dé-se publicamente. Sua pre- senca na cidade ocorre com grande visibilidade, ainda que os terreiros fossem obrigados a registro nas delegacias policiais. A partir do final dos anos 50, as festas populares pi- blicas que arregimentam a maior quantidade de devotos e simpatizantes so as festas de Temanjé nas praias de Santos ¢ Praia Grande, nos dias 8 ¢ 31 de dezembro de cada ano. Como em muitas outras capitais cidades brasileiras. PRANDI, Reginaldo. Modernidade com feitigaria: candomblé umbanda no Brasil do século XX. 61 Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 211): 49-74, 1.sem. 1990. A popularizagao da umbanda em Sao Paulo é jé entdo definitiva, pois que Sao Paulo j4 € também a metrépole de todos os brasileiros, a multido de cada um, o merca- do de todas as coisas ¢ causas, 0 capricho de todos os gostos, o templo de todos os deu- ses. A umbanda, ritualmente muito préxima do candomblé dos ritos angola e caboclo, €m que j4 estio esquecidos 0s inquices bantos, substituidos pelos orixs — os deuses nagés —, incorpora na doutrina virtudes teologais do catolicismo — f€, esperanga e cari- dade -, as grandes virtudes cat6licas adotadas pelo kardecismo, ¢ procura emprestar desta religiao seus modelos de organizacio burocrética e federativa. ‘Seu pantedo tem a frente orix4s-santos dos candomblés ¢ xang6s, mas o lugar de destaque est4 ocupado por entidades desencarnadas semi-eveméricas, & moda kardecista ¢ africana, ou encantados de origem desconhecida, & moda dos cultos de maior influén- cia indigena: os catimbés, os candomblés de caboclos, as encantarias, de onde também se originam certas praticas rituais, como 0 uso de bebida alcodlica e tabaco (Ferretti, 1985, p. 35-58; Cascudo, 1962, verbs. Catimbés, Encanterias; Arajo, 1946, cap. To- ré). A umbanda € a religiéo dos caboclos, boiadeiros, pretos velhos, ciganas, exus, pombagiras, marinheiros, criangas. Perdidos e abandonados na vida, marginais no além, mas todos eles com uma mesma tarefa religiosa e mégica que lhes foi dada pela religido de uma sociedade fundada na maxima heterogeneidade social: trabalhar pela felicidade do homem sofredor. E kardecista esta heranca da prética da caridade, que no kardecis- ‘mo sequer separa o mundo dos vivos do mundo dos mortos, pois estes também precisam de ajuda na sua saga em diregdo a luz, o desenvolvimento espiritual. E para praticar a caridade que as entidades da umbanda vém nas sessées do culto; para isso séo chama- das durante a metamorfose ritual em que o sacerdore iniciado abandona seus papéis de mortal para dar lugar & personalidade dos encantados e dos espiritos. Vém para ‘‘traba- Ihar”, como se diz, trazendo para as afligdes de toda ordem explicacées e solugdes ~ quantas vezes imploradas em desespero. Explicag6es e solugdes que pertencem a um mundo onde acredita-se no haver os limites da temporalidade e da materialidade terre- has que nos ameagam traicoeiramente a cada instante ¢ em cada situagdo de nossas vi- das. Ali onde nossa racionalidade nao conta, posto que aqui, neste nosso mundo, ela esté limitada por nossa condicéo humana, nossa fragilidade kérmica de desejos e frus- tragées, apego A materialidade do corpo, nosso desespero diante da dor, nossa misera incompeténcia de sermos como desejamos e como nos querem os outros. Este homem que busca a religio, que se converte, é um homem que conheceu o fracasso de si mesmo, impresso no fracasso do seu proprio mundo: um mundo de rela- 62 PRANDI, Reginaldo. Modernidade com feiticaria: candomblé e umbanda no Brasil do século XX. ‘Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 2(1): 49-74, I.sem. 1990, Ges {ntimas © sociais tantas vezes adversas € aversivas; de crencas ¢ ciéncias insufi- cientes ou inacessfveis aos mais pobres; de préticas politicas limitadas; de célculos e previsdes irrealizéveis. A histéria dessas religiées aparentadas, porque meditinicas, porque elos de uma mesma cadeia simbélica da nossa propria histéria como sociedade em formacao, porque experiéncias de concepgées de mundo, da vida e da morte, tao instigantes, a hist6ria dessas religides que so 0 candomblé, o kardecismo, a umbanda, e mais o tambor-de- mina, 0 batuque, a pajelanca, o catimb6, tudo isso impregnado dos secularizados valo- res cristéos do catolicismo pré-Restauracéo e pré-Vaticano II, essa hist6ria decifra-se com a histéria da sociedade. A sociedade é a esfinge. Mas para o crente, 0 convertido, a religifio € a decifrago da sociedade. A {6 é a privacéo da divida, como alguém jé disse. O refluxo do kardecismo em favor da umbanda, que se verifica decisivamete na década de 50, € capaz de espelhar um movimento de reordenamento das classes sociais iniciado nos anos 30, mas muito mais decisivamente, um refazimento da imagem que se experimenta desta mesma sociedade. Nao é s6 0 momento do nacionalismo, mas tam- bém da intervengo do Estado numa politica econémica que prepara o pais para as mu- danas profundas que se dardo no sistema produtivo no segundo pés-guerra, quando a atividade produtiva urbana do eixo Rio-Sa0 Paulo rouba a cena da producao rural, quando as relacdes de trabalho de base familiar e as profissées rurais perdem definiti- vamente para o primado do assalariamento, individual, impondo-se na constituico da sociedade brasileira princfpios universalistas de qualificacdo profissional, competico pelos postos de trabalho, monetarizacio das relagdes de troca, enquanto novas classes médias se moldam pela possibilidade de ascensao social individualizada. J4 € outra a sociedade (Prandi, 1982 e 1978). ‘A umbanda de certo modo rompe com a concepgao kardecista do mundo: aqui néo € mais uma terra de sofrimentos onde devemos ajustar contas por atos de nossas vidas anteriores. Trazendo do candomblé a idéia, ainda que desbotada, pouco definida, de que a experiéncia neste mundo implica a obrigagao de gozé-lo, a idéia de que a realiza- cdo do homem se expressa através da felicidade terrena que ele deve conquistar, a um- banda retrabalha a nogo culpada da evolugéo kérmica kardecista, assim como, através da propiciacéo ritual, descobre a possibilidade de alteracdo da ordem. E necessério que cada um procure a sua realizaco plena, mesmo porque o mundo com o qual nos depa- ramos € um mundo que valoriza o individualismo, a criatividade, a expanséo da capaci- dade de imaginac&o, a importancia de subir na vida. Este pormenor é essencial. Por esta forma de ver mundo, a umbanda se situa como uma religido que incen- tiva a mobilidade social, porém mais importante do que isto € 0 fato de que essa mobili- dade esté aberta a todos, sem nenhuma excesio: pobres de todas as origens, brancos, pardos, negros, frabes... 0 status social nao est4 mais impresso na origem familiar. PRANDI, Reginaldo. Modemidade com feiticaria: candomblé e umbanda no Brasil do século XX. 63, ‘Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 21): 49-74, L.sem. 1990, Trata-se agora, para cada um, de mudar o mundo a seu favor. E essa religifo é capaz de oferecer um instrumento a mais para isso: a manipulago do mundo pela via ritual. As cidades grandes do Sudeste, depois todas as outras, conhecem 0 despacho. Exu esté solto pelas ruas e encruzilhadas do Brasil. Laroié! O kardecismo sempre se pensou como religiao intelectualizada, nascido que foi sob 0 racionalismo do século XIX. Abandonou no Brasil a intenc&o de ser também ciéncia, sob orientacdo de seu mais importante der nos tltimos dois quartos deste sé- culo, Francisco Xavier, para quem “aquele que cré no precisa fazer experiéncias”. A enorme capacidade de organizacao ¢ de constituicao burocrética do kardecismo jamais foi plenamente alcangada pela umbanda: o kardecismo é uma religido que deu certo numa sociedade em que “cada um conhecia seu lugar”. Os Iideres espititas foram pequenos intelectuais de uma pequena-burguesia urbana tradicional, escolarizada, filhos de familias com um minimo de status e com certa visibilidade social, vivendo num mundo em que os papéis sociais estavam fortemente definidos pela origem familiar e social, € que encontravam no espiritismo uma forma de partilhar idéias e ideais anticle- ricais, abragando uma religifo cristd, filantrépica, erudita, que aposta nos homens por sua boa vontade, por sua capacidade de adeséo livre, ¢ que € socialmente conformista. Ainda que muitos pobres ou uma maioria de pobres constituissem as bases do kardecis- mo, do final do século passado até poucos anos apés 1950, a existéncia da religiéo de- pendia muito dessa camada média letrada que optara intencionalmente por essa religifio como alternativa cristé ilustrada. Poucos foram no Brasil os Iideres carisméticos do kar- decismo. A propria lideranca de Chico Xavier impée a necessidade de producio e estu- do de uma literatura, psicografada, que ensina ¢ que salva através da reflexao. J4 0 modelo de lideranca da umbanda tem muito do candomblé, em que todo 0 po- der — verdade e preceito — est4 nas méos do pai ou mée-de-santo e emana do deus ou espfrito que 0 cavalga, cada um em seu terreiro. Em que nfo h& codificacao fundante, no hé um pai fundador, mas varios e antag6nicos entre si. Nem autoridade e nem pen- samento disciplinado que se sobreponha ao carisma do chefe da casa. A lideranga, o governo espiritual, € aceita como desejo e determinagdo da divindade e do encantado. Num pais € numa época em que o bem-estar social, em todas as formas de assis- téncia material e previdencifria, ndo ¢ assumido como dever do Estado, a maneira como © kardecismo realiza a virtude da caridade, que assisténcia espiritual mas também sa- nitéria e material, fez dele importante parceiro no conjunto da sociedade civil, como as sociedades de misericérdia cat6licas, com quem por muito tempo dividiu papéis no cui- dado dos desvalidos ¢ desamparados, fossem criancas, adultos ou velhos. Foi isso um 64 PRANDI, Reginaldo. Modernidade com feitigaria: candombié © umbanda no Brasil do século XX. ‘Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 21): 49-74, grande trunfo do espiritismo em sua defesa contra a pregacdo cat6lica anti-kardecista e em favor de seu reconhecimento institucional pela sociedade. A umbanda se proporé e em parte realizar uma obra assistencial & moda espirita, mas j4 muito menos significa- tiva. No Estado Novo 0 governo federal nao sé regulamenta o trabalho assalariado, como institui a previdéncia social e as aposentadorias. Grande parte das tarefas das obras filantropicas e assistenciais vo sendo incorporadas pelo Estado, que passa tam- bém a financiar érgios néo governamentais de assiténcia, especialmente hospitais, asi- los, orfanatos. Vao se criando na populacdo expectativas por servicos sociais que pas- sam a ser reivindicados como direitos pela populacdo junto aos governos federal, esta- dual e municipal. Cada vez mais o Estado se embrenhard nestas questées. Ainda que os servicos oferecidos sejam ruins, sua prestaco nao € mais um beneficio da caridade lai- ca ou religiosa, é direito do cidadao. Na Arquidiocese de Sao Paulo, a igreja faré ques- tao de mudar sua presenca da assisténcia social direta para o interior dos movimentos sociais, como jé antes estreara no chamado “Movimento de Natal” no Rio Grande do Norte (Camargo, 1971). De um outro prisma, o kardecismo é uma religiéo de transe, da experiéncia reli- giosa pessoal, ¢ a0 mesmo tempo uma religido da palavra, da pregagao doutrinéria codi- ficada em livros religiosos de autoridade incontestével. Dotado de um cédigo moral e doutrinério explicito ¢ de procedimentos condutores da experiéncia religiosa piiblicos ¢ publicados, a iniciagéo no kardecismo adotou uma pedagogia do ndo-segredo, do néio- mistério, Essa universalizacao contribuiu enormemente para uma acentuada unificacao burocrético-institucional. A umbanda carrega consigo parte da norma dos candomblés, que € a do segredo, do recolhimento iniciético, da infalibilidade do pai-de-santo, da autoridade ex cathedra do orixé acima de qualquer preceito, tendo por conseqiiéncias enomes dificuldades de unificacéo doutrindria e institucional. (Nao é desprovida de sentido a existéncia hoje de 42 federacdes de umbanda em Sao Paulo.) O ideal de transe consciente kardecista ¢ o transe modelar inconsciente que a um- banda trouxe do candomblé tem também significado nas formas diferentes de sociabili- dade que se estabelecem nesses grupos religiosos. O sacerdote umbandista nao é dou- trinariamente nem moralmente responsdvel pelo uso que dele faz a entidade que 0 pos- sui. Para os kardecistas as virtudes e habilidades intelectuais do médium condicionam e interferem na plena manifestacao do espirito incorporado. Esta diferenca leva a nogdes muito distintas de cédigo moral, autoridade, responsabilidade e poder. As respostas que 0s umbandistas encontram ao se enfrentarem com a sociedade em mudanga, o sentido que eles experimentam ao lidar religiosamente com este mundo que eles podem manipular, ¢ a nogdo de poder de origem religiosa que eles conhecem € usam podem levar muitos deles ao desejo de sentirem ampliadas essas respostas, essas PRANDI, Reginaldo. Modernidade com feitigaria: candomblé ¢ umbanda no Brasil do sSculo XX. 65 ‘Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 21): 49-74, L.sem. 1990, possibilidades de manipular 0 mundo, esse poder. A umbanda néo terd sido em suas vi- das a religifo final. Segundo movimento: Da umbanda ao candomblé Sao Paulo, anos 60. A umbanda est4 presente, j4 plenamente enraizada no correr da década anterior por todo 0 Estado, em toda cidade, das grandes as pequenas. Como nunca antes, contava-se com um quadro rico ¢ variado de ofertas religiosas. Séo dessa €poca os estudos sisteméticos sobre as novas religiées urbanas no Brasil. A umbanda se fizera, como 0 pentecostalismo, uma grande religiao de converso. Mas diferente do pentecostalismo. E ambas, enquanto alternativas, tém provocado a curiosidade dos pes- quisadores: Por que alguém se converte a uma ¢ nao a outra? Apenas porque so res- postas diferentes para uma sociedade que deixou para trés a via tinica da explicagéo possivel. A lealdade uniforme e unicentrada est para sempre perdida. certo que a umbanda contava com uma grande esteira aberta pelo kardecismo, religiéo igualmente meditinica, e que j4 se constituira no Brasil bem antes desses novos tempos. E quando o candomblé chega em Sao Paulo, nos meados dos anos 60 (Prandi ¢ Goncalves, 1989 e 1989a), a cidade também j4 € bem outra daquela onde aportara a umbanda mais de vinte anos antes. O jeito de se viver na cidade jé € bem outro também. proceso de metropolizacdo jé esté em sua fase plena. J4 estamos préximos dos cinco milhées de habitantes; chegaremos a mais de oito milhdes em 1980, milhdes que se en- volvem por outros milhdes na contigiiidade da regio metropolitana. Alguns indicadores “‘fisicos” nos ajudam a visualizar as mudancas por que passa a cidade neste perfodo. Constroem-se as avenidas expressas das marginais do Tieté e do Pinheiros. Abrem-se as avenidas 23 de Maio, Rubem Berta e Faria Lima, 0 elevado Costa e Silva, a avenida Radial Leste e as ligagées viérias Leste-Oeste. Além das ave- nidas Ricardo Jafet, dos Bandeirantes, Cupecé, ligando as diferentes regides da cidade. E, para dar vazo ao trinsito multiplicado, para dentro e para fora da metrépole, ras- gam-se as rodovias Castelo Branco, Imigrantes, dos Bandeirantes, dos Trabalhadores. Nessa trama de transporte e locomogéo, surge o metré, suas conexées com ferrovias ¢ 6nibus e com os terminais rodovidrios do Tieté, do Jabaquara e da Estacao Bresser. Sao Paulo € um formigueiro. Mais de 2.500 6nibus fazem o trajeto de 720 linhas dentro da cidade. Os trens de subirbio transportam por dia quase um milhao de passa- geiros, 0 metr6, outros dois milhées. E so quatro milhées de vefculos em circulagio, dos quais 34 mil sdo taxis, s6 no municfpio da capital. 66 PRANDI, Reginaldo. Modernidade com feiticaria: candomblé ¢ umbanda no Brasil do século XX. ‘Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 21): 49-74, I.sem. 1990, A paisagem da cidade vai mudando. No centro da cidade, constroem-se os calca- dées no leito das ruas. O grande setor bancério ¢ o de diverséo mudam-se do centro pa- Ta a regido da avenida Paulista e dos Jardins até a avenida Faria Lima. O comércio de rua, especialmente 0 comércio de consumo de luxo vai para dentro dos shopping cen- ters, cujo marco € o Iguatemi, inaugurado em 1966. O comércio varejista experimenta a expansao oligopolista das grandes redes de supermercados. O empério est4 morto. Neste perfodo, a cidade experimenta o exacerbamento das diferencas sociais im- pressas na sua imagem urbana. Os edificios de apartamento crescem em velocidade apenas inferior @ proliferagao das favelas. A vida na cidade muda. Os habitos se alte- ram. A cidade se transforma numa cidade violenta. Ninguém est mais seguro em sua casa, muito menos nas ruas. As casas vo se envolvendo em grades protetoras. Com os saques de 1983, as lojas péem barras de ferro nas suas vitrines. Os meios de comunica- co por satélite cobrem o pais. A televiséo, agora colorida, é definitivamente parte da familia. A midia eletronica unifica ¢ isola, uniformiza e diferencia. Vive-se sob a ditadura militar, vive-se sob censura e medo, mas a metrépole vai conhecendo 0 que Eder Sader chamou de novos personagens sociais: os novos movi- mentos sindicais, os movimentos sociais, as comunidades eclesiais de base (Sader, 1988). Generaliza-se neste periodo 0 crediério, a compra a prazo, ampliando-se por con- segilinte a necessidade que cada um tem de demonstrar a todo instante que € honesto, que tem emprego, que tem fiadores, que pode ter crédito. Todo mundo terf uma conta bancéria para administrar. A cada ano haveré a obrigagio de fazer a declaragao de ren- da. Nunca antes na hist6ria brasileira as pessoas tiveram que ter tantos papéis a respeito de si proprias, pois apenas a identidade, o certificado militar, o titulo eleitoral ¢ a car- teira de trabalho j4 néo permitem ao homem comum mover-se neste mundo de relacdes cada vez mais burocratizadas, impessoalizadas e em meio a um mercado de ofertas que crescem, diversificadas ao infinito. Os utensflios domésticos e outros objetos de uso pessoal ou doméstico tornam-se obsoletos antes mesmo de ficarem velhos. Também no ramo dos produtos alimenticios, novos e mais novos itens véo se impondo como neces- sidades. Sao anos de grandes crises ¢ profundas mudangas. O “Milagre Econémico”’ ges- tado pela ditadura se faz, para em seguida se negar. A metrépole, onde todo emprego era possfvel, comeca a conhecer, jf nos anos 70, o desemprego. Enquanto a economia crescia, o homem diminufa, literalmente. De 1968 a 1978, as novas geracées da metrépole paulista foram ficando com estatura mais baixa e peso menor, em sua maioria. Em contraponto, os filhos das familias de melhores rendas fica- ram mais altos ¢ mais gordos (Prandi, 1982a). PRANDI, Reginaldo. Modernidade com feiticaria: candomblé e umbanda no Brasil do século XX. 67 ‘Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 21): 49-74, 1 sem. 1990. E o homem, principalmente a maioria, que é pobre, foi ficando cada vez mais 6. Ele fica espremido ou no local de trabalho, ou nos transportes coletivos entupidos, ou no espaco escasso da sua residéncia; ndo hé mais para onde ir. A rua, as pragas, os par- ques (que parques?) nao sio lugares nem para distragdo, nem para conhecer pessoas, nem para se representar como individuo que vé e € visto, que nota ¢ € notado, que re- conhece € é reconhecido. Na imensidéo da metrpole ndo hé espaco piblico para esse novo homem € essa nova mulher cosmopolita e narcisista. Os lugares publicos foram tomados pelos auto- méveis, pelos trombadinhas, pela apropriacdo privada, Restam, contudo, os clubes, os bares, os templos ¢ terreiros religiosos. Os templos tém sido desde muitos séculos lugares privilegiados onde homens e mulheres se apresentam publicamente, se reconhecem, e ao se apresentarem representam as estruturas € papéis sociais. No Brasil colonial, brancos separados de negros, cada um em sua igreja; homens de um lado, mulheres do outro; os mais comuns atrés ¢ os de maiores posses na frente. No catolicismo de vinte anos atrés, ainda se separavam os homens das mulheres (costume que o velho candomblé e grande parte da umbanda pre- servaram). Na sociedade que estamos estudando, as comunidades eclesiais de base ¢ os movimentos sociais podem também ser vistos como criaco de espacos piiblicos; e poli- ticos, porque, voltados para interesses coletivos. Esse homem e essa mulher que ndo tém para onde ir sofrem ainda com 0 amesqui- nhamento de sua vida privada, fntima. Nao pode uma vida familiar deixar de se empo- brecer quando as préprias condigdes econdmicas nao fornecem espaco ffsico conforté- vel. Numa época em que 0s familiares pouco se falam, pois nem hé tempo para isto. Em que a reunido da familia se emudece para assistir, através da televisio, ao mundo das intimidades imaginadas. Por onde se vé também — mas sem participar — 0 desenrolar dos conflitos na esfera do mundo publico politico (Sennett, 1988). Nesta nova sociedade, também, o homem perdeu muito da seguranga que se ima- ginava poder alcangar até bem poucos anos atrés. A mobilidade social nem é mais ga- rantida pela escolarizacdo de nivel médio e superior, que ao se ampliar brutalmente nos anos 60, banalizou-se, deixou de ser instrumento seguro para a planificaco da vida pessoal € para os projetos familiares. Esse homem destes novos tempos acredita menos nas promessas de uma sociedade que busca intensamente pét-se na via da planificagéo racional ¢ da organizagdo burocritica. Mas nao € s6. Os anos durante os quais 0 candomblé viré a se instalar em Sao Paulo, grosseiramente nos meados dos 60 ¢ nos primeiros anos dos 70, e que estamos habituados a chamar simplesmente de ‘os anos 60”, marcam um periodo de fundamen- tais efervescéncias no plano da cultura e das mentalidades; profundas sao as mudancas ‘em relago aos modos de vida € aos c6digos intelectuais. Na Europa, nos Estados Uni- 68 PRANDI, Reginaldo. Modernidade com feiticaria: candomblé e umbanda no Brasil do século XX. ‘Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 2(1): 49-74, Lem. 1990. dos, no Brasil. No Brasil, sobremaneira no Sudeste, nas grandes cidades, na metrépole paulista. ‘Sao os anos da contracultura, da recuperacéo do exético, do diferente, do original. A juventude ocidental ilustrada se rebela, toma gosto pelas civilizacées orientais, seus mistérios transcendentais e ocultistas (lembremo-nos dos Beatles e da peregrinaco da juventude americana e européia em busca dos gurus do Himaldia). Valoriza-se a cultura do outro. No Brasil, a cultura indfgena. A antropologia redimensiona a etnografia para fazer politica indigenista. E a cultura do negro. A sociedade sai em busca de suas rai- zes. E preciso voltar para a Bahia — “por que ndo?” —, acampar em Arembepe. Abrir as portas da percepgdo, ir em busca do prazer, da expansio da sensibilidade, de gratifica- c6es imediatas para 0 corpo e para a mente. O inconformismo e 0 desprezo pela cultura racional, essa mudanga de rumos, est4 nas classes médias. Nao obstante, vale lembrar que o movimento se mostra de forma generalizada através da midia, que jé € eletrénica, ¢ provoca novos gostos, traz novas informagoes. A intelectualidade brasileira de maior legitimidade nos anos 60 participar ativamente de um projeto de recuperagao de origens, que vai remeter muito diretamente a Bahia. Em 1964, através da antiga TV Excelsior, Elis Regina canta o “‘Arrastéo”, de Ruy Guerra e Edu Lobo: “eh, meu irmao me traz lemanja pra mim. Nunca se viu tanto peixe assim...”. Da modemnidade da bossa nova partia-se para a recuperacdo do contetido de uma brasilidade “‘legitima”’. lemanjé, diga-se de passagem, j4 é muito conhecida no Sul- Sudeste através da umbanda. Mas, na medida em que a referéncia passa a ser a Bahia, o orixé passa a ser referido como o da Bahia, isto €, 0 do candomblé. Sao anos de produ- cao de uma nova forma de cantar em que elementos da cultura do candomblé vao se firmando com legitimidade nas classes médias consumidoras do que se produz de mais avancado no pais. Da Bossa Nova & Tropicdlia, os baianos estéo na ponta da renovacdo da musica popular brasileira. O “Canto de Ossanha” de Vinicius e Baden, ainda com Elis, mas j4 pela TV Record, € novo marco. Virio Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa, Maria Bethania, entre os mais importantes, Tudo leva a Bahia: 0 Cinema Novo, as artes cénicas. Com “‘O Pagador de Promessas”, filme de Anselmo Duarte da pega de Dias Gomes, 0 Brasil se reconhece e se faz reconhecer nas telas do mundo inteiro. Ian- sG, Santa Barbara da promessa, esté no centro do enredo: o padre contra, 0 povo a fa- vor. Eparrei Oid! O paladar do pais experimenta 0 sabor do azeite de dendé. Aprende- mos a gostar de aracajé, vatap4, caruru... Essa enorme publicidade e popularidade que a Bahia e a cultura negro-baiana vao alcangando, através também da literatura de Jorge Amado, de pecas de teatro como “Zumbi” (““...ziquizira posso tirar..., Upa Neguinho na estrada...”) nos apresenta as venerdveis méaes-de-santo dos candomblés de Salvador: primeiro Olga do Alaketo, PRANDI, Reginaldo. Modernidade com feitigaria: candomblé umbanda no Brasil do século XX. 69 ‘Tempo Social; Rey. Sociol. USP, S. Paulo, 2(1): 49-74, sem. 1990. depois, e definitivamente, Menininha do Gantois. Nas vozes de Gal e Bethania, e tantos ‘outros, o Brasil inteiro aprende a cantar, de Caymmi, “A Oxum mais bonita esté no Gantois... Ai, minha mae, minha mae Menininha...”. Pela miisica popular aprendemos os nomes dos santos, que também so os da umbanda, mas agora € necessério ir até a Bahia para pedir a bengdo de Menininha, para jogar os biizios e ler a sorte, para expe- rimentar 0 sabor do feitico, o verdadeiro. Ora yé yé d! Esse consumo, que néo ¢ do pobre, mas é do jovem, do estudado, do branco me- ‘tropolita, leva primeiro essa classe média aos terreiros da Bahia: ha um novo universo no mercado religioso interno, & altura das formas mais originais ¢ herméticas do Orien- te. Mas a metrépole nao vai pagar por muito tempo o prego de ir tao longe. Quer que a Bahia seja refeita aqui, em So Paulo, por que nao? E quando o candomblé chegar, sua clientela j4 estar de prontidao. Uma clientela de classe média, alias, indispensdvel para garantir a infra-estrutura desta religido, clientela que se ampliaré e se diversificaré muito, evidentemente. De toda sorte, j4 temos af uma pré-condicao importante. E 0 povo-de-santo que descerd da Bahia, para essa nova fronteira da metrépole do Sudeste, ¢ que aqui abriré terreiros e faré filhos-de-santo, refazendo aqui a religiao de 14, oferecendo aqui os feitigos e adivinhagées 14 aprendidos, vai querer ser, todo ele, um filho do Gantois, de Menininha. Mas isto € outra hist6ria... E neste context (econémico, social e cultural), que 0 candomblé chega e se ins~ tala em Sao Paulo. Como religido, abstratamente, reforcard idéias de que a competicao na sociedade € bem mais aguda do que se podia pensar, que € preciso chegar a niveis de conhecimento muito mais densos ¢ cifrados, que o poder religioso tem amplas possibili- dades de se fazer aumentar. Na pritica, enquanto grupo de culto, comunidade de fiéis, pemnitiré o transito num espago em que no h4 separacdo entre a intimidade e a publici- dade. Onde, portanto, no hé nada a esconder ou reprimir, com relagdo a si mesmo € com relacao aos demais. Onde também podemos ser 0 que somos, o que gostariamos de ser € 0 que 08 outros gostariam que fssemos. A um mesmo tempo. Enquanto agéncia de servicos religiosos ofereceré ao no devoto um tipo de servi- go em que o sagrado, o estritamente religioso, é pouco exigente para quem busca uma religido nao para ser ou por ser religioso, mas simplesmente para a solucdo de um pro- blema ndo resolvido por outros meios. Aos olhos do cliente, a densa sacralidade do candomblé pode, também, passar desapercebida. Isto permitiré ao homem de mentalida- de laicizada das classes médias — de onde sai o grosso da clientela do candomblé na metrépole — um menor ou nulo envolvimento religioso quando se trata de uma solugao ad hoc: posto que pensada como magia executada pelo sacerdote ¢ menos como inter- vengéo de uma divindade espiritual que ele tem que enfrentar face to face na umbanda. Este deslocamento da magia em relacdo ao plano da religiéo, no sentido de que a magia pode ser exercida ¢ pensada como prética aut6noma, as vezes até se valendo de proce- 70 PRANDI, Reginaldo. Modernidade com feitigaria: candomblé ¢ umbanda no Brasil do século XX. ‘Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 2(1): 49-74, 1.sem. 1990. dimentos aparentemente cientfficos, isto ¢, totalmente dessacralizados e racionais, re- pete talvez, 0 processo estudado & exaustio por Keith Thomas para a Inglaterra dos sé- culos XVII e XVIII (Thomas, 1985), $6 que agora € a religifo que dé legitimidade para esta mégica “‘autnoma” e, por isso, nem considerada magia, nem julgada perniciosa para a sociedade. Essa legitimidade de elementos de uma cultura negra, ou de origem africana, cujo celeiro mais importante é a Bahia, essa legitimagGo da “‘raiz”, gestada pela classe média intelectualizada do Rio e de Sao Paulo, que adota os artistas ¢ intelectuais baianos, in- clusive, propaga-se pela midia eletronica e chega a todas as classes sociais. Também entre os pobres, que ndo viviam esse desejo de retomo e rebeldia que atracou no Porto da Barra, subiu a ladeira do Gantois na Federacdo e se embrenhou pelo Matatu de Bro- tas. E se alastrou inclusive entre umbandistas, que com esforgo buscavam desde muito apagar justamente essa origem néo branca de sua religio, essa Bahia, essa Africa. No imaginério deste crente, crente que € pobre, o orixé “original”, cantado e cortejado por aquele que € mais rico, mais escolarizado, famoso e mais bem sucedido na vida, esse orix4 cultuado 4 moda “antiga”, 4 moda dos candomblés, vai se revelando mais forte, mais rico, mais “‘auténtico”, mais poderoso. Este mesmo crente umbandista que viu tantos de seus sonhos fracassarem, muitos deles anunciados pela sua religiao, ainda é um homem de fé. Uma religiao nao se faz apenas para uma clientela interessada na solucao de pro- blemas eventuais e no prazer da experiéncia emocional no comprometida. Uma religido precisa de devotos; sem eles os deuses no existiriam. E este fiel sente agora que talvez seja preciso ir mais fundo, No sentido religioso, para o sentido da vida. Mais que nunca, numa sociedade como a de agora, ‘“é preciso estar atento e for- te”, nas palavras do poeta baiano. © umbandista que passaré para os quadros do can- domblé diria: mais forte. Recebido para publicacdo em novembro/1989. PRANDI, Reginaldo. Modemidade com feiticaria: candomblé umbanda no Brasil do século XX. 71 Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 21): 49-74, 1.sem. 1990. PRANDI, Reginaldo. Modernity with Sorcery: Candomblé and Umbanda in XXth Century Brasil. ‘Tempo Social; Rev. Sociol. USP, S. Paulo, 21): 49-74, I.sem. 1990. ABSTRACT: Umbanda has been considered the most genuine Brazilian religion originated from believes brought to Brazil by the African slaves. This article wants to show how the constitution of this religion keeps a strong relationship to certain social changes in Brazil about the 1930's, particularly in Rio de Janeiro. By 1950 Umbanda was spread throughout the country as a religion for all kinds of people whatever their color, class and geographic origins could be. Candomblé, that is the African worship that Umbanda is derived from in sincretism with Catholicism, Indigene faiths of Brazil, and the French Kardecism, still goes on being a religion for some groups of Negroes in the Northwestern. Nonetheless, about 1960 and since, expressive parts of Umbanda adepts started practicing Candomblé, basically in the big and developed cities in the Southeastern. The author trys’ to understand why this kind of movement has been happening and what particular dimensions of the recent changes in Brazilian society all this is related to. UNITERMS: Brazil: african religions, “Umbanda”, “Candomblé”, social changes. 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