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O PATOLÓGICO
  O patolÓGICO

Centro Acadêmico Adolfo Lutz - Medicina Unicamp - ano mmx - março

A CALOURADA 2010 p. 4 e 5

DEPOIMENTOS DA CALOURADA P. 4
Coluna Extensão
Leia texto de Frabício Costa (Bambu - XLV) so-
Confira o relato daqueles que organizaram as atividades bre sua visita às comunidades Quilombolas
da semana de Calourada do CAAL e também a opinião » leia mais, p. 2

daqueles que tiveram a oportunidade de participar dos


eventos. PET-SAÚDE
Leia mais sobre a evolução dos Programas
Federais de assistência às escolas médicas:
PROMED, PROSAÚDE e PETSAÚDE.
» leia mais, p. 3

SPASMO!
Henrique Sater (Abre Alas 45)
» leia mais, p. 5

SAIU NA MÍDIA
Leia texto sobre a Reforma da Saúde dos EUA.

» leia mais, p. 6

AVALIAÇÃO DAS PATOCULTURAL


ATIVIDADES P. 5 Leia a análise do movimento de revolta que abalou a França e re-
percutiu em todo o mundo, conhecido como “Maio de 68” a partir
da perspectiva de dois filmes: “Os Sonhadores” e “Amantes Cons-
Confira a avaliação da ca- tantes”. Por Marcelo Lopes - XLVI » leia mais, p. 8
lourada feita pela XLVIII.

Coluna SAÚDE
Confira o texto “Trabalho médico e as tecnolo-
gias em saúde” que aborda a divisão do trabalho
manual e intelectual em saúde e analisa como o
desenvolvimento da tecnologia se relaciona com
a prática médica. Por Marília Felício - XLIV
» leia mais, p. 7
2  O patolÓGICO março de 2010

Protagonismo Estudantil: Da Busca Pela


Extensão ao Adote-ME e TransforME
“Entrei na faculdade de medicina buscando uma coi- de extensão comunitária na FCM. Após o seminário, o há quase dez anos, uma palavra sempre foi destacada:
sa, e só depois fui descobrir que o que eu buscava se projeto nas comunidades quilombolas se iniciou e está humanizar o ensino médico. E segundo ele mesmo
chamava extensão”. Esta frase foi proferida por uma até hoje de vento em popa, e a percepção desta necessi- que o aluno vá para o centro de saúde, esse proces-
aluna da quadragésima sétima turma, em um dos dade da extensão pela diretoria se transformou na ideali- so é mecânico e é imposto pelo currículo. A demanda
muitos encontros para se discutir extensão universi- zação do projeto que chamou de Adote-ME e TransforME. deve partir do estudante. “Humanização, sem exten-
tária promovidos pelo centro acadêmico. É com um O nome seria uma analogia recursiva de que a comu- são, não existe. Quem vai aprender mais são os alunos”.
enorme prazer que pudemos propiciar aos alunos da nidade seria adotada e transformada pelos estudantes Estas citações foram proferidas pelo próprio diretor no I
faculdade a realização de um trabalho concreto, de e profissionais envolvidos, assim como essas pessoas Workshop sobre extensão realizado no dia 18/09, tam-
transformação de vidas dentro de uma comunidade. seriam adotadas e transformadas pela comunidade. Tra- bém numa parceria do Centro Acadêmico com a Comis-
Um trabalho de contato e respeito com a realidade do ta-se da criação dentro da FCM de um Programa de Ex- são de Extensão. Esse workshop contou com a presença
outro, com educação popular, com esse exercício de tensão Comunitária. Um Programa de Extensão é uma do professor da UFPB: Emmanuel Fernandes Falcão, para
uma das faces mais belas da medicina desde a gradu- entidade dentro da universidade que dá diversos tipos falar sobre extensão universitária e do professor: da USP
ação. É com um prazer maior ainda, que vamos vendo de apoio a vários projetos diferentes. No caso do Adote- de Ribeirão Preto para mostrar um dos projetos que é fei-
sonhos que não estão sendo perdidos pelo caminho. ME e TranforME, será oferecido via programa uma linha to lá,que ele coordena; Logo após apresentação do proje-
A extensão universitária dentro da Unicamp e de financiamento para quem tiver um projeto a ser reali- to do centro acadêmico com exemplo de projetos possí-
principalmente, dentro da Faculdade de Ciên- zado numa comunidade. Além do financiamento, serão veis de se encaixarem dentro do Adote-ME e TransforME.
cias Médicas foi um importante eixo do trabalho dados aos participantes o reconhecimento institucional O Programa de Extensão da FCM : AdoteME e TransforME
da Gestão Roda Viva, e isso já havia ficado bem pelo trabalho desenvolvido com a concessão de dois é um início da valorização da extensão, esse pé até agora
claro desde as reuniões para formação de chapa. créditos a mais por semestre de trabalho no currículo do capenga do tripé universitário dentro da faculdade. É tam-
Começamos no primeiro semestre conhecendo vários aluno, numa matrícula em matéria de extensão, o que bém um reflexo institucional de muita vontade por par-
projetos realizados em nossa universidade, e nos for- é um diferencial acadêmico. Há também a questão de te dos alunos e de muito trabalho do Centro Acadêmico.
mando sobre o assunto, com uma bibliografia densa de apoio institucional, no caso de materiais e estrutura da Esperamos que em 2010 muitos projetos sejam
livros e artigos ciênfíficos. Logo depois, surgiu o terceiro universidade caso necessária e/ou negociação com ou- enviados ao programa, pois comunidades e tra-
edital para projetos de Extensão Comunitária da PREAC tras instituições, como Prefeitura etc. Tudo isso seria fei- balho fora desses muros que nos cercam e des-
(Pró Reitoria de Extensão e Assuntos Comunitários). Es- to com ajuda da FCM. Está ainda em discussão, e não é sa grade curricular que nos aprisiona, é o que
crevemos um projeto, para trabalharmos com comuni- certo, a possibilidade também de bolsas para os alunos. não falta. Alunos competentes, também não.
dades quilombolas no Vale do Ribeira e este foi aprovado. A princípio, o programa funcionaria em fluxo contínuo, E para isso a Gestão Rosa dos Ventos já tirou em pla-
Para apresentar à faculdade o que era extensão, e como ou seja, a qualquer hora o projeto poderia ser apresenta- nejamento para 2010 um grupo de trabalho só para
se dava a extensão que acreditamos (Extensão Popular) do à Comissão de Extensão. Essa comissão se reúne uma ajudar e acompanhar os projetos do Adote-ME. Esta-
e também apresentar o projeto e formar um grupo de vez por mês, e depois de aprovado nessa reunião, já se- mos a disposição para ajudar em qualquer etapa do
trabalho fizemos no dia 26 de agosto de 2009 o “I Semi- ria liberado o financiamento. Há possibilidade de articu- trabalho, desde oferecer sugestão de leitura sobre
nário de Extensão Popular Comunitária da FCM” em par- lação com o Comitê de Ética para avaliação dos projetos. extensão e educação popular, ajudar na confecção
ceria com a Comissão de extensão da FCM. Na abertura Segundo a própria diretoria, é um projeto para esti- do projeto, nos tramites institucionais de busca de fi-
do evento, dentre os presentes estavam o Pró Reitor de mular a participação de alunos de graduação, pós- nanciamento dentro e fora da FCM, e em qualquer
Extensão da UNICAMP, Muhamed Habib, e o diretor da graduação e residentes médicos da Faculdade de outra pedra no caminho que se não soubermos de
Faculdade Prof. Dr. José Antônio Gontijo. A partir daí, jun- Ciências Médicas em programas de intervenção so- antemão, aprenderemos em conjunto a contornar.
tamente com a ocupação da vaga de representante dis- cial e pressupõe a iniciativa dos alunos de uma forma
cente na Comissão de Extensão (também com repasses multidisciplinar e de mão dupla, onde comunidade e
estudantes troquem experiências e saberes. De acor- Thais Machado Dias – XLV
para toda a faculdade a cada reunião) desencadeou-se
um movimento de busca, parte dos alunos, por projetos do com Gontijo, desde a reforma curricular iniciada Gestão Rosa dos Ventos

EXTENSÃO POPULAR: Comunidades quilombolas


O convite em participar de uma atividade de seus braços e pensamentos. É inegável o fato de isolamento, sobretudo com relação à assistência
Educação em Saúde no Vale do Ribeira, junto as que estar no Vale é ser mais que um estudante de médica dá vazão à mecanismos adaptativos: os
Comunidades Quilombolas foi aceita de pronto medicina em um campo novo de desbravamen- chás, as simpatias e as consultas de marcação de-
por mim. De fato, tive sempre interesse e certa to – carece de se ter noção que o projeto carrega moradas em Registro. Num certo momento você
curiosidade em participar de um projeto de Ex- a herança fecunda e adquirida por anos de pas- pode até ser tomado por um afã de que muita
tensão, antes um termo conceitual tão etéreo, sos curtos em busca de confiança, exercidos por coisa precisa ser feita. Neste instante, prioridades
agora mais domesticável aos meus ouvidos. Ex- diversas pessoas que acreditam muito no poder devem ser elegidas. Prioritários são os desejos dos
tensão: algo tão legitimamente inscrito nos pan- transformador da extensão comunitária. quilombolas, mas nunca deve confrontar com a
teões da Universidade, mas tão extinta aos olhos O encontro com as Comunidades Quilombolas vivacidade do projeto, autônomo.
do flagrante. é sempre um momento de surpresa. Na verdade, Finalizando o relato faço algumas conside-
Faço um relato pontuando alguns vislumbra- quando estamos no Vale, literalmente estamos rações: 1) aproveite bem o poder do diálogo. As
mentos, obtidos durante minha participação em num plano de espera. Percebemos que as lideran- comunidades quilombolas são bem receptivas e
um final de semana, junto aos organizadores do ças como apoiadores multiplicam as possibilida- bastante participativas. Apenas dê a iniciativa de
“Projeto Desvendarte”, vinculado ao Programa des de ação dos projetos. Carece de se ter noção estabelecer um canal sem interferências de pré-
Comunidades Quilombolas (PCQ) da UNICAMP. que no plano das ideias, o imprevisível é sempre concebidos. Ouça com atenção e aprenda com o
De pronto, já afirmo que tentarei ser o mais jor- deixado de lado. As adversidades não ficam ape- ritmo da fala o que as entrelinhas escondem – a
nalístico possível ao tentar problematizar algu- nas nas distâncias medidas em quilometragem. problemática da exclusão social, a percepção de
mas questões, evitando o sensacionalismo, tão A chuva, o sol, os morros, os cultos, as votações poucas perspectivações, a curiosidade, a neces-
reinante em nossa mídia, bem como esquivando- de estatutos, as reuniões das cooperativas podem sidade de aprender e de ensinar; 2) Leve sempre
me das opiniões do senso comum, infecundas de consolidar barreiras e limitar algumas de nossas um lanche, pois as conversas podem se alongar.
discussões. Pretendo como pano de fundo resga- atuações in lócus. Mas a familiaridade, o senti- Lembre-se que a nossa melhor ferramenta de
tar alguns fatos de minha experiência no trabalho mento de “construção coletiva e compartilhada entendimento do novo é o interesse; 3) Faça das
junto aos moradores do Vale, deixando (espero das responsabilidades” acaba que aos poucos vai inquietações dos quilombolas alguns de seus pla-
eu), sobretudo um gosto de “protagonismo expe- tornando os obstáculos mais pérvios. nos de ação, poesias, campos de estudo e, acima
rimental” aos leitores. Vamos aos fatos! O choque de culturas é algo que deve ser assi- de tudo, alguma ação afirmativa que promova
Um dos grandes detalhes que antecedem a tão milado com tranqüilidade. No começo, após fre- o senso de auto-sustentabilidade das comuni-
esperada “descida” ao Vale é o caráter organizacio- qüentar algumas das reuniões de formação sobre dades. Não se contente em estar no quilombo
nal dos projetos. De fato, conhecer a filosofia dos Extensão e mais especificamente sobre as Comu- pelo projeto, ou pela extensão. As pessoas e as
projetos, ou no mínimo, a metodologia condutora nidades Quilombolas, tinha ainda uma visão dú- possibilidades que elas encerram em si são mais
das atividades de campo é de grande importância bia sobre a vida no Quilombo. Ainda permaneço primordiais do que os outros itens elencados; 4)
antes de ver o projeto acontecer. Uma boa lida no com esta visão, contudo ela é mais vívida pelas Insira-se em um projeto, estude um pouco, e aci-
projeto, a problematização das práticas em co- impressões que pude captar através de minhas ma de tudo, tenha a iniciativa de querer ir até o
munidades como os organizadores e orientador, lentes divergentes: o passado e o futuro estão em quilombo. As teorias podem lhe dar uma ajuda,
tendo em vista a noção da especificidade de cada diálogo constante. Os jovens sentem-se livres e podem espantar alguns mosquitos de seus calca-
cultura, é de suma importância na busca de uma acorrentados ao quilombo, pintam o futuro nos nhares, mas nunca se esqueça de passar protetor
participação salutar em um terreno novo. Outro grandes centros (Curitiba e São Paulo, sobretudo). solar nos cotovelos.
ponto crucial é enxergar-se como parte integrante Em alguns instantes, a fala dos personagens do Fabrício Donizete da Costa (Bambu) – Medici-
de um grupo de trabalho imenso, que ultrapassa Vale misturam tons de nostalgia e de revolta. O na Unicamp XLV
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PROMED, Pró-Saúde, atenção básica a saúde, que se traduzem, no Bra-


sil, pela estratégia de Saúde da Família; estabele-
cer mecanismos de cooperação entre os gestores
e os tutores do PET UNICAMP são os professores
da Medicina (Nelson, Rosana e Sérgio), da Enfer-
magem (Eliete) e da Fonoaudiologia (Helenice,

PET- Saúde: Um pouco da do SUS e as escolas de Medicina, Enfermagem e


Odontologia, com vistas à melhoria da qualidade
e resolutividade da atenção à saúde prestada ao
Maria Inês e Sônia).
O projeto do PET- Saúde da UNICAMP foi apre-
sentado aos estudantes pelos coordenadores do

história do nosso curso cidadão, bem como à integração da rede pública


de serviços de saúde e à formação dos profissio-
nais na graduação e na educação permanente.
PET UNICAMP: Prof. Dr. José Luiz Tatagiba Lamas
(coordenador do curso de enfermagem) e Prof. Dr.
Gastão Wagner de Sousa Campos (chefe do depar-
PROMED A UNICAMP também foi selecionada para parti- tamento de medicina preventiva e social) no dia
cipar do Pró-Saúde: ´´Avalio que o Pró-Saúde é 17/03 em uma reunião no auditório da FCM. Al-
No final de 2001, ainda no governo FHC, ocorre um incentivo muito bom, pois fez a diferença em guns pontos de dúvidas dos estudantes não fica-
uma mudança importante no cenário nacional. O muitas escolas e na FCM/UNICAMP, viabilizou um ram muito claros, como: quem são os alunos que
governo federal lança o Programa de Incentivo a projeto que a escola já tinha. Antes do Pró-Med poderão se candidatar a bolsista? De quais anos?
Mudanças Curriculares nos Cursos de Medicina, já havia se aprovado a mudança curricular, já ha- Em que horário realizarão suas atividades do PET,
conhecido como PROMED, desenvolvido numa via esse projeto de ir pra rede, só que ainda não nos horários dos módulos que envolvem atenção
parceria entre o Ministério da Saúde e o da Educa- estava viabilizado. Tal viabilização ocorreu graças primária (Ações em Saúde Pública MD142/242,
ção com o apoio da OPAS (Organização Pan-ame- ao Pró-Med e agora ao Pró-Saúde. Isso nos ajudou Saúde e Sociedade MD342/442) ou fora do ho-
ricana de Saúde). Com esse programa, o estado muito, pois há uma contrapartida para a rede da- rário curricular, como num projeto de iniciação
passou a disponibilizar recursos financeiros da or- quilo que a gente faz lá; então, você vai pra rede científica? Como será feita a seleção dos possíveis
dem de R$ 1,2 milhões para três anos de trabalho com muitos alunos, usa tudo e oferece algo em monitores? Quais critérios eles devem preencher?
para cada Instituição de Ensino Superior que ade- troca. Assim, o centro de saúde que recebe o alu- Após uma reunião entre os tutores e o CAAL, CAE
quasse sua proposta de formação às diretrizes da no está recebendo muita coisa em troca, não só e CAXS, foi definido como será a forma de seleção
medicina comunitária. da qualidade que a gente leva de atendimento e do monitores do PET-Saúde:
Também ocorria em 2001 a reforma curricular do de interação com a unidade, mas também com Todos os estudantes dos cursos de graduação em
curso de Medicina da UNICAMP , que gerou a in- equipamentos, com infra-estrutura de melhoria Enfermagem, Fonoaudiologia e Medicina da FCM
tegração dos conteúdos curriculares, a ampliação do prédio. Isso tem feito a diferença, pois nós te- poderão se inscrever, no período de 30/03 a 08/04.
dos estágios nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), mos sido convidados a nos inserir nas unidades.´´ Cada interessado deverá entregar, na Câmara de
no Hospital Estadual de Sumaré e o contato, mais (Angélica Maria Bicudo Zeferino,2009) Graduação da FCM, uma carta de intenção em
cedo, do aluno com sua profissão.Neste contexto, que indique seu nome, forma de contato (e-mail
a UNICAMP foi umas das 20 instituições seleciona- PET-SAÚDE e telefone, com DDD) e explique porque quer par-
das para participar do PROMED em 2002. ticipar do programa. Essa carta deverá ser de, no
‘‘A intenção do Estado com esse Programa de In- Então em 2009 inicia-se o PET-Saúde, Programa máximo, uma página de papel almaço ou caderno
centivo foi regular a formação dos recursos huma- de Educação pelo Trabalho para a Saúde, outro universitário, escrita à mão. Nela, o aluno deverá
nos na saúde. (...) Além disso, segundo consta na programa do governo federal com o objetivo de indicar três projetos dos quais tenha interesse de
proposta do PROMED acusa-se os órgãos de for- fomentar a formação de grupos de aprendizagem participar, em ordem de prioridade. Deverá ser
mação superior de excessiva autonomia, que teria tutorial em áreas estratégicas para o Sistema Úni- acompanhada pelo histórico escolar, porque as
acarretado um “afastamento de seu constituinte co de Saúde (SUS), caracterizando-se como instru- notas obtidas nas disciplinas de saúde coletiva de
principal, que é a sociedade”. (PROMED, 2001) mento para qualificação em serviço dos profissio- cada curso serão levadas em conta como critério
O objetivo do PROMED era de oferecer cooperação nais da saúde, bem como de iniciação ao trabalho de desempate para estudantes que já as tiverem
técnica e operacional às escolas de graduação em e vivências dirigidos aos estudantes das gradua- cursado. Os alunos de primeiro ano estão
Medicina que se dispuseram a adotar processos de ções em saúde, de acordo com as necessidades dispensados da apresentação do histórico escolar,
mudança nos currículos de seus cursos, com enfo- do SUS. O PET-Saúde busca incentivar a interação mas deverão entregar um mini currículo, de no
que para as necessidades de saúde da população ativa dos estudantes e docentes dos cursos de máximo duas páginas (pode ser digitado).
e do Sistema Único de Saúde; programar estágios graduação em saúde com os profissionais dos ser- A Seleção será feita, pelos tutores, através de uma
nos hospitais universitários e em toda a rede de viços e com a população. análise das cartas de intenção apresentadas. Os
serviços e atividades extraclasse contemplando Cada grupo PET-Saúde é formado por um tutor candidatos cuja proposta de atuação e motivação
os principais problemas de saúde da população; acadêmico (docente), 30 estudantes, sendo 12 es- mais se encaixem no projeto de cada tutor serão
capacitar melhor os estudantes de medicina para tudantes monitores (bolsistas) e seis preceptores convocados para as entrevistas, que acontecerão
atender aos principais problemas de saúde da po- (profissionais da rede). As bolsas PET-Saúde têm entre os dias 12 e 16/04, em horários e locais a se-
pulação, de acordo com a nova realidade de fun- como referência valores pagos pelo Conselho Na- rem definidos pelas bancas. Estas serão compostas
cionamento do SUS, sendo necessário, para isso, cional de Desenvolvimento Científico e Tecnológi- pelos tutores e estudantes dos Centros Acadêmi-
que os cursos de medicina possibilitassem a for- co (CNPq). Atualmente, o valor das bolsas de tuto- cos, sendo necessária a presença de representan-
mação de médicos com competência geral, essen- res acadêmicos e de preceptores é de R$ 1.045,89, tes de cursos diferentes na mesma banca. Nem
cial à ampliação de programas de atenção básica, e o da bolsa incentivo para os estudantes é de R$ todos os alunos que se inscreverem serão convo-
como o Programa Saúde da Família (PSF). 300,00, correspondendo ao valor da bolsa de ini- cados para entrevista, mas poderão participar do
ciação científica. programa, que prevê a inscrição de estudantes
PRO-SAÚDE ‘‘Quando veio o edital do PET-Saúde, (...) achamos não bolsistas.
que ele ia poder pagar tutor, facilitar transporte; A bolsa terá a duração de dois anos. O estudante
´´O PROMED surgiu no final do governo FHC com mas ele veio engessado, (...) o que ele está fazendo que desempenhar suas atividades a contento só
algumas regras: o dinheiro era para dar condições é estimular ´´ iniciação científica ´´ para pesquisa será excluído por vontade própria ou se comple-
de inserção do aluno na rede básica de saúde. na rede básica. Exigia integração e se tivesse al- tar o curso. Nos casos de exclusão, as bolsas serão
Quando mudou o governo, mudou todo o minis- guma chance (naquele momento) seriam entre o destinadas a outros estudantes, que terão direito
tério e esqueceram um pouco do programa, mas 1º e 2º anos. Eu sabia que não ia dar, porque não a recebê-las no período restante.
como este já tinha sido aprovado, ele continuou adianta você por no papel o que não será viabili- Todos os participantes receberão um certificado
vigente. Entretanto, voltou ao ministério o grupo zado. O PET-Saúde não deu certo, pois teríamos de participação emitido pelo Ministério da Saúde.
do Francisco Campos (participante da criação do que criar outro modelo, o nosso modelo não ia dar
PROMED), resgatando o projeto com outro nome; pra entrar no edital pra fazer o que ele esta exi- O programa PET- Saúde da UNICAMP terá suas ati-
Pró-Saúde e ampliando para os cursos de enfer- gindo. Teria que criar essa integração, (...) temos vidades iniciadas no mês de maio. Dependerá de
magem e odontologia. A idéia do Pró-Saúde era um currículo engessado, mas podemos conseguir nós, alunos da Faculdade de Ciências Médicas, o
começar com esses três cursos e ir ampliando para integrar tendo muitas conversas antes.’’(Angélica acompanhamento crítico dos projetos, bem como
outras áreas, o que já aconteceu.´´(Angélica Maria Maria Bicudo Zeferino,2009) suas reformulações ao longo do ano para que este
Bicudo Zeferino,2009) Passado um ano e após muitas conversas entre projeto atinja seus objetivos.
Os objetivos do Pró-Saúde eram: incentivar trans- docentes e entre cursos, foi criado o projeto PET- Este texto foi baseado nos editais do PROMED,
formações de processo de formação, geração de Saúde da UNICAMP que busca realizar integração Pró-Saúde, PET-Saúde, revista da ABEM(out/2009),
conhecimentos e prestação de serviços de saúde à entre os cursos de Medicina, Enfermagem e Fono- regulamento do PET-Saúde UNICAMP e em entre-
população, para abordagem integral do processo audiologia, o projeto enviado para o Ministério da vista da Profa. Dra. Angélica Maria Bicudo Zeferino
de saúde-doença, reorientar o processo de forma- Saúde foi aprovado e fomos contemplados com 7 para o Patológico de Fevereiro de 2009.
ção em Medicina, Enfermagem e Odontologia de grupos de PET-Saúde, ou seja, recebemos bolsas
modo a oferecer a sociedade profissionais habilita- para 7 tutores, 42 preceptores e 84 monitores.
dos para responder as necessidades da população As linhas de pesquisas a serem desenvolvidas pe- Camilla Bellomo de Oliveira Santos - XLVI
brasileira e que entendam a operacionalização do los grupo PET são: Processo saúde doença e cui- Diego Augusto Barbosa - XLVI
SUS; possibilitar aproximação entre a formação de dado; Gestão do cuidado e serviços de saúde; Pro- (Representantes Discentes da Comissão Local de
graduação em saúde no País e as necessidades da cesso de trabalho em saúde e trabalho em equipe Acompanhamento do Pró-Saúde)
4  O patolÓGICO março de 2010

O Conto da no nosso cotidiano.


Proporcionar esta oportunidade e receber de
volta olhos despertos, sorrisos agradecidos, satisfação
Amim,Semana de Calourada foi, para
uma experiência maravilhosa. Infelizmente, não

TRABALHOURADA por ter entrado na nossa UNICAMP e ter escolhido pude ir a todas as atividades (não fui ao Integra Saúde,
a nossa medicina, porque surgiu o sentimento de ao tour por Campinas de domingo, ao pedágio e nem
identificação com os nossos questionamentos, dá ao churrasco), mas apreciei imensamente aquelas
mais do que uma sensação de dever cumprido, traz das quais participei. Cheguei totalmente perdida,
Era uma vez a história de pessoas felizes que avidez por continuar lutando por um pensamento sem conhecer ninguém (se bem que calouro perdido
sonhavam... Sonhavam em trazer jovens para o crítico e por uma medicina diferente, porque não é pleonasmo...) e meio, bem, na verdade muito,
palco de ouro para que eles rissem, dançassem, estamos lutando sozinhos. assustada. Desde criança, ouvia histórias escabrosas
gritassem, pulassem, fizessem malabarismos e sobre agressões de veteranos a calouros, e a mídia não
o que mais quisessem, até que muitas barreiras me ajudava muito a superar o medo. Mas a atitude
vieram desses sonhos. Sarah Segalla-XLVI dos veteranos conosco foi beeem diferente do que
Primeiramente, o ouro não era suficiente para Gestão Rosa dos Ventos eu esperava: todos foram muito gentis e atenciosos

Só não vê quem não


construir o palco. Sendo assim, as pessoas foram desde o princípio. Fiquei (e ainda estou) muito feliz de
abandonando os sonhos. No final, sobraram eles terem se esforçado tanto para nos proporcionar
apenas duas pessoas (não tão mais felizes) que atividades tão construtivas e ajudarem-nos a conhecer

QUER ver
andavam como bichos agachados para que melhor nossos colegas de turma e nossos irmãos mais
nenhuma migalha de ouro fosse desperdiçada. velhos da família Med Unicamp.
Muito, mas muito distante mesmo de suas casas, Justamente pela integração, a parte da qual eu mais
essas duas pessoas sentiam-se solitárias. Não gostei da Semana da Calourada foi a festa do Caal, pois
havia amigos. A cidade estava vazia. Nada era tão Participar da Semana da Calourada e receber foi uma ótima maneira de integrar calouros e veteranos
importante quanto o sorriso nos rostos dos jovens o carinho de todos os funcionários, professores e, de forma descontraída. A vivência no assentamento do
do palco de ouro. Os seus familiares perguntavam: claro, de nossos veteranos foi muito gratificante. MTST não fica muito atrás, porém, já que foi uma forma
“Mas por que esse sorriso é tão importante?” Eles Desde o dia da lista estamos sendo paparicados de abrir nossos olhos à triste realidade social do país,
não sabiam responder, apenas sabiam que tinham com vídeos emocionantes, tinta, bateria, festas, quebrar preconceitos e lembrar-nos de nosso dever
que ir até o final. Talvez tivessem medo do tédio padrinhos e inúmeras atividades muito bem como profissionais: promover mudanças.
ou mesmo tinham medo de olhar para si e, para preparadas durante as férias!Com toda essa Por todo esse aprendizado e a oportunidade de conhe-
não pensarem, continuavam a trabalhar. dedicação devo primeiro agradecer a todos que cer melhor nossa família, agradeço a todos os veteranos
As duas pessoas que nunca tinham carregado participaram dos preparativos para nossa chegada, que participaram da Semana da Calourada pela aten-
ouro na vida continuavam a carregá-lo, até que ele a todos que se preocuparam em escrever desde um ção a nós proprocionada e desejo que nós, turma XLVIII,
fosse o suficiente. Qual não foi o espanto quando parabéns no Orkut até dicas de livros no manual possamos realizar algo tão divertido e construtivo para
elas descobriram que ele nunca seria suficiente. do calouro,enfim, a todos que nos acolheram nossos calouros no ano que vem.
Muitos as acusavam, afinal, “elas não sabem como novos membros da família Unicamp.
carregar ouro direito e carregar ouro agachado é Indubitavelmente, o período da Calourada Heloísa Takasu Peres - XLVIII
moleza, difícil era antigamente em que a gente foi muito marcante. Mas, como Drummond já
tinha que carregar ouro rastejando-se...” só que dizia “de tudo ficou um pouco” e elegi a Vivência
esses que as acusavam ou nunca tinham carregado
migalhas de ouro em suas vidas e não sabiam o
do CAAL como um momento inesquecível, de
muito aprendizado e reflexão, que gostaria de Aincrível!
Semana de Calourada foi
Vocês sabem que quando a gente passa
que era ficar pra lá e pra cá no sol de todo o verão registrar aqui. Fomos a uma fábrica ocupada pelos
ou não tinham consideração e eram destruidores funcionários, os quais não apenas reergueram a no vestibular além da extrema felicidade existe o
de sonhos. empresa, como criaram um centro esportivo no medo da recepção, o que é inevitável. Pelo menos
mesmo estabelecimento, oferecendo atividades para mim, esse medo se mostrou desnecessário
Aliás, era isso que os colhedores de migalhas logo no primeiro dia do tour. Foi visível o tempo
queriam: mostrar o quão difícil é pegar o ouro, a toda a comunidade. Fiquei encantada com a
iniciativa e observei que a própria sociedade pode que vocês, meus veteranos, “perderam” para
mas não impossível. Mostrar que os sonhos planejar a nossa recepção, antes mesmo de sair
são possíveis porque o ouro é maleável; pode se reconstruir independentemente da gestão
patronal e com dignidade. nomes em listas, antes mesmo de nós fazermos a
se quebrar, mas pode se reconstruir. Mostrar segunda fase do vestibular! A nossa presença era
que somos lapidados durante toda a vida e que Além desse projeto, conhecemos também querida, e isso era fácil de sentir.
podemos ajudar o outro a se lapidar. Mostrar que a ocupação do Movimento dos Trabalhadores
o ouro reluz para a direção mais adequada (qual é Sem Teto (MTST) em Sumaré. Vimos as precárias O tour foi muito divertido, muito bem pensado,
essa direção?). condições de moradia das pessoas que esperam gostei demais dos dois dias! Foi ótimo pela
receber sua casa própria em 2012: falta de oportunidade de conhecer alguns lugares da
O palco ficava pronto enquanto os jovens cidade e principalmente pela integração com
chegavam. E com muito esforço, ele se finalizou. abastecimento de água nos finais de semana,
veteranos e outros calouros. Quem foi certamente
Obviamente, alguns espaços tiveram que ser se sentiu “recebido” pela Medicina Unicamp e
reconstruídos pelos colhedores de migalhas pela cidade. É algo novo que deve ser mantido
durante as apresentações, mas o palco continuou
brilhando e emocionou muito os jovens, que nem “ de tudo ficou um pouco” nos próximos anos.
sequer sabiam dos colhedores de migalhas que O pedágio apesar de cansativo foi uma
tiveram e que um dia serão. experiência única! Pedir dinheiro na chuva,
locais de proliferação da dengue, dificuldade conversar com os veteranos quando o sinal
inicial de serem reconhecidos como moradores do estava aberto, jogar CURLING na faixa de
Thaïs Florence Duarte Nogueira - XLVII pedestres para o entretenimento dos motoristas,
bairro atendido pelo Centro de Saúde em frente à
Gestão Rosa dos Ventos ocupação. ganhar coisas inusitadas, vender essas coisas
Antes dessas visitas, tivemos um momento para inusitadas, ver os veteranos ajudarem a pedir
dinheiro quando os calouros não estavam mais

Vivendo...
ilustrar com desenhos e colagens o perfil do médico
que desejaríamos ser daqui a 10 anos. E, com agüentando, enfim, um dia longo, mas único!
chave de ouro, terminamos a vivência ouvindo as A festa do CAAL foi sinônimo de integração! Um
regras de uma sociedade utópica, onde a palavra clima ótimo, outra oportunidade para conhecer
liberdade estaria extinta dos dicionários, já que, as pessoas, salgadinhos, open bar, música e
“A partir deste instante muita, muita dança! Outro evento que deve ser
a liberdade será algo vivo e transparente como diria Cecília Meireles, em seu “Romanceiro
da Inconfidência”: “liberdade – essa palavra que repetido!
como um fogo ou um rio, o sonho humano alimenta: que não há ninguém A vivência do CAAL foi algo que me marcou,
e a sua morada será sempre que explique, ninguém que não entenda!”. O de forma intensa e positiva. O planejamento
o coração do homem.” detalhe é que esses artigos foram lidos pra gente, e a sensibilidade de vocês me deixaram
Thiago de Melo quando estávamos com os olhos vendados, sendo impressionada! Nesse dia eu senti que estou no
constantemente guiados até ficarmos parados e lugar certo, e com as pessoas certas, algo que
começarmos a ouvir : “eu vejo tudo!Você não quer nunca vou esquecer.
Não há como sentir verdadeiramente aquilo
que não se vive. Não se questiona aquilo que não se ver?Só não vê quem não quer ver!” A choppada, evento possível graças ao trabalho
vê. Viver para sentir, sentir para se indignar, indignar- Instigados com essas exclamações, cada um foi intenso da COXOXU, teve momentos muito bons
se para questionar, questionar para mudar. Viver para tirando a venda, no seu tempo, e descobrindo o também, como conhecer veteranos e ver a linda
mudar. país que se pode construir caso enxerguemos o Batucogu tocar!
A vivência foi incorporada ao calendário mundo como ele é na realidade. Todos esses eventos somados ao almoço
da calourada com objetivo de fomentar a indignação Parabéns a todos os organizadores dessa com o sexto ano, primeiro ensaio da bateria e
que sentimos ao observar tantas contradições na maravilhosa Semana da Calourada. Vocês, almoço com o CAAL fizeram da minha semana
graduação, na profissão, na nossa vida, antes mesmo certamente, conseguiram motivar seus calouros a de calourada algo muito especial, de fato
desta nova etapa começar. Mais do que isso, ela quer serem profissionais mais realistas e humanos. inesquecível.
mostrar aquilo que não nos é mostrado por 6 anos e
que é tão próximo da nossa realidade e tão presente Silvia de Oliveira Verisssimo Teixeira - XLVIII Mariana Abreu de Andrade - XLVIII
  O patolÓGICO março de 2010 5

os grÁFICOS DA SEMANA DE CALOURADA AVALIAÇÃO DAS ATIVIDADES , SEGUNDO OS CALOUROS*


dados obtidos em avaliação anônima feita por 39 integrantes da turma 48

Pedágio AAAAL; 7,39

Almoço com o 6º ano; 7,66

Gincana do Integra Saúde; 8,19

Almoço com o CAAL; 8,44

Apresentação AAAAL; 8,73

Trote da Cidadania Integrado; 8,74

Apresentação do CAAL; 8,89

1 Tour por Campinas; 8,95

Tenda no CAAL matrícula; 9,03

Tenda do CAAL confirmação; 9,12

Integra Saúde; 9,20

Ensaio da Batucogu; 9,43

Vivência do CAAL; 9,48

Atividade da Liga do Trauma; 9,68

Festa do CAAL; 9,70

0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10
Ativifdades que os Calouros mais gostaram: Ativifdades que os Calouros menos gostaram:
Tour por Campinas
2% Almoço com o 6º ano Apresentação CAAL
Tenda do CAAL Tour por Campinas
2% 3% Almoço com o CAAL
confirmação 3%
3%
2% Tenda do CAAL
Atividade da Liga do
Integra Saúde confirmação
Trauma 3% Almoço com o 6º ano
2% 27%
30% Apresentação
AAAAL
Ensaio da Batucogu
7%
5%
Integra Saúde
7%
Trote da Cidadania
Integrado
7%
Trote da Cidadania
Festa do CAAL Integrado
10%
20% Gincana do Integra
Saúde
Vivência do CAAL 20%
Pedágio da Atlética
30% 17%

SPASMO
Das novas idéias Espera-se da poesia que se limite ao registro
de sentimentos, espera-se do vento que se
à autocrítica por estarmos “sonhando de-
mais”. Quando insistimos em tê-las, somos
limite à brisa fresca. duramente inibidos pela mecanização e im-
“A dispersão não lhes tira a unidade, nem Esquecemos do poder de novas palavras, ou posição das idéias antigas.
a inquietude a constância.” Assim Machado ainda, do poder de velhas palavras em novos Mas de que adiantas as idéias, sem homens
de Assis descreveu o vento. Mário Quintana lugares. Mas novos lugares às vezes são ina- e mulheres para pô-las em prática? De que
aproveitou e aplicou-a aos poetas. tingíveis com brisas frescas, são inatingíveis adiantam a dispersão e a inquietude, sem a
Dispersão e inquietude são características com tanta concentração, tanta serenidade. unidade e a constância?
geralmente pejorativas. Principalmente, em Dispersos e inquietos, encontraremos as no- Exploremos a constância de nossa unidade,
dias que se espera concentração e serenida- vas palavras e os novos lugares. E novas pa- aproveitando novos ventos para conhecer e
de. Não concentração opcional, concentra- lavras em novos lugares, por mais desacos- por em práticas as novas palavras. As novas
ção apenas naquilo que é importante. Não tumados que estejamos, são NOVAS IDÉIAS. idéias.
serenidade atingida, serenidade apenas ne- Quem nos dá o direito de ter novas idéias?
cessária e involuntária. Nem nós mesmos, quando nos forçamos Henrique Sater - XLV
6  O patolÓGICO março de 2010

Saiu na
Os primeiros sinais de
mÍDIA (e mais progressista que o de Obama, diga-se de pas-
sagem), que acabou rejeitado. A tentativa de Bill Clin-
mente. Para Glenn Beck, astro da Fox News, “é o fim da
prosperidade nos EUA para sempre... o fim da América
ton, no início de seu governo, foi derrotada, a agenda como a conhecem. Obama controlará cada aspecto da

vida * democrata foi esvaziada e o presidente passou o resto


de seus dois governos executando um programa mais
republicano que democrata.
sua vida. Perdemos o Partido Democrata para os socia-
listas”. Para Sean Hannity, também da Fox, “se a saúde
for nacionalizada, acabou, é o socialismo”.
Com a reforma da saúde, o governo Obama recupe- Obama fez avançar uma realidade praticamente Rush Limbaugh, radialista: “Os democratas regula-
ra-se da paralisia. Mas pode ter uma recaída estagnada há quase meio século e conseguiu aprovar rão cada aspecto de nossa vida. Vou deixar o país se
uma de suas principais bandeiras de campanha, coi- todo esse negócio for implementado. Vou para a Costa
Os estados Unidos não tinham saúde pública como sa que Bill não conseguiu. Nem Bush júnior, que não Rica. Só malditos idiotas terão seguros de saúde. Se-
outros países desenvolvidos nem cobertura universal conseguiu fazer avançar sua proposta de privatização remos todos escravos”. Cal Thomas, outro da Fox: “O
por sistemas de saúde privados e continuarão a não parcial da Previdência. governo vai negar cuidados à vovó porque ela custa
ter nenhuma das duas coisas. O que foi aprovado em Por um triz, é verdade: era necessário o apoio de demais”. Jim Quinn, radialista: “Se o projeto passar, é o
21 de março, ao fim de um ano de guerra política sem 61 senadores para fazer o projeto avançar sem obs- fim da República. O governo terá poder para cometer
quartel, é uma mera regulamentação dos seguros de trução republicana e teve exatamente esse número. assalto violento a seu corpo. Vocês vão ver insurreição.
saúde que, por um lado, amplia o âmbito dos segura- Perdeu uma cadeira, em razão da inesperada derrota Vão ver um levante”.
dos (de 85% para 95% da população, aproximadamen- na eleição do sucessor de Ted Kennedy, em Massachu- Alguns acreditam. Grupos extremistas de direita
te) e, por outro, coíbe muitos dos piores abusos das setts, após a aprovação no Senado. Na votação mais multiplicaram-se nos EUA desde a posse de Obama.
seguradoras. decisiva na Câmara, precisava de 216 votos: teve 219 Um “blogueiro e escritor”, fez no Twitter uma ameaça
Estas não poderão mais impor limites aos benefí- (220, em seguida, na votação da “conciliação” entre as de morte ao presidente, quando o projeto foi aprova-
cios ao longo da vida do segurado, negar cobertura versões da Câmara e Senado) e, para isso, teve de se do. Mas o fenômeno é mais ideológico que econômico:
a crianças com problemas preexistentes (no caso dos comprometer com a bancada “pró-vida” a proibir o uso as ações de empresas da área de saúde, principalmente
adultos, os custos serão subsidiados pela União), exigir de recursos federais para financiar abortos. O aliviado os laboratórios, subiram com a aprovação do plano – e
aprovação prévia para exames ginecológicos ou cuida- presidente tuitou “Yes, We Can!” e dedicou a vitória à é provável que as próprias seguradoras também saiam
dos de emergência ou romper o contrato com clientes mãe, que passou os últimos dias de sua vida brigando ganhando, por muito que tenham esperneado contra
que apresentem queixas à Justiça. Terão de cobrir gas- com o plano de saúde pelo seu tratamento de câncer. as restrições – principalmente enquanto a proposta de
tos preventivos, inclusive check-ups anuais e vacinas Houve um momento, logo depois da derrota em uma “opção pública” (plano de saúde estatal) ainda es-
para crianças. O custo dos planos será subsi- tava na mesa.
diado para a baixa renda, enquanto “planos de A extrema polarização da políti-
luxo”, com vantagens além do básico, pagarão ca estadunidense é um dado com o
taxas extras. Tanto a direita quanto certos seto- qual será preciso lidar. A tendência
res da esquerda com bases em sindicatos que vinha se acentuando bem antes da
gozam de planos mais generosos protestam eleição, não é consequência da refor-
contra isso como “racionamento”. ma da saúde – mas esta a pôs a nu de
Todos, exceto os mais pobres, terão de con- forma a acabar de vez com as ilusões
tratar um seguro de saúde ou pagar multas de uma política “pós-partidária”, de
anuais, mesmo que pensem não precisar disso. negociações calmas e racionais, que
É necessário somar doentes e saudáveis e tor- Obama alimentou por muito tempo.
nar o custo médio acessível à grande maioria. Foi a primeira vez na história dos
Mas de tão estranha à mentalidade dos EUA, EUA que uma lei importante foi apro-
essa disposição já enfrenta contestação judicial vada sem um só voto da oposição.
de 14 governos estaduais. Nos aspectos práti- Até o Medicare de Johnson, também
cos, equivale a cobrar um imposto para susten- atacado como “socialista” por radi-
tar um plano de saúde de amplo alcance. cais, teve o apoio de quase a metade
A montanha pariu um rato? Não é bem as- da bancada republicana. Agora, to-
sim. Os gastos de saúde são um problema nos dos os republicanos se portam como
EUA, desde antes da independência. Um artigo extremistas decididos a fazer o go-
do historiador Andrew Wehrman para o Boston verno fracassar a todo custo, mesmo
Globe conta como, em janeiro de 1774 (um mês o da má-fé. O ex-líder republicano e
depois da Tea Party original), 20 marinheiros atual analista Newt Gingrich- disse
incendiaram um novo hospital de Marblehead, com satisfação que, com a reforma,
Massachusetts, criado por quatro empreen- os democratas “terão destruído seu
dedores (inclusive Elbridge Gerry, futuro vice- partido como Johnson acabou com
presidente) para vender inoculações contra a o Partido Democrata por 40 anos”, ao
varíola. Custavam nada menos que 5 libras e 15 aprovar leis de direitos civis e contra
xelins: vacinar a família custaria a um marinheiro mais Massachusetts, que parecia que Obama e os democra- a discriminação racial, medidas que nem Gingrich hoje
do que um ano de salário. Três anos depois, quando a tas iam desistir, como, aliás, recomendaram analistas critica.
epidemia voltou, o povo votou por contratar um médi- e democratas “moderados”. Mas o presidente, que até Obama, além de fazer a coisa certa, evitou ser re-
co e enfermeiras para vacinar todos os que quisessem então parecia esperar o Legislativo resolver “bipartida- duzido a figura decorativa, mas o quadro interno con-
por conta do município. riamente”, passou a jogar todo o seu peso na disputa e tinuará sendo de chantagem e ameaças, em meio aos
As campanhas por um sistema de saúde nacional conseguiu uma vitória da qual houve razões para duvi- piores problemas econômicos e geopolíticos de déca-
enfrentam mais de 150 anos de batalhas morro aci- dar. Em meados de fevereiro, a probabilidade de apro- das. Os democratas, segundo as pesquisas dos últimos
ma. A primeira batalha foi perdida em 1854, quando o vação era estimada em 30% pelas bolsas de apostas. meses, tendem a recuar nas eleições de novembro: de
presidente Franklin Pierce vetou asilos para indígenas Subiu a quase 100% em poucas semanas. 60 para talvez 54 das 100 cadeiras no Senado e de 253
inválidos, argumentando que o bem-estar social não Mesmo assim, 34 democratas votaram contra o (em 435) para pouco mais ou pouco menos que os 218
cabia ao governo federal. O ex-presidente republica- projeto, ao lado de todos os 178 republicanos. É inte- necessários para a maioria.
no Theodore Roosevelt defendeu um plano de saúde ressante notar que o voto dos democratas nada teve a A perspectiva pode melhorar até lá. Apesar de Gin-
pública ao tentar voltar à Presidência como candidato ver com o número de pessoas sem cobertura de saúde grich, a pesquisa Gallup indica que 49% viram positi-
independente em 1912, mas foi derrotado. Em 1933, em seus distritos (chegando a 43%) e foi decidido prin- vamente a aprovação da reforma, ante 40% contrários
o democrata Franklin D. Roosevelt tentou incorporá- cipalmente pela votação de Obama em suas regiões: – democratas favoráveis (79 a 9), independentes dividi-
lo à legislação previdenciária, mas a feroz oposição da todos os democratas de distritos onde o presidente dos (46 a 45), republicanos contrários (14 a 76). Ao ver
Associação Médica Americana o forçou a desistir. Harry recebeu menos de 40% dos votos foram contrários. que o mundo não acabou e crianças com asma serão
Truman também foi derrotado. Foram favoráveis todos os eleitos por distritos onde o tratadas a custo mais razoável, outros poderão mudar
O primeiro avanço – e até agora, o mais substancial presidente teve mais de 70%. de opinião, como mudaram em relação ao Medicare e
– veio em 1965, quando Lyndon Johnson conseguiu Os democratas de distritos mais conservadores se aos direitos civis.
fazer aprovar o Medicare, que atende os maiores de apavoraram com a radicalização dos comunicadores
65 anos. Ted Kennedy fez um raro acordo com o então republicanos, em cujo discurso a aprovação do projeto Antonio Luiz Monteiro Coelho da Costa
presidente Richard Nixon por um projeto mais amplo seria, se não o fim do mundo, o fim do país.- Literal- * Texto retirado do site da revista CARTA CAPITAL
  O patolÓGICO março de 2010 7

saúde
Trabalho médico e as vos aparelhos de imagem. Deve-se levar em con-
ta ainda que os novos conhecimentos podem
ser produzidos a partir de modelos tecnológicos
necessidades, o trabalho em saúde passa a ser
progressivamente organizado de forma muito
semelhante ao espaço de produção de qualquer

tecnologias em saúde distintos, como exemplo a clínica e a epidemio-


logia; sendo que cada um poderá trazer críticas
e visões distintas do que é o atendimento em
outro produto material. Um dos aspectos dessa
forma de organização é a busca constante pela
maior produtividade do trabalho. Assim, o traba-
O processo de trabalho em saúde inclui saúde. lho em saúde, passará a incorporar formas orga-
tanto o objeto sobre o qual atuamos (o paciente) É com base na realidade do grande de- nizativas, normatizações, “racionalizações” como
quanto quem trabalha (médicos, enfermeiros, fi- senvolvimento tecnológico progressivamente modo de buscar isso.
sioterapeutas, etc) e seus meios para realizar tal incorporado ao trabalho em saúde a partir do A crítica feita não é a de que o conhecimen-
atividade (domínio da teoria acumulada, instru- século XX, que é necessário fazer alguns ques- to científico não é importante na reorganização
mentos e tecnologia). Sempre que ocorre algu- tionamentos: como tem ocorrido o comando do da prática em saúde, nem que o conhecimento
ma mudança em um desses itens, há uma alte- trabalho em saúde? O trabalho prático na área científico é dispensável – muito pelo contrário, o
ração em como o trabalho ocorre, no quanto ele de saúde ainda é capaz de comandar o trabalho conhecimento científico deve ser profundamen-
será produtivo. Por exemplo, se compararmos o de construção do conhecimento e da tecnolo- te valorizado e difundido – mas sim de que exis-
tratamento em oncologia há 50 anos e hoje, ve- gia? Os novos conhecimentos são construídos te um limite sobre o que a ciência de forma ex-
mos que as pesquisas desenvolvidas nessa área, a serviço do profissional que realiza o trabalho clusiva pode passar a estabelecer como critério
o novo conhecimento produzido e as novas tec- prático? do que é legitimo e como guia das práticas de
nologias criadas para tratamento e diagnóstico Os mais diferentes recursos diagnósticos e diagnóstico e terapêutica, seja através de equi-
permitem que hoje se tenha uma possibilidade terapêuticos não se constituem em realizadores pamentos, seja através de conhecimentos e téc-
de controle e cura muito maior. dos atos em saúde, mas são facilitadores das nos- nicas. Os saberes e técnicas de origem científica
O homem é um ser essencialmente práti- sas ações. O oftalmoscópio, por exemplo, não faz não são os únicos a constituírem e direcionarem
co, e é através de uma atividade essencialmente mais do que ampliar nossa capacidade de visão o modo de trabalhar em saúde; eles podem ori-
prática que entramos em contato com o mundo a um grau que somente com nossos próprios re- gem na prática cotidiana e nas experiências acu-
e podemos intervir nele. Somos capazes de criar cursos naturais (os olhos) não conseguiria alcan- muladas informalmente pelos profissionais ao
nossa prática, repensá-la e mudá-la deixando-a çar. É o trabalhador quem dirige o instrumento longo de sua vida de trabalho.
mais eficiente para atender nossas necessidades. para os fins de que necessita e extrai desse uso A complexidade que envolve o ato de
Esse exercício de transformar nossa atividade di- o que lhe interessam a fim de propiciar uma in- cuidar, restaurar ou manter a integridade fun-
ária, o que fazemos, em algo que compreende- tervenção mais eficiente. Não é um aparelho de cional do corpo, mesmo que seja somente em
mos, saber o que fazemos, ocorre através de abs- ultra-som que coloca o médico a auxiliá-lo no seu aspecto anatomofisiológico, impossibilita a
trações que realizamos a partir da nossa relação cumprimento da sua atividade, mas sim o mé- transferência de todo o processo de trabalho em
com o que é concreto, real. Portanto o conhe- dico que tem sua capacidade sensorial ampliada saúde para um mecanismo formado apenas por
cimento sobre o trabalho que realizamos surge através do aparelho. Existe, porém, uma tendên- máquinas, a não ser em etapas bem delimitadas
da própria realização desse trabalho. Podemos cia a se estabelecerem cada vez mais meios de do processo e sempre subordinadas ao trabalho
chamar esse exercício de compreensão, crítica e trabalho sob a forma de máquinas. O monitor prático do profissional. Como colocado no início,
mudança de construção do conhecimento. cardio-respiratório, por exemplo, uma vez pro- é através de nossa atividade prática e de nossa
A respeito desse exercício de compreen- gramado realiza várias ações articuladas, e qua- capacidade de compreendê-la e criticá-la que
são da nossa prática, há dois pontos importan- se autonomamente, de monitoramento de sinais somos capazes de produzir novo conhecimento,
tes. Como a humanidade está sempre amplian- vitais, dando o alarme quando ocorre alguma al- nova tecnologia, com fim de reorientar e aper-
do seu conhecimento é impossível a apreensão teração. A nossa função é quase a de colocar a feiçoar nosso trabalho prático. Ignorado isso
total de todo conhecimento por apenas um su- máquina para funcionar e vigiá-la. podemos engessar o trabalho em saúde. Alguns
jeito. E o trabalho realizado em sociedade é divi- A função das máquinas não é a de dimi- exemplos de mecanismos que podem resultar
dido, cada sujeito tem uma função definida; di- nuir o trabalho do profissional da saúde, mas de nisso – ao negarmos o exercício de transformar
fere a função do médico, do assistente social, do aumentar a produtividade do trabalho. No caso o que fazemos em saber o que fazemos – seriam,
técnico em enfermagem, etc, no atendimento do trabalho em saúde, alguns autores o confir- por exemplo, o estabelecimento de rotinas, nor-
em saúde. E essa restrição é tanto da atividade, maram, demonstrando como em serviços onde mas e protocolos que contribuem para acabar
do trabalho, como do saber o que fazer de cada foram implementadas mudanças tecnológicas, com a autonomia dos profissionais, ao invés de
profissional. seja na forma de ferramentas seja na forma de aprimorar sua prática, e para distanciar o sujeito
Esses dois elementos que nos parecem máquinas, não houve substituição de profissio- que planeja do sujeito que executa o trabalho
naturais (cada um tem sua função, cada um do- nais. Pelo contrário, ao serem liberados de certas em saúde.
mina uma parte do que deve ser feito), são de tarefas, passaram a assumir outras até então não O intuito desse texto é de a princípio nos
fato naturais e mais nítidos na forma como es- presentes no processo. Há duas conseqüências fazer pensar a partir de quê se constrói uma
tamos organizados no processo de trabalho; e, importantes da incorporação de equipamentos idéia nova sobre uma atividade que realizamos,
para além disso, nos dão subsídios para com- e máquinas ao trabalho em saúde para que se seja ela qual for, e no nosso caso o trabalho em
preendermos porque o conhecimento produzi- qualifique os novos profissionais. Uma é o au- saúde. Pensar isso e fazer a crítica nos permite
do torna-se progressivamente mais distante do mento da produtividade e intensificação do tra- ter mais claro que dividir em campos opostos
profissional que realiza seu trabalho direto. Esse balho e isso vai exigir maior domínio de como quem executa e quem pensa a atividade profis-
distanciamento corresponde à separação entre executar o trabalho, já que é mais intenso e exige sional, não é apenas uma divisão de tarefas. Se,
trabalho de quem produz novo conhecimento, mais – o que é diferente de exigir maior domínio como foi dito, quem pensa o trabalho em saúde
faz pesquisa (intelectual) e trabalho de quem re- do saber o que fazemos. A outra é a compreen- está distante da atividade prática e, ao mesmo
aliza a atividade direta no serviço de saúde (ma- são de novos conteúdos relativos a operar novos tempo, há um mercado crescente de produtos
nual). Na universidade, onde temos contato com equipamentos. para consumo em saúde, deve-se questionar
quem faz pesquisa e também realiza assistência, Porém, mesmo que os instrumentos sejam profundamente a incorporação de nova técnica
esse distanciamento pode parecer falso; mas subordinados ao profissional, essas formas de ou medicamento ou procedimento com maior
de fato, essa separação existe e é mais eviden- tecnologia passam a apresentar dimensão cada criticidade – entendendo que o objetivo de
te quando analisamos o trabalhador fora daqui, vez maior e interferem muito sobre o “modo quem trabalha é realizar sua atividade com com-
seja no centro de saúde, no hospital ou no con- de operar” o trabalho em saúde. O método da petência e compromisso. Criticidade que nossa
sultório particular. consulta clínica, por exemplo, passa a ser pro- prática profissional diária permite, e não apenas
Com essa separação, o conhecimento que fundamente transformado pela incorporação de ela, mas também o domínio do conteúdo que é
interfere na nossa atividade prática, com a cria- novos meios diagnósticos e terapêuticos dando produzido na nossa área e deve ser passado du-
ção de uma ferramenta ou máquina ou de um origem à fase da medicina tecnológica. rante nossa formação.
conjunto de técnicas, precisa retornar ao espaço A partir do momento em que o traba-
de trabalho prático e não é predominantemente lho em saúde começa a ser organizado funda- Texto baseado em trecho da dissertação
produzido nele. Inúmeros são os exemplos de mentalmente como um espaço consumidor de de mestrado de Rogério Miranda, médico da
conhecimento que é desenvolvido e transforma produtos materiais, que devem responder a rede básica municipal de Curitiba.
nossa prática, novas correlações clínicas, nova necessidades cada vez mais complexas defini-
forma de administração de medicamentos, no- das por uma sociedade que cresce e cria novas Contato: caalrosadosventos@gmail.com
8  O patolÓGICO março de 2010

Patocultural
A juvetude que não foi É exatamente nesse contexto que se
passa Os Sonhadores; ao contar a história de
um norte americano (Michael Pitt) que vai
– importante acontecimento em que houve
confronto direto dos estudantes e operários
com a polícia – com um lirismo angustiante e
As manifestações no ano de 1968 atin- passar suas férias na França para estudar cine- muito belo.
giram diversos países ao longo do ano, com ma e conhece dois irmãos,
seus ideais “libertários” e anti-conservado- Isabelle (Eva Green) e Theo
res, com expressão maior na França; até hoje (Louis Garrel) numa sessão
despertam lembranças nos mais saudosistas, na cinemateca, começando
como “o ano que não terminou”. É preciso, en- um relacionamento bastante
tretanto, fazer uma análise mais concreta de intenso com os dois. Quando
toda a movimentação que aconteceu naquele a cinemateca é fechada pelo
ano, e dois filmes conseguem atingir esse ob- governo, os três decidem
jetivo de maneira bastante distinta. Analisam se juntar às manifestações,
a juventude francesa antes, durante e depois mas em nenhum momento
do maio de 68. tem clareza do que preten-
O primeiro deles é a obra-prima de dem com aquilo. A alienação
Bernardo Bertolucci, “Os Sonhadores” (The quanto ao processo que está
Dreamers), filme ítalo-franco-britânico realiza- ocorrendo na França e tama-
do em 2003. O segundo filme é a obra-prima nha e tão bem retratada, que
de Phillipe Garrel “Amantes Constantes” (Lês das duas horas de película,
amants reguliers), produção francesa, realiza- grande parte se passa dentro
da em 2005 e roteirizada pelo próprio Phillipe de um apartamento, onde
Garrel. os três realizam jogos, be-
bem vinho e ouvem mui-
ta música (e muito boa,
por sinal). A agitação é vista pela janela do Talvez, muito mais que Bertolucci,
apartamento, e a única coisa que importa Phillipe Garrel tenha feito o filme de sua ge-
é o sujeito em sua individualidade. A úni- ração; um compêndio de análise crítica sobre
ca questão que incomoda esses três jovens esse movimento tão aclamado mundialmente;
quanto às manifestações é se o confronto e isso porque, Garrel participou diretamen-
armado é válido, ou se é melhor a luta atra- te das manifestações, já que ele era uma das
vés das idéias e isso é citado em apenas um pessoas que estavam encabeçando o mundo
diálogo do filme. cinematográfico ao movimento de protestos.
Os Sonhadores se propõe a ser um fil- Felizmente, conseguiu enxergar as limitações
me de visual moderno, com fotografia es- do “maio de 1968” e sua crítica se torna muito
caldante, direção frenética e com milhares mais direta, crua e doída. Garrel conta a his-
de citações cinematográficas em cada uma tória da “juventude que não foi; da juventude
das falas do roteiro, que foi escrito por Gil- que acabou”.
bert Adair a partir de experiências vividas As análises sobre esse movimento se
por ele mesmo no mês de maio de 1968 na mostram claras no filme e a crítica ao proje-
França, mas nunca deixa de ser um filme to romântico e idealista, defendido na época
que faz uma análise crítica do momento pela maioria dos participantes desse movi-
histórico que perpassa. mento hoje, se torna concreta. Há aqueles que
Bertolucci sabe muito bem o quer con- dizem que o ano de 1968 foi o único momento
tar com sua história e sua crítica é estarre- em que a juventude se manifestou contra as
cedora: a partir do microcosmo do aparta- injustiças do mundo e que esse tempo aca-
É preciso, primeiro contextualizar a con- mento, ele mostra como estava a situação na bou. Parece-me que essa afirmação, agora, é
juntura francesa da época, para depois entrar França naquele período, onde o discurso liber- conservadora e acomodada com a situação.
na análise dos filmes. As políticas reformistas tário era tomado pelo romantismo e idealismo Afinal, os militantes de 1968, hoje são, em sua
extremamente conservadoras de Charles de de tempos diferentes, e não havia organização maioria, membros da classe dominante e da
Gaulle no setor educacional francês e no setor suficiente por parte da população revolta para classe média, que perpetuam os ideais que
industrial, fizeram com que houvesse diversas enfrentar a ordem dominante e conseguir a tanto criticavam antigamente.
greves estudantis e de operários. Isso fez com tão sonhada revolução. O filme é maravilho- Isso tem uma explicação bastante con-
que o governo reagisse de maneira extrema- so, desde as atuações, quanto à trilha sonora creta; o movimento de maio de 1968 foi um
mente autoritária, levando a conflitos diretos e principalmente às referências cinematográfi- movimento pluralista, que relevou a existência
entre os cidadãos e a policia, o que fez com cas, que prestam uma verdadeira homenagem de classes sociais distintas, para a luta contra
que setores da população que eram, até esse ao cinema. uma onda autoritária que vinha acometendo
momento, contrários às greves, se rebelassem Já o filme de Phillipe Garrel, Amantes a França naquele período; o movimento nun-
contra o governo e passassem a apoiar as mo- Constantes, mesmo abordando o mesmo pe- ca teve o caráter revolucionário; e, portanto,
vimentações. Além disso, o governo tomou ríodo histórico, foca seu roteiro na história de quando o governo retrocedeu, não havia o
outras atitudes bastante duvidosas, fechando um grupo de jovens, que se dedica ao ópio porquê de continuar lutando para muitas das
a cinemateca francesa e prendendo o criador após os confrontos com a polícia nas manifes- pessoas que tinham se juntado ao movimen-
da mesma, alegando que o espaço era um an- tações pelas ruas de Paris. Desse grupo conta- to, já que não era um movimento homogêneo,
tro subversivo, utilizado pelos partidos de es- se a história de François (o mesmo Louis Gar- com projeto político claro; se rebelavam, como
querda para fazer reuniões secretas. Isso fez rel, filho do diretor), que fuma ópio quase o dia dito, contra as repressões, que não construiu
com que o maior festival de cinema do mun- todo e enfrenta a policia nas manifestações uma proposta diferente.
do, o Festival de Cannes, não se concretizasse noturnas. Os dois filmes conseguem retratar toda
naquele ano, já que as maiores expressões do A película se propõe a ser mais retrô, essa conjuntura de maneira impressionante,
cinema (Jean Luc Godard, Phillipe Garrel, Fran- fotografada totalmente em preto e branco, cada um a sua maneira, e merecem ser vistos,
çois Trufaut, Claude Lelouch, Roman Polanski, com direção extremamente lenta e perfeccio- revistos e analisados diversas vezes, pois têm
Alain Resnais e o brasileiro Glauber Rocha) de- nista, sem trilha sonora e com mais de 3 horas muito a ensinar de uma época não que não
cidem boicotar a competição, não compare- de duração. Além disso, tecnicamente, propor- acabou; mas que nem começou.
cendo ao evento e aderindo ao movimento. ciona cenas impressionantes, como aquela em
que há a recriação da “Noite das Barricadas” Marcelo Gustavo Lopes - XLVI

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