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CONTRABANDO OU DESCAMINHO

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109.1 CONCEITO, OBJETIVIDADE JURÍDICA E SUJEITOS


DO CRIME

O art. 334 do Código Penal contém o tipo: “importar ou exportar mercadoria proibida
ou iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela
saída ou pelo consumo de mercadoria”. A pena: reclusão de um a quatro anos.

O bem jurídico é o interesse da Administração Pública no controle sobre a entrada e


saída de mercadorias do país, bem assim no recebimento de impostos sobre a exportação e
importação.

Sujeito ativo é qualquer pessoa. Sujeito passivo é o Estado.

109.2 TIPICIDADE

O caput contém a tipificação do contrabando e do descaminho. O § 1º descreve


outros fatos punidos com a mesma pena. O § 2º contém norma explicativa e o § 3º
descreve o tipo qualificado.

109.2.1 Formas típicas básicas

109.2.1.1 Conduta e elementos do tipo

Contrabando é a importação ou exportação de mercadoria cuja entrada ou saída do


país é proibida. Importar é fazer ingressar no país, exportar é fazer dele sair. Não importa o
meio, nem se por terra, mar ou ar. Basta que a mercadoria esteja incluída entre as de
importação ou exportação proibida. Mercadoria é qualquer coisa móvel, de qualquer
2 – Direito Penal III – Ney Moura Teles

natureza.

A proibição de entrada ou saída da mercadoria pode ser absoluta ou relativa,


quando depende do cumprimento de alguma exigência legal. A norma em comento está em
branco, devendo o intérprete socorrer-se das normas complementares que estabelecem ou
relacionam as mercadorias cuja importação ou exportação seja proibida, absoluta ou
relativamente.

A mercadoria importada pode, inclusive, ser nacional que tenha sido exportada
anteriormente, cuja reentrada seja proibida.

A importação ou exportação de mercadoria que, por si só, já constitua outro delito,


como a de substância entorpecente, se ajustará ao tipo legal de crime previsto na lei
especial, afastada a incidência da norma ora comentada.

Descaminho é a falta do pagamento de direito ou imposto devido pela entrada,


saída ou consumo de mercadoria importada ou exportada. A importação ou exportação é
permitida, a mercadoria é lícita, mas o agente, mediante fraude, engana a autoridade
pública deixando de efetuar o recolhimento do tributo incidente ou de direito decorrente
da sua entrada, saída ou do seu consumo. O verbo iludir significa fraudar, enganar, burlar
o pagamento devido.

Crime doloso. Numa como na outra modalidade típica o agente age com
consciência e livre vontade. Sabe que a importação ou exportação da mercadoria é
proibida ou sabe que tem o dever de efetuar o recolhimento do valor devido. Realiza a
conduta com vontade livre.

Se não sabe da proibição ou do dever de recolher o valor do imposto, a tipicidade fica


excluída por erro de tipo, uma vez que o delito só é punível a título doloso.

109.2.1.2 Consumação e tentativa

Consuma-se o contrabando com a efetiva entrada da mercadoria no território


nacional ou com sua saída quando feita de modo clandestino ou com a liberação na
alfândega, momento em que também se consuma o descaminho. Possível, em qualquer
caso, a tentativa.

109.2.2 Formas típicas equiparadas


Contrabando ou Descaminho - 3

O § 1º do art. 334 descreve outras condutas, cominando para elas a mesma pena de
reclusão de um a quatro anos, equiparando-as ao contrabando ou descaminho.

A primeira delas está descrita na alínea a: “praticar navegação de cabotagem, fora


dos casos permitidos em lei”. Navegação de cabotagem é aquela que tem por fim a
comunicação e o comércio direto entre os portos do país, dentro de suas águas territoriais e
dos rios que correm pelo território nacional. Só as embarcações nacionais podem realizá-
la, salvo as exceções previstas em lei, como determina o art. 178, § 3º, da Constituição
Federal, nos casos de necessidade pública.

Na alínea b: “praticar fato assimilado, em lei especial, a contrabando ou


descaminho”. Tanto quanto a norma da alínea anterior esta contém um preceito primário
em branco, que será complementado por outra norma legal. O Decreto-lei nº 288/67, a Lei
nº 4.906/65 e o Decreto-lei nº 399/68 são preceitos legais que contêm normas
complementares do tipo do § 1º, b, do art. 334.

Na alínea c estão incriminadas as condutas de quem “vende, expõe à venda,


mantém em depósito ou, de qualquer forma, utiliza em proveito próprio ou alheio, no
exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria de procedência estrangeira
que introduziu clandestinamente no País ou importou fraudulentamente ou que sabe ser
produto de introdução clandestina no território nacional ou de importação fraudulenta
por parte de outrem”.

Só realiza esse tipo o agente que esteja no exercício de atividade comercial ou


industrial e pratique uma das condutas descritas: vender, expor à venda, manter em
depósito ou, de qualquer modo, utilizar a mercadoria.

Segundo dispõe o § 2º, “equipara-se às atividades comerciais, para os efeitos


deste artigo, qualquer forma de comércio irregular ou clandestino de mercadorias
estrangeiras, inclusive o exercício em residências”. Não basta, entretanto, que o agente
realize uma das condutas esporadicamente, uma única vez. Para se caracterizar a atividade
comercial ou industrial é necessário que haja habitualidade.

Deve fazê-lo em proveito próprio ou alheio. A mercadoria deve ser de procedência


estrangeira, isto é, ter vindo de outro país ainda quando fabricada no Brasil e
anteriormente exportada. Quando tenha sido introduzida no território nacional
clandestinamente pelo próprio agente ou por ele importada com fraude só responderá por
um delito. Quando a mercadoria tiver sido importada por outra pessoa, o agente
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responderá desde que tenha conhecimento de que ela é fruto de contrabando ou


descaminho. É uma modalidade especial de receptação.

Na alínea d está o seguinte tipo:

“Adquirir, receber ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, no exercício de


atividade comercial ou industrial, mercadoria de procedência estrangeira,
desacompanhada de documentação legal, ou acompanhada de documentos que
sabe serem falsos.”

Exige este tipo que o agente realize a conduta no exercício de atividade comercial
ou industrial, bem assim que tenha consciência de que os documentos que acompanham a
mercadoria de procedência estrangeira sejam falsos ou simplesmente que esteja ela
desacompanhada dos documentos exigidos por lei.

Se o agente não está no exercício de atividade comercial ou industrial a sua conduta


poderá se ajustar ao tipo de receptação, dolosa ou culposa, descrito no art. 180 do Código
Penal.

109.2.3 Forma qualificada

Determina o § 3º do art. 334 a aplicação da pena em dobro quando o contrabando


ou descaminho é praticado em transporte aéreo.

109.3 AÇÃO PENAL

A ação penal é de iniciativa pública incondicionada, permitida a suspensão


condicional do processo penal, salvo na forma qualificada.

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