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ef DOMINGO, 28 DE JUNHO DE 2009 ribeirão C5

Guardacompartilhadaépoucoaplicada
Sancionada há um ano, lei prevê igualdade de direitos de pai e mãe na criação de filhos e demanda diálogo entre ex-casal
Edson Silva/Folha Imagem

Segundo especialistas, lei Na avaliação da especialista triz, na época com quatro anos.
foi tímida pois não alterou em direito de família e profes- Ao pai, restaram as visitas,
sora da Faculdade de Direito da ocorridas duas vezes por sema-
forma como juiz decide USP de Ribeirão Lydia Telles, a na. “Com o tempo contado, era
sobre a tutela; os pais, no lei em tese é “excelente”, mas muito mais um momento de
entanto, apontam avanços tem difícil aplicação. “É um sis- estresse do que de encontro.”
tema que exige bom senso dos Com a aprovação da nova lei,
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DANIELA MERCIER
pais. E, para o juiz, a decisão de- ele consegui a tutela comparti-
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA RIBEIRÃO ve se basear no princípio do lhada da criança. Ela continua
melhor interesse da criança.” morando com a mãe, mas a
As irmãs Giulia, 6, e Bruna, 4, Por exigir decisões tomadas convivência com o pai foi am-
veem o pai e a mãe todos os em conjunto, é preciso haver pliada e os horários, mais flexí-
dias. Foram eles que escolhe- condições mínimas de diálogo veis. “Na minha casa, tem um
ram, juntos, a escola onde elas entre os pais —situação que é quarto só para minha filha. Ela
estudam, o horário das aulas de pouco frequente em pessoas não sente que está me visitan-
balé e de natação e o que elas fa- que acabaram de romper um do, mas que está na casa dela”.
zem no final de semana. Os pais relacionamento afetivo. Segundo a advogada Sandra
das meninas não moram mais Para Analdino Paulino, pre- Vilela, que atua junto a movi-
juntos, mas têm direitos e deve- sidente da Apase (Associação mento de pais separados, a van-
FOTO res iguais na criação das filhas. de Pais e Mães Separados), falta tagem desse sistema é a flexibi-
3.0 A situação das irmãs é exce-
ção entre filhos de pais separa-
entendimento da Justiça em
relação à abrangência da lei.
lidade, já que não existe um for-
mato único de aplicação da lei.
41.0 dos, mas não deveria ser assim. “Dizem que a lei só pode ser “Ela permite muitos arranjos.
Passado um ano da lei federal aplicada quando o casal tem Muitas vezes, falta imaginação
que instituiu a guarda compar- acordo. Mas ela foi criada justa- aos juízes e aos pais.”
tilhada como sistema preferen- mente para casais que não se Segundo ela, muitas pessoas
cial na tutela de crianças e ado- entendem”, afirma. se enganam ao achar que o
lescentes, ainda são poucos os Criada há 11 anos, a Apase foi compartilhamento da guarda
exemplos dessa divisão. uma das partes que elaboraram implica o fim da pensão. “São
“Não chega a 1% das decisões. o projeto de lei encaminhado questões independentes.”
Na maioria dos casos, nem se ao Congresso em 2002. Apesar O pai de Giulia e Bruna, as
cogita a guarda compartilha- de reconhecer que a lei é pouco meninas do início da reporta-
da”, afirmou o juiz Ricardo Bra- aplicada, ele diz que a norma gem, faz uma compensação fi-
ga Monte Serrat, da 1ª Vara da trouxe avanço. “Antes, a guarda nanceira para a mãe das meni-
Família e Sucessões de Ribei- dependia só da sensibilidade de nas que, por morar com elas,
rão Preto. A principal razão é advogados e juízes. Mas agora é tem mais gastos.
que o sistema já existia na prá- um direito”, afirma. “Nada substitui a situação de
tica e a lei não mudou a forma O analista de sistemas Nildo pai e mãe vivendo juntos. Mas a
como o juiz analisa os casos. Fernandes Silva iniciou em guarda compartilhada é o me-
“A lei não trouxe solução pa- 2006 o processo de separação lhor que você pode fazer mi-
ra os conflitos, embora tenha da ex-mulher, que logo obteve a rando o bem-estar das crian-
Marcos Papa e as filhas Giulia e Bruna na pça. Luís de Camões, em Ribeirão; guarda é compartilhada sido novidade como norma.” guarda provisória da filha Bea- ças”, afirma o pai, Marcos Papa.

Justiçanãosegue
mudança,afirma
associaçãodepais
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COLABORAÇÃO PARA A FOLHA RIBEIRÃO

Sancionada em junho de
2008 pelo presidente Luiz Iná-
cio Lula da Silva, a lei da guarda
compartilhada é fruto da rei-
vindicação de pais que sentem
falta do convívio com os filhos
após a separação do casal.
Segundo Analdino Paulino,
da Apase (Associação de Pais e
Mães Separados), a mãe é res-
ponsável pela guarda dos filhos
em 93% das separações.
“O homem não é só o prove-
dor e a mulher não é mais a do-
na de casa. Mas a Justiça não
acompanhou as mudanças da
sociedade”, diz. A nova luta da
instituição é pela aprovação do
projeto de lei que pune a práti-
ca da alienação pariental, em
que um dos pais induz a criança
ao repúdio ou ao afastamento
em relação ao outro. A proposta
tramita no Congresso.
Para a psicóloga Solange Ser-
rano, essas medidas são impor-
tantes para garantir o direito da
criança de conviver com os dois
pais. “Muitos ex-casais não
conseguem separar o que é da
conjugalidade da parentalida-
de, e a criança sente isso.”
A professora da Faculdade de
Direito da USP de Ribeirão
Lydia Telles diz que, na guarda
compartilhada, a criança mora
com um dos pais, mas as deci-
sões devem ser feitas em acor-
do. Isso distingue o sistema do
de guarda alternada —em que
as crianças se dividem entre as
casas e a atuação dos pais é in-
dependente. “Não há alternân-
cia, há conjunto. É como se os
pais fossem casados.”

[Aguarda
compartilhada]Éum
sistemaque exigebom
sensodos pais.Adecisão
devesebasearno
princípiodomelhor
interessedacriança
LYDIATELLES
professora da Faculdade de
Direito da USP de Ribeirão

Antes,dependiasóda
sensibilidadede
advogadosejuízes.
Agoraéumdireito
ANALDINOPAULINO
presidente da Apase (Associação
de Pais e Mães Separados)

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