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Antonin Leonard

Matthieu de Maupeou

Pesquisa Empírica em Julgamento e Tomada de decisão – Trabalho final

A utilização crescente do storytelling na comunicação política nos


Estados Unidos

Vincent Auriol, o primeiro presidente da Quarta Republica de França, conta em seu


« jornal » que seu próprio filho se encarregava de responder às chamadas telefônicas no
Palácio do Elysée. Desde então, os governos e palácios presidenciais no mundo inteiro se
encheram de profissionais das « public relations », e hoje em dia, poucas palavras ainda são
deixadas sujeitas ao acaso. Naturalmente, essa importância crescente das técnicas de
comunicação nos discursos políticos e na expressão midiática varia muito dependendo do
país : a quantidade de estudos sobre a questão nos Estados Unidos mostra a preocupação
dos atores da vida publica para a comunicação. Mas por outro lado, tem muitos paises onde
os políticos prestam menos atenção na maneira mas eficaz de seduzir a população,
particularmente quando as pessoas associam essas técnicas ao termo negativo de
« propaganda ». Ferramenta de manipulação, essa é considerada antidemocrática e suscita
a denúncia. A palavra mais simples, mais neutra de « comunicação política » precisou
tempo para ser aceitada. Foi só a partir dos anos sessenta que no mundo ocidental, as
eleições presidenciais conheceram uma sofisticação e uma profissionalização crescente das
técnicas de comunicação.

Os expertos dessa matéria ensinaram estratégias e técnicas aos novos


departamentos de informação e comunicação dos governos, e este desenvolvimento da
comunicação política suscitou cada vez mais análises de filósofos e historiadores da mídia.
Essas técnicas dizem respeito à natureza das relações entre os jornalistas e políticos, aos
efeitos das mensagens políticas, ao impacto das campanhas eleitorais sobre os votos. Os
estudos sobre os « public relations » se apóiam nessas campanhas, nos programas de
televisão sobre política, e até nos livros que cada vez mais políticos escrevem (por exemplo,
em França, quase ninguém político se atreve a pretender obter um posto muito elevado sem
ter escrito um ou vários livros).

As pesquisas de multiplicaram sobre a estrutura textual e a argumentação dos


discursos políticos na mídia. Isso foi particularmente apos os sucessos de políticos
nacionalistas : suscitaram uma abundante reflexão sobre a eficácia simbólica dos discursos
1
« populistas » e «racistas. Alem disso, estudos sobre o « framing » permitiram explicitar a
maneira com que o discurso político difundia nas mentes dos eleitores representações,
definições dos problemas públicos capais de influenciar seus votos.

O Storytelling pertence a essas técnicas inspiradas das ciências cognitivas e que


tenta agir diretamente sobre as representações mentais dos eleitores. E uma tendência
aparecida nos anos oitenta, durante a presidência de Reagan, quando os « stories »
começaram a se substituir às estatísticas no discurso oficial. E no mesmo tempo, as ficções
do presidente à realidade. O antigo ator de Hollywood acreditava no « poder das historias »
sobre as mentes. Às vezes, evocaria um episodio sacado dum velho filme de guerra como si
pertencesse à história real dos Estados Unidos.

O que é o Storytelling na comunicação política ? Apenas contar a historia do


candidato, a historia da sua visão do e para o país, ilustrando com anedotas a fim de
conseguir adesão. E isso é eficaz. Parece que, muitas vezes, uma boa narração vale mais
do que um longo discurso, e que resulta mais fácil se dirigir às emoções das pessoas do que
a sua mente. Parece que contar se tornou num modo de seduzir ou convencer, influenciar
um público, eleitores, clientes. Isso também significa : compartir, transmitir informações, uma
experiência .

Nesse documento, nós vamos descrever e analisar aquela ascensão da pratica do


Storytelling no caso particular da política estadunidense, e de varios candidatos ou
presidentes em cargo do poder. Nesse sentido, vamos mostrar numa primeira parte como a
utilização de técnicas de comunicação em relação com o « framing » se desenvolveu na
comunicação política, logo como os políticos americanos, de Reagan até Obama,
aproveitaram o processo de Storytelling, e finalmente tentaremos nós interrogar sobre as
razões profundas e a viabilidade e desse fenómeno.

I. Discurso político, poder da linguagem e « framing effect »

Um político sendo « fora do poder » (por exemplo um candidato às eleições


presidenciais), ou em situação de poder (membro do governo), ele tem que agir e
comunicar, comunicar e agir, mas com estratégias diferentes porque esta em posições com
legitimidades distintas. Mas nos dois casos, ele tem diversos tipos de palavra a disposição :
palavra de promessa, palavra de decisão, de justificação e de ocultação.

A palavra de promessa deve definir uma identidade social, com um sistema de


valores e jeitos para lhe alcançar. Este discurso tenta ser tanto idealista como realista. Além
disso, como o candidato quer a adesão do máximo de pessoas possíveis, ele tenta comover
seu público, focando às vezes na razão, às vezes na emoção. A palavra de decisão é sobre
tudo uma palavra de fazer, fundada sobre uma posição de legitimidade no posto de poder.
Decisão de intervir ou não num conflito, decisão de orientar a estratégia econômica em um
rumo ou outro, etc. A palavra de justificação aparece no momento de toda decisão, porque
2
todo anuncio de ação – o sujeito ocupando um cargo de poder ou não - precisa ser
justificada, como será questionada ou duvidada pelos adversários políticos ou os
movimentos dos cidadãos.

Assim, o discurso político tem varias ferramentas e grandes características, mas


também tem restrições. Restrições de simplicidade, porque falar ou escrever para as
massas, é dirigir-se a um conjunto de indivíduos heterogêneos do ponto de vista dos seus
níveis de educação, da capacidade de se informar, da capacidade de raciocínio e da
experiência de vida coletiva. Logo, tem restrições de credibilidade que levam o político a se
constituir uma imagem de si mesmo, que servira de base de identificação para todos.
também tem restrições de « dramatização » no sentido de animar a vida política usando
palavras e argumentos que toquem a emoção do público.

Por todas essas razões, e por causa do desenvolvimento dos « mass media », da
liberdade de palavra para todos, das enquêtes de opinião, se tornou cada vez mais
complicado para um político conseguir ter uma boa imagem na opinião publica. Desse
modo, a partir dos anos setenta principalmente, todos começaram se cercar com
especialistas de comunicação. Esses famosos « spin doctors » apareceram no governo de
Reagan no momento da crise do « Watergate », a fim de destruir a imagem publica de
Richard Nixon e se fosse possível, do Partido Democrata inteiro. Artigos de jornais,
entrevistas ou debates na Televisão, discursos, maneira de se vestir, viagens
internacionais : todos os aspectos da vida pública e privada dos políticos se tornou
observada, analisada e julgada pela mídia e então preparados por seus conselheiros.

Baseando-se sobre as teorias do discurso, os métodos de retórica e de


argumentação, e hoje em dia até sobre as ciências cognitivas (Georges Larkoff, conselheiro
de Obama, é professor dessa matéria na Universidade de Berkeley), essas pessoas
participam da construção de personagens públicos capais de tocar no mesmo tempo o
coração e a mente dos eleitores.

Para seduzir os eleitores, esses profissionais da comunicação política não podem


fazer sem o conceito de « framing » : a maneira mais eficaz para combinar o discurso
política com as expectações do público é estudar o processo de representação mental, e
então o « framing ». Esse conceito nós explica que durante a vida inteira, uma pessoa
constrói para si vários « filtros emocionais ». A pessoa usa esses filtros para compreender o
mundo, e as escolhas que ela faz são diretamente influenciadas por eles.
Conseqüentemente, « framing » é influenciado pelo contexto da escolha e a maneira com
que esta formulada, porque dependendo dessa formulação, uma escolha vai poder
corresponder com distintos representações na mente do sujeito. Para esclarecer : quando
alguém tenta explicar um evento, a maneira de entendê-lo muitas vezes depende da forma
utilizada para descreve-lo (palavras, contexto de referência). Aplicado na política, o “framing”
parece muito relevante: é o Senhor Lakoff quem fala desse exemplo: “o dia em que Georges
Bush se estabeleceu na Casa Branca, as palavras “tax relief” – alívio de impostos –
começaram a sair do seu escritório”. Esse novo termo vem se opor diretamente nas mentes
nos conceitos de “tax burden” ou “tax responsabilities”, e suscita uma promessa de

3
benefícios. Após um anúncio de “tax relief”, que adversário vai poder, vai se atrever a
denunciá-lo? Seria como se opor às pessoas vítimas de impostos pesados.

Com a importância do “framing” e as dificuldades em geral dos discursos políticos


alcançar da melhor maneira as expectativas emocionais e racionais dos eleitores, nós
explicamos porque se tornaram tão importantes às técnicas de comunicação política. No
mesmo tempo, vimos quais são as restrições que esses discursos devem respeitar, e alguns
formatos que podem ter. Insistimos sobre a relevância e a dificuldade de aproveitar o efeito
“framing”, que constrói representações em nossas mentes, cujas representações os políticos
tentam tocar e dum certo modo manipular, com o apoio dos seus conselheiros.

Agora, vamos estudar um modo mais especifico de fazer comunicação política: o


Storytelling.

II. Ascenção do Storytelling nos Estados Unidos pós-setenta

Ashley’s story1

Foi o videoclipe mais caro da campanha presidencial americana de 2004 : 6,5


milhões de dólares segundo uma pesquisa do Center for Public Integrity. A difusão na
televisão durante as três últimas semanas da campanha veio com uma operação de
comunicação incluindo a expedição de mais de 2,3 milhões de envios postais, a criação de
um site da Internet, milhões de e-mails e chamadas automáticas2. Esse sucesso sem
precedente na historia das campanhas políticas americanas e Ashley’s story se tornou um
objeto de estudo para os pesquisadores em comunicação.

Segundo Susan Allen, da universidade de Maryland, “os defensores dos dois campos
reconheceram a eficiência desta campanha3”. “Foi um exemplo de comunicação realmente
muito eficiente, comentou John Green, professor de Ciências Políticas na Universidade de
Akron em Ohio, porque contava uma historia pessoal, tratava de um tema importante,
complicado, o terrorismo, e o situava num contexto que as pessoas podiam compreender.
[...] O clipe quebrava um tabu usando a filha de uma vitima do 11 de Setembro para
transmitir uma mensagem política, mas poucas pessoas criticaram esse aproveitamento».

O maior impacto emocional da história de Ashley tinha muito a ver com seu caráter
“memorável, motivador e positivo”4. O clipe dura só um minuto, mas é verdade que é muito
eficiente: a montagem rápida de tomadas curtas apresentando os diferentes testemunhos
deixa o relato bastante coerente e crível. O presidente, figura central da narração, não se
exprime. Não expõe idéias, nem apresenta um programa. So é serenidade e bondade. A

1
http://www.youtube.com/watch?v=LWA052-Bl48
2
Susan ALLEN, « Ad Analysis », Political Advertising Resource Center, 19 de Outubro de 2004,
www.umdparc.org/AdAnalysisAshleystory.htm.
3
Ibid
4
Eric BOELHERT, « The TV ad that put Bush over the top »
4
jovem Ashley primeiro aparece em foto mas é ela quem anuncia a mensagem chave do
relato : “E o homem mais poderoso do mundo e quer assegurar-se que estou bem.”

Segundo a socióloga Francesca Polletta, o videoclip “demonstra que o atentado do


11 de Setembro tocou as camadas mais profundas dos Estados Unidos e apresenta as
vítimas como se pertencessem ao campo de Bush. Outro objetivo do clipe é dizer que a
ameaça terrorista agora pertence ao passado. Preocupar-se pela seguridade de Ashley, é
ajuda-la a olvidar a emoção de um ataque terrorista e não proteger ela de um ataque no
futuro5”.

“Eles contam uma historia, nós recitamos uma ladainha.”

Exemplo relevante de manipulação, Ashley’s story pode ser visto como a


consagração, revisada pelo storytelling, dos “conselheiros em comunicação” ou spin doctors,
empregos aparecidos vinte anos antes no mundo político. O término spin doctor, inventado
pelos conselheiros de Ronald Reagan em 1984, apareceu por primeira vez durante o debate
com o candidato democrata Walter Mondale. Como ele dominou o presidente, Lee Atwater,
o conselheiro de Reagan declarou ao final do debate : “Agora vamos embora e vamos
debater sobre o debate (spin this afterward)”. Hoje em dia, o “debate sobre o debate” nas
campanhas políticas tornou-se tão importante quanto o debate e permitiu a Reagan (graças
a uma intensa campanha de spinning) ser declarado ganhador do debate.

Lee Atwater era o perfeito exemplo dessos conselheiros na sombra que o jornalista
Jack Rosenthal chamou spin doctors6 o 21 de Outubro de 1984, o dia mesmo do debate,
num editorial do New York Times. Os spin doctors se definiam como agentes de influência
que podiam fornecer argumentos, imagens e uma postura para produzir um certo efeito
sobre a opinião pública. Depois da derrota democrata de 2004, James Carville, um dos spin
doctors responsáveis da vitória de Bill Clinton em 1992, declarou : “Acho que poderíamos
eleger qualquer ator desde que tenha uma história para contar7.” “Um relato é a chave de
tudo”, afirmou também Stanley Greenberg, especialista das pesquisas de opinião no partido
democrata. Alguns dias depois, James Carville foi ainda mais explícita : “Os republicanos
dizem : “Nós vamos proteger vocês dos terroristas de Teerã e dos homossexuais de
Holywood”. Nós dizemos : “Nós somos por ar puro, escolas melhores, mais curas de saúde.”
Eles contam uma historia, nós recitamos uma ladainha8.”

Mas, é um relato o fato de afirmar “Vou proteger vocês dos terroristas de Teerã e dos
homossexuais de Holywood”? Provavelmente não, em termos de categorias literais pelo
menos. No entanto, usar esta frase no contexto das eleições procurava contar uma historia.
Segundo Francesca Polletta, “James Carville queria dizer que os eleitores republicanos
deviam escolher heróis contra maus; novas personagens que representavam a ameaça.
Enquanto os eleitores democratas deviam optar por uma mera lista de temas da vida
cotidiana.” Para ele, os republicanos conseguiram apresentar as apostas da eleição com

5
Francesca POLLETTA, It Was Like a Fever
6 O termo se inspirava do efeito dado a uma bola de tênis.
7 Citado por Francesca POLLETTA
8 Citado por William SAFIRE, « The way we live now narrative », New York Times Magazine, 5 de Dezembro de

2004
5
uma intriga acessível e usando emoções simples como o medo, a solidão, a necessidade de
proteção. Colocavam na cena eleitoral heróis simpáticos (a classe media norte-americana) e
maus (os terroristas de Teerã e os homossexuais de Hollywood) para criar entre eles uma
tensão narrativa que a eleição do candidato devia resolver.

Paul Begala, outro spin doctor democrata, explica que uma das razões da derrota de
John Kerry em 2004 foi sua incapacidade a contar uma historia coerente. “Se você não
comunicar com historias, você não esta comunicando. Os homens tratam as informações
sob uma forma narrativa. E por isso que, desde os mitos gregos, a historia da humanidade
sempre foi contada com relatos9.” Entre os doze segredos que permitiriam ganhar uma
eleição segundo ele, tem a arte de contar historias. “Os fatos falam, mas as historias
vendem.”

Seth Godin, um dos expertos do marketing mais famosos, faz a mesma analisa : “
Porque, depois de ter gastado 100 milhões de dólares, John Kerry perdeu as eleições contra
um rival que tinha uma popularidade muito baixa? E simples : não contou uma historia
coerente. Não difundiu uma mentira que valia a pena lembrar, uma historia da qual as
pessoas poderiam falar. [...] Enquanto George W. Bush encarnou com talento a personagem
do dirigente forte, convencido e infalível. Kerry quis combater com sua inteligência, mas
falhou porque poucas pessoas decidiram achar uma historia que elas percebiam obscura e
incoerente10.”

Interrogado por Newsweek em Outubro de 2006, James Carville opôs outra vez o
relato republicano à ladainha democrata : “Por que os democratas têm tanta dificuldade para
ganhar as eleições ? Porque recitam uma ladainha previsível : “Creio no direito das
mulheres de escolher sua vida. Creio que um bom sistema escolar é essencial para que
sejamos o que somos. Estou a favor de um salário mínimo”. Bla bla bla. E como quando era
coroinha : “Creio na virgindade de Maria. Creio neste e nisso. John Kerry contou sua
ladainha durante a campanha [de 2004], enquanto Bush dizia : “era alcoólico e fui salvado
pelo poder de Jesus e fui salvado pelo 11 de Setembro e vou proteger vocês dos terroristas
de Teerã e dos gays de Hollywood.” Os democratas tendem a recitar uma ladainha, em vez
de desenvolver um relato coherente. Concordo com muitos elementos desta ladainha. Mas
assim não é como vamos ganhar11.”

III. O poder das historias: Mito ou realidade?

Contudo, algumas semanas depois da eleição de 2004, William Safire, com sua
experiência da comunicação política, zombou as explicações dada pelos spin doctors
democratas, num artigo cujo sub-titulo resumia bem o assunto : “The new story of “story”
and make sure it’s coherent”. Se o resultado tivesse sido inverso, “provavelmente os

9 James CARVILLE a Paul BEGALA, Buck up, suck up ans come back when you Fool up. 12 secrets from the War

Room, 2002
10 Seth GODIN, All marketers are liars.
11 « James Carville dissecting the Dems », Newsweek, 30 de Outubro de 2006

6
democratas se teriam congratulado que a campanha de Kerry tenha conseguido construir
um “relato coerente”. Depois de um acontecimento, há pessoas que querem controlar a
percepção e é o que fazem intervindo com um relato12”.

William Safire citava a análise de um pesquisador especialista da teoria do relato, o


professor Peter Brooks, quem lamentava o mau uso que se fazia da noção de relato e temia
que essa noção tornasse-se inutilizável: “Acho que esse uso abusivo corresponde a um
reconhecimento tardio do papel que desempenha o relato na maneira de organizar nossa
experiência do mundo, uma das ferramentas cognitivas que possuímos e que durante muito
tempo foi negligenciada pelos psicólogos e filósofos.”

O poder pelo relato : O futuro dos Estados Unidos e do mundo dependeria


da capacidade dos norteamericanos de escolher as boas historias.

Como explicar a importância do storytelling sobre os discursos políticos nos Estados


Unidos? Por que a narração de relatos edificantes é considerada como um novo paradigma
nas ciências políticas, ao contrario das noções de imagem e retórica, até dominar não
somente as campanhas eleitorais senão também o exercício do poder executivo o a gestão
das situações de crise? Os politólogos norte-americanos invocam geralmente três tipos de
razões : a fibra nacionalista dos Norte-americanos ; o talento dos políticos (como Ronald
Reagan, “melhor storyteller da historia política desde os anos sessenta”) ; a ultima atribui
essa mudança ao tempo atual, o qual privilegiaria as anedotas ou as pequenas historias.
Essas três explicações são relevantes. Entretanto, todas as explicações demais focalizadas
na tendência nacional dos Norte-americanos ocultam o caráter histórico e interdisciplinar da
mudança narrativa observada a partir dos anos noventa em campos tão diferentes como o
management, o marketing, a política ou a defesa nacional. De fato, a explicação “genética”
alimenta os preconceitos sobre a “política espetáculo” nos Estados Unidos.

O melhor narrador Reagan e seus disipulos Clinton e Sarkozy

Para James Carville, “Ronald Reagan foi o melhor narrador da historia política desde
J.F.Kennedy, ainda que a maioria das historias que contava eram falsas.”. Para aumentar o
ressentimento contra o welfare State, Ronald Regan inventou a historia da “reina-
assistencia” (queen welfare) quem comprara uma Cadillac graças às bondades do governo.
A historia evidentemente era inventada mas a lição era clara : “Os Norte-americanos que
trabalhavam duro eram os heróis, a reina-assistencia era a má e os pobres representantes
da classe media desempenhavam o papel das vítimas. Reagan podia ler simplesmente uma
lista interminável de estatísticas demonstrando a expansão das gastos públicos, mas sabia
que uma historia teria um impacto muito maior”. “Reagan entendeu que a dimensão muito
concreta do storytelling sempre seria mas vivida que uma compilação de fatos.” Sob a
presidência de Reagan, o discurso oficial apelou mais ao coração dos Norte-americanos do
que à sua ração, à suas emoções do que à suas opiniões.

12 William SAFIRE, « The way we live now narrative »


7
Bill Clinton entendeu essa lição. Assim, algum meses depois da sua eleição em
1992, ele nomeou David R. Gergen diretor da comunicação enquanto ele já ocupava este
posto durante a presidência de Reagan. David R. Gergen declarou : “Eles simplesmente
entenderam o que Reagan entendera13”. O que Clinton confirmou doze anos depois do
começo da sua autobiografia, My Life : “Meu tio Buddy me ensinou que cada um de nós tem
uma historia” E terminou sua autobiografia com essas palavras : “Escrevi um grande livro ?
Quem sabe ? De qualquer jeito, estou seguro de que seja uma boa historia.”

O exercício do poder também foi profundamente modificado pela influência do


storytelling. O poder executivo torna-se um poder de “execução”, de realização (no sentido
cinematográfico) do roteiro presidencial considerado como uma seguida de decisões e que
precisa uma montagem permanente. A atividade do poder torna-se assim muito simbólica :
coordenação da informação, controle centralizado da política de informação, poder de
influência direita e indireta sobre a mídia... E exatamente o programa aplicado pelo
presidente francês eleito em 2007, Nicolas Sarkozy, durante a campanha eleitoral e os
primeiros meses do mandato.

Segundo Richard Rose, autor em 1988 do livro The Postmodern President, “a chave
de uma presidência pós-moderna é a capacidade de manipular (o de fabricar) a opinião. O
resultado é uma espécie de campanha eleitoral permanente.”

Conclusão

Hoje em dia, o storytelling tem um impacto considerável sobre a vida política das
democracias. As campanhas políticas parecem cada vez mais como festivais de narração
onde a imprensa é ao mesmo tempo o ator e o público. A imprensa interpreta a historia,
utiliza as historias interpretadas para ela pelos spin doctors e satisfaz (às vezes) o apetite do
público para novos relatos. Hoje, o candidato que ganha é o candidato capaz de
desenvolver mais historias em conexão com mais eleitores. A historia de Lula é contada
num filme, mesmo antes do final do seu mandato. Tel vez porque as próximas eleições
estão chegando ...

O storytelling impacta também o exercício do poder que tende a identificar-se a uma


espécie de campanha eleitoral permanente. A boa comunicação política deve agir sobre as
emoções dos eleitores, considerados cada vez mais como o público de um espectáculo. E
para isso, torna-se mais importante propôr não mais argumentos e programas senão
personagens e relatos, uma disfarça da democracia em vez do seu exercício efeitivo.

13
Citado por Antony MALTESE, Spin Control
8

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