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O Go No Brasil
O Go No Brasil
O desemprego no Brasil e
os seus desafios éticos
Resumo
Este artigo propõe-se a discutir o desemprego no Brasil e seus desafios
éticos. A controvérsia encontra-se nas disparidades entre as taxas de
desemprego e o perfil da educação, principalmente nos últimos anos da
década de 1990. Os impactos da globalização e o emprego de novas
tecnologias ocasionam aumento de desemprego com diminuição de postos
de trabalho em muitos setores da economia. Apresentar esta controvérsia
para a compreensão ética é essencial numa situação onde a crise do
emprego formal é uma realidade e a busca de atividades produtivas,
como a produção para consumo próprio, e os serviços sociais e domésticos
estão sendo valorizados como formas alternativas.
Abstract
This article intends to discuss unemployment in Brazil and its ethical
*Administrador, Mestre em
challenges. The controversy is found as disparities in the unemployment
Engenharia de Produção pela
rate and the profile of education, especially in the last years of the 1990- Universidade Federal de Santa
decade. The impacts of globalisation and the use of new technologies Catarina (UFSC), Gerente de
cause a raise in unemployment with a decrease in working posts in many Operações da HSBC Seguros
economical sectors. Presenting this controversy to the ethical (Brasil) S/A.
E-mail: jkato@hsbc.com.br
understanding is crucial, in a situation where the crisis of formal
employment is a reality and the search for productive activities, like **Filósofo, Mestre e Doutorando
production for own consumption and social and domestic services, is em Engenharia de Produção pela
being valued as an alternative. Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC), Professor da
Business School FAE.
Key words: unemployment; government; education; ethic. E-mail: osmarp@bomjesus.br
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de conveniência. O DIEESE define o fenômeno da Para preparar o recurso humano para uma
forma mais abrangente possível, somando-se o tecnologia sofisticada e em permanente evolução,
desempregado aberto com os empregados o ensino profissionalizante pode não ser a melhor
precários e os empregados desalentados, ao passo opção. A maioria dos trabalhadores atuais deve
que o IBGE restringe a medida ao desemprego mudar profundamente seu modo de trabalhar em
aberto. As comparações internacionais de taxas função da introdução do progresso técnico na
de desemprego apresentam ainda maior perigo, produção. Hoje constitui privilégio de uma
uma vez que essas não dependem apenas de minoria desfrutar de um emprego estável com
definições, mas também de peculiaridades tempo integral, o ano inteiro e durante a vida
institucionais, culturais e econômicas literalmente ativa. A maioria dos ativos destina-se a ocupações
incomparáveis. Assim, tudo o que os números irregulares, temporárias, precárias, de tempo
parcial ou falsamente independentes.
podem indicar é a variação do desemprego, sua
estrutura e natureza. O aumento do desemprego no Brasil
apresenta três explicações fundamentais: fatores
A teoria econômica mais tradicional distingue
estruturais, conjunturais e sazonais.
três tipos de desemprego, de acordo com seus
mecanismos geradores e, paralelamente, três Dos fatores estruturais, o Brasil amarga
perspectivas de luta contra estes. A falta de efeitos de três fatores perversos: baixo
crescimento, educação insuficiente e legislação
visibilidade e de transparência do mercado de
inflexível. Destes fatores, a educação insuficiente
trabalho, a informação imperfeita que os agentes
desde a infância é responsável direta ou
têm, provoca uma forma benigna e geralmente
indiretamente pela baixa qualificação da mão-
de curta duração de desemprego, chamada
de-obra no Brasil e apresenta-se como um dos
friccional. A vaga e o candidato adequado existem,
pontos mais críticos para o país. Assim, é possível
mas os dois não se encontram, de sorte que a vaga evidenciar que boa parte dos problemas como
fica vazia e o candidato frustrado. É necessário desemprego no país é gerada pela baixa
circular as informações por todos os meios: meios qualificação da mão-de-obra existente, oriunda
de comunicação, lugares públicos, bancos de de uma educação precária e insuficiente. O
emprego etc. gráfico a seguir apresenta os índices de
O desemprego dito conjuntural está ligado a desemprego no Brasil no período 1989-2001.
fases de recessão da atividade produtiva. A
experiência da década de 1980 ensinou clara-
mente que o desinvestimento provoca um
desemprego duradouro, podendo haver conflito
entre objetivos de curto e de longo prazos. Mas a
forma mais resistente de desemprego está ligada
a um descompasso entre a estrutura qualificada
da mão-de-obra necessária e da força de trabalho
disponível. A curto e a longo prazos, as três formas
de desemprego misturam-se e confundem-se. No
longo prazo, a pior forma de desemprego É importante salientar que, à medida que as
(estrutural) resulta de uma defasagem entre a empresas se modernizam e aumenta a com-
evolução da tecnologia e o ensino. plexidade da tecnologia utilizada, requisitam-se
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que compram. As atividades emergentes situam- ser aplicados de maneira a atender as necessidades
se nas áreas de manipulação de dados e palavras, dos cidadãos.
representações orais e visuais. Como já foi citado anteriormente, três séculos
Quanto aos empregos primários, estagnam- atrás, o Ministro Coulbert proibia a instalação de
se em 5% dos ativos. Essa reestruturação setorial novas máquinas de tecelagem na França para
exige uma reconversão do emprego e leva a um manter o nível de emprego. O país que praticar
desemprego estrutural de longa duração. Além tal estratégia hoje deverá se proteger da concor-
disso, a natureza da atividade sofre mudanças e rência internacional e o protecionismo levará ao
deve redefinir a ética do trabalho. Para o sociólogo atraso e ao isolamento. O povo dificilmente
René Castel (1995), duas palavras caracterizam o renunciará de forma espontânea a viver a grande
emprego do futuro: precariedade e flexibilidade. aventura do progresso.
Hoje, do ponto de vista do trabalho, a questão O fato de a máquina dispensar o homem de
social cristaliza-se em torno de três pontos: a tarefas insalubres e repetitivas não deve ser visto
desestabilização dos estáveis, a instalação na apenas pelo lado negativo do desemprego; ela
precariedade e um déficit global de empregos. também liberta o trabalhador para tarefas mais
Assim, toda atividade produtiva pode ser criativas e proporciona mais tempo livre. Neste
vista como concatenação de cinco dimensões: é sentido, o desemprego de adaptação pode ser
um desempenho de competência, uma atividade minimizado por programas de reconversão para
de produção de bens ou serviços, um status os que são suscetíveis de adaptar-se.
multidimensional, um modo e nível de remune- A tentação de manipular a idéia do “cresci-
ração e um mecanismo de integração social. O mento zero” continua fascinando as mentalidades
futuro do trabalho depende de como vão evoluir catastrofistas. Ela, porém, contraria a condição
essas cinco dimensões. humana. Os desejos e aspirações são insaciáveis,
de tal forma que satisfazer uma determinada
necessidade não apaga a frustração, mas a desloca
4 O desemprego e os seus a outros objetos ou ideais. Essa insatisfação
desafios éticos permanente causa sofrimentos, mas é a mola
propulsora do progresso.
Como conclusão do presente artigo, pro- A instituição do salário mínimo é cada vez
põem-se alguns desafios éticos que marcaram mais questionada como instrumento de
esta reflexão sobre o desemprego no país e no redistribuição de renda e proteção aos mais
contexto mundial. pobres. Contudo, um estudo do Banco Mundial
Em relação ao Brasil, talvez a conclusão mais sugere que o salário mínimo nos países em
contundente a que se pode chegar é que o país, desenvolvimento não ajudou em termos de
mesmo possuindo escassez de capital para inves- justiça. Só o crescimento da renda per capita pode
timentos em educação, pode gerar resultados aumentar os salários reais.
muito mais expressivos. Cabe, neste contexto, Toda atividade produtiva envolve um risco
uma reflexão sobre a ética e a gestão dos recursos de fracasso, que pode ser reduzido, mas jamais
destinados à educação que, conforme os próprios eliminando totalmente. Quem deve assumir o
relatórios governamentais, poderiam e deveriam risco? O governo, o empresário ou o trabalhador?
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