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Cartas de Amor
Cartas de Amor
Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.
Querida Mulherzinha: … Peço-te que não estejas triste; que olhes pela saúde e tenhas
cuidado com as aragens primaveris; não saias sozinha – de preferência não saias de todo;
tenhas a certeza absoluta do meu amor; que a tua conduta seja cautelosa, não só para a tua
honra e a minha, mas pelas aparências. Não te zangues por pedir isto. Devias amar-me ainda
mais por dar valor à tua honra… Que coisas tens feito? Tenho uma curiosidade natural por todas
estas coisas.
Minha querida e amada Emma: Possa o deus das batalhas coroar os meus esforços
com êxito! Em todo o caso tudo farei para que o meu nome seja sempre o mais querido para ti e
nossa filha, a quem eu amo tanto como a minha própria vida; e como a minha última carta antes
da batalha é para ti, espero em Deus que viva para a terminar depois dela.
(Lord Nelson, 1758-1805, para Lady Emma Hamilton, sua amante e mãe da sua filha)
Anjo, acabo de saber que há correio todos os dias. Tem calma, ama-me – hoje – ontem.
Que saudades em lágrimas por ti. Tu, a minha vida, meu tudo, até breve. Oh, ama-me sempre,
nunca duvides do meu coração fidelíssimo. Do teu amado.
(Ludwing Van Beethoven, 1770-1827, carta nunca enviada para a sua amada imortal, de identidade nunca determinada)
Deixei de vos amar e, pelo contrário odeio-vos. Sois horrenda, muito grosseira, muito
estúpida, uma verdadeira Cinderela. Não me escreveis de todo, não amais o vosso marido.
Conheceis o prazer que as vossas cartas lhe dão, e não lhe escreveis nem seis linhas, mesmo
numa caligrafia descuidada. O que fazeis todo o dia, Madame? (…) Josephina, tem cuidado,
uma destas noites as portas vão abrir-se e eu estarei aí. …. Escreve-me depressa quatro
páginas, dizendo aquelas coisas ternas que enchem o meu coração de sentimento e prazer.
Espero há muito estreitar-te nos meus braços e fazer chover sobre ti um milhão de beijos tão
quentes como o equador.
(Honoré de Balzac , 1799-1850, para a Condessa Ewelina Hanska, sua amante e mais tarde sua mulher)
Minha gentil: Quem me dera ser uma ave: arrancaria uma pena às minhas asas e,
voando ao céu, embebê-la-ia na tinta da aurora, naquela tinta vermelha com que os anjos
escrevem cartinhas de namoro às estrelas… quem me dera escrever-te com uma pena assim, e
com uma tinta igual – eu seria, pela primeira vez, anjo, e tu serias o que há muito és: estrela.
Passaram seis anos desde que alcancei o meu maior êxito na vida ao conquistar-te. (…)
és querida por mim todos os dias, ainda mais do que o último aniversário; és mais querida então
mais do que um ano antes – tu és cada vez mais querida desde o primeiro aniversário, e não
duvido que esta bela progressão continuará até ao fim. Olhemos para os futuros aniversários,
com a idade e os cabelos grisalhos, sem medo e sem tristeza, confiando e acreditando que o
amor que temos um pelo outro será suficiente para os tornar abençoados.
(Mark Twain – Samuel Langhorne Clemens, 1835-1910, para Olívia Langdon, sua mulher)
Minha querida Kitty: cheguei são e salvo, excepto pelo vazio do meu coração, que tu
provocaste, como uma querida e encantadora desmazelada que és. (…) Estou sentado sozinho
e solitário no meu quarto (dez da noite, depois do teatro) e daria um guinéu por uma carícia da
tua mão.
(De Plínio, o Novo, 61 D.C. – 112 D.C, para Calpurnia, sua mulher)
Minha adorada noiva: (…) São sempre difíceis de acabar as minhas cartas – porque não
ouso escrever os finais como os sinto. J'ai peur de vous effaroucher. E depois da sua proud
reserve assusta-me um pouco. E assim só digo que te adoro, meu querido amor.
(Eça de Queirós, 1845-1900, para Emília de Castro Pamplona, sua noiva e futura mulher)
Meu querido Bebezinho: Não te admires de certo laconismo nas minhas cartas. As
cartas são para as pessoas a quem não interessa mais falar: para essas escrevo de boa
vontade. A minha mãe, por exemplo, nunca escrevi de boa vontade, exactamente porque gosto
muito dela. Quero que sintas isto, que saibas que eu sinto e penso assim a este respeito, para
não me achares seco, frio, indiferente. Eu não o sou, meu Bebezinho, minha almofadinha cor-de-
rosa para pregar beijos (que grande disparate!). Mando um meiguinho chinês. E adeus até
amanhã, meu anjo. Um quarteirão de milhares de beijos do teu, sempre teu. Fernando.
Considera, meu amor, a que ponto chegou a tua imprevidência. Desgraçado!, foste
enganado e enganaste-me com falsas esperanças. Uma paixão de que esperaste tanto prazer
não é agora mais que desespero mortal, só comparável à crueldade da ausência que o causa.
Há-de então este afastamento, para o qual a minha dor, por mais subtil que seja, não encontrou
nome bastante lamentável, privar-me para sempre de me debruçar nuns olhos onde já vi tanto
amor, que despertavam em mim emoções que me enchiam de alegria, que bastavam para meu
contentamento e valiam, enfim, tudo quanto há? Ai!, os meus estão privados da única luz que os
alumiava, só lágrimas lhes restam, e chorar é o único uso que faço deles, desde que soube que
te havias decidido a um afastamento tão insuportável que me matará em pouco tempo.
Parece-me, no entanto, que até ao sofrimento, de que és a única causa, já vou tendo
afeição. Mal te vi a minha vida foi tua, e chego a ter prazer em sacrificar-ta. Mil vezes ao dia os
meus suspiros vão ao teu encontro, procuram-te por toda a parte e, em troca de tanto
desassossego, só me trazem sinais da minha má fortuna, que cruelmente não me consente
qualquer engano e me diz a todo o momento: Cessa, pobre Mariana, cessa de te mortificar em
vão, e de procurar um amante que não voltarás a ver, que atravessou mares para te fugir, que
está em França rodeado de prazeres, que não pensa um só instante nas tuas mágoas, que
dispensa todo este arrebatamento e nem sequer sabe agradecer-to. Mas não, não me resolvo, a
pensar tão mal de ti e estou por demais empenhada em te justificar. Nem quero imaginar que me
esqueceste. Não sou já bem desgraçada sem o tormento de falsas suspeitas? E porque hei-de
eu procurar esquecer todo o desvelo com que me manifestavas o teu amor? Tão deslumbrada
fiquei com os teus cuidados, que bem ingrata seria se não te quisesse com desvario igual ao que
me levava a minha paixão, quando me davas provas da tua. Como é possível que a lembrança
de momentos tão belos se tenha tornado tão cruel? E que, contra a sua natureza, sirva agora só
para me torturar o coração? Ai!, a tua última carta reduziu-o a um estado bem singular: bateu de
tal forma que parecia querer fugir-me para te ir procurar. Fiquei tão prostrada de comoção que
durante mais de três horas todos os meus sentidos me abandonaram: recusava uma vida que
tenho de perder por ti, já que para ti a não posso guardar. Enfim, voltei, contra vontade, a ver a
luz: agradava-me sentir que morria de amor, e, além do mais, era um alívio não voltar a ser
posta em frente do meu coração despedaçado pela dor da tua ausência.