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MESTRADO EM LINGUAGENS

CEFET-MG
• . Aluno-Márcio R.A.Silva
Disciplina- Teorias
Contemporâneas do
Discurso
Análise Discursivo-
Literária da obra: A
PAIXÃO SEGUNDO
G.H. DE Clarice
Lispector
A POSSÍVEIS LEITORES
• Este livro é como um livro qualquer. Mas eu
ficaria contente se fosse lido apenas por
pessoas de alma já formada. Aquelas que
sabem que a aproximação, do que quer que
. e penosamente -
seja, se faz gradualmente
atravessando inclusive o oposto daquilo que se
vai aproximar.
Aquelas pessoas que, só elas, entenderão bem
devagar que este livro nada tira de ninguém.
A mim, por exemplo, o personagem G.H. foi
dando pouco a pouco uma alegria difícil; mas
chama-se alegria. C.L.
“A complete life may be one ending in so full
identification with the nonself that there is
no self do die” Bernard Berenson

.
• Essa foi a primeira vez que Clarice colocou um aviso antes da epígrafe
• Com a assinatura C.L., a autora faz ao leitor uma antecipação de que G.H. é C.L. e
que C.L. é G.H. Narradora e protagonista se fundem no indecifrável onomástico G.H.
• O leitor de “alma já formada” pedido por C.L. é o leitor-modelo preconizado por
Humberto Eco: “ uma espécie de tipo ideal que o texto não só prevê como
colaborador, mas ainda procura criar”
• Lispector também se coloca como autora-modelo fazendo o pretendendo fazer a
seleção de seus possíveis leitores: “ é a voz que nos fala afetuosamente (ou
imperiosamente, ou dissimuladamente), que nos quer a seu lado. Essa voz se
manifesta como estratégia narrativa, um conjunto de instruções que nos são dadas
passo a passo e que devemos seguir quando decidimos agir como leitor-
modelo”(ECO,1994,P.21)
• Com a epigrafe em inglês, C.L. reforça o leitor pretendido, e, estabelece de imediato
um diálogo com outro autor, fazendo assim, o preconizado por Bakthin citado por
Fiorim(2000): “ A orientação dialógica é naturalmente um fenômeno próprio a todo
discurso. Trata-se naturalmente de qualquer discurso vivo...o discurso se encontra
com o discurso de outrem”
• Não fazendo a tradução C.L. tira algo de alguém (do possível interlocutor).
+ O Romance monologal surgia naquela época. Lispector fazia aqui aquilo que James Joyce
havia feito nas letras saxônicas: o abandono da narrativa linear pelo monólogo interior: dessa
forma a PSGH legitima-se ao construir um enlaçamento com o sistema cultural que se
estabelecia no campo literário, “palco de um conflito permanente de posições” (MAINGUENEAU,
2001, p.122).

+ Para Maingueneau (20011) “a situação dentro da qual a obra se enuncia não é um contexto
preestabelecido e fixo: encontra-se tanto a montante quanto a jusante, pois deve ser validada
pelo próprio enunciado que permite exibir- (montante=direção que fluem as águas,
jusante=sentido que fluem as águas).

+ Nesse sentido, a escritura clariciana, ao contrastar com o dominante na literatura brasileira


(romance) validar uma poética em que a “aventura da enunciação” e a “aventura da criação
literária” caminhassem juntas.

+ A situação da enunciação da obra, chamada por Maingueneau (2001) de cenografia,


não,equivale pois, ao contexto contingente de uma “mensagem”, e sim “ uma articulação
insubstituível entre a obra considerada como objeto estético, por um lado, a condição do escritor,
os lugares, os momentos de escrita, por outra”. Ela é, pois, um dispositivo que permite articular a
obra sobre aquilo de que ela surge: a sociedade, bem como a própria vida do autor.
• Estrutura da obra: Com a PSGH Clarice transgride a chamada estrutura do romance. Ação, tempo, personagems,
narrador e lugar/ambiente podem perder ou perdem as características preconizadas pela teoria do romance para
criar algo novo, mais centrado na linguagem e, que esprime aquilo que vemm de dentro para fora.

• Expedientes romanescos como como diálogo, narração, descrição e dissertação, também receberam um
tratamento diferenciado no romance APSGH vejamos:

• Diálogos- não existem

• Narração: foge do tradicional, observa-se uma mudança brusca da narração para a introspecção, uma impressão
da personagem. Ela mais parece um mergulho naquilo que está na mente do narrador.

• Descrição: é sempre curta, só se descreve aquilo que realmente interessa à personagem protagonista.

• Dissertação: Moisés (1981) ensina que a dissertação (exposição de ideias e conceitos) é exclusiva do romance.
Em APSGH o elemento dissertativo busca desvendar e entender a alma humana: “ Eu era a imagem do que eu
não era, e essa imagem do não-ser me cumulava toda: um dos modos mais fortes é ser negativamente.”
(LISPECTOR, 1964, p.31). Dissertação também sempre curtas.

• Ação: como APSGH não tem núcleos. A ação passa-se na consciência e subconsciência de G.H.

• Tempo: o tempo se classifica em cronológico e psicológico.

• Personagens: a obra não as tem, tem sim uma personagem central e única.
• Narrador: G.H. narra sua própria história. Na primeira pessoa: “dar a mão a alguém foi o que esperei da alegria”
(LISPECTOR, 1998, p.17

• Lugar/ambiente: pelas falas da narradora sabemos que o apartamento de G.H. localiza-se na cidade do Rio de
Janeiro e “em todos os lugares e em nenhuma parte” como ela diz, e também “ao lado da caverna dos
trogloditas, como na selva de pedra carioca”. Encontra-se enfim na civilização humana. Em A paixão segundo
G.H não muito essencial saber do ambiente do apartamento do 13º andar-cobertura- onde mora a protagonista.
Vale mais saber que o texto compartilhado conosco nos faz sentir que a reflexão é um convite para todos os
leitores da obra
Referências:

• LISPECTOR, Clarice. A paixão segundo G.H. Rio de Janeiro:Rocco, 1991

• BRASIL, Assis. Clarice Lispector, ensaio. Rio de Janeiro: Organização Simôes Editora, 1969

• BRANDÃO, Helena. Introdução à análise do discurso. Campinas:Unicamp, 1991, pp.44-67

• ECO, Humberto. Entrando no bosque. IN. Seis passeios pelo bosque da ficção. Trad. Hildegard Feist, são Paulo:
Cia das letras, 1994, p.7-31.

• FIORIM, José Luiz. Introdução ao pensamento de Bakthin. São Paulo: Ática, 2006, pp.18-59

• OLIVEIRA, Clenir Bellezi de . Fênix das palavras (artigo). Discutindo Literatura. São Paulo Ano 3 nº 14, 2007.

• MOISÉS, Massaude. A análise literária, 6º ed. São Pauo:Cultrix, 1981

• MAINGUENEAU, Dominique. O contexto da obra literária. Sãp Paulo: Martins Fontes, 2001

• Revista Cadernos de Literatura- Ed.Especial nºs. 17 e 18- Dezembro de 2004. Publicação do Inst. Moreira
Salles-Rio de Janeiro.
Clarice Lispector- 10/12/1920-09/12/1977

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