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I

Carminalla Pale

© A.L. Bandina 1999


descristianator@gmail.com

A.L. Bandina
II
Índice
I - Pálida Introdução
II - O Sapateiro
III - Outro Funeral
IV - Face Ebúrnea
V - Noite De Inverno
VI - Vestida Para A Morte
VII - Promessa Cumprida
VIII - O Casarão
IX - Sangue Infantil
X - Passagem Gótica
XI - Encontro Com Lugubrous
XII - Retorno Ao Lar
XIII - Visita Ao Interior
XIV - Um Ancião
XV - Bebendo Entre Imortais
XVI - Frio Na Madrugada
XVII - Farto Banquete
XVIII - Maldito Sol
XIX - Atraindo Como A Morte
XX - Magos Presentes
XXI - Uma Breve Visita
XXII - Perseguição Noturna
XXIII - Irmandade Obscura
XXIV - Reencontro
III
Prefácio

Porque só os vampiros escrevem sobre suas vidas e aventuras?


Nós, as vampiras, também vivemos uma vida regada de imprevistos,
sangue e melancolia.
Meu nome é Carminalla Pale, já deve ter ouvido falar de mim, alias,
quando li o livro do Lugubrous, fiquei feliz por ele ter escrito a passagem de
quando nos conhecemos e de nossa rápida paixão escarlate.
Fiquei muito contente quando ele destruiu o maldito Memento, e
também Memoriant.
Lugubrous; estamos prestes a nos encontrar novamente, e quando isso
ocorrer, você saberá um pouco mais de minha vida condenada a esta eterna
escuridão em que vivemos através destas frias linhas que escrevo com minhas
pálidas e gélidas mãos, algumas de minhas aventuras e sede eterna pelo
sangue...

... Junte–se a mim nesta morte e boa leitura...

Carminalla Pale

IV
I – Pálida Introdução

U
- ... m cadáver... um cadáver sem sangue!!!...
Eu ouvi isso muitas e muitas vezes na velha cidade onde eu vivia.
Desde minha infância eu ouvia histórias de demônios, sugadores de
sangue, os temidos vampiros, mas confesso que nunca acreditei nessas
histórias, nos famosos vampyrs.
Nossa cidade já estava no auge da decadência econômica quando meus
pais resolveram mudar para a capital, “onde tudo acontece” como eles diziam.
Na minha última noite naquela vila, sai para ver e me despedir das ruas e
praças por onde passei minha infância toda.
Encontrei numa dessas ruas, um homem alto vestido em um sobretudo
preto e com encantadores olhos sedutores e brilhantes, que reluziam em sua
face pálida feito um morto.
Eu tinha naquela época por volta de quinze ou dezesseis anos, e me
apaixonei por aquele “anjo” em trajes negros.
Ele se aproximou de mim, tocou com suas mãos nas minhas, e eu senti
meu corpo todo arrepiar-se ao sentir sua pele fria.
_ Você é linda. Ouvi sua voz num tom sussurrado e excitante próximo
ao meu ouvido. Linda demais para morrer, quando tiver mais idade, lhe
encontrarei e você será minha companhia, será como eu, minha amada.
Linda demais para morrer eu pensei comigo em silêncio, ele vai me
matar?!
Quando ergui meus olhos para fitar os dele, já não vi mais ninguém,
aquele anjo da escuridão havia desaparecido tão rápido e funestamente como
havia surgido.
Voltei confusa para casa, pensei estar enlouquecendo, então no vai e
vem com as malas, acabei esquecendo o ocorrido e seguimos para a capital
com nossa mudança em uma engenhosa maravilha que estava surgindo naquela
época, o trem a vapor.
Eu estava fazendo minha primeira viagem, e de trem, um dragão que
soprava fumaça e grunhia com um sino a sua cabeça.
Fiquei a maior parte do tempo vendo pela janela o trajeto que íamos
fazendo, aguardando uma surpresa a cada curva, uma floresta, algum animal
selvagem no meio do mato, um rio, as cidades e suas estações pelas quais
íamos passando, e as pontes, nossa, cada ponte alta que atravessávamos e
enquanto eu olhava para baixo com um frio na barriga, eu via as pedras ou
árvores que pareciam tão pequeninos lá embaixo, ou as águas dos rios enormes
com suas correntezas batendo nos pilares de sustentação.
Eu nunca me esquecerei desta viagem, como se diz o velho ditado, “a
primeira vez a gente não se esquece”.

V
II – O Sapateiro

Chegamos à capital em um final de tarde chuvoso.


Meu pai nos levou para nossa nova casa que ele havia comprado com o
dinheiro da venda de nossa antiga morada. Esta era um pouco menor que a
outra, porém mais nova, tinha acabado de ser reformada.
Fui direto para o meu novo quarto, onde comecei arrumar minhas coisas
ao meu jeito.
No dia seguinte, fui conhecer a sapataria que meu pai tinha comprado
com suas economias, era seu negócio próprio, e ele estava orgulhoso disso.
Íamos todos os dias ajudar meu pai em seu negócio, eu e minha mãe
tirávamos o pó, fazíamos uma boa limpeza no lugar, atendíamos os clientes
enquanto meu pai ficava em um quartinho no fundo consertando os sapatos
trazidos pelos clientes ou estocando e separando os sapatos novos para a venda.
Logo foi necessário contratar um ajudante para a oficina, pois os
negócios estavam progredindo assim como o desenvolvimento do país.
Após alguns meses, mamãe não pode mais ir ao trabalho, ela adoeceu
em uma estranha febre que os médicos não sabiam como tratar e curar. Ela
morreu em um final de semana nublado e tristonho com lágrimas caindo do
céu.
No enterro, após as cerimônias fúnebres e o sepultamento, pedi ao meu
pai que me deixasse voltar sozinha para casa, pois eu queria pensar um pouco
sobre a vida e relembrar alguns momentos bons.
Estava escurecendo e já se passava das seis horas, quando, um pouco
antes de chegar em casa, pude ver um homem com seu sobretudo preto
caminhando do outro lado da rua.
Eu não conseguia ver o seu rosto, pois ele estava de costas para mim,
mas o cabelo comprido esparramado pelas costas eu reconheci de imediato, era
o mesmo que eu havia encontrado antes de vir morar aqui.
Corri ao seu encontro para descobrir mais a seu respeito, mas quando
toquei seu ombro, ele não se virou, apenas sorriu em um riso sinistro e falou
com sua vos sensualmente sussurrada:
_ Ah... Carminalla, você não teme o desconhecido, isso eu admiro tanto
quanto sua beleza, mas como eu disse antes, quando tiver mais idade,
estaremos juntos na morte para sempre...
Ele correu para a rua que virava à esquerda, e quando eu cheguei
correndo logo atrás dele, nada, ele havia desaparecido novamente.
_ Você é a morte? Veio me buscar como minha mãe?
Eu gritava e chorava ao lembrar de minha mãe, neste momento pus para
fora toda a dor da perda.
Meu pai saiu correndo de casa ao ouvir meus gritos desesperados e me
VI
abraçou levando-me para dentro.
Deitei em minha cama e pude ver os olhos dele com lágrimas contidas,
acho que foi a primeira e única vez que o vi com um olhar tão triste. Ele
beijou-me na fronte dizendo que também sentia a falta de minha mãe desde o
sepultamento, que ainda não fazia nem três horas. Ele saiu do quarto, apagou a
luz e encostou a porta. Logo depois ouvi a porta de seu quarto se fechando e
um soluço mudo morrer na escuridão lá dentro.
Eu já não tinha mais lágrimas para escorrer, e o pensamento sobre aquele
homem vestido de preto não saia de minha cabeça enquanto o sono ia me
dominando por completo até eu dormir.

VII
III – Outro Funeral

Nas semanas e meses seguintes trabalhamos muito, eu ficava até depois


do expediente normal junto ao papai, para ajudá-lo em seu serviço que tinha
aumentado muito, e nós gostávamos disso, pois mantinha nossa mente ocupada
amenizando os pensamentos da perda, e isso acabou nos aproximando ainda
mais.
Contratamos mais dois funcionários e ampliamos nossa loja enquanto os
pedidos também aumentavam.
Quando completei dezoito anos, fomos comemorar em uma confeitaria,
eu meu pai, e os três funcionários que trabalhavam conosco.
Comemos muito bolo de chocolate e bebemos vinho à vontade, mas o
que era uma feliz festa tornou-se uma nova tragédia em minha vida.
O coração de papai resolveu parar bem no momento de seu discurso, o
que sempre fazia quando eu ou mamãe aniversariávamos. Ele caiu sobre a
mesa, e enquanto todos gritavam e tentavam revivê-lo em vão, eu fiquei
sentada deixando apenas minhas lágrimas escorrerem, eu sabia que havia
partido para sempre.
No meio da confusão e lágrimas, eu vi aquele rosto pálido fitar os meus
olhos entre a multidão que corria de um lado para o outro em um mar de rostos
sem expressões.
Tudo estava tão distante de mim, e enquanto aquela maré de rostos se
movia em um vai e vem nauseante, eu fitava aqueles olhos brilhante me
observando.
De repente voltei a mim, e quando olhei novamente para a cadeira de
onde aqueles olhos me observavam, já não estavam mais lá.
Uma garrafa de vinho quebrou-se na mesa quando meu pai havia
tombado morto, e eu fui cortada no braço, e só depois deste tempo em que a
face pálida sumiu é que fui perceber e sentir o ferimento com o sangue que
escorria, não sei porque, mas ergui meu braço e levei o corte até minha boca
comecei a sorver meu próprio sangue que descia quente pela minha garganta,
então ouvi uma voz sussurrar dentro de minha cabeça:
_ Veja, você tem a sede pelo sangue dentro de você, e ela começou a
despertar...
Meus olhos se arregalaram e eu procurei pela fonte da voz, eu sabia
quem era, mas não estava por lá.
Mais uma vez, no dia seguinte, tive minha presença a mais um funeral.
Voltei com uma decisão tomada em minha cabeça.
Nas semanas seguintes, vendi a casa, a sapataria e me mudei mais para o
centro daquela enorme cidade.
Abri uma loja de perfumes e comecei minha nova vida.
Conheci um rapaz dois anos mais velho que eu e começamos a namorar.
VIII
Já com dois meses juntos, fomos ao cinema, e depois paramos o carro
em um lugar afastado da cidade, onde podíamos apenas ver as luzes lá
embaixo. Começamos a nos beijar, nos acariciar, e eu já estava seminua em um
êxtase total quando a porta do carro foi arrancada, e em seguida meu
namorado.
Saltei para fora do carro colocando meu vestido novamente e vi o que
segurava meu namorado; era aquele homem com sua face pálida e sem
expressão.
Fiquei assustada com sua força, pois como ele arrancou tão facilmente a
porta do carro e segurava meu namorado com outra mão como se ele fosse
feito de papel.
Foi ai que eu vi pela primeira vez seus caninos pontiagudos à mostra.
Ele esmagou o pescoço daquele que estava comigo e jogou-o barranco
abaixo. Eu gritei de pavor e medo enquanto ele me envolvia com seu frio
abraço que eu não conseguia me livrar por mais que eu me debatesse.
_ Calma, eu disse que você seria minha, eu estarei sempre a lhe proteger
como fiz agora, mas ainda não é hora de saber o que sou.
_ Maldito assassino!!! Gritei quando ele me soltou, mas parei de chorar e
fiquei mais calma após seu profundo olhar hipnotizante e desmaiei.

IX
IV – Face Ebúrnea

Acordei duas noites após o ocorrido. Eu estava em minha cama e não


sabia como havia chego até lá, provavelmente o homem de face pálida havia
me levado e me deixado em meu quarto.
Levantei e corri para o prédio onde meu namorado morava dividindo um
quarto com mais dois amigos e perguntei por ele, pois podia ser que eu apenas
pudesse ter tido algum mau sonho.
_ Ele foi encontrado morto no alto do morro, e seu carro foi encontrado
em outro estado, a polícia disse que foi morto pelos ladrões que roubaram o
carro e encerraram o caso.
Voltei para casa e me tranquei no quarto, eu sabia que não era aquilo que
realmente havia acontecido, mas quem iria acreditar em mim.
No dia seguinte tomei coragem e forças e retornei ao meu trabalho para
amenizar meu sofrimento enquanto tentava encontrar alguma explicação lógica
para os fatos ocorridos. Foi um dia bem movimentado, muitos clientes para
atender, pessoas com suas esquisitices procurando perfumes inexistentes, e
boas vendas.
Fechei a loja um pouco mais tarde neste dia por causa de uma senhora
Ter chego poucos minutos antes do fechamento e ficar um bom tempo indecisa
no produto que gostaria de adquirir, até que optou por um frasco que eu havia
lhe mostrado no primeiro momento em que ela entro na loja.
Ela foi embora e então pude fechar a loja. Acidentalmente deixei cair um
vidro de perfume no chão enquanto trancava a porta. O frasco se quebrou e
quando fui pegar os cacos no chão para jogá-los no lixo, fiz um corte na palma
de minha mão. O sangue escorria e eu me senti um pouco zonza. Sentei-me na
soleira da porta, sem perceber, levei minha mão até minha boca e senti mais
uma vez o prazer e o gosto daquele líquido vermelho escorrer para dentro de
mim, e fui beijando minha mão como se estivesse beijando alguém em grande
volúpia sensual, quando ouvi um riso que eu já conhecia.
_ Vejo que escolhi a mulher certa, desde já sente o prazer pelo sangue.
Voltei a mim de repente e vi o que estava fazendo. Olhei para frente e
aquela pálida face havia sumido novamente.
Levantei e senti o gosto de meu sangue em minha boca. Fiquei assustada
com o que eu fiz e sai correndo aos tropeços para minha casa enquanto cuspia
o que restava daquele sangue entre meus lábios.
Entrei em casa e fui até o banheiro, onde fiz um curativo no corte e fui
direto para minha cama pensando no que aconteceu e nas palavras que ouvi
daquele ser estranho que cada vez que o via, mesmo tendo medo, eu me
apaixonava cada vez mais, pelo seu brilhante olhar fixo, pelo seu rosto, pelo
seu poder de sedução que exercia sobre mim.
X
_ Para que eu fui à mulher certa que ele escolheu? Perguntei-me muitas e
muitas vezes durante as noites e dias que foram se passando até que eu acabei
deixando a questão de lado.

XI
V – Noite de Inverno

Foi em uma noite de inverno que consegui conversar com aquele rosto
branco feito a morte. Eu estava saindo de uma praça onde eu havia sentado em
um banco para contemplar a noite que estava com um maravilhoso céu
estrelado, quando senti uma fria mão repousar sobre a minha.
_ Boa noite, linda Carminalla.
Eu fitei seus olhos assustados, mas logo me tranqüilizei, seu olhar me
deixava fascinada pelo brilho incessante que emanava de sua profundeza.
_ Esta é uma noite de revelações, de trevas, dor, solidão, paixão, enfim,
hoje compreenderá o que sou.
Eu não disse uma palavra, apenas observava cada gesto e cada palavra
com uma atenção sobrenatural, como se ele estivesse controlando meus
pensamentos e meus movimentos.
_ Eu sou um vampiro.
Ao ouvir esta palavra eu caí em uma gargalhada espetacular, não
conseguia me conter, onde já se viu uma pessoa se apresentar a você dizendo
que é um vampiro, oras, vampiros não existem, era isso o que eu imaginava até
que ele me agarrou fortemente, mostrou seus caninos pontiagudos em sua boca
escancarada e cravou-os em meu pescoço engolindo um pouco de meu sangue.
Pude ver o êxtase que ele sentia, e confesso que como vítima, também o
sentiu ao ser drenado.
_ Isto é só o começo meu amor, não está na hora de ser transformada
ainda.
Ele me contou que apenas podia caminhar nas noites, este era um dos
preços cobrados pela eternidade, assim como a solidão e a tristeza que eram
nossas parceiras eternas nesta vida regada de sangue, luxúria e prazer.
Perguntei sobre as famosas cruzes, alho, e coisas do gênero, e ele me
disse rindo que eram apenas lendas nada mais do que isso.
Entramos em um bosque que ele dizia Ter uma refeição esperando por
ele, que estava sentindo o cheiro de sangue de sua vítima. Eu não sentia cheiro
algum, e então para minha surpresa, logo ele me apontou um caçador
clandestino a alguns metros à nossa frente.
_ Fique aqui e observe aquela pressa ser atacada por mim.
Eu fiquei agachada entre uma moita verde enquanto observava suas
habilidades.
Primeiramente ele se aproximou sem nenhum ruído, depois fez um
aceno e chamou o caçador que virou sua arma apontando-a para sua cabeça.
Com seu jogo de sedução e palavras apaziguadoras, logo fez com que sua
vítima abaixasse a arma. Quando o pobre coitado já não tinha mais barreiras
para impedi-lo, o vampiro soltou os botões da camisa do caçador, envolveu-o
com um abraço por de trás tirando aquela mesma camisa enquanto a vitima
XII
desfrutava do momento voluptuoso. Os caninos apareceram na escuridão
enquanto os olhos brilhantes me fitavam, e ele sabia que eu desejava estar no
lugar de sua vítima.
Aquele rosto pálido sorriu para mim e então os dentes perfuraram a
carne do pescoço e em seguida os lábios em um beijo começaram a sugar o
sangue que fluía de sua fonte para sustentar e aquecer aquele vampiro sedento.
O corpo da vítima foi largado ao chão para que terminasse de morrer
enquanto o vampiro vinha em minha direção. Ele pegou minha mão, mas agora
a dele estava mais quente, com um calor quase que humano.
_ E o corpo, não vão encontrá-lo sem sangue?
_ Não se preocupe, olhe você mesma.
Olhei para o corpo e vi muitos lobos se aproximando para uma refeição e
pensei comigo mesma vendo o noticiário do jornal no dia seguinte: - Caçador
vira caça e é devorado por lobos famintos.
Já próximo a minha casa, o vampiro me abraçou e disse:
_ Logo voltarei para que esteja sempre ao meu lado.
_ Não, eu quero agora!
Ele sabia que eu não diria nada a ninguém, ou caso contrário, eu seria
internada em um sanatório ou coisa do gênero.

XIII
VI – Vestida Para A Morte

Nas noites seguintes eu ficava sempre bem vestida e pronta para


receber meu visitante nocturno que nem nome eu sabia ainda, mas ele nunca
vinha, e isso me deixava triste e furiosa.
Eu tinha crises de depressão e melancolia, ataques de choro e pensei
estar enlouquecendo, que nada do que eu havia visto realmente houvesse
acontecido, que tudo fora apenas alucinações.
Numa dessas noites em que me encontrava em profunda depressão,
entrei em minha casa, tomei um banho demorado, me deitei nua em minha
cama com os braços abertos e fiquei sentindo o sangue escorrer do pulso que
eu havia cortado para deixar a vida fugir de mim.
Repentinamente comecei a sentir prazer e algo segurando meu braço.
Olhei para o lado e vi aquele pálido ser bebendo meu sangue no pulso cortado,
e o corte estava se cicatrizando de uma forma assustadoramente rápida.
_ Como você fez isso? Perguntei.
Ele disse que era um dos poderes que existia em sua forma vampírica,
sua saliva cicatrizou por completo meu ferimento, então eu o abracei e beijei
sua boca com meu sangue entre os seus lábios suculentos e comecei a despi-lo.
Seus olhos brilharam e ele me disse:
_ Logo você conhecerá um prazer tão forte quanto o sexo, não precisará
nem mais dele.
_ Mas eu quero você dentro de mim agora! Foram minhas palavras.
Abraçamos-nos forte e entre beijos voluptuosos, movimentos incessantes
e gemidos, eu senti o seu orgasmo junto ao meu em uma explosão de prazer, e
o que escorria por entre minhas pernas era o sangue que jorrava de seu
membro, enquanto eu olhava sem espanto algum.
_ Tudo que flui dentro de mim é sangue, o mesmo sangue que me
mantém vivo. Disse ele antes de me beijar novamente.
Pouco antes do amanhecer, ele se despediu de mim e foi embora dizendo
que eu começaria a vê-lo com mais freqüência e que logo estaria para sempre
junto a ele no mundo das trevas.

XIV
VII – Promessa Cumprida

Realmente ele cumpriu sua promessa, passou a me visitar uma vez por
semana e sempre que ele aparecia, eu estava pronta para que ele bebesse um
pouco de meu sangue. Numa dessas visitas, ele me revelou seu nome, Pietrus
que já estava com duzentos e nove anos.
Eu comecei a me sentir cada dia mais fraca, sem fome, cada vez mais
pálida e abatida, descobri que estava com uma forte anemia.
Pietrus não apareceu por um mês ou mais, e eu estava morrendo.
Deitada em minha cama, meu leito de morte, eu ficava pensando porque
ele havia tirado tanto sangue meu e me abandonou para um fim tão solitário e
lento, pois ele já havia sugado quase todo meu sangue, e mesmo que meu
corpo produzisse tanto sangue assim para repor a falta, eu não teria chances de
sobreviver, estava tudo perdido para mim.
Na noite em que eu já pressentia a morte me rodeando feito um abutre
sobre a sua carniça, Pietrus apareceu novamente. Desta vez estava muito
sinistro. Fiquei com muito medo ao olhar para seu rosto inexpressivo. Ele se
aproximou de mim, me despiu e cravou seus dentes com força em meu
pescoço, o que me fez estremecer enquanto o resto de minha vida era sugado.
Pouco antes de acabar todo meu sangue e minha vida, deixando-me entre
a fina linha entre a morte, ele afastou sua boca de meu pescoço e falou:
_ Agora é sua vez de decidir se vira para minhas trevas ou para o escuro
da morte eterna...
Ele mordeu sua própria língua e a pôs escorrendo seu sangue para fora
de sua boca. Eu então fiz minha escolha, beijei aquela língua sangrenta e
chupei todo sangue que escorria, cada gota que saia dela.
Nosso beijo durou poucos minutos até que ele me empurrou de lado
dizendo que já era mais do que suficiente para mim, enquanto eu delirava em
êxtase e queria mais.
Repentinamente cai ao chão com uma enorme dor correndo cada célula
de meu corpo, e eu tremia muito. Comecei chorar desesperadamente, então
Pietrus me envolveu com um forte abraço e me beijava dizendo que eu apenas
estava morrendo e renascendo para a eternidade.
Quando tudo acabou pude ver tudo ao meu lado com meus novos olhos
nocturnos e sentir que minhas lágrimas iam se tornando lágrimas de sangue.
Pietrus escolheu um lindo vestido preto entre minhas roupas e estendeu-
o para que eu o vestisse.
Após estar com o vestido em meu corpo, ele disse que deveríamos partir
para seu refúgio antes que o sol raiasse. E nós partimos daquela casa onde eu
perdi minha velha vida mortal para sempre.

XV
VIII – O Casarão

O refúgio de Pietrus era um casarão cercado por um enorme muro de


pedras.
A casa toda protegida por dentro com grandes trancas nas portas e
janelas pesadas para que ninguém entrasse durante o dia.
Entramos pelo Hall e ele me levou para o andar superior, até o final de
um estreito e mal iluminado corredor.
Apenas fiquei olhando para ver o que ele iria fazer, pois não havia nada
no final do corredor, a não ser uma enorme estátua de Shela, que ia do chão ao
teto, e com certeza pesava boas toneladas.
Ele então colocou suas mãos em uma das laterais desta estátua e puxou-a
para trás como se esta fosse feita de papel. Então empurrou-a para a lateral da
parede e fez sinal para que eu me “espremesse” um pouco e passasse pelo fino
vão que mal dava para atravessar.
Eu passei pela estátua e pude ver uma pequena passagem que dava
apenas para passar uma pessoa meio encolhida, e entrei vendo Pietrus vindo
atrás de mim puxando a estátua e deixando-a no mesmo lugar de onde estava
antes.
No final do estreito túnel sem iluminação alguma, chegamos a uma
espécie de cripta, onde havia dois caixões; um era o de Pietrus, muito velho e
empoeirado, enquanto o outro cheirava a madeira nova, e entendi que era para
mim.
Não falamos nada, já era manhã lá fora, e nós estávamos protegidos
naquela escuridão confortável, pois o túnel vinha do andar superior até o
subterrâneo do casarão, e estávamos ficando cada vez mais sonolentos, e isso
indicava que lá fora o sol já brilhava há algum tempo.
Acordei na noite seguinte com uma fome espantosa. Saímos para que eu
pudesse fazer minha primeira refeição completa como uma vampiresa.
Pietrus escolheu uma velha senhora que passava despercebida em uma
vetusta rua mal iluminada enquanto eu olhava e aprendia como fazer o serviço
de forma correta.
_ Pare um pouco antes do coração de sua vítima parar. Ele me disse.
Escolhi uma linda jovem de cabelos dourados que tinha um lindo olhar
azul e inocente. Seduzi-a com meus encantos e saciei minha terrível fome de
viver e por sangue.
Apreciei cada minuto naquela noite com uma visão que nunca pude
contemplar nada antes, mas agora não posso mais me lembrar como eram as
noites antes de me tornar no que sou.
Voltamos para o refúgio de Pietrus antes de o sol raiar.
Entrei em meu caixão e assim que ouvi o dele se fechando, abri o meu e
XVI
voltei para o Hall onde pude ver o sol nascer. Pressenti Pietrus escondido lá em
cima me observando entre a escuridão sem dizer nada. Fui à direção a grande
janela e a abri.
Senti o golpe fatal da luz solar me jogar longe ao chão e comecei a
queimar como papel em um incinerador. Eu gritava e chorava de dor até que
Pietrus se atirou na luz e com seu corpo fez sombras em mim e eu pude ver seu
rosto com uma expressão horrível, parecia ser muito velho e sua boca
escancarada deixava-o com uma face de demônio, enquanto o sol ia o
queimando.
Ele parecia não estar nem sentindo a dor com os raios solares queimando
então ele me pegou em seu colo e nos levou para nossos caixões enquanto eu
deixava minhas lágrimas de sangue escorrerem pedindo perdão
incessantemente e vendo minhas mãos, sentindo meu rosto e corpo todo
deformado e queimado pela maldita luz de um sol que eu quis contemplar.
Ele me deitou em meu caixão, tirou minhas roupas queimadas e fechou a
tampa do ataúde. Eu só me lembro de que após ele fechar o caixão, eu dormi
imediatamente sem saber se ele também foi para o dele e dormiu.

XVII
IX – Sangue Infantil

Levantei duas noites após o ocorrido.


Eu tinha fome e sai de meu caixão ainda nua e fiquei surpresa ao ver que
meu corpo estava tão belo quanto antes, sem nenhuma queimadura, como se
nada houvesse ocorrido.
Olhei para o estreito caminho e vi Pietrus se aproximando com uma pequena
criança em seu colo.
Ele a colocou sob meu caixão e disse para que eu me alimentasse
naquele pequeno ser que podia ter sido um filho meu tempos atrás.
Olhei para a pequena criança, sua pele macia e suas veias e artérias
pulsando por todo seu corpo.
Não pude resistir a tentação e a sede, me deliciei com aquele pequeno
corpo cheio de vida que eu ia bebendo bem lentamente, sentindo cada fio de
sangue que descia por minha garganta.
Deixei que o corpo da criança terminasse de morrer no chão úmido e
frio, enquanto fui até Pietrus e o beijei com o sangue escorrendo de minha
boca.
Ele cravou os dentes em meus seios e bebeu meu sangue, e eu bebi o
dele em seu pescoço. Ficamos nos amando por um bom tempo, ou melhor, até
o dia chegar e nos fazer adormecer dentro de meu caixão, ambos juntos e bem
abraçados.

XVIII
X – Passagem Gótica

Viajei muito com Pietrus, conheci alguns dos de nossa espécie em


diversas partes do mundo, e também li muito a nosso respeito em velhas
bibliotecas, e muitas coisas que pude ler ou ver, foram inventadas ao nosso
respeito, mas também pude encontrar muitos relatos que diziam a verdade, mas
para vocês, meros mortais, meus queridos e suculento alimento, nós não
passamos de um mito, mera história de terror que habitam vossas mentes.
Numa destas viagens, a pouco tempo atrás, estávamos no Brasil, mais
exato, em São Paulo. Pietrus foi a um encontro com seus contatos brasileiros, e
eu fui conhecer o cemitério da consolação. Lá havia vários góticos indo e
vindo, pra lá e pra cá, me enturmei entre eles fingindo ser ainda uma mortal, e
eles nem perceberam quem eu era na verdade. Eles me mostraram um túmulo
de um tal de Álvares de Azevedo, e me disseram que ele havia escrito poesias
sobre o lado fúnebre, eu li algumas e gostei, mas antes que eu soubesse mais
coisas a respeito destes góticos, Pietrus apareceu correndo e me puxou pelo
braço dizendo que deveríamos fugir, algo estava acontecendo, mas ele não me
disse o que era.
Nisso chegou a polícia para retirar os góticos do cemitério, e no corre
corre acabei me perdendo de Pietrus.
O cemitério estava vazio alguns minutos depois, e eu vi Pietrus a alguns
metros a minha frente, mas ele estava com uma expressão diferente em seu
rosto, nem percebeu que eu estava poucos metros de distância dele, e então eu
vi de que ele fugia.
Vi um outro vampiro, mas era um vampiro com conhecimentos em
magia, parecia ser mais velho e forte que Pietrus, então ouvindo ambos
discutirem, descobri que ele utilizava o sangue de outros vampiros em rituais
para aumentar o seu poder.
Os dois começaram uma briga horrível, muito rápida para olhos mortais
verem nitidamente.
Unhas rasgando a carne, roupas se estraçalhando, e eu ali paralisada.
Ouvi o nome do inimigo sair dos lábios de Pietrus entre suas maldições,
e o maldito nome era Memento.
Memento já estava levando a pior, mas apelou para sua magia e fez com
que Pietrus caísse em uma grande ponta de um para raio que estava jogado ao
lado de um túmulo, e o traspassou o peito e as costas. Aproveitando o
momento oportuno, Memento puxou um atame e cortou a garganta de Pietrus,
sugando o sangue em seguida, deixando-o mais fraco, e na seqüência, encheu
um de seus frascos com o sangue restante, ateando fogo em Pietrus com sua
magia por final.
Não sei como, mas eu corri dali e fugi sem ser seguida por Memento,
estava amanhecendo, fui até meu caixão e me preparei para viajar já no início
XIX
da noite seguinte.
Foi o que fiz então, despertei, peguei uma mala com algumas roupas, fiz
minha refeição em uma camareira que estava em meu quarto atendendo meu
chamado, e viajei sem rumo traçado no primeiro vôo que encontrei.

XX
XI – Encontro Com Lugubrous
Foi quando me perdi pelo mundo afora, e foi quando fui parar em uma
velha catedral, e lá encontrei um padre sozinho não sei fazendo o que. Eu
estava com uma boneca em minhas mãos, e nela eu vesti roupas iguais as que
eu estava vestindo. Com meu olhar inocente e sedutor, me aproximei do padre
e satisfiz minha sede e me sentei no chão empoeirado com o corpo do padre ao
meu lado, minhas roupas estavam sujas com o sangue que pingava de minha
boca.
Foi quando Lugubrous apareceu. A princípio pensei que fosse algum
aliado de Memento, pois ele emanava muito poder e magia ao seu redor.
Tive uma crise de loucura, mas acabei descobrindo que ele era inimigo
de Memento e lhe contei um pouco sobre mim e fiquei tão feliz ao saber que
ele havia destruído o maldito Memento.
Fui levada por Lugubrous até um conhecido seu, o pastor Desdomus,
este era um safado, usava a fé dos mortais para satisfazer sua sede. O problema
é que quando acordei na noite seguinte, o caixão em que eu estava havia sido
lacrado por fora durante o dia por uns carniçais de um tal de Memoriant.
Fui levada até um velho cemitério para ser usada como isca para
Lugubrous, uma vez que Memoriant era um tipo de chefe do detestável
Memento.
Lugubrous me salvou daquele lugar putrefo após alguns incidentes que
teve contra um dos carniçais que estavam de guarda.
Após isso, fui levada até sua mansão, onde nos banhamos e cuidamos
dos ferimentos que já estavam quase todos cicatrizados.
Lugubrous só tinha um caixão em seu refúgio, então dividimos o mesmo
naquele mesmo dia que se aproximava, transamos até o sol nascer e dormimos.
Acordamos com o refúgio em chamas e fugimos por uma passagem
secreta, Lugubrous já detalhou tudo isso em seu livro, por isso apenas estou
fazendo uma rápida passagem sobre nosso encontro, relacionamento e
despedida.
Após algum tempo, Lugubrous estava indeciso em relação ao que fazer,
Memoriant estava pressionado por todos os lados e ele temia por minha vida,
mesmo me tornando mais forte com o seu sangue poderoso. Decidiu então que
deveríamos nos separar pelo menos até que Memoriant não fosse destruído.
Fomos até a estação ferroviária, onde havia muitas pessoas e alguns
vampiros nos observando.
Eu parti mais uma vez sem destino traçado para este mundo afora.
Dentro do trem, eu me lembrei de quando viajei com meus pais pela
primeira vez de trem.

XXI
XII – Retorno Ao Lar
Decidi então voltar ao meu antigo lar e ver como tudo estava.
Cheguei em uma noite fria e melancólica. Abri a enorme porta dupla da
entrada e ouvi seu velho rangido que trazia boas recordações. Entrei, fechei a
porta e fui caminhando, olhando cada mobília coberta por lençóis já velhos e
empoeirados. A cada cômodo uma lembrança.
Antes de o sol nascer, desci até meu refúgio secreto e encontrei meu
velho caixão ainda inteiro, embora coberto pelo pó, era o mesmo, com o cheiro
de morte antiga ainda impregnado nele, cheiro que só a um bom faro como o
nosso é perceptível.
Com um pano esfarrapado o limpei por inteiro e me deitei para meu
merecido descanso.
Quando acordei, fui atrás de algumas pessoas para trabalharem para mim
naquela noite, a fim de deixar a casa limpa por inteira e como era antes.
Contratei muitas pessoas para que fizessem o serviço nesta mesma noite,
dando a desculpa que na manhã seguinte a casa receberia uma pessoa muito
importante, e como se sabe, nestas horas o dinheiro fala mais alto que a
curiosidade.
Começou então a limpeza e a rápida reforma, foi quando vi uma de
minhas contratadas limpando uma velha cômoda com frascos antigos de
perfume sobre sua superfície.
Era uma jovem muito linda, cabelos ruivos e lisos até a cintura, pele
macia e branca feito um véu, seus olhos verdes me fascinaram e seus lábios
com traços delicados me encantaram.
Observei-a durante a noite toda, cada movimento leve, toda sua sutileza,
e um ar melancólico a cercando a cada instante.
Todos terminaram o serviço antes do previsto, e eu fui pagando cada um
com uma boa gratificação e me assegurando que nada seria dito por ninguém, e
nem deixei que percebessem quem eu era.
Deixei a linda ruiva com suas vestes brancas por último, e antes de
remunerá-la, certifiquei-me que não houvesse ninguém mais na casa.
Conversamos um pouco sobre assuntos aleatórios e supérfluos e descobri
que ela estava morando há dois dias em uma pensão, que seus pais haviam
morrido em acidente recentemente e ela não tinha para onde ir. E seu nome era
Izabel.
O sol ia nascer logo, então fiz um convite irrecusável para ela, chamei-a
para vir morar comigo, e eu iria lhe pagar um bom salário para que mantivesse
minhas coisas em ordem.
Ela aceitou, e eu pedi que ela voltasse na noite seguinte já com suas
coisas para esta minha casa, que agora também seria a dela.
Conforme o combinado, ela apareceu na noite seguinte. Mostrei-lhe o
XXII
seu quarto e toda a casa. Depois de muita conversa sem importância, levei-a
para conhecer a parte de trás da casa, um lugar que eu gostava muito, e vi nos
olhos dela o brilho que mostrava que ela também adorou o lugar a primeira
vista. Era um pequeno espaço com algumas árvores, flores e um grande
gramado.
Uma chuva nos pegou de surpresa e começamos a rir e correr descalças
na grama, uma atrás da outra até cairmos uma sobre a outra e rolarmos
abraçadas.
Dei o primeiro beijo em seus lábios que retribuíram em um enorme amor
que fez nossa paixão aumentar assim como o desejo de uma pelo corpo úmido
da outra. Fui beijando seu pescoço, seus lindos seios e ela fazia o mesmo
comigo, até que não resisti e cheguei a seu genital que emanava um saboroso
cheiro de sua menstruação.
Comecei a sugar todo líquido de seu útero enquanto minha língua
trabalhava proporcionando muito êxtase e prazer a Izabel que, se contorcia em
seus gemidos de uma fêmea no cio, que me deixavam muito mais extasiada e
comecei a me masturbar até que sorvi a última gota de sangue proveniente de
seu útero junto ao meu orgasmo.
Beijamos-nos novamente e voltamos para dentro da casa já como duas
amantes. Eu sabia que ela não havia percebido que eu suguei aquele sangue
que havia dentro dela, mas também sabia que ela estranharia que seu ciclo
menstrual terminasse tão cedo, mas isso era fácil de contornar com alguma
história médica.
Tornamos-nos verdadeiras amantes, todas as noites nos banhávamos em
orgias como as mulheres em um perpétuo cio de fogo, e eu sempre tinha sede
pelo seu sangue que aumentava a cada relação que tínhamos, e apenas era
saciada pouco antes do amanhecer, quando Izabel já estava dormindo e eu me
deleitava com minhas vítimas que passavam pelas ruas, praças e parques
naquelas horas.
Ela nunca me perguntou por que eu me trancava em meu quarto durante
o dia e nunca a deixei entrar lá, e até ela, mesmo sendo mortal, passou a Ter
hábitos nocturnos e dormir durante o dia.
Tudo parecia estar perfeito como em um conto de fadas, mas em uma
noite em que eu saí sozinha para comprar alguma coisa para nós, encontrei um
homem já com seus cinqüenta e poucos anos, cabelos e barba grisalhos, mas
com o corpo ainda forte.
Percebi que me olhava com um olhar meio assustado, meio desconfiado.
Fui até ele para descobrir o que estava se passando em sua mente, e
quando cheguei bem perto dele, ele me falou:
_ Carminalla?!!
Foi quando descobri quem era. Há alguns anos atrás quando eu estive
naquele lugar, eu já era uma vampira, e este velho tinha seus quinze anos, e
trabalhava em uma loja de tecidos que eu freqüentava, seu nome era Antony, e
ele me reconheceu, e eu ainda estava tão bela e jovem como naquela época.
XXIII
_ Você é um demônio!
_ Calma Antony, são coisas da medicina moderna, plástica e coisas do
gênero.
- Mentira! E mesmo que fosse, com a idade que você deveria ter, você já
estaria morta!
_ Bem, como você mesmo disse, Poderia.
_ O demônio está entre nós, vou descobrir onde vive e te destruirei.
Eu não podia matá-lo ali, havia muitas pessoas caminhando por aquele
local, e muitas outras paradas vendo o velho que parecia um louco
blasfemando contra uma linda mulher.
Retirei-me o mais rápido possível do local e retornei para casa.
Eu precisava pensar em alguma saída para esta situação e pensei em
minha querida Izabel.
Naquela noite eu havia decidido contar a verdade à minha adorável
companheira, e foi o que fiz. Amamos-nos e após algumas horas juntas, eu
comecei a lhe falar de mina vida e no que eu havia me tornado, e como eu
estava apaixonada por ela.
Para minha surpresa, ela sorriu ao invés de mostrar horror e aversão a
minha pessoa, s eu sorriso era tão doce e seus maravilhosos dentes brancos me
fascinavam.
_ Eu já sabia que você era uma vampiresa há algum tempo, alias, eu
sabia desde que você sugou todo meu sangue uterino pela Segunda vez, mas
também me apaixonei por você e esperei pacientemente por este momento.
Olhamos-nos e nos beijamos demoradamente e então ela falou:
_ Me transforme em uma vampira como você, para ficarmos mais
próximas com laços de sangue eterno.
Foi quando tive a idéia perfeita de enganar o velho e os que viriam com
ele para me destruir.
Na noite seguinte havia uma multidão em frente à minha casa preste a
invadir com tochas, armas e coisas do tipo.
Izabel então abriu a grande porta dupla e se pôs a falar com o velho que
liderava o grupo e havia me reconhecido.
_ Como ousa a vir profanar uma casa em luto, onde a morte abriu suas
asas e levou minha amada patroa.
_ Mas como isso, eu a vi ontem, ela é um demônio.
_ Então você é o culpado pela morte dela. Ela voltou triste para casa
ontem por ter encontrado um velho conhecido que a recebeu com ofensas por
causa de sua cirurgia plástica facial que a manteve com aspecto mais jovem, e
suicidou-se, cortou os próprios pulsos, e eu a encontrei dentro da banheira
cheia com seu próprio sangue e já sem vida, maldito seja você.
Todos os que haviam vindo com o velho se condoeram e entraram para
velar o corpo da pobre mulher que havia se suicidado.
O velho incrédulo entrou correndo derrubando algumas pessoas e
fincou uma estaca em meu peito, isso confesso que doeu muito, mas tive que
XXIV
conter a dor e assim mostrar a todos que eu realmente estava morta.
Naquela mesma noite todos ajudaram a sepultar a mulher que no caso
era eu, e em uma outra a cova, o velho que eles lincharam por fazê-los de
idiotas. Izabel voltou para casa e dormiu pouco, pois preparou todas nossas
coisas para uma nova viagem, e quando a noite caiu, ela estava no cemitério
esperando para que eu saísse de baixo da terra, e foi isso o que fiz.
Eu a vi maravilhosa em um vestido negro com partes confeccionadas
em um véu rendado negro e transparente, ela estava vestida para mim, e eu a
aceitei de braços abertos.
Beijei-a primeiro nos lábios, então enquanto nossas mãos nos
acariciavam, eu mordi seu pescoço e drenei seu sangue até a fronteira da morte,
então fiz um corte em meu seio do lado direito com a unha e a fiz beber meu
sangue.
Izabel tombou ao chão tendo as convulsões da morte natural e
ressurreição ao mundo dos vampiros. Ela se levantou mais branca que antes,
uma palidez angelical e mórbida ao mesmo tempo, igual, senão maior que a
minha, e eu a desejei ainda mais do que antes.
Voltamos escondidas para a casa, pegamos nossa bagagem e fomos
para o aeroporto.
Antes do embarque, eu vi um vampiro que me observava, um rosto que
eu já havia visto antes.
Busquei sua face em minha memória e me lembrei de seu rosto na
estação ferroviária onde eu peguei um trem e deixei Lugubrous.
Fui até ele, e perguntei o que ele desejava.
Ele se apresentou como Dark Krishnevil, e que não desejava nada, foi
apenas uma coincidência se encontrarmos novamente. Contou-me sobre os
acontecimentos que ocorreram com Lugubrous que havia posto um fim em
Memoriant em uma batalha maligna e da busca em que Lugubrous estava
enfrentando.
Disse que ele também estava envolvido nesta busca por vontade
própria, e que faria tudo para ajudar Lugubrous.
Meu avião estava preste a partir, então nos despedimos e lhe falei que
também ajudaria Lugubrous no que pudesse ajudar, e ao despedir-nos, eu sabia
que nos reencontraríamos mais vezes.

XXV
XIII – Visita Ao Interior

Como já havia passado bons anos desde minha partida do Brasil, eu


resolvi voltar para lá.
Descemos no aeroporto de São Paulo, pois eu queria passar pelo
cemitério onde Pietrus havia deixado de existir.
Ficamos por volta de uns dois anos e meio morando em um prédio
antigo, mas muito seguro, ninguém nos perguntava nada sobre nossos
costumes noctívagos ou por morarmos juntas, mas eu decidi morar um pouco
mais pelo interior deste estado, então nos mudamos para uma cidade chamada
Valinhos, que fica à aproximadamente uma hora da cidade de São Paulo, e uns
dez minutos de Campinas, outra cidade relativamente grande.
Valinhos era uma cidade muito calma, as pessoas tinham poucas opções
noturnas, que as levavam a saírem para outras cidades vizinhas, onde “curtiam”
suas noites.
Compramos uma chácara, não muito afastada do centro da cidade, e
muitas noites caminhamos pelas ruas vazias desta cidade, e sempre que
aparecia algum “perdido na noite”, nós nem saíamos para caçar em outra
cidade.
Nestas nossas andanças noturnas, conhecemos cinco góticos desta
cidade, eles eram bem interessante, por isso apenas nos tornamos amigos e eu
não drenei o sangue deles, eles raramente eram vistos naquela cidade, e pouco
se sabia a respeito deles, perfeito, como nós os seres da escuridão.
Fomos convidadas uma vez por eles para irmos a um bar em Campinas
onde rolava som gótico e coisas dos anos oitenta, foi muito divertido, havia
vários jovens e adultos vestidos em sobretudos, lentes de contato, enquanto
uma banda tocava músicas covers de bandas como The Sisters Of Mercy, Joy
Division, The Cure, Dead Can Dance, entre outras do estilo. Havia um pessoal
jogando um jogo chamado R.P.G. (live), onde eles fingiam serem vampiros de
clãs diferentes, fomos até convidadas a participar do jogo, e mesmo sem saber
como funcionava o sistema direito, nós participamos e nos divertimos muito.
Após a banda acabar de tocar, passou um filme de vampiros e depois
ainda, vídeos clipes de bandas góticas.
Fomos embora um pouco antes do amanhecer, nos despedimos de nossos
amigos, e até hoje creio que ninguém desconfiou que duas pessoas que estavam
presentes naquela noite desapareceram, pois nos alimentamos por lá mesmo e
escondemos os corpos em um lugar onde ninguém jamais imaginaria poder ter
alguém.
Três noites depois, fomos a um cemitério onde apenas havia pequenas
lápides com os nomes dos sepultados no grande gramado encoberto por
inúmeras árvores, um lugar que transmitia enorme paz com um ar de tristeza,
XXVI
mas nesta noite sentimos uma melancolia muito grande cercando o lugar, um
grande contristamento pairava no ar.
Fomos à busca da fonte de toda esta dor, e quanto mais nos
aproximávamos, mais sentíamos a melancolia e um cheiro, sim, um cheiro
muito, muito antigo de morte, um cheiro que além de nós vampiros, raros
outros seres podem senti-lo.
Ao longe em meio a alguns arvoredos havia a sombra de uma pessoa, ela
estava sentada próxima a uma lápide e os longos cabelos voavam ao vento que
soprava uma triste canção de ninar.
Aproximamos-nos, pois não havia nenhuma premonição de perigo, só a
tristeza que nos dominava cada vez mais, e ali sentado junto à lápide número
seiscentos e sessenta e seis estava um vampiro. Ele era alto, mais ou menos um
metro e oitenta, oitenta e cinco, cabelos de um castanho claro com alguns fios
meio avermelhados e compridos, deixando seu rosto ainda mais pálido, triste e
delicado, mais atraente ainda.
Seu nome era Anlert, e de seus olhos estavam correndo as lágrimas de
sangue enquanto olhava perdido para a lua que iluminava sua fria face serena.
_ Porque nós amamos e deixamos nosso amor morrer em nossos braços
após a última gota de sangue? Ele perguntou-nos sem tirar seus olhos da
direção da lua.
_ Eu não sei, tudo que posso dizer é que cada vez que procuro meu
alimento eu me apaixono, e desta paixão eu bebo todo o prazer e a vida que me
alimenta. Respondi enquanto Izabel deitou-se entre minhas pernas ao mesmo
tempo em que eu abracei Anlert sentando ao seu lado, então Izabel disse
sussurrando:
_ Nós não devemos nos apegar aos mortais, nosso pecado é punido com
nossa solidão, nossa tristeza, nossos corpos frios...
_ Frio... Corpo frio e vazio, apenas o enorme vazio que preenche nossa
alma condenada. Completou Anlert.
_ Mas temos a nós, um amenizando a dor do outro... Antes que eu
dissesse mais alguma coisa ele comentou:
_ Sim amenizando, mas jamais trazendo a paz, apenas grãos de areia na
praia de nosso eterno sofrer, de nossa eterna ventura.
Izabel voltou seus lindos olhos para os meus e segurou minhas mãos
dizendo:
_ Podemos amar eternamente, mas nosso amor jamais será
correspondido por completo, e talvez até nós não amemos suficientemente uns
aos outros...
_ Talvez... Mas sempre estará lá a nossa espera por mais que nos
esforçamos para esquecê-lo.
Após estas palavras de Anlert, ficamos até próximo do dia começar a
nascer em um silêncio confidente.
Convidei Anlert para dormir em nosso lar para que pudéssemos nos
conhecer melhor na noite seguinte, mas ele disse que tinha assuntos
XXVII
importantes para serem resolvidos nas próximas noites, e assim que tudo
estivesse em ordem, ele nos encontraria.
Despedimos-nos com uma tristeza maior de que quando chegamos,
nossas lágrimas e dor foram mútuas e sinceras.
Já em nosso refúgio, pedi a Izabel que dormisse junto a mim em meu
caixão, ela me olhou e comentou em tom baixo que iria pedir a mesma coisa.
Estávamos muito mais frágeis e sensíveis que nunca, Anlert mexera muito em
nossos corações rasgados pelo tempo, não apenas por suas sinceras palavras,
mas pelo seu encanto, sua tristeza, era o tipo de ser que não precisava dizer
nada para lhe conquistar para sempre, e assim foi conosco.
Deitamos em meu ataúde, fechei a tampa, nos abraçamos bem forte e
nos beijamos chorando enquanto o sono nos foi dominando até tudo ficar em
silêncio e escuridão dentro de nós.

XXVIII
XIV – Um Ancião

Passaram-se cinco noites e nós não tivemos nenhuma notícia de Anlert,


eu comecei a pensar muitas coisas e em tudo que conversamos naquela noite de
nosso encontro casual.
Eu estava próxima à lareira que eu havia acendido para sentir um pouco
do calor do fogo enquanto Izabel estava sentada em uma de nossas poltronas de
veludo vermelho no canto mais escuro da enorme sala em que nos
encontrávamos.
_ Izabel! Comecei a chorar e falar desesperadamente; Izabel! Ele se
entregou à luz do sol! Por isso ele estava lá, ele queria acabar com a dor, ele
morreu!!!
Cai de joelhos no chão deixando minha cabeça descansar entre as pernas
de Izabel que começou a chorar junto a mim enquanto acariciava meus cabelos
com suas mãos delicadas, mãos brancas como a neve.
_ Sim, eu iria fazer isso...
A voz de Anlert nos fez ficar em pé e assustadas.
_ Não fiquem assustadas, vocês não são as únicas que não conseguem
pressentir minha chegada, muitos vampiros não conseguem perceber minha
presença quando eu não quero ser percebido, talvez seja um dos dons que
recebi ao ser transformado e se desenvolveu com o tempo.
Corri em sua direção e abracei-o forte, e Izabel abraçou a nós dois, e
ficamos ali alguns minutos sem falas, apenas três corpos frios abraçados na
morte em uma grande sala que era iluminada pelo fogo que crepitava na
lareira.
_ Porque você iria se entregar ao sol? Perguntei.
_ Isso ainda não sei como lhe responder, também me pergunto porque,
talvez seja por Ter visto a mesma história se repetir por muitos séculos...
Milênios...
_ Que história?
_ Toda história, nações nascendo, evoluindo e se destruindo, amar e ver
o amor definhar, envelhecer e morrer, enfim muitas histórias... ou talvez seja
pelos olhos dela que jamais tornarei a ver novamente... e isso dói muito...
Foi quando vi seus olhos pensamentos antigos, e foi quando me dei
conta de quão antigo era aquele ser que estava em pé na minha frente. Pela
primeira vez prestei atenção em sua palidez cadavérica, mais branca que a
minha pele, seu corpo com tecidos mais rijos que de muitos vampiros, parecia
uma pedra de mármore macia e aveludada que se movia suavemente, e os
olhos, aquele brilho de quem presenciou infinitas gerações e batalhas.
Seria este ser um dos antigos anciões que dizem existir entre os
vampiros mais jovens, os que se levantam de suas tumbas secretas para beber o
XXIX
sangue dos mais jovens? Será que é a tal da Gehennah que citam nos tais
R.P.G.s que se aproxima? Pensei nisso naquele momento, e percebi uma leve
expressão de riso em sua fria face.
_ Talvez, disse ele, talvez eu seja uma destas bestas que virão clamar
pelo sangue dos mais jovens, mas isso você poderá descobrir com o tempo.
Quanto a minha existência, talvez eu possa ser considerado como um dos
anciões, pois até Lugubrous é mais jovem que eu.
_ Você conhece Lugubrous?
_ Como já lhe disse, sou mais velho que ele, e nas minhas andanças pelo
mundo, já nos cruzamos várias vezes, já bebemos sangue juntos, e já tivemos
desentendimentos, mas ainda nos encontraremos mais vezes, este planeta não é
tão grande quanto nos parece.
_ Puxa vida, todos conhecem este Lugubrous e eu ainda não, quando nos
encontraremos com ele para que eu o conheça? Quis saber Izabel que naquela
época ainda não conhecia Lugubrous.
_ Nós nunca sabemos como e nem quando nos encontraremos com
outros de nossa espécie, isto sempre ocorre casualmente, como nosso encontro
no cemitério. Comentou Anlert.
_ Não sei quanto a vocês, mas estou com uma terrível sede, não me
alimentei muito bem esta semana que se passou, e nem você minha linda
Izabel. Falei com uma voz sensual e provocante que fez os lindos olhos de
Izabel me observar com seu olhar sedutor e insinuante.
_ E você Anlert, vem conosco para a caçada? Perguntou Izabel
abraçando Anlert por trás e sussurrando em seu ouvido.
_ Farei companhia a adoráveis damas da escuridão nesta bela e fria
noite, e que nosso banquete seja farto e suculento.
Saímos então em busca de nosso alimento. Não precisamos ir muito
longe, pois estava acontecendo uma festa em uma chácara ali por perto.
Entramos sem sermos convidados e logo seduzimos aqueles que seriam
nossa refeição.
Levamos os três escolhidos para nossa moradia. Eu me deliciei com um
jovem loiro de olhos azuis, enquanto Izabel se satisfez em um rapaz de cabelos
ruivos parecidos com os dela.
Fiquei curiosa em ver Anlert se alimentar, uma vez que ele quis ficar
fora da casa para beber. Fui caminhando silenciosamente até uma grande janela
e pude ver Anlert acariciando a pele da jovem de cabelos negros e lisos com
olhos asiáticos que ele havia escolhidos naquela noite, sua mão deslizava em
movimentos leves e constantes enquanto ele beijava a boca sensual de sua
vítima. Ele virou-a de costas para ele, despiu o vestido azul escuro de seda que
ela vestia e suas mãos começaram a brincar em seus seios e pernas até penetrá-
la com seu membro e cravar os dentes em seu macio pescoço saboroso e
começar a sugar o sangue enquanto transava freneticamente.
Quando ela estava quase sem vida, eu presenciei um ato que ainda não
tinha visto nenhum outro vampiro fazer ainda, eu apenas tinha ouvido falar de
XXX
vampiros que cultivavam este habito, mas ver ao vivo com meus próprios
olhos foi a primeira vez, ele virou-a de frente para ele, beijou-a nos lábios e
enquanto sua mão esquerda segurava a mulher, a outra mão estava livre entrou
entre o peito dela e saiu novamente com o coração preso entre seus dedos ainda
com um fraco pulsar. Levou então o órgão até sua boca e sugou todo sangue
que ainda restava dentro dele.
Após beber o sangue do coração, ele devolveu o órgão para dentro do
corpo, abraçou-a já sem vida alguma e ficou ali parado como se tivesse
acabado de amar aquela linda mulher, e foi o que realmente fez, ele a amou e
bebeu todo amor que havia nela e beijou-a com um beijo de adeus os lábios
mortos de sua presa.
Afastei-me da janela e fui para meu caixão, o dia iria chegar em breve, e
Anlert já estava partindo para seu refúgio sem se despedir, mas eu sabia que ele
iria se livrar do corpo, pois o vi carregando-a em seus braços como quem leve
uma pessoa amada que acaba de morrer em seu campo de batalha.
Ouvi o caixão de Izabel se fechar e meus olhos também fizeram a
mesma coisa.

XXXI
XV – Bebendo Entre Imortais

Passaram-se dois meses, e durante este período, eu não vi Anlert beber


mais sangue, e então decidi perguntar como ele conseguia passar tanto tempo
sem beber nosso apreciável líquido.
_ Eu já não necessito de tanto sangue, e o sangue humano tornou-se
fraco para mim. Eu bebo de sangue humano apenas para me divertir e sentir
seus corpos quentes em meus braços. Posso ficar muitos meses sem me
alimentar, venha comigo, hoje irei fazer meu desjejum.
Fomos até um casarão muito velho, esquecido pelo tempo e pelas
pessoas. Lá de dentro saiu um vampiro muito jovem, deveria Ter uns dez ou
doze anos de transformação em vampyr.
Seguimos furtivamente entre a mata úmida após um dia chuvoso, e
quando nos aproximamos de um putrefo pântano, Anlert fez sinal para que eu
parasse e observasse de onde eu estava. Ele chegou muito próximo a sua presa,
a mais ou menos uns três passos de distância e então falou:
_ Este é um bom lugar para um morto não ser encontrado.
O outro de um salto virou-se para Anlert que ria ao ver o susto que
causou no pobre coitado.
_ Mas como chegou tão perto sem que eu o percebesse? Quem é você?
_ Bem, esta questão de como cheguei tão perto, estou me cansando de
responder, talvez esteja embutido em meus dons desde minha criação, e eu vim
aprimorando durante o tempo em que andei por este planeta, digo isso porque
também passei algum tempo enterrado ao solo, as vezes isto é bom também; já
sobre quem sou, apenas direi meu nome, pois minha história atravessa os
séculos e até alguns milênios, me chamo Anlert, e hoje serei teu carrasco.
_ Oh, Anlert, mais um destes vampiros de nomes estranhos, meu nome
é...
Antes dele se apresentar, Anlert disse o nome dele.
_ Gilbert, eu sei quem você é.
_ Como?!
_ Isso não vem ao caso agora, apenas posso dizer que sua ventura acaba
por aqui.
Anlert o segurou com seu abraço forte, o abraço de um ancião, tornando
impossível à fuga de um vampiro novo como Gilbert. Enquanto ele drenava o
sangue, seus olhos se abriram e me observavam. Após a última gota, ele
chupou o negro coração de Gilbert esmagando-o em seguida com suas gélidas
mãos.
_ Você ira beber em nós também, não ira? Perguntei. Nós somos teu
alimento.
_ Não, eu bebo poucas vezes, como pode comprovar, fico meses sem
beber, fora o tempo que nos conhecemos, eu já estava muitos meses sem me
XXXII
alimentar, e o sangue dos vampiros mais jovens são meu alimento, mas eu só
bebo de seres como Gilbert.
_ Como assim de vampiros como Gilbert?
_ Vampiros que não respeitam algumas regras, como exemplo, Gilbert
matou seu criador, se mostrava de forma aberta aos meros mortais, etc...
_ Entendo, mas como você sabe estas coisas sobre Gilbert?
_ Simples, eu sempre sigo os boatos sobre cidades, vilas, etc... Que
dizem Ter um vampiro ou coisas do tipo, estes idiotas como Gilbert adoram
serem populares, mas nunca pensam nas conseqüências, e então muitos desses
boatos se revelam serem verdadeiros, ai eu pesquiso o passado de minha
provável refeição, e quando minhas suspeitas sobre a vítima são como as de
Gilbert, eu me alimento como pode ver, mas saiba, tem alguns vampiros muito
mais velhos que eu, não sei se estão enterrados aguardando algum momento
certo para reaparecerem entre nós, e é com estes que vocês devem Ter
cuidados especiais, talvez até eu possa ser sugado por alguns deles, embora
ache isso meio improvável.
Voltamos por algumas ruas escuras e seguimos até o centro da cidade,
onde encontramos Izabel sentada no banco de uma praça observando o luar que
estava lindo naquela noite.
- Como foi o passeio? Perguntou ela em um riso despreocupado, quase
angelical que me fez lembrar porque me apaixonei por ela desde a primeira vez
que a vi.
- Foi interessante, por assim se dizer, ou melhor, ainda posso dizer que
foi instrutivo, depois lhe conto tudo. E você, o que andou fazendo?
Comportou-se como uma boa menina?
- Se eu me comportei bem? Ela falava fazendo uma encenação de
garotinha levada que está levando uma bronca de seus pais, com o dedo
indicador de sua mão direita entre os lábios em forma de “biquinho”, a mão
esquerda entre as coxas que balançam de um lado para o outro, e observando
com os cantos dos olhos.
Nós três rimos, Izabel se levantou, demos nossas mãos uns aos outros e
saímos caminhando como três amigos no jardim de infância.
Chegamos perto de um cemitério, em um jardim com gramas e flores e
acabamos nos encontrando com nossos amigos góticos, eles estavam bebendo
vinho e disseram que a polícia havia os retirado de dentro do cemitério, então
resolveram ficar por ali mesmo.
Apresentamos Anlert a eles como um amigo nosso que passaria algum
tempo conosco, e ficamos conversando sobre vários assuntos como, por
exemplo, política, religião, sexo, história (e isso nós sabemos até demais).
Nossos amigos chegaram a comentar que Anlert até parecia um vampiro que
realmente vivera em certos lugares de suas histórias, pois relatava
acontecimentos e fatos com tal realismo, que só quem viveu e presenciou
poderia detalhar da forma que ele fazia. Nós olhávamos uns para os olhos dos
outros e ríamos, pois eles provavelmente cairiam duros se soubessem que
XXXIII
realmente presenciamos os fatos que relatamos.
A manhã estava próxima, então nos despedimos e cada um seguiu seu
caminho para casa.
Faltava algum tempo antes do sol nascer, eu olhei para Izabel, ela
entendeu e esboçou seu riso de menina levada e segurou minhas mãos, nos
beijamos, tiramos nossas roupas, entramos em meu caixão e fechamos a tampa.

XXXIV
XVI – Frio Na Madrugada
No anoitecer do dia seguinte fazia muito frio, não sei porque, mas eu
sabia que deveria ir para São Paulo, como se algo estivesse me avisando de
alguma coisa.
Conversei com Izabel e nos preparamos e fomos pegar o ônibus. Ao
chegar na rodoviária, Anlert estava nos esperando.
_ O que faz aqui? Perguntei.
_ Oras, vamos até S.P.
_ Como você sabe que iremos até lá?
_ Quem você acha que lhes invocou mentalmente?
_ Estranho, como você entra em nossas mentes desta forma, eu nem
percebi que era alguém tentando se comunicar comigo, é como se fosse algo
dentro de mim mesma dizendo que devo fazer algo, como isto é possível?
_ Com o tempo você poderá desenvolver mais seus dons noturnos, ai o
que você faz hoje com seus poderes será como um simples truque de mágica
para iniciantes.
_ E o que faremos em S.P.?
_ Krishnevil está nos esperando, falei com ele por telefone e vamos para
uma pequena e rápida reunião e tomarmos algumas decisões.
_ Reunião? Decisões?
_ Algo está acontecendo, lá nós conversaremos melhor sobre o assunto,
agora vamos, o ônibus chegou.
Fui pensativa sobre o que estaria acontecendo, o que seria esta reunião.
Pela janela do ônibus eu via o asfalto, árvores e prédios de concreto no
decorrer do caminho, carros passando apressados por nós. Na poltrona próximo
a porta de entrada, uma garotinha jogava seu mini-game distraidamente
enquanto sua mãe cochilava ao seu lado e seu pai trabalhava com um
notebook. Meus olhos correram por todos presentes ali, e eu sentia cada um
perdido em seus pensamentos enquanto outros dormiam despreocupadamente.
Descemos no terminal Tietê e a garoa intensa não incomodava, nem o
frio, nossas capas nos protegiam naquela noite em que eu estava ansiosa para
saber de que se tratava a tal reunião.
Dark Krishnevil apareceu para nos recepcionar. Todos se
cumprimentaram e fomos até o carro que Krishnevil havia alugado.
Chegamos em um hotel de luxo ande Krishnevil se hospedara e subimos
pelo elevador como humanos mortais.
Já no quarto do hotel, eu perguntei sobre a tal reunião e onde estavam os
que participariam do encontro.
_ Estão todos presentes no recinto. Disse Anlert.
_ Mas só estamos nós quatro aqui.
_ Exato, somente nós participaremos neste encontro.
XXXV
Lá fora a chuva havia apertado um pouco mais e a noite se tronava mais
sombria, eu parei perto de uma janela de vidro meio opaca e olhei para as
imensas nuvens negras encobrindo todo o céu, e sendo cortadas vez por outra
pelos relâmpagos seguidos de trovões tormentosos.
Batidas na porta foram ouvidas e Krishnevil comentou:
_ Deve ser Murlok, ele veio comigo para o Brasil.
A porta se abriu e realmente era Murlok, um vampiro de
aproximadamente um metro e setenta e seis de altura, olhos negros e sem
cabelo algum, ele provavelmente raspava sua cabeça com alguma navalha
todas noites após se levantar, um típico nosferatu dos cinemas.
_ Bem, começou a dizer Anlert chegando mais próximo a nós fechando
um círculo, agora que estamos todos aqui, podemos dar início a nossa reunião.
_ Sim. Disse Krishnevil. Ivant reapareceu e fugiu aqui para o Brasil,
estamos alertando a todos que estão por aqui para que nos avise a qualquer
sinal dele.
_ Quem é Ivant? Quis saber Izabel.
_ Ivant, Humn! Anlert fez uma expressão de desprezo e começou a falar
sobre o ser em questão. Ivant foi abraçado para o mundo vampírico uns setenta
anos após Lugubrous ter sido transformado, e disse também que foi Dórius
quem o Criou, alias, onde estará Dórius agora? Será que realmente está morto
como dizem? Ou será que se enterrou enganando a todos, um bom truque dos
anciões para desaparecerem por algum tempo sem serem seguidos e
perturbados.
Anlert se virou para mim e falou:
_ Ele é muito antigo, se estiver vivo, pode muito bem ser um destes
anciões que despertarão atrás do sangue de todos nós, mas isto é uma outra
história, voltemos a Ivant. Ele viveu alguns séculos em paz com os de nossa
espécie, mas depois se tornou um problema para nós, primeiro ele conseguiu
matar um vampiro muito velho e bebeu todo o sangue deste mesmo. Depois
entrou em esquemas de magia negra, começou estuprar mulheres mortais e
deixa-las vivas para contarem sobre seus atos sádicos, enfim, vários casos que
levaríamos algumas noites para comentarmos. O fato é que nós o aprisionamos
em um caixão de chumbo e enterramos debaixo de uma catedral, mas alguns
historiadores sem saber acabaram o libertando e consequentemente o
alimentaram com o próprio sangue e vidas.
_ Formamos grupos para caçá-lo, mas ele conseguiu desaparecer.
Acrescentou Murlok. Semana retrasada foi visto embarcando em um avião para
o Brasil. Avisamos amigos pelo país e aqui estamos, contando a vocês o que
aconteceu, agora sabem, irão nos ajudar nesta “caçada”?
Concordamos, mas agora tínhamos um problema, o de como encontrar
Ivant neste país tão grande.
Murlok percebendo o que pensávamos comentou:
_ Estou chegando de um contato nosso, e segundo as informações que
obtive, é que Ivant está aqui em São Paulo, embora ainda não saibamos o local
XXXVI
exato onde se esconda, mas logo ele terá que se apresentar em algum lugar.
Nesta hora acabou a energia elétrica. Fui até a janela para ver a chuva e
Izabel parou ao meu lado.
_ Algo estranho está acontecendo aqui. Comentei. Olhe as luzes na rua
lá embaixo, estão todas acesas assim como as dos prédios a volta deste.
Foi quando pressenti o perigo se aproximando. Foi tudo muito rápido,
quando fui correr, uma estaca varou minhas costas atravessando meu peito, e
eu caí no chão sentindo meu sangue jorrar para fora me deixando muito fraca e
com uma dor insuportável.
Ouvi apenas gritos, vidros se quebrando e vultos indo e vindo com uma
velocidade vampírica incrível.
O pior de tudo é que senti o amanhecer se aproximando. Algumas mãos
me pegaram e fui levada para um cômodo vedado contra a luz. Senti a estaca
ser puxada para fora de meu corpo e mais sangue escapar pelo ferimento.
Comecei a chamar por Izabel com a voz enfraquecendo a cada palavra.
_ Izabel... Izabel... Izabel...
Então a escuridão do sono fez tudo sumir a minha volta, assim como a
dor.

XXXVII
XVII – Farto Banquete

Acordei na noite seguinte com uma fome dilacerante, meu ferimento


estava quase que fechado por inteiro, até o final da noite já não teria mais nada
onde antes havia um enorme buraco. Minha roupa estava rasgada onde à estaca
entrara e por onde saíra e também toda suja de sangue coagulado.
Anlert entrou no quarto onde eu estava e disse para que eu fosso me
banhar.
Fui até um enorme banheiro que havia naquela suite, me despi e entrei
na banheira com água quente. Anlert entrou no banheiro acompanhado por
duas lindas garotas nuas, uma de cabelos preto cortado até o queixo, e a outra
de cabelos castanhos encaracolados até a cintura.
_ Contratei as duas para cuidarem de você, divirtam-se.
Ele saiu do local e as duas entraram na água junto a mim.
Entendi muito bem o que Anlert quis dizer, ele sabia que eu acordaria
com uma fome tremenda após Ter perdido tanto sangue na noite anterior, então
ele contratou duas garotas de programa dizendo a elas que era apenas para meu
divertimento.
Aproveitei para realmente me descontrair com as duas e só depois de me
satisfazer sexualmente foi que eu bebi o sangue delas em um êxtase final.
Elas ficaram mortas uma de cada lado, enquanto eu virei para a de
cabelos curto e beijei seus lábios já esfriando no lado direito, e depois beijei a
outra do lado esquerdo. Levantei-me e sai da banheira que estava com suas
águas vermelhas de sangue.
Vesti-me com um grosso vestido preto que Anlert deixara para mim em
cima da cama e fui até a sala onde todos se encontravam.
Murlok passou por mim dizendo que iria se livrar dos corpos e eu olhei
para Anlert e Krishnevil percebendo a ausência de Izabel.
_ Onde está Izabel?
_ Ele a levou. Falou Krishnevil olhando para baixo.
_ Como assim, ele a levou?
Anlert veio e me abraçou dizendo:
_ Ivant nos surpreendeu, enquanto socorríamos a você que foi
traspassada por uma estaca que ele lançou, e também já havia fincado outra em
Izabel, deixando-a vulnerável e levou-a com ele.
_ Maldito! Porque Izabel? O que ela tem a ver com sua loucura?
_ Nada, ele nos ligou enquanto você se banhava e disse que a manteria
prisioneira em seu esconderijo até terminar o que veio fazer aqui, que segundo
ele é apenas se divertir, se nós tentarmos impedi-lo ou qualquer outra coisa que
tentarmos contra ele, Izabel pagará com a própria vida.
_ Vou matá-lo com minhas próprias mãos e beberei o sangue de seu
coração ainda quente em minhas mãos!
XXXVIII
_ Tenha calma Pale, temos que Ter muita calma e cuidado para não
cometermos nenhum erro que possa prejudicar e ser fatal a Izabel.
_ Eu sei, mas não podemos ficar aqui parados sem fazer nada.
_ Isso nós não faremos, já temos pessoas vasculhando possíveis lugares
onde Ivant possa estar refugiado.
Saímos em busca de pistas que pudesse nos levar ao encontro de Ivant.
A noite estava bem fria e só uma fina garoa descia das nuvens que ainda
tampavam o céu.
Passando perto de um cemitério onde havia um grupo de roqueiros
reunidos, e lá senti um cheiro familiar de vampiro.
No meio do grupo distingui o mesmo, tentando se passar por mortal
entre os outros, mas ao perceber que eu o descobri, ele se despediu
rapidamente dos outros, saltou o muro para a rua e saiu correndo.
Foi difícil de alcançá-lo, ambos corríamos com nossa velocidade
vampírica. As pessoas pelas quais passávamos apenas sentiam um leve vento e
um calafrio, só éramos vistos quando dávamos algumas paradas para fitarmos
um ao outro com as presas à mostra como cães prestes a uma briga.
Ao passarmos em frente ao MASP na avenida paulista, eu parei na
calçada ao perceber um outro vampiro, enquanto o que eu perseguia vacilou ao
sentir a mesma presença, o idiota ficou bem no meio da avenida e foi lançado a
uns cinco metros de distância por um carro que colidiu contra seu corpo a uns
cento e vinte por hora, azar do motorista que estava fugindo da polícia após
roubar o carro e com o atropelamento, perdeu a direção e bateu em cheio em
um poste, o air bag falhou e o infeliz ainda teve tempo de sorrir bem alto, com
efeito, da cocaína em seu corpo e morrer logo em seguida.
A presença que eu senti era Murlok que já estava imobilizando o
vampiro fujão que eu perseguia.
Levamo-lo para uma igreja velha e abandonada em um lugar bem
afastado na periferia e começamos nosso interrogatório. Ele não era nenhum
vampiro conhecido nosso, e tinha se tornado em um vampyr há pouco tempo.
Revelou-nos que tinha sido abraçado por Ivant há duas semanas e que estava
esperando ele no cemitério.
Não conseguimos saber onde Ivant se escondia, pois não revelara seu
refugio a seu discípulo, eu estava com muito ódio de Ivant naquele momento e
não quis nem saber o nome do jovem vampiro e nem dei chances para ele
escolher outro caminho longe de Ivant, enfiei minha mão direita em seu peito e
arranquei-lhe o coração e esmaguei-o em seguida.
Comecei a dar socos e chutes no resto do corpo e também comecei a
desmembrá-lo, primeiro um braço, outro, então uma perna, mas Murlok me
segurou e disse para que eu parasse, para que eu mantivesse a calma.
Jogamos os pedaços do coitado na parte de trás da igreja para quando o
sol nascesse pudesse acabar com os restos que ainda sobraram do infeliz.
Anlert esperava fora da igreja, ele havia nos seguido desde o MASP e
ficou escondido lá fora nos esperando.
XXXIX
Elaborei um plano e logo pusemos em ação. Fui até o cemitério onde
havia encontrado o vampiro que destruí e fiquei a espera de Ivant, caso ele não
houvesse passado por lá ainda para encontrar sua “cria”. Anlert se escondeu em
um mausoléu, pois tinha seu “Dom” de conseguir ficar imperceptível a outros
vampiros (só não sei se este Dom funciona contra os anciões), Murlok voltou
ao hotel, pois poderia por em perigo nosso plano se fosse percebido.
Depois de uma hora de espera, Ivant apareceu. Ele me viu e já ia se
virando para fugir quando falei:
_ Estou só, você pode sentir isso, não é mesmo.
_ É verdade, não sinto mais nenhum de nós por perto, onde está Doy?
_ Então era este o nome dele, que o céu ou inferno o tenha.
_ Você o fez descansar para sempre não foi?
_ Mais ou menos, pois não sei se existe descanso eterno.
_ Tudo bem, eu não gostei muito de ter o tornado em um de nós, ele era
um idiota.
_ Como você, não é mesmo?
_ Cuidado com as palavras, mas vamos direto ao que você quer de mim?
_ Mas deixe de brincadeiras, não se faça de bobo, você sabe porque
estou aqui, onde ela está?
_ Em um caixão de chumbo bem guardado e trancado a sete chaves.
_ Porque não me leva com você, não seria bom ter mais um de nós sob
seu poder para suas exigências serem realmente cumpridas?
_ E porque você viria sem lutar?
_ Porque seu estaria junto a Izabel e saberia que não a machucaria.
_ Então vamos logo, sem rodeios.
Não acreditei que ele concordou tão fácil daquela maneira, isto só me
provou que ele era mais estúpido do que parecia.
_ Sabia que vou matá-lo depois de tudo isso? Comentei enquanto
caminhávamos pelas ruas rumo a seu refúgio. Ele riu e continuou andando.
_ Gosto de você, seríamos um belo par, um magnífico casal, não acha?
_ Você é louco? Estúpido? Não entendeu, vou realmente destruí-lo.
Ele riu mais ainda e seguimos nosso caminho.
Entramos em um velho sobrado caindo aos pedaços, mas ao entrarmos
dentro da casa, havia uma porta muito bem conservada e com uma tranca nova.
Ele abriu os cadeados e entramos no cômodo bem protegido.
Ele tornou a fechar por dentro, empurrou uma estátua de anjo esculpida
em uma pedra que deveria pesar muito para os simples mortais, e se revelou
um alçapão, que depois de aberto, tinha uma escada que descia para um lugar
bem escuro e úmido.
Descemos até uma espécie de cripta. Lá eu vi sobre alguns pedestais, o
caixão de chumbo e ouvi os gritos de Izabel abafado lá dentro, ela pressentia
minha presença no recinto.
Eu quis abrir o caixão, mas Ivant não permitiu, e neste mesmo momento
ouvimos uma pancada lá em cima que fez Ivant se calar e ir em direção a
XL
escada para verificar o que era, mas eu já sabia quem era e comecei a inventar
histórias para fazê-lo perder tempo e se surpreendido.
_ Devem ser crianças jogando pedras.
_ Isso nunca aconteceu enquanto estive aqui, e olhe as horas, que criança
estaria por aqui numa hora desta?
_ Tudo tem sua primeira vez, ouça, não há mais barulho algum, e nem
pressentes nada, concorda?
_ Sim, mas é bom verificar, como diz o velho ditado, todo cuidado é
pouco.
_ Você não vai verificar nada seu covarde! Falou Anlert sorrindo já atrás
de Ivant, que saltou em um susto.
_ Como isso aconteceu? Como chegou tão perto sem eu sentir tua
presença?
_ Não lhe interessa seu traidor!
Corri para o caixão e o abri o mais rápido que pude, retirando as trancas
e pinos que o fechavam por de fora. Izabel saiu lá de dentro em um salto e me
abraçou.
E em três nós o cercamos e o agarramos. Ivant se debatia com toda sua
força, mas conseguimos jogá-lo dentro do caixão de chumbo e fechá-lo.
Anlert pegou um telefone celular que trouxe em seu bolso e ligou para
Murlok e passou o endereço de onde estávamos.
Uma hora e meia depois chegou Murlok com uma caminhonete alugada
e entrou de marcha ré até bem próximo a porta que Anlert derrubou para entrar.
Carregamos o caixão atrás da caminhonete e envolvemo-lo com uma
grande lona preta que Murlok trouxe junto ao automóvel.
Voltamos ao hotel e subimos com o enorme “pacote” pelas escadas,
havíamos dito ao porteiro que era uma escultura que havíamos comprado e
logo levaríamos embora.
Deixamos o caixão em um quarto bem trancado e fomos para os nossos
para podermos descansar, pois mais uma vez o dia se aproximava.
Anlert havia dito que iria levá-lo ao lugar onde Ivant era mantido preso,
e que tudo voltaria ao normal.
O dia mostrava seus primeiros raios solares, todos estavam em seu sono,
mas eu lutava contra o meu. Voltei onde estava Ivant, abri seu caixão e finquei
uma estaca em seu coração, ele abriu os olhos com a dor, e eu lhe dei um bom
soco no meio de seu nariz e cortei seu pescoço com uma faca. Ele não
conseguiria fazer nada por pelo menos meia hora, então eu o joguei no meio do
quarto, tranquei o caixão para que ele não conseguisse entrar mais, arranquei as
cortinas das janelas de vidro espalhadas por todo quarto.
A luz começou a invadir o lugar e já estava queimando nós dois, eu
corri, arranquei-lhe o coração e sai do quarto fechando a porta com a chave e
fiquei ouvindo o maldito virar pó.
Voltei para meu quarto com uma dor insuportável pelas queimaduras
que obtive, mas deitei para meu repouso tranqüila, as queimaduras logo se
XLI
curariam e Ivant não faria mais mal a ninguém.
Então olhei para o lado e vi Anlert me cobrindo com um lençol fino com
seu ar de cúmplice ao meu crime, sim eu deveria saber que ele estaria
observando a tudo, mas não interferiu em nada, pois se eu não o fizesse, seria
Anlert que o faria, foi ai que me toquei, Anlert iria beber o sangue daquele
desgraçado. Ele riu para mim concordando ao ler este meu pensamento, mas
meu sono me dominou de vez e eu dormi.

XLII
XVIII – Maldito Sol

Meu despertar na noite seguinte foi estranhamente tranqüilo, ninguém


estava esperando, pronto para dizer que o que eu fiz era errado ou coisas do
tipo.
Fui até o quarto onde Ivant estava e encontrei Anlert deitado sobre o
caixão de chumbo e sem se mover começou a falar:
_ Sorte não ter incendiado todo o edifício.
Ele levantou-se virando para o lado direito do caixão com um riso nos
lábios e voltou a falar:
_ Após você dormir eu voltei ao quarto onde o fogo estava queimando
Ivant, abri este caixão de chumbo e joguei-o aqui dentro para que terminasse
de queimar sem por em risco a nós. Então voltei ao meu quarto ardendo em
conseqüência dos raios solares terem me atingido, embora eu não possa ser
destruído mais pelo sol, pois o tempo me tornou mais forte do que podes
imaginar, e assim será com você e outros que atravessarem os séculos como eu.
A dor é horrível, claro, pois o maldito sol queima muito nossa sensível pele,
mas a destruição total, nem pensar, talvez apenas se passarmos vários dias
seguido sendo expostos do raiar ao por do sol, sem dar tempo dos ferimentos
se recuperarem por completo.
_ E quanto a Ivant, mesmo ele sendo muito antigo, como foi destruído
pelo sol?
_ Bem seu coração foi arrancado, e ele perdeu quase todo seu sangue
antes de ser exposto à luz, e depois de você dormir, lembre-se que eu voltei
para me certificar da total destruição dele, aqui no caixão ainda resta alguns
restos imundos de seu corpo que ainda não se queimaram por completo, e
muitas células até estão se recompondo.
_ E o que faremos? E os outros vampiros, espalhados pelo mundo, não
irão nos perseguir por termos feito isso?
_ Fique tranqüila, eu só deixei você fazer o que fez porque eu tinha sido
avisado assim como qualquer ancião que o encontrasse, deveria destruí-lo, ele
já estava se tornando um problema muito grande para nós, e quanto ao que
faremos com estes restos de corpo, eu tenho um bom plano.
Krishnevil e Murlok vieram nos ajudar a envolver o caixão com a
mesma lona preta de antes e levamos o grande “embrulho” até a caminhonete
que usamos na noite anterior, dando a mesma desculpa de ser uma escultura ao
porteiro.
Fomos até um necrotério e sem que ninguém nos visse, jogamos os
restos de Ivant em um incinerador e o ativamos até que não restasse nada a não
ser cinzas, que nós espalhamos ao vento que soprava naquela noite.
O caixão nós enterramos em um buraco bem fundo no cemitério e
XLIII
voltamos para o hotel onde Izabel nos esperava. Ela estava faminta e saímos
para nossa caça. Murlok foi para sua caça sozinho assim como Krishnevil. Eu e
Izabel decidimos beber juntas enquanto Anlert já não precisava de tanto
sangue, então ficou para resolver alguns assuntos e telefonemas.
Próximo a uma danceteria encontramos nossas vítimas, um casal de
namorados que tinham pensamentos obscenos em mente, nós os convencemos
de nós quatro irmos até a casa do rapaz que morava sozinho e ali perto.
Chegamos na casa e começamos os jogos de sedução e prazer. Beijos,
carícias e logo estávamos em uma grande orgia, e quando sentimos que o casal
estava próximo ao maravilhoso orgasmo, nos tornamos o prazer em uma orgia
de sangue e saciamos nossa sede por aquela noite.
Livramos-nos habilmente dos corpos e saímos para uma caminhada
noturna pelo resto da noite paulistana que ainda tínhamos pela frente.
Paramos em um banco de uma praça qualquer que não lembro o nome e
conversamos muito. Era chegada à hora de nossa separação, isso sempre
acontece com os de nossa espécie, sempre chega o momento que cada um
segue seu destino sozinho, mas sempre nos reencontramos e separamos
novamente para a dolorosa solidão nas trevas.
Krishnevil foi para Londres junto a Murlok na noite seguinte. Izabel
também embarcou junto a eles, pois ela ficaria umas duas semanas por lá e
depois decidiria para onde iria se aventurar sozinha.
Após nos despedirmos, em meio a nossas lágrimas de sangue e o avião
ter decolado, eu sabia que Anlert também partiria naquela noite.
_ Perdoe por deixá-la só, mas tenho coisas a resolver, você sabe como
são as coisas, apenas imprevistos e nada mais.
_ Sim eu sei, nascemos para a eternidade, a eterna solidão.
Caminhando de volta para o hotel, passamos em frente a um velho
cemitério e Anlert parou repentinamente.
- Vamos entrar um pouco aqui neste cemitério deserto, preciso lhe dizer
algumas coisas antes de partir.
Entramos e nos sentamos em um grande túmulo de mármore tão gelado
quanto nossas peles.
_ Carminalla, meu sangue é muito poderoso, eu bebi de ancestrais que
me conceberam poderes que ainda nem sei que possuo, Lugubrous também
recebeu sangue ancestral, não tão poderoso quanto este que corre em minhas
veias, mas eu bebi o sangue de Lugubrous uma vez que precisei, e então ofertei
meu sangue a ele, ele aceitou e tornou-se tão poderoso quanto eu, mas quando
você bebeu nele, ele ainda não tinha recebido meu sangue, e agora estou lhe
oferecendo nossa comunhão com este mesmo poder.
Beijamos-nos sentindo nossas línguas se enlaçarem como duas víboras e
nos abraçamos fortemente ficando assim por alguns minutos, apenas sentindo o
corpo frio um do outro. Depois nos amamos em um amor funesto e cravei
meus dentes no pescoço de Anlert e bebi seu sangue bem devagar enquanto
escorria pelo ferimento, levando o prazer ao máximo possível, então Anlert fez
XLIV
o mesmo em meu seio do lado esquerdo sugando quase todo meu sangue, e me
fez beber o seu novamente.
Nos abraçamos fortemente e nos separamos em um suspiro quase mortal,
esboçamos um triste sorriso de despedida e ele foi desaparecendo
vagarosamente entre as sombras dos velhos mausoléus.

XLV
XIX – Atraindo Com A Morte

Decidi ficar mais um tempo em São Paulo até ver o que faria, se viajaria
para algum lugar ou sei lá, eu precisava deste tempo sozinha para poder pensar
em tudo o que aconteceu.
Sai pelas ruas como uma simples mortal comum, hoje em dia temos
muita facilidade de nos locomovermos entre os mortais sem desertar a atenção
com nossa palidez, pois pensam que somos como alguns deles que se pintam
para se parecerem com os vampiros da TV.
Fui até um bar gótico, eu adoro estes lugares, pessoas depressivas, um
mundo maravilhoso para nós.
Conheci algumas pessoas, mas eu percebi que enquanto eu estava
sentada próximo ao balcão de bebidas conversando com uma linda garota, um
jovem aparentando uns vinte e três anos me observava sentado nos degraus de
uma escada que levava ao andar superior. As velas que bruxuleavam na parede
atrás dele davam-lhe um aspecto muito triste e sombrio.
A princípio, pensei que ele estava apenas me observando como uma
garota comum de lindos encantos que despertara seus desejos, sua paixão, mas
eu comecei a perceber que em qualquer parte da casa em que eu estivesse, ele
estava a me observar de uma forma diferente.
Acabei me apaixonando por um garoto de dezenove anos que passou por
mim. Quando digo que me apaixonei por este ser, digo que me apaixonei em
minha sede. Seu jeito triste de caminhar e seus olhos chamando pela morte em
uma dor por esta vida estúpida.
Pude ver que quando este meu desejo pelo sangue do garoto me invadiu
a mente, o jovem que observava quase expressou um riso em seu rosto, e eu
percebi que ele sabia o que eu era, mas não deixei que isso interferisse em
minha sedução pelos cabelos loiros de minha nova vítima.
Após conquistar a minha pobre caça, eu o levei para uma rua deserta e
escura para saciar minha fome, e fui sugando seu sangue bem lentamente,
proporcionando um grande êxtase a nós dois, até que o garoto moribundo
tombou sem nenhum vestígio de vida, eu senti seu desejo pela morte e lhe
concedi a mesma.
Deixei o corpo encostado na parede de um prédio como se fosse um
bêbado dormindo após um porre, comecei a caminhar em direção a um poste
com sua luz piscando por algum defeito e falei:
_ Quem é você e porque me segue, sabe que vou matá-lo!?
_ Não, você não vai me matar.
Falou a voz do jovem que observava no bar e saia das sombras de um
monte de lixo que estava empilhada na calçada para que os lixeiros
recolhessem ao amanhecer.
XLVI
_ Meu nome é Eillian, eu pertenço à irmandade obscura, você já deve ter
ouvido falar de nós.
Lembrei-me que Lugubrous me falou certa vez sobre esta irmandade
negra, mas não me contou muito a respeito, apenas que era um grupo de
bruxas, magos, feiticeiros, etc., e que entre eles tinham alguns que nos
conheciam, uns amigos, outros inimigos e a maioria nem sabia que nós
existíamos.
_ Então você é um mago ou coisa parecida? Perguntei.
_ Sim, ou melhor, sou um bruxo, mas ainda sou muito novo como você
mesma pode ver, ainda tenho muito a aprender no mundo da magia.
_ E porque me segue? Desde quando me observa?
_ Eu fiquei sabendo que existiam vampiros realmente após ouvir uma
conversa entre dois magos que já transcenderam a mortalidade com seus
conhecimentos místicos, ouvi-os comentarem sobre um amigo deles chamado
Lugubrous, apenas comentários de amigos sobre amigos, e fiquei sabendo que
esse Lugubrous é um vampiro muito poderoso, e tem muito conhecimento em
magia.
_ E o que isso tem a ver comigo?
_ Nada, é que eu comecei a ficar atento e observando melhor as pessoas
durante a noite para ver se eu encontrava algum de vocês, e nesta noite, sem ter
o que fazer, fui até o mesmo local que você escolheu, destino, coincidência ou
não, eu percebi o que você era ao sentir seu desejo pelo sangue daquele pobre
corpo ali. Ele apontou para o garoto que já começava a emanar o cheiro putrefo
da morte, mas naquele momento, apenas para quem tem o olfato como o nosso.
_ E o que faz me seguindo? Eu vou beber seu sangue se não desaparecer
de minha frente, e nunca mais me siga ou tente me procurar.
_ É isso que quero, que você beba meu sangue, e depois me de um pouco
do seu, eu quero ser um vampiro, não quero ficar velho, não quero morrer,
quero ser assim para sempre.
_ E porque não pede ao seu mestre para lhe tornar imortal?
_ Você sabe como é o mundo da magia, eles dizem que só depois de
muitos estudos e trabalhos em laboratórios alquímicos nós conseguimos o
elixir da eternidade, e muitos nem conseguem, ou morrem loucos ou por alguns
experimentos que não dão certo, e se conseguir o tal elixir da eternidade, já se
está muito velho, com aparência de velho, você me entende.
_ Sim, mas ai se torna eterno já com grande sabedoria e não como nós,
que ainda nos tornamos eternos ainda jovens e temos que ir aprendendo com o
passar dos séculos e com a dor.
_ Mas se tornam sábios, pelo menos os que querem.
_ Sim os que querem, pois na maioria, nós apenas queremos o prazer e a
luxúria, o sangue, a aventura.
_ E para que querer mais que isso? Para ser sábio e ficar filosofando
sobre o começo e o fim do mundo, porque tudo foi criado, qual o sentido da
vida, buscando eternamente respostas que nunca serão respondidas? Foda-se
XLVII
tudo isso, eu quero é mais viver e viver para sempre, grandes orgias escarlates
me esperam, foda-se se Deus ou o Diabo existam e se forem julgar nossas
almas, nossos atos em um juízo final, eu quero é ser eterno em carne e osso e
sangue é claro, mais uma vez eu digo, foda-se o resto.
Eu comecei a rir do jeito que ele falava seus palavrões, mas eu senti
sinceridade em suas palavras, no animo em que ele falava.
_ Infelizmente não posso torná-lo como um de nós.
_ Porque não? Eu imploro.
- Já pensou se transformássemos todos que querem ser vampiros em
vampiros de verdade? Seria um caos.
_ Porra!!! De-me uma chance, depois de eu fizer besteiras, vocês tem o
poder de me destruir, concorda?
_ Sim, com certeza isto seria fácil demais. Eu falei quase em um
cochicho e fiquei observando Eillian que me olhava já com a face meio triste e
infeliz, quase desesperada, então olhou para mim e disse:
_ Caralho, o que tenho que fazer para você me transformar?
Eu ri mais uma vez de seu vocabulário vulgar e lhe falei:
_ Primeiramente deve parar de dizer tantas palavras obscenas, ainda
mais para quem se acaba de conhecer, depois, vejamos, quem sabe um dia eu
lhe dê a chance de se tornar um vampyr.
Eu desapareci como um passe de mágica em livros de fábulas encantadas
para os olhos mortais de Eillian, mas na verdade eu estava no alto de um prédio
apenas observando. Ele começou um choro e depois se controlou.
Decidi espioná-lo enquanto eu estivesse por São Paulo e quem sabe eu
não o tornaria em um vampyr?!.

XLVIII
XX – Magos Presentes

Nas noites que se passaram, eu ficava apenas nos cantos escuros


observando Eillian. Cada movimento, cada palavra qualquer gesto por mais
simples e comum que fosse, eu observava com imensa calma e curiosidade, eu
queria saber tudo sobre ele, seu passado, sua cor preferida, seus gestos e
costumes, enfim, tudo que pudesse me fazer conhecer o máximo possível sobre
ele, sobre seu modo de pensar e agir.
Em uma noite dessas que eu o observava, ele saiu de uma festa e estava
um pouco alcoolizado, pois ele não bebia bebidas alcoólicas sempre, e bastava
um pouco para deixá-lo meio “zonzo” por assim se dizer.
Ele voltava para sua residência quando foi abordado por três assaltantes
que davam empurrões com as mãos abertas em seu peito até ele cair. O
marginal mais alto dos três parecia ser o líder, ele mandou seu companheiro
que vestia um gorro vermelho e amarelo que eu achei simplesmente ridículo e
me provocou risos que não deixei que eles ouvissem e fiquei apenas olhando
ele cumprir a ordem de pegar a carteira e vasculhar os bolsos de Eillian.
_ Nada chefe, o cara tá a zero. Disse o sujeito de gorro ridículo a seu
chefe.
Os malandros então começaram a chutar ferozmente Eillian no chão que
nem conseguia se levantar.
Eu fiquei furiosa, além destes vagabundos roubarem as pessoas que
trabalham toda sua vida, ainda espancam ou matam se estes não têm nada.
Saltei de me u esconderijo e esmaguei o pescoço do que vestia o maldito
gorro bicolor e soltei-o sem vida enquanto o outro que estava ao seu lado me
atacou assustado com a surpresa que causei a eles e o medo saltando de seus
olhos ao ver que eu fiz com seu parceiro de trapaças e roubos. Ele tentou me
furar com um punhal de prata que provavelmente roubara em algum lugar ou
de alguma de suas vítimas pelas ruas.
Eu desviava e ria de seu desespero comum por não conseguir furar uma
indefesa garota até que me enchi do bale de desvios e segurei seu pulso com
minha mão esquerda e torci para cima até seu osso aparecer em uma fratura
exposta e ver o sangue jorrar. Em seguida peguei o punhal que estava caído ao
chão e varei seu olho direito até chegar ao cérebro para sua morte, quando senti
minhas costas sendo cortada por algo bem afiado.
Olhei para trás e vi o que era o líder segurando uma senhora faca em sua
mão, e a jogava de uma mão para a outra enquanto pela lâmina escorria um
pouco de meu sangue.
Fiquei furiosa com ele, e ele estava muito louco, devia Ter cheirado ou
tomado algumas drogas pesadas. No canto de sua boca escorria um fio de
saliva enquanto sua língua ia de um lado para o outro em sua boca aberta.
XLIX
Fiz um movimento muito rápido para os olhos dele, que quando
percebeu já estava com sua mão esquerda furada com o punhal cravado nela,
ele estava preso à parede com este golpe. Eu arranquei a faca e fiz o mesmo
com a outra mão, deixando-o crucificado na parede, de braços abertos e
berrando insanamente, mas eu tampei sua boca imunda com minhas mãos
gélidas e falei:
_ Agora vou fazer minha refeição.
Finquei meus dentes em seu pescoço de barba mal feita e bebi daquele
imundo sangue até a última gota.
Deixei o corpo pendurado na parede e voltei para Eillian que já estava
em pé guardando sua carteira no bolso de trás de sua calça jeans.
_ Nem sei como te agradecer meu doce sucubo noturno.
_ apenas me de um beijo. Eu falei e o beijei antes de qualquer reação, e
enchi sua boca com o sangue do marginal que eu acabara de me alimentar.
Ele me empurrou, virou-se de lado cambaleando e vomitou na rua
enquanto eu ria.
_ Você não quer ser um vampiro? Mas como se nem tem coragem de
provar o gosto do sangue alheio?
_ Eu não estava preparado!
_ Então beba agora! Mostrei minha língua pingando o sangue do
vagabundo, e Eillian tornou a vomitar e eu ri mais ainda.
_ Não estava preparado e nunca estará!
Ele voltou a olhar para mim, mas ele só ouviu uma risada ecoando no ar,
eu já havia desaparecido aos seus olhos que me procuravam assustados em vão.
Ele voltou à caminha meio cambaleando rumo a seu lar, e eu o segui
para certificar-me de que ele chegaria sem mais nenhum imprevisto a sua
espera.
Eillian chegou até uma velha casa, muito antiga, que mais se parecia
com um castelo em miniatura. Ele parou em frente a porta dupla de madeira da
frente e hesitou um pouco para abri-la e entrar, mas quando fez um gesto com
sua mão para alcançar a maçaneta, a porta se abriu e um velho vestido em um
manto negro apareceu para recebe-lo.
Era um mago muito antigo pelo que pude ver, sua barba cinza chegava
até a altura de seu peito, e seus cabelos brancos também com tons de cinza,
alcançavam os ombros. Em sua mão direita ele segurava uma espécie de cajado
que tinha entalhado em toda sua volta uma serpente e um dragão que iam se
enlaçando desde a ponta que estava no chão até a outra extremidade que
terminava com a cabeça da serpente voltada para baixo com a boca
escancarada mostrando suas presas que eram feitas de ouro, e os olhos eram
duas pedras vermelhas com um brilho meio enevoado por dentro, e a cabeça do
dragão voltada para cima também com os dentes expostos e os olhos com duas
pedras verdes com o mesmo brilho enevoado da serpente.
Eu li o pensamento de Eillian e descobri que o mago era um dos eternos
e seu nome era Lethichan.
L
Eillian começou a falar e se desculpar pelo seu estado, mas eu vi que o
mago estava com os olhos fixos em minha direção, ele não podia me ver como
eu o via com minha visão poderosa, mas ele sabia que eu estava lá.
Tentei ler seus pensamentos, mas ele os bloqueou para mim e enviou
uma mensagem para mim:
_ Não é o momento de nos conhecermos ainda, logo, muito em breve
conversaremos.
Eu queria ir até lá e saber quem ele era, o que fazia lá, mas o dia estava
nascendo e eu tinha que me recolher para meu descanso cadavérico, e foi o que
fiz, voltei para meu esconderijo tranqüila, pois eu vi nos olhos do velho que ele
era uma pessoa de boa índole, ele estava lá para ajudar Eillian e não para o
contrário.

LI
XXI – Uma Breve Visita

Na noite seguinte procurei Eillian para saber mais sobre Lethichan e o


que ele estava querendo.
Fui até a casa da noite anterior e esperei até que Eillian aparecesse.
Ele chegou em torno de meia hora após eu me fazer presente pelas
proximidades. Vi que ele estava despreocupado e até assobiava uma melodia
alegre entre seus lábios.
Apenas o chamei mentalmente com o poder telepático e ri quando
Eillian deu um salto para trás virando-se rapidamente em minha direção.
_ Quer me matar de susto?!
Eu apenas ri e fiz um sinal com minha mão direita para que ele viesse até
mim.
Fomos até um restaurante para que Eillian fizesse seu jantar enquanto
conversávamos um pouco até chegar as minhas perguntas.
_ O que Lethichan queria com você ontem?
_ Você o conhece? Ele perguntou assustado deixando cair o garfo de
prata de sua mão no prato de porcelana fina.
_ Não, apenas sei o nome dele.
Ele retomou o garfo em sua mão e com um guardanapo limpo o pouco
de comida que caiu em sua calça e tornou a falar.
_ Ele é um mago muito velho, diria até mesmo um ancião, ele conhece
Lugubrous há alguns séculos.
_ Ele conhece Lugubrous?! Fiquei espantada em saber que eles se
conheciam há alguns séculos. Ele sabe onde Lugubrous está?
_ Bem, Lethichan apenas disse que há umas duas semanas atrás eles se
encontraram em Londres, mas provavelmente Lugubrous já não esteja mais por
lá também.
_ E quanto a Lethichan, o que ele queria com você ontem?
Ele respirou fundo, limpou seus lábios com o guardanapo. O garçom que
nos atendia perguntou se podia retirar os pratos. Eillian fez um sinal
concordando e pediu um uísque.
_ Lembre-se da outra noite em que você andou bebendo um bocado.
Falei para ele me referindo a noite em que os marginais tentaram assaltá-lo e
eu impedi.
_ Perdoe, mas estou meio nervoso.
_ Eu sei, posso sentir isso, mas me conte o que aconteceu.
_ Lethichan veio me prevenir contra alguns magos que fazem parte da
irmandade obscura, tem propósitos extremamente malignos. Ele me disse que
há murmúrios sobre eu estar mantendo contato com um vampiro, e isso é
perigoso.
LII
_ Mas Lethichan não é amigo de Lugubrous e outros vampiros, qual o
problema por você também ser amigo de vampiros?
_ Lethichan e outros magos que tem contatos com vampiros não
pertencem a nenhum clã ou irmandade, ou o que quer que seja, ou se
pertencem a algum tipo de sociedade, é diferente da nossa, Lethichan é um
caminhante, ele vive sozinho como vocês vampiros, e eu fui me meter justo em
uma sociedade de magos e bruxos loucos por poder a qualquer custo, temo que
o preço seja muito alto por isso.
Ele deu uma pausa para beber um gole do uísque com gelo que o
garçom acabara de servir.
_ Continue. Eu pedi.
_ Ele me disse também que os murmúrios dentro da irmandade obscura,
cuja qual eu pertenço e quero sair, mas não sei como isso é possível sem
morrer, é que já sabem de nossos encontros casuais, e que estão preparando
alguma espécie de armadilha para poderem lhe capturar. Com certeza eu sou a
isca para esta armadilha, e isto não me agrada em nada, já quanto a você, eu
não sei o que dizer, apenas que corre um grande perigo.
_ Malditos! Fiquei triste em saber disto, mas o que me deixou furiosa foi
à revelação que Eillian me fez:
_ Você se lembra de Memento e Memoriant?
_ Sim, aqueles malfadados que Lugubrous destruiu.
_ Exato, o que você não sebe e o que Lugubrous descobriu
recentemente, segundo Lethichan me contou, é que ambos estavam atrás de
Lugubrous a mando da irmandade obscura.
A sensação que tive foi como se eu ainda tivesse um coração mortal
ainda pulsando dentro de mim e ele desse uma leve falhada em uma de suas
constantes batidas, então o ódio tomando conta dos pensamentos em seguidas.
Fiquei um breve momento em silêncio e tomei total controle sobre mim
mesma e minha raiva, tornando a falar com Eillian.
_ O.k., se Lugubrous já sabe disto eu não preciso sair a sua procura para
lhe contar, e estes safados da irmandade obscura não sabem com qual demônio
foram mexer. Quando eu me encontrar com Lugubrous novamente, quero ficar
junto a ele para ajudar, ou pelo menos para assistir a destruição de cada um
desses repugnantes desmerecedores de qualquer Dom ou poder.
_ E o que nós faremos enquanto isso?
_ Nada, vamos fazer de conta que nada sabemos sobre isso, vamos ver
como eles movimentarão as peças deste jogo até termos uma idéia geral dos
planos que eles tem em mente, ai nós agiremos fria e calculadamente.
_ E quando fizermos isto, provavelmente Lugubrous estará aqui para nos
ajudar.
_ Tomara que sim, ou seja, antes dele agir por conta própria, senão, não
sobrará nada para nossa diversão.
_ E pelo que sei, Lethichan vai estar ao lado de Lugubrous nesta batalha,
assim como a temida e antiga paixão de Lethichan; a bruxa Katrina.
LIII
_ Katrina? Mas que história é esta de bruxa?
_ Outra hora lhe contarei mais sobre Katrina, agora só para um rápido
esclarecimento, você deve saber que ela também já tem um século e meio ou
dois, não me lembro muito bem, e que ela e Lethichan tiveram um
relacionamento afetuoso muito grande no passado, e ainda ambos sentem um
carinho especial entre eles, embora não vivam mais juntos, como já falei,
Lethichan é um caminhante solitário, e Katrina também trilha seu próprio
caminho na solidão.
Saímos do restaurante e caminhamos um pouco juntos falando de
assuntos diversos para rirmos um pouco e nos distrairmos até que tive que me
despedir de Eillian para me recolher na escuridão acolhedora de meu solitário e
profundo sono diurno.

LIV
XII – Perseguição Noturna

Despertei sedenta por sangue no anoitecer seguinte. Eu não havia me


alimentado na noite anterior e era a primeira coisa que decidi fazer ao abrir os
olhos.
Uma garoa caia como sempre em São Paulo, conhecida como a cidade
da garoa.
Andei um pouco a esmo apenas observando as pessoas até encontrar
qual saciaria meu desejo sangüíneo.
Vigiei por entre algumas tábuas encostadas debaixo de um viaduto todo
pichado por gangues e cheio de panfletos colados em suas velhas e cinzentas
colunas de concreto, um homem bem vestido em um terno preto que acabava
de matar um velho com roupas esfarrapadas sem motivos, apenas pelo prazer
de matar.
Eu o segui pacientemente, após ele Ter deixado o corpo inerte e sem
vida caído ao chão úmido e mal cheiroso por causa de alguns indigentes terem
urinado naquele local. Então ele seguiu para o metrô.
Entrei pela porta do metrô com uma velocidade que me deixou invisível
aos seus olhos ao meu passar em sua frente, deixando-o apenas sentindo uma
leve brisa tocar seu rosto, e sentei-me em um banco onde ele não pudesse me
ver.
Saindo da estação, passamos por uma praça e finalmente e ele entrou em
um prédio velho e sujo, literalmente podre, caindo aos pedaços, um lugar que
estava interditado pela prefeitura e que seria demolido na semana seguinte.
Fiquei curiosa para saber o que ele iria fazer em um lugar daquele e
continuei na espreita apenas observando como um voyeur.
Alguns minutos e alguns degraus depois estava tudo esclarecido, ele
estava lá para comprar drogas. Ele começou a negociar a mercadoria e sem
motivos começaram a discutir, ele e os dois que estavam com uma maleta preta
e vestidos em ternos pretos iguais as dele, com a diferença de que o que eu
seguia tinha cabelos curto, e um cavanhaque, e os outros dois pareciam
gêmeos, ambos de cabeça raspada, sem barba e óculos escuro idênticos.
No meio da discussão, os dois carecas sacaram armas, mas antes de usá-
las, eu os matei quebrando o pescoço de ambos com minha velocidade e força.
Logo em seguida eu segurei firme em meus braços o homem que eu
seguia e bebi um pouco de seu sangue e o soltei.
Ele não conseguia nem gritar em falar nada com o medo e desespero
humano que sentia naquele momento. Fez uma tentativa de fuga correndo em
direção a mesma escada por onde veio, e antes de que chegasse até ela, eu
apareci repentinamente em sua frente com minha boca escancarada e os dentes
pingando o seu próprio sangue, deixando-o mais apavorado ainda.
LV
Instintivamente um chute vindo de sua perna direita me acertou o
queixo, coisa que me deixou irritadíssima, e eu apenas ri, ri muito de meu
descuido e olhei fixamente em seus olhos e falei:
_ Isso doeu um pouquinho, mamãe nunca falou que é coisa feia bater em
mulheres?
Saltei em sua direção e bebi mais um pouco de seu sangue e soltei-o
novamente.
O coitado começou a rastejar em direção aos dois corpos mortos que
ainda tinham os revólveres caídos em seus lados. Deixei que ele pegasse as
armas e apontasse para mim.
_ Vá para os quintos dos infernos!!! Gritou o infeliz puxando o gatilho
fazendo diversos disparos contra mim, ou melhor, somente parou de atirar após
as balas se esgotarem e mesmo assim ainda puxou o gatilho muitas vezes
deixando ouvir apenas o click seco de uma arma sem munição.
Eu cai no chão e vos digo, é uma dor miserável, mas eu estava adorando
tudo aquilo. Levantei-me com uma fome ainda maior, pois os tiros fizeram
com que eu perdesse bastante sangue, e fui em direção do homem que chorava
feito criança ao perceber que a morte iria abraçá-lo naquele momento.
Segurei-o firme por trás e puxei a mão de um dos corpos caídos ao chão
levantando-a até próximo dos olhos de minha vítima e comecei a arrancar os
dedos daquela mão começando pelo polegar dizendo:
_ Beber, não beber... Um a um até o quinto e último dedo. Beber...
Olhei para seus olhos que não tinham mais lágrimas, beijei-lhe os lábios
e a testa e cravei os dentes em seu pescoço bebendo e saboreando cada gota
que escorria por minha garganta enquanto eu sorvia vagarosamente o líquido.
Deixei o corpo cair junto aos outros e sai correndo do local, pois logo as
sirenes da polícia chegariam ao serem informados sobre os disparos feitos e
ecoaram até outros prédios pela rua.
Eu queria mais sangue, e logo eu vi uma linda Ruiva com os olhos tão
azuis quanto meu saudoso céu azul e diurno.
Fui em sua direção, isto já era em um outro canto da cidade e mais tarde
da noite. Vi seus lindos olhos me verem assustados quando me lembrei que
meu vestido estava todo furado e sujo com o sangue que escorreu dos buracos
feitos pelas balas.
Usei meu poder hipnótico para confundir seus pensamentos até que a
abracei e a conduzi para o hotel onde eu estava hospedada.
Entramos, tomamos um banho juntas e nos divertimos brincando em
uma grande cama no quarto principal. Eu não me cansava de beijar aqueles
lábios macios e de sentir a umidade em sua flor escondida entre suas lindas
pernas.
Levei-a até meu féretro, e ela não se assustou ao vê-lo. Abri a tampa e
convidei-a para entrar comigo lá dentro. Ela entrou e em seguida eu entrei.
Estávamos nuas e nos amando muito, o dia iria surgir em poucos minutos,
então eu beijei seus lábios e mordi sua língua começando a beber seu sangue
LVI
suculento, e ouvindo seus gemidos de prazer entre a morte, minha mão ia
fechando o esquife para que eu dormisse agarrada a aquela linda mulher que
morria em meus braços.
Acordei abraçada ao corpo que já tinha o cheiro da morte exalando no ar.
Limpei o sangue coagulado em minha boca e fiquei um pouco admirando
aqueles olhos que ainda estavam abertos com seu lindo azul, embora já
embaçado e sem vida, mas ainda eram lindos de se observar.
Livrei-me do corpo e fui a procura de Eillian.
Mais uma vez fui até a casa onde vi Lethichan conversar com Eillian, e
para minha surpresa quem atendeu a porta foi o próprio Lethichan.
_ Você?! Perguntei demonstrando minha surpresa.
_ Quem você esperava, Deus? Ele respondeu rindo depois continuou. O
que esta fazendo aqui, onde esta Eillian, ele não foi ao seu encontro de acordo
com seu bilhete?
_ Bilhete? Eu não mandei bilhete algum, que história é esta de encontro?
_ Então uma cilada foi armada, temos que ser rápidos, Eillian encontrou
um bilhete debaixo da porta que dizia para ele ir ao seu encontro, com certeza
foi alguém da irmandade obscura.
_ E para onde ele deveria ir de acordo com o bilhete?
_ Para o MASP, agora vamos.
Usei meu poder para voar o mais rápido possível, sem exageros é claro,
ainda não sei qual é meu limite, tenho medo de voar, é meio estranha a
sensação, nem sei explicar direito como é, parece que você vai subir cada vez
mais e não descer nunca mais.
Cheguei ao MASP e quando olhei ao meu lado, vi Lethichan.
Como ele chegou tão rápido? Perguntei a mim mesma em meus
pensamentos.
_ Da mesma forma que você, voando. Ele havia lido meus pensamentos
novamente e fiquei atenta bloqueando-os a partir de então.
_ E agora o que faremos?
_ Pelo que vejo vamos ter que seguir aquele carro ali. Lethichan apontou
para um carro preto onde dois homens empurravam Eillian para dentro.
_ Seguir nada. Saltei entre eles jogando um para o lado que caiu sentado
na calçada, e ao se levantar foi nocauteado pelo cajado de Lethichan, que o
acertou em cheio com uma pancada na cabeça.
Puxei Eillian para fora do carro que já saia cantando pneus, e ele rolou
pela calçada e se levantou dizendo que estava bem.
_ Esses loucos no volante provocam cada acidente. Comentou Lethichan
olhando para o carro que ziguezagueava entre outros pela avenida.
_ Que acidente? Perguntei.
_ Este. Ele respondeu fazendo um gesto com seu cajado como se
estivesse desenhando algum símbolo cabalista no ar, e em seguida, o carro
perdeu o controle e colidiu com um poste elétrico e explodindo em seguida.
_ O que eles queriam com você? Quis saber Lethichan.
LVII
_ Eles iriam me usar como isca para poder atrair Carminalla até uma
armadilha.
_ Malditos! Meu ódio por esta organização aumentava cada vez mais.
_ Tudo bem, vamos embora, por aqui nosso trabalho terminou, e já tem
muitos curiosos por perto. Lethichan disse isso se referindo às pessoas que
passavam por nós indo à direção ao carro acidentado logo mais a nossa frente.
Peguei o homem que estava se recuperando do golpe em sua cabeça e
levei-o comigo e comuniquei a Eillian para que fosse com Lethichan na frente,
pois eu iria para um lugar mais deserto saciar minha sede com o sangue
daquele idiota e depois os encontraria na casa.
Voltei até a casa onde Eillian e Lethichan me aguardavam e pela
primeira vez entrei nela.
Ambos estavam sentados no hall de entrada, confortáveis em poltronas
macias e com acabamentos finos e bem entalhados com formas diversas, como
dragões, serpentes, galhos de espinho, etc. Estavam conversando
despreocupadamente e bebendo vinho em taças de ouro incrustada por rubis,
esmeraldas e outras pedras que não consigo recordar agora.
_ Venha, sente-se conosco Pale. Convidou Lethichan mostrando uma
poltrona vazia entre os dois.
Sentei-me e senti o veludo cor de vinho com minhas pálidas, gélidas e
esguias mãos, que contrastava exuberantemente contra aquele assento antigo,
não tanto quanto eu, mas de uma época de bom gosto por móveis, ao contrário
de hoje em dia.
No hall também haviam lindos vitrais trabalhados tanto em formas
quanto em cores, mais ou menos como os de antigas catedrais.
Muitas cortinas de tecidos nobres esboçando riqueza, beleza e leveza
cobriam cantos e paredes num toque clássico a decoração do ambiente que
trazia muita sensação de paz e tranqüilidade.
No chão, um lindo tapete felpudo, alto que dava até vontade de ficar descalça e
sentir sua maciez e delicadeza com os pés nus.
Veio-me imagens na mente de estar amando Izabel ali, ambas nuas
enlaçadas em voluptuosidade.
Percebi que Lethichan estava espionado meus impuros pensamentos,
mas não me importei, apenas demonstrei um malicioso esboço de sorriso para
ele, que ficou meio sem graça diante de minha depravação.
Percebi que estava tocando uma música que eu não conhecia o criador da
obra e perguntei a Lethichan quem era.
_ É um dos maiores compositores do Brasil, nascido em uma cidade no
interior de São Paulo chamada Campinas, e falecido em Belém do Pará, se não
me falha a memória em 1896. Seu nome é Antonio Carlos Gomes, e esta ópera
que estamos ouvindo chama-se “À noite do castelo”, cuja qual foi sua primeira
ópera, que em 1861, após o final do espetáculo, D. Pedro II conferiu-lhe a
Ordem da Rosa.
Eu olhei para Eillian espantada com o resumo histórico apresentado por
LVIII
Lethichan.
- Não se assuste Pale. Disse Eillian. Lethichan conhece muito bem a
história de muitos países e dos “personagens” que fizeram parte destas
histórias.
_ E quando D. Pedro II conferiu a Ordem da Rosa a Carlos Gomes, eu
estava lá, embora ninguém pudesse perceber minha presença no local, afinal eu
sempre sou discreto ao observar fatos como este, por exemplo. Comentou
Lethichan. Mas antes de falarmos mais coisas sobre o Brasil, vou contar-lhes
um pouco sobre a Irmandade Obscura, mas só na próxima noite, pois como já
perceberam o dia está próximo e eu estou exausto.
Despedimos-nos e eu voltei ao meu quarto no hotel para meu merecido
sono acolhedor.

LIX
XXIII – Irmandade Obscura
Conforme havíamos marcado, após meu desjejum nos encontramos no
mesmo hall da noite anterior.
Conversamos um pouco sobre assuntos aleatórios sem importância até
Lethichan se acomodar bem na mesma poltrona da noite anterior, que parecia
ser sua preferida. Colocou sobre a mesinha de centro uma garrafa de vinho e
sua taça já cheia, com qual ele observava com olhos perdidos em pensamentos,
até que sua voz rompeu o silêncio.
_ Vamos então começar nossa “viagem ao tempo”. E então começou a
falar:

A Irmandade Obscura:
Voltando nossas vistas para a época das grandes aglomerações de seres
humanos, onde o fenômeno chamado civilização se tornava determinado na
Mesopotâmia e Egito, uma das coisas mais importantes em todas as cidades
eram os templos.
Nestes templos existia um santuário, onde comumente tinha uma grande
figura monstruosa, metade humana, metade animal.
Nestes templos, havia determinados números de sacerdotes ou
sacerdotisas e serventuários.
Em um destes templos, tinha um jovem aprendiz de magia, era um
templo dedicado a um Deus egípcio chamado Set, Deus da escuridão.
Este jovem chamava-se Radau. Seu mestre é desconhecido de nossos
arquivos, mas sabemos que quando Radau completou seus trinta e seis anos de
idade, ele se tornou muito poderoso, há especulações dizendo que ele matou
seu mestre e bebeu seu elixir da vida eterna, dizem também que ele ainda vive
e voltará a liderar a Irmandade Obscura algum dia, mas disso falaremos mais
tarde.
Voltando ao assunto, nesta mesma época em que ele provavelmente
praticou este crime, ele apareceu vestido em um manto negro no templo onde
era apenas um sacerdote, e disse que havia recebido ordens diretas do Deus Set
para construírem um templo para se unir os Deuses Set., Deus da escuridão,
Anúbis, conhecida como a terrível, e Osíris, Deus da morte.
Disse também que ele, Radau seria o líder deste templo e que deveria ser
feito o mais rápido possível.
Houve uma investigação e descoberta que Radau não só praticava
magia branca como também magia negra, e que seu templo era invenção sua
para finalidades de seus projetos mágicos insanos.
LX
Ele foi condenado à morte, mas antes que a lei fosse executada, ele
desapareceu da cidade.
Conformes relatos em nossos arquivos, ele reapareceu cento e quinze
anos mais tarde em outra cidade do Egito, mas com outro nome, Darau, ou
seja, apenas inverteu as consoantes de seu verdadeiro nome, mas na época, o
suficiente para não levantar suspeitas, ainda mais cento e quinze anos depois.
Lethichan parou um momento e tomou o último gole do vinho em sua
taça e a encheu novamente, para assim dar continuidade ao seu relato.
Darau então fundou uma seita secreta apenas com discípulos em magia,
e como ele havia proposto antes, em seu templo secreto, havia imagens de Set,
Anúbis, Tifão e Osíris.
O nome desta seita foi batizada como Irmandade Obscura, cuja qual
Eillian foi acabar se metendo.
Boatos espalhados pelo mundo afora dizem que Darau permanece vivo
em tempos atuais, e utilizando seu nome verdadeiro, Radau, e como nós
sabemos, podem-se utilizar muitos nomes diferentes em contas e outras coisas,
como você mesma faz para se proteger, Pale.
Eu concordei com um leve sorriso, pois é verdade, tenho muitas contas
bancárias pelo planeta inteiro, e agentes que cuidam delas para mim, e cada
um, assim como para cada conta, utilizo um nome diferente, e em muitos
casos, com o passar dos anos, sempre preparo papéis comprovando a morte da
“dona” da conta que deixa tudo para uma sobrinha ou algo parecido, toda
fortuna como herança, não pondo assim minha identidade real em risco.
Fui embora para meu repouso já que novamente o dia se aproximava.
Na noite seguinte, pressenti que havia algum vampiro muito poderoso na
cidade.
Bebi o sangue de um maltrapilho que tentou me cortar com uma
butterfly para roubar meu precioso colar que eu havia escolhido para aquela
noite.
Segui meu instinto até chegar em uma casa de shows onde estava
tocando uma banda de black-doom.
Fiquei surpresa e feliz ao ver que era Lugubrous que tocava e cantava
sua triste e ao mesmo tempo agressiva música, que explorava sentimentos
sublimes em nossa alma condenada, sentimentos de dor e ódio.
O show acabou e ele veio até mim.
Seus olhos mostravam sua tristeza, aflição e preocupação.
Saímos para caminhar pelos cantos escuros e contarmos nossas andanças
pelo mundo, até que Lugubrous começou a falar sobre a Irmandade Obscura.
Ele havia vindo até o Brasil para desvendar e destruir de uma vez por
todas esta organização e seu líder Radau.
_ Mas ele realmente está vivo? Perguntei.
_ Estava, minha linda Pale. Então vi que sua expressão mudara para um
semblante ainda mais triste ainda.
_ E o que o atormenta tanto assim, não posso suportar todo este
LXI
sofrimento que emana de você. Eu queria chorar junto a ele.
_ Meu tormento é somente meu, não chores por mim. Ele suspirou
profundamente e continuou. Chegando aqui em São Paulo no final da
madrugada anterior, descobri algo que me deixou totalmente desorientado.
Ele olhou para o céu semi nublado com algumas estrelas brilhando e
voltou a falar:
_ Senti um poder muito forte por perto, pensei que fosse Radau, e ao
chegar ao local onde tal força era o centro, fiquei chocado ao ver que Radau
realmente estava lá, mas morto, alias, consegui ver seu último suspiro antes
que ele desencarnasse.
_ Como? Agora eu estou ficando confusa.
_ Um ancião Carminalla, um ancião muito poderoso tinha acabado de
arrancar o coração de Radau e terminava de sugá-lo. Ele então olhou para mim
em um sorriso perverso e ao mesmo tempo emanando amor por mim. Ele ateou
fogo no corpo exangue apenas com um estalar de dedos, jogou o coração
murcho sobre o fogo e virou-se para mim dizendo:
_ Boa noite meu amado filho, esta Irmandade não lhe fará mais sofrer,
este era o criador de toda esta ordem desgraçada, e também o último, pois eu
matei todos os outros por você. Eu sempre estive lhe observando desde meu
despertar de um profundo sono e jejum pelo sangue, eu te amo, sempre amei,
talvez não se lembre, mas sou teu criador, lembra-se da floresta? Meu sangue
corre em tuas veias, mas hoje não temos tempo, quem sabe em breve?
_ Eu cai de joelhos ao chão sem saber o que fazer, não sabia se corria
atrás do vulto daquele ser que sumia com sua velocidade vampírica ou se
chorava. Meu passado correu em frente aos meus olhos em segundos em uma
visão aterradora, imagine séculos passar em segundos em sua visão, lembrei-
me de minha transformação naquela floresta úmida e muitas coisa mais. A
única coisa que consegui fazer foi gritar perguntando seu nome.
_ “Memalon”. Sua voz soou este nome em minha mente ‘num sussurro
excitante, enquanto o sol ia libertando seus primeiros raios que brilhavam no
horizonte distante.
_ Corri para meu refúgio com meu novo tormento em mente, mas
felizmente logo o dia se fez presente e meu sono se fez supremo.
_ Acordei hoje com milhões de perguntas em minha cabeça, mas eu
tinha que cumprir este show para com os mortais, e não podia deixar meus
problemas interferirem, nem deixar alguma dúvida em suas mentes, para que
viessem a desconfiar que realmente sou um vampiro.
_ E aqui estamos nós. Falei com um sorriso inocente, puro e sincero.
_ Sim, aqui estamos nós, nosso lindo reencontro.
_ Mas você vai partir hoje, não é mesmo, eu sinto isso em tuas palavras.
_ É preciso, agora tenho que saber onde procurar Memalon, preciso
saber por que ele me escolheu, para trazer ao mundo dos não mortos.
_ Mas fique comigo esta noite, me ame mais uma vez.
_ Eu iria fazer este mesmo pedido a você.
LXII
Uma limusine chegou para nos pegar após Lugubrous ligar de um
telefone público, pois ele odeia celular e coisas do gênero.
O grande carro negro de vidros escuros ficou vagando a esmo por toda
cidade enquanto nosso deleite era consumado na parte de trás do carro.
Lugubrous era e ainda é meu mais querido amante, sombrio, triste e
voluptuosamente se entrega por inteiro em nossa paixão vampírica.
Nossas lágrimas selaram nosso longo beijo na despedida no aeroporto
onde ele estava partindo para algum lugar na Escócia, onde um de seus
contatos sabia algo sobre Memalon.
Sabíamos que logo nossos caminhos se cruzariam novamente como
sempre, e teríamos mais tempo juntos em nosso amor.

LXIII
XXIV – Reencontro

Eu não queria mais ficar nesta cidade, eu precisava viajar e pensar um


pouco no que eu faria a partir deste momento, alguns anos mais tarde eu
voltaria para cá, pois pode parecer estranho, mas eu gosto muito desta cidade.
Fui para Nova Zelândia, depois para Irlanda, passei por muitos países até
que me encontrei com Darkrishnevil no Canadá, conversamos e caçamos
juntos por umas duas semanas e continuei minhas viagens.
Eu sentia muita falta de Lugubrous, mas eu ansiava mesmo era por
encontrar Izabel, minha linda amada ruiva dos olhos tristes e selvagens.
Eu estava no Japão, queria conhecer o monte Fuji. Estava no topo em
uma noite fria onde uma imensa melancolia me enchia por completo.
Minhas lágrimas de sangue afloraram ao ver os cabelos de fogo vindo
silenciosamente em minha direção como uma cena de filmes de terror aonde
um sucubu vem ao encontro de sua vítima sensualmente em vestes
transparentes sopradas pelo vento.
Não tínhamos palavras, só lágrimas e amor nos envolviam.
Nos abraçamos e nos beijamos como se fosse nossa última noite juntas.
Não conseguíamos nos separar. Senti o seu cheiro particular enchendo
minhas narinas enquanto eu mordia e bebia o sangue em seu pescoço.
Ela fez o mesmo comigo enquanto seus dedos brincavam com meus
seios já nus, ao mesmo tempo em que os meus dançavam em sua flor que
exalava mais ainda seu cheiro atraente.
Amamos-nos ali mesmo, em nossa erupção de amor na boca de um
vulcão coberto por neves.
Nossos beijos e nosso sangue se encontrando profundamente como se
fosse o único motivo de nossas existências.
Está amos juntas novamente, e novos conhecimentos e aventuras ainda
nos aguardavam.
Mas a única coisa que eu queria dizer era...

I
... ZABEL...

LXIV

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