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A Defesa do Consumidor

Introdução

Evolução Histórica do Direito do Consumidor

Mundo Antigo:
O Código de Hamurabi (2.300 a.C.) já exercia certa regulamentação do
comércio se preocupando-se com a prática do lucro abusivo e
resguardando certos direitos do consumidor. Na Índia (1.800 a.C.) o
Código de Massú previa pena de multa e punição, além de ressarcimento
de danos, aos que adulterassem gêneros ou entregassem coisa de
espécie inferior à acertada, ou ainda, vendessem bens de igual natureza
por preços diferentes.

Mundo Clássico:
No Direito Romano, o vendedor era responsável pelos vícios da coisa, a
não ser que estes fossem por ele ignorados. Porém, no período
Justinianeo, a responsabilidade era atribuída ao vendedor, mesmo que
desconhecesse do defeito.

Idade Média:
Na França de Luiz XI (1481) punia-se com banho escaldante aquele que
vendesse manteiga com pedra no interior para aumentar o peso, ou leite
com água para aumentar o volume.

Independência Americana:
Nos Estados Unidos, em 1773, em seu período de colônia, o episódio
contra o imposto do chá no porto de Boston (Boston Tea Party) é um
registro de uma manifestação de reação dos consumidores contra as
exigências exorbitantes do produtor inglês, pois a própria revolução
americana foi contra o sistema mercantilista de comércio britânico
colonial da época, no qual os consumidores americanos eram obrigados
a comprar produtos manufaturados na Inglaterra, pelos tipos e preços
estabelecidos na metrópole.

A Revolução Industrial:
Com o advento da Revolução Industrial no início do século passado, os
negócios jurídicos para aquisição (compra e venda) de produtos e a
contratação, utilização e prestação de serviços no âmbito mercadológico

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começaram a sofrer proeminentes transformações. O desenvolvimento
tecnológico à produção em série fez desaparecer, quase por completo, a
fabricação artesanal de bens; aquela relação individual, de confiança
mútua, que se verificava entre os integrantes do mercado, este muito
restrito, que se destinava basicamente à satisfazer às necessidades
básicas do ser humano, como alimentação, vestuário, higiene, saúde,
etc. Essa transformação gerada no plano do liberalismo decorrente da
própria Revolução Francesa, levou as pessoas físicas, destinatárias desse
mercado industrial, a uma situação insustentável em face dos abusos
que se verificaram, quer no campo econômico, como nos planos político
e jurídico.

O Consumerismo:
Diante disso, como visto em outras áreas de relações humanas
(empregados e empregadores no setor trabalhista; população e Estado
(monarca) no plano dos direitos políticos; camponeses e proprietários
agrícolas, quanto à exploração da terra e dos produtos na agricultura,
etc.), tivemos o surgimento de um movimento social organizado,
denominado “consumerismo”, fruto do “mercado de massa”, exigindo-se
respeito à dignidade e à satisfação de necessidades jurídicas mínimas do
consumidor, totalmente vulnerável na relação jurídica mantida com o
fornecedor dos produtos e serviços. Nos países mais avançados
economicamente, como os Estados Unidos e diversos países da Europa
ocidental, o consumerismo solidificou-se após a Primeira Grande Guerra.
No Brasil, porém, o mencionado movimento começou a ganhar força
depois da Segunda Grande Guerra, coincidindo com o nosso
desenvolvimento e expansão industrial.

A Selva:
O norte-americano Upton Sinclair, em 1906, escreveu um romance
chamado “The Jungle” (A Selva) que serviu para despertar no povo de
seu país o mais vivo interesse pela problemática do consumidor. Neste
trabalho Sinclair retratava o modo pelo qual a indústria alimentícia
americana cometia certos abusos, vendendo carne moída misturada com
pedaços de tecidos e pães mofados, além de outros exemplos. O impacto
de sua novela foi tão grande que inspirou a criação de leis e órgãos nos
EUA para defesa do consumidor.

O Período Pós-Guerra:
Após o Segunda Guerra, com o surgimento da mídia e conquistas
tecnológicas, despontou o movimento em prol dos direitos do
consumidor. A partir da década de 60, houve a consolidação do Direito
do Consumidor nos Estados Unidos e em 1973, em Genebra, reconheceu-
se pela Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas o Direito do
Consumidor como direito fundamental do homem.

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Cláusula Rebus Sic Stantibus:
Também após o período pós-guerra acontece o ressurgimento da clásula
rebus sic stantibus, o que enfraquece o princípio da força obrigatória dos
contratos. Esta restauração se deu sob o nome de “teoria da imprevisão”
e visava a quebra do princípio do “pacta sunt servanda”. Esta quebra
possibilitou o surgimento do Direito do Consumidor, que se
fundamentava a partir da responsabilidade civil objetiva e do
reconhecimento dos interesses e direitos difusos.

O Direito do Consumidor no Brasil

Surgimento do Direito do Consumidor:


No Brasil, o Direito do Consumidor surgiu entre as décadas de 40 e 60,
quando foram sancionados diversas leis e decretos legislando sobre
saúde, proteção econômica e comunicações e a partir daí foi se
desenvolvendo com o tempo. Dentre as leis existentes, pode-se citar a
Lei de Economia Popular, a Constituição de 1967 com a emenda 1/69 que
consagrou a defesa do consumidor e a Constituição de 1988 que
apresenta a defesa do consumidor como princípio da ordem econômica
(art. 170) e no art. 48 do Atos das Disposições Transitórias
expressamente determinou a criação do Código de Defesa do
Consumidor.

Necessidades de Instrumentos de Proteção:


O tempo, porém, demonstrou que a simples previsão legal de direitos
não era suficiente para proporcionar proteção mínima ao consumidor,
em termos de sua própria efetividade, principalmente numa sociedade
de massa e diante do enorme poder econômico e sua influência nos
diversos setores do campo sócio-político. Era essencial dotar-se o
consumidor e a própria sociedade de instrumentos básicos para que se
pudesse fazer valer, de modo efetivo, os direitos materiais conquistados.

Tutela dos Interesses Difusos e Coletivos:


Assim, fruto de trabalho vanguardeiro de juristas como Mauro Cappelletti
e Bryant Garth, foi realçada a importância do efetivo acesso à justiça
para tutela de interesses difusos e coletivos e das massas de
consumidores como um todo. Com o advento da Constituição Federal,
em 1988, e do Código de Defesa do Consumidor, somado à anterior
edição da Lei da Ação Civil Pública, o Brasil ocupa posição de expoente
na concessão de instrumentos processuais próprios e específicos para a
efetiva tutela dos direitos do consumidor, levando alguns doutrinadores
a afirmarem a existência de um “novo processo do consumidor”. Países
como a Holanda, Austrália, Itália, Canadá, dentre outros, têm realçado a
relevância de nosso processo civil coletivo e utilizando-o como modelo
para a legislação de seus países.

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Proteção Jurisdicional do Consumidor

Formas de Tutela Jurisdicional

Noções Iniciais:
A proteção do consumidor é um dos aspectos mais relevantes do acesso
do cidadão à justiça e não pode ser encarada desligada desta proteção
mais ampla, face ao disposto no art. 5.°, incisos XXXII e XXXV, da
Constituição Federal. O grande mérito do Código de Defesa do
Consumidor em comparação com o próprio Código Civil, foi o fato dele,
ao mesmo tempo que reconhece os direitos básicos do consumidor,
também outorga-lhe instrumentos processuais necessários e
indispensáveis para a tutela jurisdicional desses direitos.

Formas de Proteção:
Na tutela dos direitos do consumidor em juízo, verifica-se a existência de
duas formas, com modelos processuais bem distintos:

1) No plano individualizado, considerando o consumidor, por si só, como


titular de direitos e legitimidade “ad causam” para pleitear a defesa
desses direitos em juízo (arts 3.° e 6.° do CPC c.c. o art. 81, caput, do
CDC).

2) No plano coletivo, considerando o consumidor como universalidade,


cujos titulares individuais de direitos são, pelo menos a princípio,
indetermináveis, como as pessoas expostas a uma publicidade
enganosa, a práticas comerciais abusivas, mormente por meio de
contrato de adesão contendo cláusulas abusivas ou comércio de bens
móveis pelo sistema telemarketing, etc. Aqui fala-se na tutela de
interesses ou direitos difusos, coletivos (estrito senso) e individuais
homogêneos (art. 81, parágrafo único, incisos I a III, do CDC).

Tutela Jurisdicional do Consumidor no Plano Individual

Noções Iniciais:
A defesa, em juízo, do consumidor individualmente considerado deve ser
buscada com lastro no processo civil tradicional, consoante as
disposições previstas no Código de Processo Civil, ao que se soma alguns

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dispositivos específicos assegurados no Código de Defesa do
Consumidor, tais como:
a) direito à inversão do ônus da prova;
b) direito de demandar no foro do domícilio do consumidor;
c) desconsideração da personalidade jurídica da empresa;
d) vedação à denunciação da lide e do chamamento ao processo.

1) Direito à Inversão do Ônus da Prova:


O direito à inversão do ônus da prova surge sempre que o consumidor
for hipossuficiente, tanto econômica como tecnicamente, ou verossímil
sua alegação (art. 6.°, inciso VIII, do CDC). Este direito decorre do próprio
princípio da isonomia, visto que o consumidor é a parte mais fraca,
vulnerável, nas relações de consumo. Busca a igualdade real entre as
partes no processo.

Hipóteses da Inversão do Ônus da Prova:


Essa inversão do ônus da prova somente é possível legalmente nas
hipóteses de ações judiciais envolvendo relações de consumo,
operando-se “ope judicis”, isto é, por ato do juiz, salvo na hipótese da
prova da veracidade e correção da informação ou comunicação
publicitária, ocasião em que tal inversão é “ope legis” (art. 38 do
CDC). O juiz deverá apreciar, tão somente, a presença ou não dos
requisitos legais exigidos para se proceda a inversão. Verificando a
existência de qualquer um dos mencionados requisitos e da
impossibilidade do consumidor desincumbir-se do ônus “probandi”, o
juiz deverá aplicar o disposto no art. 6.°, inciso VIII, do CDC,
determinando ao fornecedor que demonstre a inexistência do alegado
direito do consumidor. O momento processual para que o juiz decida
sobre a inversão do ônus da prova é, em regra, na fase do
saneamento do processo, quando se inicia a instrução, com a fase de
especificação de provas pelas partes. Todavia, nada impede, no caso
concreto, que ele defira a inversão na fase inicial do processo, ao
determinar a citação, conforme as circunstâncias do caso concreto e
questões de natureza eminentemente técnicas, cujo conhecimento
somente o fornecedor detenha.

2) Direito de Demandar no Foro do Domicílio do Consumidor:


A norma processual insculpida no art. 101, I, do CDC possibilita, a critério
do consumidor-autor da demanda, a propositura de ação de
responsabilidade civil na comarca de seu domicílio, sempre que, em face
do fornecedor, buscar reparação de danos causados por produtos e
serviços colocados no mercado de consumo. Tal dispositivo regula a
competência para ações propostas pelo consumidor individualmente
considerado, decorrente, evidentemente de negócios jurídicos
envolvendo relações de consumo, ainda que fundadas em contratos
pactuados, antes mesmo, da vigência do Código de Defesa do

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Consumidor, pois trata-se de norma processual, que adquire vigência
imediata.

3) Desconsideração da Personalidade Jurídica:


Desconsideração da personalidade jurídica da empresa fornecedora,
proporcionando legitimidade passiva “ad causam” para que os
respectivos sócios respondem em juízo, diretamente com seus
patrimônios individuais, sempre que, numa situação de insolvência, a
personalidade jurídica do fornecedor constituir obstáculo ao
ressarcimento dos danos causados aos consumidores. O comportamento
fraudulento da pessoa jurídica gera o fundamento principal para tal
desconsideração, nos termos do art. 28 do CDC.

4) A Vedação à Denunciação da Lide e do Chamamento ao


Processo:
A vedação à denunciação da lide e do chamamento ao processo nas lides
envolvendo relações de consumo se encontra nos arts. 88 e 102, inciso II
do CDC.

Responsabilidade Objetiva nas Relações de Consumo:


Em face do disposto no art. 6.°, inciso VI, do CDC, a responsabilidade
civil do fornecedor de produtos e serviços nas relações de consumo é
fundada na denominada teoria do risco atividade, portanto vigora no
Código de Defesa do Consumidor (nas relações de consumo), a
responsabilidade civil objetiva por danos, perdas e prejuízos aos
consumidores e vítimas (art. 17 do CDC - acidente de consumo), salvo
em relação aos profissionais liberais (art. 14, § 4.°, do CDC). Com a
adição desses institutos processuais na defesa do consumidor
individual em juízo, o Código do Consumidor colimou colocá-lo numa
situação de igualdade com o fornecedor, de modo que a proteção dos
direitos básicos do consumidor seja efetiva e rápida, até mesmo
procurando inibir a ocorrência de práticas comerciais abusivas no
mercado de consumo, de modo que se amplie a valorização da
qualidade dos serviços e produtos, com maior competitividade na
oferta ao consumo. Essa regra geral (responsabilidade civil objetiva
nas relações de consumo), foi explicitado nas hipóteses dos arts. 12,
13 e 14 do Código de Defesa do Consumidor, impondo a
responsabilidade civil do fornecedor, construtor, fabricante,
importador, produtor, independentemente de culpa. A admissão da
denunciação da lide e do chamamento ao processo, ambas ações
condenatórias, é incabível porque introduziria fundamento novo
(causa de pedir) ao processo: discussão sobre responsabilidade civil
com culpa (responsabilidade subjetiva), por parte do denunciado à
lide.

Profissional Liberal:

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Quando tratar-se de hipótese de ação promovida em face de
profissional liberal, fundada na conduta culposa ou dolosa, é
admissível a denunciação da lide e o chamamento ao processo.

Seguradora:
O art. 102, II do CDC somente admite o chamamento ao processo de
seguradora, quando o réu houver contratado seguro, porque isso se
mostra mais benéfico ao consumidor, constituindo-se garantia do
recebimento da indenização devida.

Tutela Jurisdicional do Consumidor no Plano Coletivo

Noções Gerais:
Para evitar maiores indagações e interpretações extremamente díspares,
o legislador procurou, propositadamente, conceituar o que sejam direitos
difusos e coletivos - direitos metaindividuais, supraindividuais,
transindividuais (titulares indetermináveis ou dificilmente
determináveis), bem como direitos individuais homogêneos, fazendo-o
no art. 81, parágrafo único, incisos I, II e III, in verbis:

Art. 81 - A defesa dos interesses e direitos dos


consumidores e das vítimas poderá ser exercida em juízo
individualmente, ou a título coletivo.

Parágrafo único - A defesa coletiva será exercida quando


se tratar de:
I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para
efeitos deste Código, os transindividuais, de natureza
indivisível, de que sejam titulares pessoas
indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato;
II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos,
para efeitos deste Código, os transindividuais de
natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria
ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte
contrária por uma relação jurídica base;
III - interesses ou direitos individuais homogêneos,
assim entendidos os decorrentes de origem comum.

Interesses Difusos:
Basicamente, a distinção entre esses direitos está no fato de que os
difusos são caracterizados pela indeterminação dos titulares,
indivisibilidade do direito (o objeto do direito não pode ser cindido, ou
atende a toda sociedade ou não atende ninguém) e sua origem

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meramente factual. Por exemplo, o direito do consumidor de não ser alvo
de publicidade enganosa; de que os fornecedores se abstenham de
inserir cláusulas abusivas em contratos de adesão; não colocação de
produto nocivo à saúde no mercado de consumo; etc.

Os interesses difusos são direitos insusceptíveis de apropriação


individual.

Interesses Coletivos:
Os interesses ou direitos coletivos, por sua vez, têm por característica a
possibilidade de determinação dos titulares, cujo espectro é menor do
que os direitos difusos. Também é de natureza, indivisível, pois todos os
integrantes do grupo, categoria ou classe serão alcançados do mesmo
modo. Sua origem decorre de uma relação jurídica que une os
consumidores ao fornecedor. Podemos exemplificar com os consumidores
contratantes de plano de seguro-saúde relativamente a determinada
cláusula contratual abusiva, no sentido de que ela ou é abusiva em
relação a todos ou não é em relação a ninguém do respectivo grupo.
Outro exemplo seria quanto aos consumidores assinantes de
determinado jornal, relativamente à imposição de pagar importância
complementar para continuar recebendo a assinatura já integralmente
paga, sob alegação, por parte da empresa, de que houve acréscimo de
caderno ao jornal; alunos de uma escola com relação à qualidade do
ensino. Portanto, consideram-se direitos insusceptíveis de apropriação
exclusiva por qualquer membro do grupo, classe ou categoria.

Direitos Individuais Homogêneos:


Por sua vez, os direitos individuais homogêneos são aqueles, como
expressa sua denominação, cujos titulares são individualizáveis para fins
de reparação de danos sofridos numa relação de consumo semelhante,
comum a todos os lesados, daí porque sua origem é comum. Podemos
citar o exemplo de consumidores de determinado produto de higiene,
como uma espécie de sabonete, que vierem a sofrer reação alérgica ou
problemas na pele devido ao uso do produto, em face de um dos
componentes da fórmula do produto. Portanto, o inciso III, do parágrafo
único, do art. 81 do CDC trata-se de hipótese de defesa coletiva de
direitos individuais, expressamente prevista em lei.

Procedimento Processual:
O procedimento processual para tutela jurisdicional dos direitos difusos e
coletivos encontra-se, basicamente, previsto na Lei da Ação Civil Pública.
A ele somará as disposições gerais previstas nos arts. 81 a 90 e 102 a
104, do CDC, mais a possibilidade de inversão do ônus da prova.
Considerando que a hipótese relativa aos direitos individuais
homogêneos não era regulada pela Lei da Ação Civil Pública, o CDC criou
procedimento processual próprio e específico para sua defesa em Juízo,

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conforme dispõe os arts. 91 a 100 do CDC. Na verdade, há perfeita
interação e harmonia entre as normas processuais previstas na Lei da
Ação Civil Pública e aquelas elencadas no Código de Defesa do
Consumidor (art. 90 do CDC e 21 da LACP). Um diploma completa o
outro.

Legitimidade Para Propor Ações Coletivas

Noções Gerais:
No processo civil clássico, em regra, há coincidência entre a legitimação
de direito material (art. 3.° do CPC e 75 do CC) e a legitimidade para
estar em juízo. Trata-se da denominada hipótese de legitimação
ordinária. Excepcionalmente, o Código de Processo Civil admite a
denominada legitimação extraordinária, permitindo que alguém, em
nome próprio, pleiteie em juízo direito alheio, nos casos expressos em lei
(art. 6.° do CPC).
Porém, o Código de Defesa do Consumidor optou por uma legitimação
concorrente e disjuntiva, onde cada legitimado, por si só, pode propor
ações coletivas, sem necessidade de autorização dos demais, admitido
eventual litisconsórcio facultativo.

Art. 82 - Para os fins do art. 81, parágrafo único, são


legitimados concorrentemente:
I - o Ministério Público;
II - a União, os Estados, os Municípios e o Distrito
Federal;
III - as entidades e órgãos da administração pública,
direta ou indireta, ainda que sem personalidade jurídica,
especificamente destinados à defesa dos interesses e
direitos protegidos por este Código;
IV - as associações legalmente constituídas há pelo
menos um ano e que incluam entre seus fins
institucionais a defesa dos interesses e direitos
protegidos por este Código, dispensada a autorização
assemblear.

§ 1.º - O requisito da pré-constituição pode ser


dispensado pelo juiz, nas ações previstas no art. 91 e
seguintes, quando haja manifesto interesse social
evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou
pela relevância do bem jurídico a ser protegido.

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As Ações Para a Defesa do Consumidor

Regras Gerais

Ações Para Defesa do Consumidor:


O consumidor, na defesa judicial de seus direitos e interesses, tanto pode
utilizar-se da ação individual como da coletiva.

Art. 83 - Para a defesa dos direitos e interesses


protegidos por este Código são admissíveis todas as
espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e
efetiva tutela.

A Ação Visando a Obrigação de Fazer ou Não Fazer:


O Código de Defesa do Consumidor concede tutela específica às
obrigações de fazer e de não fazer. A obrigação de fazer ou não fazer se
resolve em perdas e danos, se o devedor se recusa-se a cumpri-la. A
conversão em perdas e danos é admitida quando:
a) o credor (consumidor) assim o desejar;
b) se comprovar a impossibilidade de cumprir a obrigação;
c) for impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado
prático correspondente.

Art. 84 - Na ação que tenha por objeto o cumprimento da


obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela
específica da obrigação ou determinará providências
que assegurem o resultado prático equivalente ao do
adimplemento.

§ 1.º - A conversão da obrigação em perdas e danos


somente será admissível se por elas optar o autor ou se
impossível a tutela específica ou a obtenção do
resultado prático correspondente.

§ 2.º - A indenização por perdas e danos se fará sem


prejuízo da multa (ART.287 do CPC).

§ 3.º - Sendo relevante o fundamento da demanda e


havendo justificado receio de ineficácia do provimento
final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou
após justificação prévia, citado o réu.

§ 4.º - O juiz poderá, na hipótese do § 3º ou na sentença,


impôr multa diária ao réu, independentemente de

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pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a
obrigação, fixando prazo razoável para o cumprimento
do preceito.

§ 5.º - Para a tutela específica ou para a obtenção do


resultado prático equivalente, poderá o juiz determinar
as medidas necessárias, tais como busca e apreensão,
remoção de coisas e pessoas, desfazimento de obra,
impedimento de atividade nociva, além de requisição de
força policial.

Despesas Processuais e Ações Coletivas:


As entidades que visam a proteger o consumidor, tais como associações
de consumidores, quando ajuizarem ação coletiva versando interesses
ou direitos reconhecidos por lei ou que sua existência é objeto de
controvérsias nos planos doutrinário e processual, estão isentas de
adiantamento do pagamento de despesas várias e não poderão serem
condenadas, a final, no seu pagamento e em honorários advocatícios.
Se, porém, a associação conduzir-se com má-fé, desaparecem as
vantagens, sendo a associação e seus diretores (princípio da
desconsideração da pessoa jurídica) condenados ao pagamento de
honorários advocatícios, ao décuplo das custas sem prejuízo da
responsabilidade por perdas e danos.

Considera-se litigância de má-fé quando:


1. Deduz-se pretensão ou defesa contra texto expresso da lei ou fato
incontroverso.
2. Altera-se a verdade dos fatos.
3. Usa-se do processo para conseguir objetivo ilegal.
4. Opõe-se resistência injustificada ao andamento do processo.
5. Procede-se de modo temerário em qualquer incidente ou ato do
processo.
6. Provoca-se incidentes manifestamente infundados.

Art. 87 - Nas ações coletivas de que trata este Código


não haverá adiantamento de custas, emolumentos,
honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem
condenação da associação autora, salvo comprovada
má-fé, em honorários de advogados, custas e despesas
processuais.

Parágrafo único - Em caso de litigância de má-fé, a


associação autora e os diretores responsáveis pela

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propositura da ação serão solidariamente condenados
em honorários advocatícios e ao décuplo das custas, sem
prejuízo da responsabilidade por perdas e danos.

Ação de Regresso:
O artigo 13 do Código de Defesa do Consumidor relata que “aquele que
efetivar o pagamento ao prejudicado poderá exercer o direito de
regresso contra os demais responsáveis, segundo sua participação na
causação do evento danoso”. Assim a ação de regresso poderá ser
proposta em processo autônomo ou em respeito ao princípio da
economia processual, poderá prosseguir-se nos mesmos autos.

Art. 88 - Na hipótese do art.13, parágrafo único, deste


Código, a ação de regresso poderá ser ajuizada em
processo autônomo, facultada a possibilidade de
prosseguir-se nos mesmos autos, vedada a denunciação
da lide.

O Código vedou em qualquer hipótese a denunciação da lide.

Subsidiaridade do CPC e da Lei da Ação Civil Pública:

Art. 90 - Aplicam-se as ações previstas neste Título as


normas do Código de Processo Civil e da Lei n.º 7.347, de
24 de julho de 1985, inclusive no que respeita ao
inquérito civil, naquilo que não contrariar suas
disposições.

As Ações Coletivas Para a


Defesa de Interesses Individuais Homogêneos

Legitimados e Substitutos Processuais:


O Consumidor não é impedido de individualmente cuidar da defesa do
seu interesse lesado por ação ilícita do fornecedor, mas o artigo presente
também oferece a possibilidade de outrem ajuizar ação para a defesa de
seu direito. Trata-se de legitimação extraordinária, onde se observa o
substituto processual, exercido pelos legitimados de que trata o art. 82.

Art. 91 - Os legitimados de que trata o art.82 poderão


propor, em nome próprio e no interesse das vítimas ou
seus sucessores, ação civil coletiva de responsabilidade
pelos danos individualmente sofridos, de acordo com o
disposto nos artigos seguintes.

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Ministério Público:
Se o Ministério Público não for parte ativa da ação, é necessário a sua
presença como fiscal da lei (custos legis), sob pena de nulidade.

Art. 92 - O Ministério Público, se não ajuizar a ação,


atuará sempre como fiscal da lei.

Competência da Justiça Federal e Local:


A competência da Justiça Federal é fixada pela Constituição em seu art.
109. No parágrafo 2.º deste artigo constitucional é esclarecido que as
ações em que a União for ré serão aforados na seção judiciária em que
tiver domicílio o autor. Não se tratando de causa em que a União seja
parte, é da justiça local a competência para conhecer e julgar causas de
interesse do consumidor.
Quando o dano for de âmbito local, a competência é da justiça do lugar
onde ele ocorreu ou deva ocorrer. Se o dano for de âmbito nacional ou
regional, a competência é do foro do Distrito Federal ou da capital do
Estado.

Em se tratando de competência concorrente, aplica-se o art. 106 do


CPC: “correndo em separado ações corretas perante juízes que têm a
mesma competência territorial, considera-se prevento aquele que
despachou em primeiro lugar”.

Art. 93 - Ressalvada a competência da Justiça Federal, é


competente para a causa a justiça local:
I - no foro do lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano,
quando de âmbito local;
II - no foro da Capital do Estado ou no do Distrito
Federal, para os danos de âmbito nacional ou regional,
aplicando-se as regras do Código de Processo Civil nos
casos de competência concorrente.

Convocação dos Interessados por Edital:

Art. 94 - Proposta a ação, será publicado edital no órgão


oficial, a fim de que os interessados possam intervir no
processo como litisconsortes, sem prejuízo de ampla
divulgação pelos meios de comunicação social por parte
dos órgãos de defesa do consumidor.

Condenação Genérica na Ação Coletiva:


No CDC, a sentença genérica, prolatada em ação coletiva, proclama a
responsabilidade do fornecedor (ou do réu) pelo fato ou ato causador do
dano.

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Art. 95 - Em caso de procedência do pedido, a
condenação será genérica, fixando a responsabilidade
do réu pelos danos causados.

Liquidação e Execução da Sentença:


A sentença condenatória, em ação coletiva, por ser genérica, tem se ser
liquidada no processo de execução. É o que vem consignado no art. 586
do CPC. Esta execução pode ser promovida pelos consumidores lesados
ou pelos legitimados no art. 82.

Art. 97 - A liquidação e a execução de sentença poderão


ser promovidas pela vítima e seus sucessores, assim
como pelos legitimados de que trata o art.82.

Execução Coletiva e Individual:

Art. 98 - A execução poderá ser coletiva, sendo


promovida pelos legitimados de que trata o art.82,
abrangendo as vítimas cujas indenizações já tiveram
sido fixadas em sentença de liquidação, sem prejuízo do
ajuizamento de outras execuções.

§ 1.º - A execução coletiva far-se-á com base em certidão


das sentenças de liquidação, da qual deverá constar a
ocorrência ou não do trânsito em julgado.

§ 2.º - É competente para a execução o juízo:


I - da liquidação da sentença ou da ação condenatória,
no caso de execução individual;
II - da ação condenatória, quando coletiva a execução.

Concurso de Créditos e Indenizações:


As indenizações individuais preferem as de caráter coletivo.

Art. 99 - Em caso de concurso de créditos decorrentes de


condenação prevista na Lei n.º 7.347, de 24 de julho de
1985, e de indenizações pelos prejuízos individuais
resultantes do mesmo evento danoso, estas terão
preferência no pagamento.

Parágrafo único - Para efeito do disposto neste artigo, a


destinação da importância recolhida ao Fundo criado
pela Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985, ficará sustada
enquanto pendentes de decisão de segundo grau as
ações de indenização pelos danos individuais, salvo na
hipótese de o patrimônio do devedor ser

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manifestamente suficiente para responder pela
integralidade das dívidas.

Prazo de Habilitação de Interessados na Ação Coletiva:

Art. 100 - Decorrido o prazo de 1 (um) ano sem


habilitação de interessados em número compatível com
a gravidade do dano, poderão os legitimados do art.82
promover a liquidação e execução da indenização
devida.

Parágrafo único - O produto da indenização devida


reverterá para o Fundo criado pela Lei n.º 7.347, de 24
de julho de 1985.

Trata-se de prazo decadencial de 1 (um) ano, contado a partir da


publicação pelo juiz do edital da sentença condenatória.

As Ações de Responsabilidade
do Fornecedor de Produtos e Serviços

Ações de Responsabilidade do Fornecedor:


No inciso I deste artigo observamos que o princípio consagrado de a
ação ser proposta no domicílio do réu foi derrogado, estabelecendo que a
ação pode ser proposta no domicílio do autor.
Cuida o inciso II da hipótese de o réu haver contratado seguro de
responsabilidade.

Art. 101 - Na ação de responsabilidade civil do


fornecedor de produtos e serviços, sem prejuízo do
disposto nos Capítulos I e II deste Título, serão
observadas as seguintes normas:

I - a ação pode ser proposta no domicílio do autor;

II - o réu que houver contratado seguro de


responsabilidade poderá chamar ao processo o
segurador, vedada a integração do contraditório pelo
Instituto de Resseguros do Brasil. Nesta hipótese, a
sentença que julgar procedente o pedido condenará o
réu nos termos do art.80 do Código de Processo Civil. Se
o réu houver sido declarado falido, o síndico será
intimado a informar a existência de seguro de
responsabilidade facultando-se, em caso afirmativo, o

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ajuizamento de ação de indenização diretamente contra
o segurador, vedada a denunciação da lide ao Instituto
de Resseguros do Brasil e dispensado o litisconsórcio
obrigatório com este.

Ação Judicial para Proibir a Fabricação do Produto:


Embora no capítulo que cuida da responsabilidade, trata o presente
artigo da ação onde se é pleiteada uma ordem para proibição da
produção, divulgação, distribuição ou venda, ou a alteração na
composição, estrutura, fórmula ou acondicionamento de produto, cujo
uso ou consumo regular se revele nocivo ou perigoso à saúde pública e à
incolumidade pessoal.
Quanto à legitimidade ativa para esta ação, entendo a corrente
majoritária ser não somente os legitimados pelo art. 82, como também o
consumidor considerado isoladamente.

Art. 102 - Os legitimados a agir na forma deste Código


poderão propor ação visando compelir o Poder Público
competente a proibir, em todo o território nacional, a
produção, divulgação, distribuição ou venda, ou a
determinar alteração na composição, estrutura, fórmula
ou acondicionamento de produto, cujo uso ou consumo
regular se revele nocivo ou perigoso à saúde pública e à
incolumidade pessoal.

A Coisa Julgada

A Coisa Julgada nas Ações Coletivas:


O art. 103 do CDC disciplina integralmente a extensão da coisa julgada
nas ações coletivas quanto às relações de consumo, regendo as
sentenças proferidas em qualquer ação civil pública ou ação coletiva no
processo do consumidor.

Art. 103 - Nas ações coletivas de que trata este Código,


a sentença fará coisa julgada:
I - erga omnes, exceto se o pedido for julgado
improcedente por insuficiência de provas, hipótese em
que qualquer legitimado poderá intentar outra ação,
com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova, na
hipótese do inciso I do parágrafo único do art.81 ;
II - ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria
ou classe, salvo improcedência por insuficiência de
provas, nos termos do inciso anterior, quando se tratar

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da hipótese prevista no inciso II do parágrafo único do
art.81 ;
III - erga omnes, apenas no caso de procedência do
pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus
sucessores, na hipótese do inciso III do parágrafo único
do art.81.

§ 1.º - Os efeitos da coisa julgada previstos nos incisos I


e II não prejudicarão interesses e direitos individuais dos
integrantes da coletividade, do grupo, categoria ou
classe.

§ 2.º - Na hipótese prevista no inciso III, em caso de


improcedência do pedido, os interessados que não
tiverem intervindo no processo como litisconsortes
poderão propor ação de indenização a título individual.

§ 3.º - Os efeitos da coisa julgada de que cuida o art.16,


combinado com o art.13 da Lei n.º 7.347, de 24 de julho
de 1985, não prejudicarão as ações de indenização por
danos pessoalmente sofridos, propostas individualmente
ou na forma prevista neste Código, mas, se procedente o
pedido, beneficiarão as vítimas e seus sucessores, que
poderão proceder à liquidação e à execução, nos termos
dos artigos 96 a 99.

§ 4º Aplica-se o disposto no parágrafo anterior à


sentença penal condenatória.

Litispendência e Ações Coletivas:

Art. 104 - As ações coletivas, previstas nos incisos I e II


do parágrafo único do art. 81, não induzem
litispendência para as ações individuais, mas os efeitos
da coisa julgada erga omnes ou ultra partes a quem
aludem os incisos II e III do artigo anterior não
beneficiarão os autores das ações individuais, se não for
requerida sua suspensão no prazo de 30 (trinta) dias, a
contar da ciência nos autos do ajuizamento da ação
coletiva.

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