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Curso de

Hemoparasitoses
em Medicina Veterinária

MÓDULO III

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descritos na Bibliografia Consultada.
MÓDULO III

HEMOPARASITOSES CAUSADAS POR PROTOZOÁRIOS DAS FAMÍLIAS


BABESIIDAE, THEILERIIDAE E HEPATOZOIIDAE

INTRODUÇÃO

Outros protozoários, além daqueles que pertencem à família


Trypanosomatidae, também são hemoparasitos de animais domésticos. Estes
protozoários pertencem ao filo Apicomplexa, ordens Piroplasmida e Eucoccidiida.
De modo geral, os piroplasmidas são protozoários que não produzem
esporos, não têm flagelos, cílios nem formam pseudópodes, pois se locomovem por
flexão ou deslizamento. Eles se reproduzem por divisão binária simples ou por
esquizogonia (quando a célula-mãe realiza mitose e as células-filhas são resultados
da divisão completa da célula-mãe) no interior de células do hospedeiro vertebrado.
Na ordem Piroplasmida existem duas famílias, ambas causadoras de
hemoparasitoses:
• Família Babesiidae: compreende as diversas espécies de
Babesia;
• Família Theileriidae: compreende os gêneros Theileria e
Citauxzoon.
Também há um protozoário chamado Rangelia vitalli, que é descrito como
piroplasmida, mas ainda não está classificado adequadamente.
Na ordem Eucoccidia há a Família Hepatozoiidae, que compreende o gênero
Hepatozoon. Protozoários deste gênero possuem corpo alongado, cerca de duas
vezes mais longo do que largo, com citoplasma homogêneo ou discretamente
granular e núcleo grande e oval.

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1 Babesioses

As babesioses também chamadas de piroplasmose, nutaliose, entre outros


nomes, acometem praticamente todos os animais domésticos. Elas são doenças
causadas por diversos gêneros de Babesia (Tab. 1). Atualmente há cerca de 25
espécies registradas destes protozoários em hospedeiros vertebrados. As babesias
são cosmopolitas, espécie-específicas, transmitidas por carrapatos, encontradas no
interior dos eritrócitos, estruturalmente semelhantes, e apesar de variarem quanto à
virulência seus efeitos nos hospedeiros são muito semelhantes.

TABELA 1. Hospedeiros definitivos e espécies de babesias que os parasitam.


Hospedeiros Espécies de Babesia
Definitivos
Bovinos B. bigemina, B. bovis, B. divergens, B.
major
Eqüídeos B. equi, B. caballi
Canídeos B. canis, B. vogeli, B. gibsoni
Felídeos B. felis, B. cati, B. pantherae, B. leo, B.
herpailuri
Ovinos B. motasi, B. foliata, B. taylori
Suínos B. trautmani, B. perroncitoi

As estruturas presentes nas hemácias dos vertebrados são chamadas de


trofozoítos. Os trofozoítos são piriformes (piroplasma, em forma de pêra), redondos
ou ovais, e devido à divisão binária simples, geralmente aparecem em pares unidos
pela extremidade mais afilada (Fig. 1). Nos invertebrados, as babesias aparecem em
formas arredondadas, e se multiplicam por esquizogonia em diversos tecidos do
carrapato, conforme a adaptação da babesia ao ciclo de seu vetor.

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FIGURA 1. Babesia sp. no interior de eritrócito, observar a forma piriforme com o par unido
pela extremidade mais afilada (Foto cedida pela M.V. Mestre Thatianna Camillo Pedroso).

De acordo com seu tamanho, as babesias são distribuídas em dois grupos,


as grandes babesias com mais de 3 μm (2,5 a 5,0 μm) e as pequenas com menos
de 3 μm (1,0 a 2,5 μm). No Brasil, as grandes babesias de importância para os
animais domésticos são Babesia bigemina (bovinos), Babesia caballi (eqüinos) e
Babesia canis (caninos), estas são geralmente mais sensíveis aos quimioterápicos
do que as pequenas. As pequenas, também de importância, incluem Babesia bovis
(bovinos) e Babesia equi (eqüinos).
Outra característica que diferencia as babesias, além do tamanho, é sua
localização no organismo do vertebrado. Algumas preferem se manter no sangue
periférico, por isso estão relacionadas a altas parasitemias, e outras são chamadas
viscerotrópicas porque podem causar doença sem alta parasitemia e os animais
podem até morrer pela formação de um trombo cerebral, por exemplo, sem que
ocorra anemia. Entre as babesias periféricas estão B. bigemina e B. equi, e entre as
viscerotrópicas estão B. bovis, B. caballi e B. canis.

1.1Ciclo de vida

As babesias são transmitidas aos hospedeiros vertebrados pela picada do


carrapato durante seu repasto sanguíneo. No vertebrado, estes hemoparasitos
invadem os eritrócitos, transformam-se em trofozoítos e iniciam a multiplicação por
divisão binária simples ou esquizogonia.

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Inicialmente os trofozoítos encontram-se unidos, e posteriormente, se
separam, rompendo o eritrócito e partindo para invasão de outros. B. equi ao invés
de pares, geralmente forma tétrades, e no caso de B. canis podem ser encontrados
inúmeros trofozoítos no interior da mesma hemácia. Este processo multiplicação-
invasão pode continuar indefinidamente durante toda a vida do animal.
No carrapato, o ciclo de vida acontece de duas formas, que dependem da
espécie de babesia e da espécie do carrapato, sendo que estes podem albergar
simultaneamente mais de uma espécie de Babesia. Nos carrapatos monoxenos
(Boophilus microplus, Dermacentor nitens), que desenvolvem todo seu ciclo em
apenas um hospedeiro, há um tipo de desenvolvimento, e nos heteroxenos
(Amblyomma sp. e Rhipicephalus sanguineus), que utilizam mais de um hospedeiro
para fechar o ciclo, há outro.
O ciclo nos monoxenos ocorre da seguinte forma: as babesias ingeridas
pelos carrapatos penetram e se multiplicam nas células epiteliais do intestino, ali
caem na hemocele, penetram os túbulos de Malpighi, nos ovários, e invadem os
oócitos infectando os ovos. Nas larvas infectadas, as babesias se desenvolvem na
hemocele ainda dentro do ovo, e posteriormente nos estádios de ninfa e adulto do
carrapato migram para as glândulas salivares, onde continuam se multiplicando e
são transmitidas aos hospedeiros definitivos. Assim, no ciclo dos monoxenos, a
transmissão é transovariana, ou seja, de geração a geração.
Nos heteroxenos, a transmissão é transestadial, isto é, de estádio a estádio
do ciclo do carrapato. Se a ingestão de babesias ocorrer na fase de larva, as ninfas
é que farão a transmissão para o animal, ou se a ingestão ocorrer na fase de ninfa, a
fase adulta é que será a transmissora. A multiplicação das babesias nos vetores
heteroxenos ocorre na hemocele, onde se reproduzem por divisão múltipla formando
pseudocistos que podem abrigar até 200 microrganismos. Posteriormente, os
pseudocistos se rompem e há invasão dos músculos do carrapato que permanecem
inalterados até a próxima metamorfose, quando as babesias migram para as
glândulas salivares. Nas glândulas salivares, elas continuam suas multiplicações por
divisão binária, e aguardam serem inoculadas nos hospedeiros definitivos.

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1.1 Resposta Imunológica e Patogenia

A resposta imunológica contra as babesias se divide em celular e humoral. A


imunidade humoral tem importância restrita, pois os anticorpos produzidos só
conseguem agir sobre os parasitos livres e não contra os intraeritrocitários. Além
disso, não há proteção duradoura, o animal imune que perde o contato com a
babesia por mais de oito meses volta a se tornar suscetível. Também não ocorre
proteção cruzada entre as diferentes espécies de Babesia.
Na imunidade celular, o baço age como órgão mais importante contra as
babesioses. Os linfócitos B, T, células natural killer (NK) e macrófagos participam da
defesa, mas não há evidências de que atuem diretamente na lise de parasitos livres
ou dentro de eritrócitos. A imunidade celular age por intermédio de citocinas que
causam a degeneração da babesia.
A patogenia das babesioses inclui a fase de invasão, multiplicação e
rompimento das hemácias, que leva à anemia hemolítica e provoca febre. A
liberação de hemoglobina em excesso não consegue ser metabolizada
adequadamente, então há deposição de bilirrubina nos tecidos produzindo icterícia e
eliminação pela urina resultando em hemoglobinúria. Estes fatores em conjunto,
produzem metabólitos tóxicos e anoxia. A morte pode ocorrer por anemia
superaguda, ou por obstrução de capilares do cérebro, ou de órgãos viscerais
importantes com trombos formados pelas hemácias parasitadas, os próprios
parasitos e outros detritos celulares.
Alguns fatores interferem na gravidade da patogenia da babesiose, são eles:
• Idade do hospedeiro: animais mais velhos são geralmente
mais suscetíveis do que os jovens. Os animais jovens têm resistência
natural devido aos anticorpos colostrais e a persistência do timo, e ainda
há o fato de a hemoglobina fetal ser mais resistente; assim os quadros
clínicos são de menor intensidade com anemia branda e parasitemia
breve;
• Raça do animal: raças bovinas européias são menos
resistentes imunologicamente às infestações por carrapatos e são

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também mais suscetíveis à infecção por B. bovis, B. bigemina e A.
marginale; o fator racial não é observado em cães;
• Estado nutricional: animais nutridos adequadamente são
mais resistentes do que aqueles com carências nutricionais;
• Estado imunológico: animais imunodeprimidos ou que não
apresentaram re-infecção pelo período de oito meses após a primeira
infecção são mais suscetíveis, enquanto aqueles que apresentam
recidiva no intervalo de oito meses restabelecem gradualmente a
imunidade;
• Virulência do agente: pequenas babesias são
consideradas mais patogênicas que as grandes babesias, o tratamento
contra pequenas babesias também é mais complicado, pois é difícil
eliminá-las;
• Associação a outros patógenos: especialmente se a co-
infecção for causada por outro hemoparasito, o que em geral agrava a
patogenia e o quadro clínico do animal.
Estes fatores pedem maior atenção a animais que vivem em regiões onde os
carrapatos apresentam sazonalidade, como na Região Sul do país, favorecendo a
ocorrência de surtos de babesiose nos períodos mais quentes e úmidos do ano.
Bovinos que vivem em propriedades com controle intensivo de carrapatos e
bezerros nascidos confinados, transferidos para o pasto quando a imunidade
passiva transmitida pelo colostro está declinando também são mais suscetíveis a
surtos de babesiose, pois não tiveram exposição prévia ao agente. A exposição é
desejável, mas de forma controlada, para que o animal possa desenvolver
imunidade sem desenvolver a doença clínica.

1.2 Bovinos

Os principais agentes da babesiose em nosso país são Babesia bovis (Fig.


2) e Babesia bigemina (Fig. 3), ambas transmitidas pelo carrapato monoxeno
Boophilus microplus. A transmissão transplacentária é considerada rara, mas

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existem relatos, pois a gestação é uma fase imunossupressora, que favorece a
reativação da infecção latente.
Nos bovinos, a babesiose também é conhecida por tristeza parasitária, febre
esplênica, malária bovina, febre do Texas ou água vermelha. As co-infecções
principalmente com Anaplasma marginale são bastante comuns.

FIGURA 2. Babesia bovis em esfregaço sanguíneo periférico de bovino (Disponível em


http://www.cnpgc.embrapa.br/publicacoes/doc/doc131, 07/05/2008).

FIGURA 3. Babesia bigemina em esfregaço sanguíneo periférico de bovino (Madeira, 2007).

A babesiose bovina tem um período pré-patente de oito a quinze dias. A


infecção causada por B. bigemina se apresenta de duas formas, a aguda e a
crônica. Na forma aguda, os sinais observados incluem febre de 40 a 41,5ºC,
icterícia, anorexia, edema. As alterações laboratoriais mais freqüentes na fase aguda
são: anemia severa, hemoglobinúria e acidose metabólica. Esta forma possui

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evolução rápida para a morte, cerca de dez dias; a taxa de mortalidade em animais
não tratados varia de 50 a 90%. Na forma crônica, o período pré-patente leva de
dois a seis meses e o único sinal observado pode ser um emagrecimento crônico e
progressivo, acompanhado de anemia.
Na infecção por B. bovis, ocorre a formação de trombos (viscerotropismo)
especialmente no cérebro, fígado e baço, com baixa parasitemia, sendo esta, muitas
vezes não detectável. Ocorrem também sintomas como diarréia, aborto, sinais
neurológicos, alterações de comportamento com agressividade ou apatia extremas,
paresia e convulsões. Distúrbios da coagulação também já foram descritos.
No Brasil, a babesiose bovina é considerada uma doença endêmica, que
causa grandes prejuízos econômicos. Estima-se que as perdas anuais da babesiose
bovina em associação ao carrapato B. microplus fiquem em torno de um bilhão de
dólares no país. Estes prejuízos econômicos para a bovinocultura são observados
sob as formas de mortalidade, gastos com medicações, diminuição na produção de
carne e leite, diminuição do ritmo de crescimento dos bezerros e gastos com
vacinações ou premunição.
Assim, estudos epidemiológicos da babesiose bovina em uma determinada
área podem prever a possibilidade da ocorrência ou não de surtos e diminuir as
perdas econômicas. Esta possibilidade é avaliada segundo a situação
epidemiológica que pode ser classificada em três tipos: estabilidade enzoótica,
instabilidade enzoótica e situação de área marginal. Uma área é considerada estável
enzooticamente quando a soroprevalência encontrada tanto de B. bovis quanto de
B. bigemina é maior do que 80%. Áreas em que a soroprevalência fica entre 75 e
80% são classificadas como áreas marginais, e aquelas com soroprevalência menor
que 75% são consideradas instáveis e sujeitas a surtos.

1.3 Equinos

A babesiose eqüina é uma hemoparasitose importante, mundialmente


distribuída, também conhecida por nutaliose ou piroplasmose eqüina. Esta
hemoparasitose é considerada o principal impedimento para o trânsito internacional

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de cavalos, pois países como Japão, Canadá, EUA e Austrália, que possuem uma
indústria eqüina muito forte, já são livres de Babesia, e animais positivos são
terminantemente proibidos de entrarem nesses países, seja para exportação ou
apenas competição.
Isso faz com que o Brasil sofra restrições para exportações de cavalos,
apesar da qualidade do plantel, pois aqui a infecção é considerada endêmica em
todo o território nacional. Diante disso, a importância da babesiose eqüina não se
reserva apenas aos danos individuais causados, mas a todo o plantel e às perdas
econômicas geradas aos criadores. Os agentes causadores da babesiose eqüina no
Brasil, freqüentemente encontrados concomitantemente, são Babesia caballi (Fig. 4)
e Babesia equi.

FIGURA 4. B. caballi no interior de eritrócito de eqüino (Edwards et al., 2008).

Atualmente a B. equi foi renomeada para Theileria equi (2004). Descobriu


que B. equi faz seu desenvolvimento primário no interior dos linfócitos formando
macro e microesquizontes. Os microesquizontes desenvolvem micromerozoítos que
são liberados na corrente sanguínea e invadem os eritrócitos, onde se multiplicam
em tétrades, apresentando a forma característica deste hematozoário, chamada de
Cruz de Malta (Fig. 5). As diferenças morfológicas e de capacidade de multiplicação
no interior de leucócitos não são as únicas que distinguem B. equi das demais
babesias, também há diferenças quanto às propriedades bioquímicas e na
seqüência genética.
Todas essas diferenças fizeram com B. equi fosse considerada uma
Theileria e renomeada como T. equi (como denominaremos a partir de agora),

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porém ainda existem discordâncias entre pesquisadores. De modo geral concorda-
se que B. equi não seja uma babesia verdadeira, mas alguns pesquisadores
discordam que se trate de uma Theileria, o que sugeriria um novo gênero para B.
equi.

FIGURA 5. Merozoítos de T. equi no interior de eritrócito eqüino. Observe a forma


característica de Cruz de Malta (seta) (Edwards et al., 2008).

A parasitemia provocada por B. caballi é geralmente baixa, com menos de


1% dos eritrócitos infectados. Seu período de incubação varia de 10 a 30 dias e os
sinais clínicos tendem a ser mais brandos, por menor patogenicidade. Os cavalos
sem tratamento se mantêm podem se manter portadores por um a três anos. O
carrapato Dermacentor nitens é considerado seu principal vetor.
Já T. equi causa infecções persistentes, que podem perdurar por toda a vida
do animal. Seu período de incubação é de 12 a 19 dias. No Brasil, o carrapato
Boophilus microplus é considerado o hospedeiro intermediário mais importante deste
parasito. Talvez por isso, altas incidências têm sido associadas com a criação
conjunta de bovinos e equinos. Além da transmissão através de vetor, já foi descrita
a transmissão transplacentária de T. equi, com uma porcentagem de infecção de até
30% dos potros.
Clinicamente, na babesiose eqüina, pode haver quadros agudos,
subagudos, crônicos e os portadores assintomáticos. Na doença aguda, o animal
apresenta prostração, perda de apetite, febre, mucosas pálidas, icterícia e
gastroenterite, nem sempre ocorre hemoglobinúria. Pode ocorrer taquipnéia,
constipação, edema de membros e petéquias nas mucosas oral, nasal e ocular. Nas

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infecções causadas por B. caballi, ocasionalmente há paresia do trem posterior.
Animais que vem a óbito dificilmente morrem em decorrência da anemia, e sim pela
formação de microtrombos, assim como ocorre com os bovinos; a não ser em casos
onde a parasitemia é bastante elevada e ocorre anemia aguda.
Nos quadros subclínicos, os sinais são os mesmos, mas se apresentam de
modo mais leve ou intermitente, há diminuição do desempenho dos animais de
competição e comprometimento do potencial atlético do cavalo. Os cavalos
cronicamente infectados são os mais comuns e apresentam sinais inespecíficos;
nestes, e nos portadores assintomáticos, situações de estresse ou doenças
intercorrentes podem reverter a doença para a forma aguda.
As alterações laboratoriais de eqüinos com babesiose incluem anemia
hemolítica acompanhada de hiperbilirrubinemia e conseqüente hemoglobinúria.
Monocitose e eosinopenia são consideradas alterações significativas. Sinais de
coagulopatia são freqüentes nas infecções severas. Também já foi descrita
hipofosfatemia.

1.4 Caninos

Babesia canis e Babesia gibsoni são as principais causadoras da babesiose


canina. Há três subtipos de B. canis: B. canis canis, B. canis vogeli e B. canis rossi;
estas subespécies são idênticas morfologicamente, mas possuem diferenças quanto
aos vetores e a patogenicidade. No Brasil ainda existem poucos estudos sobre a
caracterização genética da B. canis local, mas um estudo realizado com amostras do
Rio de Janeiro indicou que neste estado ocorre a subespécie B. canis vogeli.
Esta babesia é considerada grande, e se apresenta nas formas piriforme,
redonda, oval ou até amebóide dentro dos eritrócitos (Fig. 6). Rhipicephalus
sanguineus é seu hospedeiro invertebrado mais comum. As outras subespécies de
B. canis utilizam outros carrapatos como vetores, entre eles Dermacentor, Hyaloma
e Haemaphysalis. Nos cães a doença também é chamada de nambiuvú e peste de
sangrar.

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FIGURA 6. Babesia canis no interior de eritrócitos caninos, observar forma amebóide e
piriforme (Foto cedida pela M.V. Mestre Thatianna Camillo Pedroso).

A patogenia da babesiose canina envolve mecanismos que levam a


hemólise intravascular e também hemólise extravascular. A hemólise intravascular
se deve ao rompimento das hemácias após multiplicação das babesias em seu
interior, e também pela ação do sistema complemento nas células parasitadas. O
outro mecanismo produz destruição citotóxica mediada por anticorpos que agem
contra os componentes das membranas dos eritrócitos, estejam eles infectados ou
não. Este mecanismo leva à hemólise extravascular, pois os eritrócitos marcados
com anticorpos são destruídos por macrófagos no fígado e no baço.
A doença pode estar presente na forma hiperaguda, aguda, crônica ou
subclínica. Os sinais clínicos observados incluem febre, anorexia, depressão,
oligúria, hemoglobinúria, vômito, letargia, desidratação, icterícia, mucosas pálidas,
dispnéia, esplenomegalia, dor abdominal e sensibilidade renal à palpação. O período
pré-patente geralmente é de 10 a 20 dias. Pode ocorrer choque endotóxico,
alterações da coagulação e até mesmo babesiose cerebral.
As alterações hematológicas observadas são anemia normocítica
normocrômica regenerativa ou arregenerativa, trombocitopenia com presença de
macroplaquetas, neutropenia com desvio à esquerda e linfocitose ou linfopenia,
raramente ocorre neutrofilia. Os monócitos geralmente se apresentam dentro do
intervalo de referência, diferentemente do que ocorre com Ehrlichia canis, quando
geralmente há monocitose. As alterações morfológicas freqüentemente observadas
nos eritrócitos são anisocitose, poiquilocitose, policromasia (policromatofilia),

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hipocromia e eritroblastose. A eritroblastose é caracterizada pela presença de 2 a
11 eritroblastos a cada cem leucócitos examinados.

1.6 Felinos

A babesiose felina tem sido descrita esporadicamente em países da Europa,


África e Ásia com exceção da África do Sul, onde tem sido descrita regularmente. No
Brasil poucos relatos já foram descritos. Novas espécies de Babesia têm sido
descritas desde o surgimento das técnicas moleculares, entre elas espécies que
acometem os felídeos (Tab. 1).
As espécies B. herpailuri e B. pantherae são grandes babesias que
acometem naturalmente felinos selvagens na África e experimentalmente felinos
domésticos. As babesias identificadas como causadoras de infecções naturais nos
gatos são B. felis e B. leo na África, B. cati na Índia, B. canis canis na Espanha e
Portugal, B. microti-like em Portugal e B. canis presentii em Israel. Entre todas estas,
B. felis é considerada a mais freqüente. Ela é considerada uma pequena babesia,
altamente patogênica, que usualmente ocorre em gatos com menos de três anos de
idade sem predileção de sexo ou raça.
Como descrito, as babesioses são doenças transmitidas por carrapatos, por
isso considera-se que o mesmo aconteça com a babesiose felina, no entanto, seu
vetor ainda não foi identificado. O mesmo ocorre com a patogênese, que se supõe
ser semelhante ao que ocorre com as demais espécies, mas ainda exige maiores
esclarecimentos.
Nos gatos, a babesiose geralmente se apresenta como uma doença crônica.
Os sinais clínicos mais comuns são anorexia, letargia, fraqueza e pêlos ásperos.
Febre e icterícia são consideradas incomuns nos gatos, sendo que nos casos em
que foi observada febre, sempre havia uma doença concomitante. As complicações
da babesiose felina incluem falência renal, edema pulmonar, hepatopatia e sinais
neurológicos. As principais co-infecções observadas ocorreram com Mycoplasma
haemofelis (= Haemobartonella felis), FIV e FeLV.
As alterações laboratoriais da babesiose nos gatos incluem anemia
macrocítica hipocrômica regenerativa com alterações morfológicas de

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policromatofilia, corpúsculos de Howell-Jolly, eritroblastos e anisocitose (Fig. 7).
Pode ocorrer eritrofagocitose e trombocitopenia. Geralmente não são observadas
alterações nas contagens de leucócitos. Outras alterações incluem aumento dos
níveis séricos da ALT, bilirrubina total e hipergamaglobulinemia devido à gamopatia
policlonal.

FIGURA 7. Indicativos de anemia regenerativa na babesiose felina: policromatofilia,


anisocitose e corpúsculos de Howell-Jolly (setas) (Bishop et al., 2008).

1.7 Diagnóstico e Prognóstico

Os métodos diagnósticos utilizados para babesiose podem ser divididos em


diretos e indiretos. Os métodos diretos incluem o esfregaço sanguíneo periférico,
necropsia e a PCR, enquanto os métodos indiretos incluem os testes sorológicos.
O exame microscópico de esfregaços sanguíneos corados pelos métodos de
Panótico ou Giemsa é um método prático e bastante útil rotineiramente, apesar da
baixa sensibilidade. Contudo, a sensibilidade é geralmente maior na fase aguda, por
isso se torna mais fácil localizar o parasito quando o sangue é coletado durante os
picos febris do animal, que tem estreita relação com a parasitemia. O esfregaço
sanguíneo também é adequado a animais jovens, especialmente no caso dos cães,
devido à imaturidade do sistema imunológico, e a possibilidade de resultados falso-
positivos em testes sorológicos devido à presença de anticorpos maternos.
Na necropsia, as alterações cadavéricas das babesioses nas diferentes
espécies de animais domésticos são muito semelhantes, mas possuem ligeiras

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diferenças. Nos bovinos, as alterações observadas são hepatoesplenomegalia,
fígado de coloração amarelada, vesícula biliar com bílis espessa, rins cianóticos,
mucosas do abomaso e intestino com edema, icterícia e petéquias; tecido conjuntivo
intramuscular edemaciado e ictérico, gordura amarelada e gelatinosa, e sangue de
aspecto aquoso.
Nos equinos, a necropsia revela carcaça anêmica, ictérica, edematosa (Fig.
8). Há acúmulo de fluidos no pericárdio e peritônio, hepatoesplenomegalia,
estômago e intestino hemorrágico. Nos equinos, os diagnósticos diferenciais são
importantes, entre eles anemia infecciosa (A.I.E.), não qual não ocorre icterícia e
hemoglobinúria, e erlichiose equina.

FIGURA 8. Carcaça e órgãos ictéricos de potro com infecção experimental de T. equi (Nizoli, 2005).

À necropsia dos cães observa-se hepatoesplenomegalia, coração pálido e


amarelado, rins amarelados, músculos pálidos e ictéricos, intestinos e brônquios
hemorrágicos. Também ocorre acúmulo de líquido na pleura, pericárdio e peritônio.
As amostras de tecidos coletadas durante a necropsia podem ser fixadas em
formol e utilizadas para confecção de cortes histopatológicos corados pelo método
de HE (hematoxilina-eosina), ou podem ainda ser feitos decalques dos tecidos, que
serão corados com Giemsa para pesquisa direta do parasito. Esta última técnica é
interessante quando aplicada a fragmentos do cérebro a fim de constatar babesiose
cerebral.
Os métodos moleculares representam avanços no diagnóstico da babesiose,
assim como para as demais hemoparasitoses. A PCR se mostra bastante útil,

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especialmente por ser capaz de identificar animais portadores assintomáticos e
possibilitar a diferenciação entre espécies de Babesia e possíveis infecções
concomitantes. Amostras de sangue são as mais utilizadas para PCR. A
determinação exata do agente causador, possibilitada pela PCR, pode ser
determinante no tratamento do animal, especialmente em eqüinos, pois a T. equi é
freqüentemente mais refratária ao tratamento do que a B. caballi.
E, no caso específico dos gatos, a PCR permite o diagnóstico específico do
parasito, o que não ocorre na observação dos hemoparasitos no interior dos
eritrócitos, pois os merozoítos de B. felis (Fig. 9) são morfologicamente
indistinguíveis de B. leo e de Citauxzoon felis.

FIGURA 9. Piroplasmídeos intraeritrocitários em esfregaço sanguíneo periférico de gato


(Bishop et al., 2008).

Os testes sorológicos são mais úteis em infecções crônicas ou em animais


portadores assintomáticos, quando a parasitemia é geralmente baixa. Os principais
testes sorológicos para babesiose são a reação de imunofluorescência indireta
(RIFI), ELISA e fixação de complemento. Não se usa sorologia em gatos porque os
testes ainda não foram padronizados para a espécie.
Para bovinos, as provas sorológicas são os métodos mais adequados e
práticos para se conhecer e classificar a situação epidemiológica da babesiose em
um rebanho ou região, sendo que o teste de ELISA é considerado o que confere
melhores resultados.

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O prognóstico da babesiose depende do momento em que foi feito o
diagnóstico, o estado geral do animal e se há ou não infecções concomitantes.
Quanto mais brando o quadro e quanto antes o animal for tratado, melhor o
prognóstico.

1.8 Tratamento

O tratamento da babesiose se baseia no uso de uma babesicida e terapia de


suporte. As drogas babesicidas mais utilizadas em todas as espécies são o
dipropionato de imidocarb e o diminazeno; como terapia de suporte usa-se
fluidoterapia, transfusão sanguínea e tetraciclinas, quando há co-infecção com
Anaplasma ou Ehrlichia.
Em bovinos utiliza-se diaceturato (Ganaseg®) e diminazeno (Ganazene®),
ambos por via intramuscular na dose de 1 ml para 20 kg, sendo que o primeiro deve
ser reaplicado com intervalos de uma semana e o último de 24 horas em locais
diferentes da musculatura do animal. O dipropionato de imidocarb (Imizol®) é
administrado na dose de 1 ml para 40 kg também por via intramuscular; e, seu
fabricante indica que o animal somente seja abatido para consumo humano após 28
dias da última aplicação. Como as co-infecções com Anaplasma são freqüentes em
bovinos, a associação a tetraciclinas pode ser necessária.
Nos eqüinos é interessante determinar a espécie do agente da babesiose
porque isto modifica o tratamento, já que T. equi é dificilmente eliminada. Além
disso, deve-se estar atento aos diversos graus de toxicidade nervosa, hepática e
renal apresentados pelos equinos com a utilização de terapias químicas. A droga
mais utilizada, com segurança, é o dipropionato de imidocarb em diferentes
protocolos:

1) 2,2 mg/kg por via intramuscular, em duas doses com intervalo de 24 ou 72


horas – recomendado para B. caballi que é mais sensível;
2) 4,0 mg/kg por via intramuscular, em quatro doses com intervalos de 72
horas – recomendado para T. equi;

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3) 7,2 mg/kg por via intramuscular, divididos em duas aplicações no mesmo
dia com intervalo de uma hora entre elas, e depois dez dias para novas aplicações –
inespecífico;
4) 8,0 mg/kg por via intramuscular, divididos em duas aplicações com
intervalo de 10 horas e repetido a cada 48 horas – inespecífico;
5) 1 ml para 50 kg por via intramuscular, com uma segunda dose após 24
horas no caso de infecção por T. equi – indicação do fabricante.
Em cães, o diaceturato e o diminazeno são muito tóxicos, o índice
terapêutico destas drogas nesta espécie é muito baixo. Então, assim como em
eqüinos, a droga mais utilizada é o dipropionato de imidocarb, utilizado nas
dosagens de 0,5 ml a cada 10 kg ou 5 mg/kg por via subcutânea com intervalos de
14 ou 15 dias entre as aplicações. Nesta espécie, efeitos colaterais podem ser
observados, o mais freqüente é a dor no local da aplicação.
Além da dor localizada, os efeitos colinérgicos, tais como salivação
excessiva, secreção ocular, diarréia e depressão são comuns após a utilização desta
droga, por isso recomenda-se que o animal seja observado por cerca de dez a
quinze minutos após a injeção ou que se controle tais sinais com a administração
prévia de sulfato de atropina na dose de 0,04 mg/kg por via subcutânea.
Nos gatos, o tratamento ainda é questionável, mas tem se utilizado
primaquina na dose de 0,5 mg/kg por via oral ou intramuscular, porém ela causa
vômitos quando administrada oralmente e seu índice terapêutico é baixo, sendo que
as doses acima de 1,0 mg/kg podem ser letais. Outra droga que tem se mostrado
eficiente, de acordo com alguns pesquisadores, é o dipropionato de imidocarb na
dose de 2,5 mg/kg por via intramuscular, todavia esta droga não tem indicação para
felinos domésticos, de acordo com o fabricante. Todas as outras drogas testadas ou
demonstraram-se muito tóxicas para os gatos ou ineficazes contra o agente.

1.9 Profilaxia

Um dos maiores problemas na profilaxia da babesiose é que não há


imunidade duradoura, pois esta se desfaz em cerca de oito meses. Por este motivo
alguns autores defendem a exposição controlada ao agente e que os tratamentos

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não eliminem todos os parasitos de uma vez. Os métodos profiláticos englobam a
quimioprofilaxia, o controle de vetores, a premunição e a imunização.
A quimioprofilaxia consiste em tratar o animal com doses sub-terapêuticas a
fim de manter o animal com a doença em nível subclínico e torná-lo apenas um
portador assintomático. A quimioprofilaxia também serve para prevenir a agudização
da doença em portadores assintomáticos. Este método é defendido por alguns
pesquisadores e condenado por outros, com discussões sobre o desenvolvimento
de resistência às drogas utilizadas em baixas doses e a manutenção de animais
portadores no rebanho, plantel ou canil.
O dipropionato de imidocarb, mais uma vez, é a droga mais indicada. As
doses para quimioprofilaxia, de acordo com cada espécie estão descritas a seguir:
1) Bovinos: 2,5 ml a cada 100 kg por via subcutânea;
2) Eqüinos: 1 ml a cada 50 kg por via intramuscular ou 1,2 mg/kg também
por via intramuscular em duas aplicações com intervalos de 24 horas;
3) Caninos: 0,2 ml para cada 10 kg por via subcutânea.
O controle dos vetores é um método profilático válido para todas as
espécies. Sendo que o recomendado é realmente controlar e não erradicar os
carrapatos, a fim de manter os animais sob desafio ao longo de todo o ano. O uso
de pulverizações no ambiente e banhos carrapaticidas nos casos de bovinos e
eqüinos, ou os banhos e o uso de coleiras, no caso dos cães, são úteis.
Em bovinos, antigamente, usava-se fazer uma premunição com a inoculação
subcutânea de sangue positivo, a fim de proteger os animais, especialmente nas
áreas endêmicas. Após a inoculação controlava-se o quadro clínico e tratava-se o
animal. No entanto, este método encontra-se praticamente abandonado porque não
há como controlar a quantidade de antígeno inoculado, a virulência e ainda há a
possibilidade de transmissão de outras doenças ou desenvolvimento de auto-
imunidade. Modernamente, aplicam-se vacinas padronizadas, a fim de imunizar o
animal que utilizam desde parasitos vivos, inativos ou ainda subunidades de DNA
recombinante.
Para eqüinos não há vacina disponível comercialmente. Para caninos, uma
vacina contra B. canis (Nobivac Piro®) foi registrada em 2006 no Ministério da

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Agricultura, Pecuária e Abastecimento brasileiro, mas ainda permanece sob
estudos, e não se encontra disponível comercialmente.
Para bovinos, outro fator que diferencia o nível de controle da babesiose em
determinada região é a condição epidemiológica da mesma. Isto é, em regiões
endêmicas não se indica medidas de controle, a fim de manter o estímulo e a
resposta imunológica através da exposição contínua ao hemoparasito. Já em
regiões de instabilidade enzoótica, sujeitas a súbitos aumentos da quantidade de
carrapatos deve-se utilizar o controle estratégico com uso de carrapaticidas, rotação
de pastagens, seleção de animais resistentes e imunização.

2 Rangelise

A rangeliose é uma doença canina descrita unicamente no Brasil,


especialmente nas zonas rurais do estado do Rio Grande do Sul, e há muita
controvérsia sobre a real identidade do agente causador, denominado Rangelia
vitalli, seu ciclo evolutivo e outros aspectos.
Suspeita-se que Rangelia vitalli seja transmitida por carrapatos que
parasitam cães, como R. sanguineus e Amblyomma, mas ainda não se tem certeza
sobre a identidade do vetor. A doença, além de rangeliose, também é denominada
de febre amarela dos cães ou nambiuvú e peste de sangue, assim como a
babesiose, talvez por isso este agente também seja denominado de Babesia vitalli,
ou mesmo considerado sinônimo de Babesia canis, principalmente na literatura
internacional. Esta hemoparasitose é mais comum em cães jovens de zonas rurais,
apresentando sazonalidade relacionada aos vetores.
Na literatura consta que R. vitalli ocorre em células endoteliais, macrófagos e
hemácias, mas ainda não há evidências suficientes que garantam que este
protozoário se multiplique no interior das hemácias e células fagocitárias. A grande
maioria das vezes em que foi vista microscopicamente, encontrava-se no interior de
vacúolos citoplasmáticos de células endoteliais de capilares sanguíneos.
Os sinais clínicos mais freqüentes são: febre, icterícia, esplenomegalia,
linfadenopatia generalizada, hemorragia gastrintestinal (“nambiuvú das tripas”) e
sangramento persistente nas bordas e face externa da orelha (Fig. 10), narinas e

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cavidade oral do cão. As alterações hematológicas observadas são compatíveis
com anemia hemolítica extravascular imunomediada.

FIGURA 10. Sangramento persistente da face externa e pina da orelha de cão naturalmente
infectado com R. vitalli (Loretti & Barros, 2005).

O diagnóstico pode ser um tanto complicado. Primeiro porque clinicamente a


doença pode ser confundida com outras hemoparasitose mais comuns. E segundo,
porque dificilmente R. vitalli é vista em esfregaços sanguíneos periféricos, e sim com
mais facilidade em cortes histopatológicos de animais necropsiados. Eritrócitos
parasitados ou formas livres de R. vitalli são considerados achados raros,
especialmente na fase crônica da doença. Alguns pesquisadores sugerem que se o
sangue for coletado na fase aguda ou durante picos febris, a observação no
esfregaço sanguíneo seja mais fácil, pois estudos recentes com microscopia
eletrônica de transmissão reforçam a hipótese de que R. vitalli realmente se trata de
um hemoparasito, ou seja, ocorre no sangue. Os locais onde o parasito tem sido
encontrado com mais freqüência e facilidade são linfonodos, medula óssea (Fig. 11)
e plexo coróide.

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FIGURA 11. Esfregaço de medula óssea de cão experimentalmente infectado com R. vitalli;
observar os numerosos zoítos no interior da célula endotelial (Loretti & Barros, 2005).

Muitas vezes, o diagnóstico da rangeliose acaba sendo presuntivo pela


soma de fatores: quadro clínico, histórico, hemograma e resposta à terapia. O
tratamento da rangeliose consiste em terapia à base de doxiciclina e dipropionato de
imidocarb e, quando necessário são associados corticóides ou transfusão
sanguínea. O diminazeno também é descrito no tratamento da rangeliose, mas esta
droga possui baixo índice terapêutico para os cães, e os casos de intoxicação não
são raros, tanto que muitos laboratórios têm retirado de suas bulas a informação de
que esta droga pode ser utilizada no tratamento de hemoparasitoses caninas.
Finalmente, a rangeliose tem sido confundida com hemoparasitoses mais
comuns, como a babesiose e a erlichiose caninas. E mesmo na histopatologia, R.
vitalli tem sido confundida com outros protozoários e riquétsias. Alguns autores
acreditam que as controvérsias aliadas às confusões em torno deste parasito
fizeram com que ele caísse em descrédito e se tornasse um tópico de livros antigos,
porém há evidências recentes de que se trata de um importante patógeno que pode
inclusive levar os cães à morte.

3 Theileriose

Protozoários da família Theleriidae são chamados teilerídeos e


compreendem os gêneros Theileria e Citauxzoon como descrito anteriormente.

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Estes protozoários possuem forma arredondada, ovalada ou bacilar, e seus
estádios de desenvolvimento ocorrem em linfócitos, histiócitos, eritrócitos e
eritroblastos.
Entre as espécies de Theileria importantes, além da “recente” T. equi, temos
T. parva, T. annulata e T. mutans; ambas agentes da theileriose bovina, também
conhecida como Febre da Costa Leste da África ou doença da passagem. Esta
doença tem casos descritos em diversos países da África e da região mediterrânea
da Europa. Zebuínos e bubalinos também são acometidos por teilerídeos.
A multiplicação inicial ocorre por esquizogonia em linfócitos (Fig. 12) e
células endoteliais do hospedeiro definitivo formando esquizontes, que são
denominados de corpos azuis de Koch. Os esquizontes podem ser de dois tipos,
macroesquizontes e microesquizontes. Os macroesquizontes repetem a
esquizogonia, e os microesquizontes produzem os merozoítos que invadem as
hemácias. Depois, Theileria invade os eritrócitos e se multiplica por divisão binária
simples. Nos eritrócitos, sua forma é redonda, oval ou bacilar (Fig. 13), e vários
parasitos podem ser encontrados no mesmo eritrócito. Também podem ocorrer
merozoítos livres.

FIGURA 12. Esquizontes de T. parva no interior de linfócito (seta) (Disponível em


http://instruction.cvhs.okstate.edu/kocan/disk4/images/img0034.jpg, 07/05/2008).

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FIGURA 13. Formas anelares de Theileria spp. no interior de eritrócitos (Disponível em
http://instruction.cvhs.okstate.edu/jcfox/htdocs/disk1/images/img0024.jpg, 07/05/2008).

Quando o carrapato, hospedeiro intermediário, se alimenta no bovino,


adquire a infecção. Ao ser ingerida, a teileria atravessa a parede do intestino, cai na
cavidade celomática e migra até as glândulas salivares, onde se multiplica por
divisão binária simples, e aguarda ser inoculada. No carrapato, a transmissão da
teileria é sempre transestadial e nunca transovariana. Quando a larva é infectada,
quem transmite é a ninfa e quando a ninfa é infectada, o adulto é o transmissor; este
parasito só tem a capacidade de sobreviver a uma muda.
A theileriose é uma doença grave, na qual entre 90 e 100% dos animais
infectados morrem. Animais jovens são mais resistentes do que os adultos, e
zebuínos (Bos indicus) são mais resistentes naturalmente.
O período de incubação vai de 10 a 25 dias. A febre é geralmente o primeiro
sinal, seguida de perda do apetite, emaciação, parada da ruminação, descarga
nasal, lacrimejamento, edema de orelhas e pálpebras, taquicardia, diarréia
hemorrágica, edema pulmonar e morte.
Alguns animais podem não desenvolver esta forma aguda e manifestar
sinais clínicos mais brandos, em uma forma dita subclínica.O diagnóstico pode ser
feito pela identificação do parasito em esfregaço sanguíneo periférico ou punção
aspirativa de linfonodo ou baço. Na necropsia são observadas linfadenopatia
generalizada, rins hemorrágicos, úlceras no abomaso e intestinos, caracterizadas
por área central necrosada e área externa hemorrágica. A profilaxia é feita com o
combate aos carrapatos vetores.

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4 Citauxzoonose

A citauxzoonose é uma doença grave, freqüentemente fatal, que acomete


felinos domésticos. Esta hemoparasitose foi descrita na África, EUA e existem
relatos no estado do Rio de Janeiro, Brasil. Sua taxa de mortalidade está estimada
em mais de 95%. O agente causador desta doença é o protozoário denominado
Cytauxzoon felis.
Recentemente (2007), pesquisadores identificaram uma nova espécie de
Citauxzoon, a qual foi denominada C. manul. C. manul e C. felis são geneticamente
diferentes e morfologicamente muito semelhantes, contudo pouco se conhece sobre
a patogenicidade de C. manul, tanto em felinos domésticos como em selvagens.
O reservatório natural de C. felis é o lince (Lynx rufus), que geralmente
permanece assintomático, mas também pode manifestar a doença e até morrer.
Acredita-se que C. felis seja transmitido por vetores, principalmente carrapatos
ixodídeos. A espécie Dermacentor variabilis já foi descrita como capaz de transmitir
a doença dos linces para os gatos domésticos, no Brasil, o vetor não foi identificado.
A citauxzoonose tem maior incidência nos meses de verão, quando aumenta
a população de carrapatos. Assim, gatos com acesso à rua e especialmente às
áreas próximas de florestas têm maiores risco de entrar em contato com vetores
infectados e adquirirem a infecção.
O gênero Citauxzoon apresenta dois estágios de desenvolvimento em seu
ciclo no hospedeiro definitivo, o eritrocitário e o leucocitário ou tecidual. A fase
leucocitária começa quando C. felis invade os mononucleares fagocitários. Os
microrganismos se multiplicam nessas células de forma assexuada formando
esquizontes. Estes leucócitos tornam-se volumosos e quando circulam pelos
capilares dos órgãos causam obstrução da corrente sanguínea. A obstrução e a
isquemia conseqüente são responsáveis pela maior parte dos sinais clínicos
manifestados na citauxzoonose. Em seguida, os esquizontes se desenvolvem para
merozoítos que rompem a célula e invadem os eritrócitos. O número de eritrócitos
parasitados é variável, geralmente a parasitemia aumenta até atingir um pico, e
alguns dias depois, o animal morre.

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Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores
Os sinais clínicos observados na citauxzoonose são inespecíficos, entre
eles letargia aguda, depressão, anorexia, icterícia, mucosas pálidas, desidratação e
dispnéia. A dispnéia é acompanhada de alteração radiográfica sugestiva de afecção
pulmonar broncointersticial moderada a grave. Com menor freqüência ocorre
renomegalia, esplenomegalia, hepatomegalia e febre. A febre geralmente coincide
com o período de pico da parasitemia. Na fase terminal, a temperatura corporal do
animal declina até a hipotermia, ocorre prostração, coma e por fim, a morte.
As alterações laboratoriais da citauxzoonose são diversas, leucopenia com
desvio à esquerda e alterações tóxicas em neutrófilos, trombocitopenia e anemia
normocítica normocrômica arregenerativa. A anemia está relacionada à parasitemia
e à destruição imunomediada das hemácias. Também ocorrem alterações da
hemostasia e do perfil bioquímico, com hiperbilirrubinemia, hiperglicemia,
hipoalbuminemia, hipocalemia e aumento da atividade da ALT. Em alguns casos
aparece bilirrubinúria.
O diagnóstico da citauxzoonose pode ser realizado com a identificação dos
piroplasmas no interior dos eritrócitos felinos. Eles possuem um núcleo pequeno,
localizado na periferia do protozoário que apresenta forma oval ou anelar com 1,0 a
1,5 μm de diâmetro (Fig. 14), formando tétrades ou como pontos anaplasmóides
(semelhantes ao gênero Anaplasma) com menos de 0,5 μm de diâmetro. Raramente
são vistas células mononucleares nos esfregaços sanguíneos, contendo merozoítos
em desenvolvimento. Os macrófagos sobrecarregados de parasitos podem chegar a
medir 75 μm de diâmetro.

FIGURA 14. Citauxzoon felis no interior de eritrócitos felinos, observe as formas anelares
(Dailey et al., 2008).

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Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores
A identificação de C. felis em um esfregaço sanguíneo periférico exige uma
lâmina bem corada, sem depósitos de precipitados sobre as hemácias que possam
dificultar sua visualização. Em locais onde são descritos outros hemoparasitos de
felinos, como Mycoplasma haemofelis e Babesia felis deve-se estar atento. O
primeiro é mais facilmente distinguível, por se apresentar na periferia das hemácias,
fora destas, formando correntes, enquanto C. felis encontra-se no interior da
hemácia. Já a diferenciação entre C. felis e B. felis não é possível morfologicamente,
como descrito anteriormente (veja Babesiose Felina e Fig. 9).
Quando a detecção dos parasitos no sangue periférico não for possível,
recomenda-se fazer punções aspirativas com agulha fina do baço (Fig. 15),
linfonodos ou medula óssea. Nesses casos, visualizar macrófagos contendo
merozoítos não é incomum. Outros métodos diagnósticos incluem testes
sorológicos, como o teste de anticorpo fluorescente direto e o imunoensaio de
microfluorometria, o primeiro é realizado em amostras de tecido e o segundo, de
soro, contudo estes testes são mais utilizados em pesquisas, e não estão
disponíveis comercialmente.

FIGURA 15. Macrófago contendo inúmeros merozoítos de C. felis em baço de gato (punção
aspirativa com agulha fina) (Dailey et al., 2008).

Em conseqüência à alta taxa de mortalidade da citauxzoonose, o diagnóstico


é freqüentemente realizado durante a necropsia. As alterações macroscópicas
observadas são: desidratação; palidez generalizada; icterícia; linfonodos

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intumescidos, edematosos ou avermelhados; vasos sanguíneos abdominais
distendidos; petéquias e equimoses em órgãos abdominais, coração e pulmões;
baço aumentado de volume e de coloração escura; e pulmões congestos e
edematosos.
Lâminas feitas por decalque dos tecidos afetados geralmente levam ao
diagnóstico. Os macrófagos contendo esquizontes ou merozoítos em
desenvolvimento são facilmente observados em imprints teciduais. Em cortes
histopatológicos, os macrófagos parasitados são vistos próximos ao lúmen de
capilares sanguíneos, principalmente nos pulmões, baço e fígado (Fig. 16). Os
parasitos ocasionalmente podem ser vistos livres no lúmen, na parede dos vasos ou
até ocluindo o capilar.

FIGURA 16. Obstrução parcial de capilar hepático por macrófagos parasitados por C. felis
(corte histopatológico, corado com HE) (Dailey et al., 2008).

O prognóstico da citauxzoonose é muito pobre, a despeito das tentativas de


tratamento. As drogas que têm sido testadas são o diminazeno e o dipropionato de
imidocarb acompanhados de uma agressiva terapia de suporte. Apesar disso,
existem alguns poucos relatos de gatos que apresentaram cura espontânea. Alguns
pesquisadores acreditam que isto se deve ao fato de o parasito estar se adaptando
ao hospedeiro doméstico, pois quanto mais adaptado o parasito, maior será o
número de gatos sobreviventes a esta infecção. De qualquer forma, o prognóstico
ainda é muito ruim e a letalidade altíssima, por isso se recomenda a prevenção
mantendo o controle de carrapatos e restringindo o acesso dos gatos, especialmente
nos meses quentes do ano.

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5 Hepatozoonose

A hepatozoonose é uma doença mundialmente descrita causada por


protozoários do gênero Hepatozoon, que também é transmitido por carrapatos, mas
com uma diferença das demais hemoparasitoses, pois a transmissão ocorre com a
ingestão do carrapato e não pelo repasto sanguíneo.

5.1 Caninos

No Brasil, o agente da hepatozoonose canina é o Hepatozoon canis, que é


transmitido pelo carrapato R. sanguineus. Na América do Norte, o agente é o H.
americanum. Estas duas espécies são geneticamente diferentes, o que as diferencia
também em termos de sinais clínicos, sorologia, tamanho dos gametócitos,
morfologia dos esquizontes e até mesmo o vetor, que no caso do H. americanum é o
carrapato Amblyomma maculatum.
Hepatozoon canis não é freqüentemente descrito como responsável pelas
hemoparasitoses diagnosticadas no Brasil, sendo um achado ocasional nos
laboratórios veterinários. Estima-se que em áreas urbanas a taxa de infecção nos
cães esteja em torno de 4,5%, enquanto nas áreas rurais, esta taxa possa
ultrapassar os 30%, mesmo utilizando como método diagnóstico a observação em
esfregaço sanguíneo periférico.
Nas áreas urbanas brasileiras, este protozoário é transmitido pela ingestão
do carrapato R. sanguineus, mas em áreas rurais, onde R. sanguineus não é o
carrapato mais prevalente outros participam da transmissão, como Amblyomma,
Dermacentor e Haemaphysalis.
Nos cães, o desenvolvimento do parasito ocorre de duas formas. Nos
tecidos há a multiplicação de esquizontes e no sangue periférico, de gamontes. A
patogenia e os sinais clínicos ainda precisam de mais estudos, mas se sabe que
variam com a idade do cão, o grau de infecção e a presença de co-infecções. Alguns
autores consideram que a observação dos gametócitos é um incidente e que os
sinais clínicos atribuídos ao Hepatozoon são na verdade causados por outra doença,
todavia muitos cães apresentam alta parasitemia e infecção severa.

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Este material deve ser utilizado apenas como parâmetro de estudo deste Programa. Os créditos deste conteúdo são dados aos seus respectivos autores
A hepatozoonose pode se manifestar nos cães como uma doença discreta
com poucos sinais clínicos ou uma doença grave, que pode até causar a morte. Os
sinais clínicos observados são febre, anorexia, perda de peso, descarga ocular,
fraqueza dos membros posteriores levando a paresia e sinais de debilidade crônica.
As alterações laboratoriais observadas na hepatozoonose canina incluem
leucocitose moderada, anemia, trombocitopenia, hipoalbuminemia, hiperglobulinemia
e elevação da atividade sérica da fosfatase alcalina e creatina quinase.
O diagnóstico é geralmente feito pela observação dos gametócitos nos
neutrófilos e monócitos em esfregaços sanguíneos periféricos (Fig. 17). A
parasitemia por H. canis é em média de 3%, mas certamente que quanto maior a
parasitemia, mais fácil a observação na lâmina.

FIGURA 17. Hepatozoon canis no interior de neutrófilo canino (Foto cedida pela M.V.
Mestre Thatianna Camillo Pedroso).

No Brasil ainda não há pesquisas que apontem relação entre a parasitemia e


a severidade da doença, mas isto já foi observado na hepatozoonose americana.
Para o diagnóstico também é possível utilizar técnicas sorológicas, como o RIFI, e
moleculares, como a PCR.
O tratamento da hepatozoonose canina é controverso. Sabe-se que a
oxitetraciclina e o cloranfenicol não são efetivos, enquanto que os resultados de
tratamentos com outras drogas são contraditórios. As drogas utilizadas geralmente
são:
1) Tetraciclina: 22 mg/kg por via oral, três vezes ao dia durante 14 dias;

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2) Doxiciclina: 10 mg/kg por via oral, uma vez ao dia durante 14 dias;
3) Dipropionato de imidocarb: 6 mg/kg por via subcutânea ou 5 mg/kg por via
intramuscular, em duas doses com intervalo de 14 dias.
Alguns pesquisadores associam o tratamento à prednisona, suplementos
vitamínicos e transfusão sanguínea. Uma droga que vem sendo testada na França
com resultados positivos é o anticoccidiano toltrazuril, na dose de 10 mg/kg, por via
oral durante seis dias.

5.2 Felinos

Já foram descritos protozoários do gênero Hepatozoon no interior de


neutrófilos de gatos domésticos, mas ainda não se sabe a espécie do agente, pois
há divergência entre os autores. O agente já foi descrito como Hepatozoon felis e
também como H. canis, por ser considerado morfologicamente idêntico ao agente da
hepatozoonose canina.
No Brasil ainda não há relatos em gatos domésticos, contudo já houve relato
em um gato-do-mato (Felis tigrina). Os relatos em felinos domésticos concentram-se
na Índia, África, Israel e Estados Unidos.
A patogênese da hepatozoonose felina ainda não está clara, mas há
suspeitas de que esteja associada à imunossupressão. Na maioria dos casos
descritos até hoje, os gatos estavam co-infectados por outro agente, especialmente
FIV, FeLV e Mycoplasma haemofelis.
Diversos sinais clínicos foram descritos, tais como letargia, anorexia, perda
de peso, estomatite, gengivite, descarga oculonasal, linfadenopatia generalizada,
ataxia, paresia, falência renal e icterícia. Nem sempre é descrita febre. Alguns
autores suspeitam que os sintomas devam-se às co-infecções e não apenas à
hepatozoonose felina.
As alterações laboratoriais observadas nos felinos domésticos incluem
anemia, neutrofilia, monocitose e azotemia. Achados interessantes, como a elevação
das enzimas musculares creatina quinase e lactato desidrogenase foram descritos.
O aumento dos níveis séricos destas enzimas sugere lesão muscular esquelética ou
do miocárdio. Estes achados são compatíveis com lesões histopatológicas descritas

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em felinos selvagens com hepatozoonose, nos quais foram observadas estruturas
semelhantes a esquizontes de Hepatozoon sp. em capilares sanguíneos do
miocárdio.

-----------------FIM DO MÓDULO III-----------------

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