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A Modernidade nos fez acreditar que tudo pode ser resolvido desde que cada um faa o que bem entender: se eu penso de um jeito, est certo, e se ele pensa do jeito contrrio, tambm est certo... Mas o que Hamlet quer saber se a me e o tio #so# mesmo corruptos e assassinos, e no o que eles ou o resto da Dinamarca acham sobre o assunto. A soluo que o prncipe da Dinamarca encontrar tem razes no mundo clssico, no no moderno. Ele acredita que h uma voz no homem que, embora no tenha lngua, expressa-se com outra e milagrosa voz: (...) a conscincia do rei se trair com a pea. E para isso contrata atores para representar uma cena parecida com o possvel assassinato do pai: levaro os atores, diante do meu tio, algo de semelhante morte do meu pai: vigiar-lhe-ei o olhar, sond-lo-ei ao vivo: se se encolher... eu sei o rumo a seguir. A Modernidade no apenas alienou o trabalhador do fruto das suas mos, mas conseguiu alienar a prpria conscincia do cidado. No queremos mais pensar, discutir e decidir sobre o que certo fazer, basta-nos saber se est regulamentado em algum cdigo, se h por perto um policial que nos vigie, se a multa muito alta. Como Dostoievski lembraria muitos anos depois, em #Os irmos Karamazov#, o homem prefere a paz e at mesmo a morte liberdade de discernir entre o bem e o mal. No h nada de mais sedutor do que o livre arbtrio, mas tambm nada de mais doloroso. Enquanto isso, a questo central da pea de Shakespeare continua ressoando em nossos ouvidos: Ser ou no ser. Eis a questo. E Hamlet continua angustiado porque no lhe parece suficiente tomar uma deciso qualquer. Ele quer tomar a deciso certa.
Rafael Ruiz professor adjunto de histria da Amrica da Universidade Federal de So Paulo (Unifesp) e autor de #O espelho da Amrica De Thomas More a Jorge Luis Borges# (Editora da UFSC, 2011).