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A INTERNACIONAL DOS TRABALHADORES


DE SUA FUNDAÇÃO ATÉ O CONGRESSO DA BASILÉIA
James Guillaume

I. PRELIMINARES (1862-1864) / REUNIÃO DO DIA 28 DE SETEMBRO DE


1864 / ESTATUTOS

A Exposição universal de Londres de 1862 originou uma mudança de idéias e de


projetos entre os operários franceses e ingleses. Uma delegação composta por duzentos
operários eleitos por seus colegas das oficinas de Paris foi enviada para Londres,
custeada pelo governo, para estudar a Exposição e redigir relatórios técnicos. Em uma
grande festa ocorrida em 5 de agosto de 1862 e oferecida pelos representantes das trade-
unions para os trabalhadores franceses, os ingleses leram um manifesto em que
expressavam o desejo de uma aproximação entre os operários das diferentes nações.
“Esperamos encontrar, dizia o documento, algum meio internacional de comunicação e
que no futuro vejamos formar-se um novo elo da corrente de amizade que deve unir os
trabalhadores de todos os países”. Os operários franceses responderam propondo “que
fossem estabelecidos comitês operários para a troca de correspondência sobre as
questões internacionais que afetam a indústria”: esta idéia foi aclamada por toda a
assembléia.

No ano seguinte (1863) a insurreição polonesa despertou as mais intensas simpatias


dentro da classe operária, tanto na Inglaterra como na França. Os operários de Londres
organizaram um grande comício em favor da Polônia para o dia 22 de julho, e
convidaram os parisienses para enviarem seus delegados: seis operários de Paris
atenderam à reunião em que foi votado um manifesto entusiasta. Em um segundo
comício, o trade-unionista Odger, depois de ter falado da paz universal, pediu para os
operários organizarem Congressos Internacionais, a fim de chegarem a um acordo sobre
os meios de poder lutar contra o capitalismo e impedir a introdução de um país em
outro, de uma mão-de-obra não organizada que obrigue a reduzir os salários. A idéia
lançada no ano anterior era precisa: mais um ano e ela tomaria corpo.

O ano de 1864 viu crescer o movimento no âmago das classes operárias de ambos os
países. Enquanto na Alemanha a propaganda socialista nacional, iniciada em 1862 por
Ferdinand Lasalle, fica bruscamente interrompida por sua morte em um duelo (agosto
de 1864), a França e a Inglaterra irão constituir uma organização internacional do
proletariado. Na Inglaterra (no mês de abril), os representantes das trade-unions
recebem com grande entusiasmo Garibaldi e igualmente manifestam sua simpatia pelos
federais da América do Norte em guerra com os escravistas do sul. Na França (mês de
maio), por iniciativa do próprio imperador, inquieto pela atitude dos trabalhadores, o
Corpo Legislativo suprime o Código Civil, a proibição absoluta das “coligações”. Em
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setembro, os operários de Londres convocam outro grande comício em favor da Polônia


para o dia 28 de setembro, que deveria realizar-se em Saint Martin‟s Hall. Convidados,
os operários de Paris apresentam como delegados os trabalhadores Tolain, Perrachon e
A. Limousin, que foram os portadores de um projeto: uma associação internacional. A
reunião foi presidida pelo jovem Edward Spencer Beesly, filósofo positivista e ardente
radical que falou dos povos oprimidos, denunciou a violência dos governos e expressou
a esperança de que a união projetada entre os operários de todos os países sairia
consolidada daquela Assembléia. Odger passou a ler o manifesto enviado aos operários
de Paris e Tolain leu a resposta dos operários parisienses que dizia:

“Trabalhadores de todos os países que desejam ser livres! Chegou a hora que vocês
podem realizar congressos. O povo aparece em cena tendo consciência de suas forças e
levantando-se perante a tirania na ordem política, contra o monopólio e o privilégio na
ordem econômica... É preciso que nos unamos para opor uma barreira intransponível a
um sistema funesto que dividirá a humanidade em duas classes.”

Um jovem professor de francês, chamado Le Lubez, educado em Jersey e Londres,


traduziu o documento de Tolain, explicando depois o plano de organização apresentado
pelos franceses, plano que foi calorosamente aplaudido. O trade-unionista Wheeler
apresentou a resolução submetida à reunião pelo Comitê de iniciativa; ele disse, com
cordialidade e humor, “que os franceses sempre superavam os ingleses, pois enquanto
estes últimos tinham enviado seu manifesto a Paris pelo correio, os franceses levavam-
no pessoalmente a Londres, acompanhado de um projeto de organização, demonstrando
dessa forma, mais uma vez, que o progresso sempre vem da França, mesmo quando os
franceses são os mais oprimidos.” A resolução votada foi a seguinte:

“Tendo a assembléia ouvido as respostas de nossos irmãos franceses, damos a eles as


boas-vindas e como seu programa tende a melhorar a situação dos trabalhadores, o
aceitamos como base de uma organização internacional. A assembléia nomeia um
comitê, com possibilidade de ser aumentado para um número maior de membros, a fim
de redigir regulamentos para a associação.”

A resolução foi adotada pela unanimidade e o comitê, que deveria ficar em Londres, foi
nomeado nesse ato. Era composto em sua maioria por ingleses, entre os quais estavam
os membros das trade-unions, Odger, Cremer, Wheeler e o discípulo de Owen, Weston.
A França foi representada por Le Lubez e outros dois ou três franceses residentes na
Inglaterra; a Itália pelos mazzinianos Fontana e o polonês Wolff, e a Alemanha pelo
operário Eccarius e o doutor Karl Marx. O comitê recebeu a ordem de preparar um
projeto de estatutos e de convocar um congresso operário para 1865.

Assim foi fundada a Associação Internacional dos Trabalhadores que os ingleses


denominaram International Workingmen‟s Association. Segundo a frase do socialista
Bibal, um dos que subscreveu o Manifesto dos Sessenta[1], o comitê era “uma criança
nascida nas oficinas de Paris e amamentada em Londres”.
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Em uma carta com data de 4 de novembro de 1864, Karl Marx relatou para seu amigo
Friedrich Engels, que então residia em Manchester, como havia acontecido sua ida ao
encontro no Saint Martin‟s Hall. Diz ele:

“Faz um tempo alguns operários de Londres tinham enviado para outros operários de
Paris um manifesto relativo à Polônia e os tinham convidado para uma ação comum
sobre o assunto. Os parisienses, por sua vez, enviaram uma delegação encabeçada por
Tolain, o candidato operário de uma recente eleição em Paris. Um comício público foi
convocado para 28 de setembro, em Saint Martin‟s Hall, por Odger (sapateiro,
presidente do London Trades Union Council e também da Trades Unions Suffrage
Agitation Society, que está em relação com John Bright) e Cremer (pedreiro, secretário
da Mason‟s Union). Estes dois homens foram aqueles que organizaram, sob a direção de
Bright, o grande comício das Trade-Unions em Saint James Hall, em favor da América
do Norte, como também a manifestação em homenagem a Garibaldi. Enviaram um tal
de Le Lubez para perguntar-me se eu queria fazer parte da reunião representando os
operários alemães e, sobretudo, se eu podia enviar um orador alemão para o comício. Eu
mandei o Eccarius, que fez muito bem o seu papel e eu mesmo estive na reunião do
tablado, como personagem mudo. Eu sabia que tanto do lado londrino quanto do
parisiense, desta vez, eram „potências‟ reais as que estavam em cena; por isso decidi
aceitar o convite, afastando-me de minha regra habitual de recusar todos eles.”

O comitê eleito em 28 de setembro, em sua primeira sessão, nomeou uma comissão


encarregada de redigir uma declaração de princípios e os estatutos provisórios. Marx foi
designado como um dos membros da comissão; os outros encarregados foram (segundo
carta de Marx de 4 de novembro), o judeu-polonês italianizado Wolff, o francês Le
Lubez e os ingleses Cremer e Weston. Por causa do mal estado de sua saúde, Marx não
pôde participar das duas primeiras reuniões da comissão e da segunda sessão do comitê.
Na primeira reunião, Wolff apresentou os estatutos das sociedades operárias italianas
(mazzianianas), propondo que servissem de base para os da nova associação, e Weston
apresentou um programa confuso. O comitê, em sua segunda sessão plena, designou
uma comissão para corrigir o programa de Weston, como também os estatutos de
Wolff: estes dois projetos foram adotados pela comissão, na ausência de Marx, para
serem submetidos ao comitê, cuja terceira sessão plena deveria realizar-se em 18 de
outubro.

A carta de Marx, de onde tiramos esses dados, continua deste modo:

“Tendo-me escrito Eccarius sobre a necessidade da minha presença fui, (em 18 de


outubro), e fiquei verdadeiramente assustado ao ouvir o bom Le Lubez lendo um
preâmbulo de uma fraseologia que chocava, mal escrito, e completamente infantil...
Além disso, os estatutos italianos tinham sido conservados com seus traços essenciais, e
esses estatutos, além de seus outros defeitos, instituíam algo inadmissível; uma espécie
de governo central (com Mazzini nos bastidores, naturalmente) das classes operárias da
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Europa. Fiz algumas observações, e depois de uma longa discussão, Eccarius fez decidir
que a comissão examinasse novamente os projetos „para redação‟; contudo, os
sentimentos contidos na declaração de Le Lubez, foram votados”.

Como fazer para recusar os projetos de Wolff e de Le Lubez? “Eu estava firmemente
decidido”, escreve o futuro autor de O Capital, “a não permitir que ficasse uma só linha
de todo aquele palavrório”. Para atingir os seus fins, e tendo reunido em sua casa em 20
de outubro Cremer, Fontana e Le Lubez, Marx propôs “para poupar tempo” que
começassem a discutir os estatutos.

Diz Marx:

“Assim foi feito. Era uma hora da manhã quando o primeiro dos quarenta artigos foi
concluído. Cremer disse (e era isso que eu queria): „O comitê deve reunir-se em 20 de
outubro e nada temos para lhe apresentar. Devemos deixar a sessão do comitê para o dia
1º de novembro, reunir de novo a comissão em 27 de outubro e procurar a maneira de se
obter um resultado definitivo‟. Isso foi feito, e os documentos ficaram comigo para
serem examinados.”

Vi que era impossível tirar algo daquela confusão. Para justificar a singular maneira
com que eu me propunha „redigir‟ os sentimentos já votados, escrevi um manifesto às
classes operárias, espécie de exame dos fatos e das expressões dos trabalhadores desde
1845.[2] Depois, sob pretexto de que todos os fatos históricos já estavam contidos neste
manifesto, e que não podíamos repetir três vezes as mesmas coisas, mudei todo o
preâmbulo, acabei com a declaração de princípios e finalmente, reduzi para dez, os
quarenta artigos dos estatutos. Todas as minhas proposições foram aceitas pela
comissão; somente me impuseram, no preâmbulo dos estatutos, a introdução de duas
frases sobre os deveres e direitos, sobre a verdade, a moral e a justiça; porém eu
coloquei essas frases de tal modo que não tenham como prejudicar o conjunto.

Na sessão do comitê (1º de novembro) meu manifesto e todo o resto foi adotado com
grande entusiasmo e unanimemente [...]. Era muito trabalhoso poder apresentar meu
ponto de vista sob uma forma aceitável dentro do contexto em que atualmente se
encontra o movimento operário. Imagine que esse pessoal daqui a quinze dias vai
realizar comícios em favor do sufrágio universal com Bright e Cobden! É necessário
tempo para que o desenvolvimento do movimento permita a antiga franqueza de
linguagem. Por enquanto, devemos agir fortiter in re, suaviter in modo.”[3]

Devemos ficar felizes pelo fato de a Internacional ter achado, em seu começo, um
homem de tão alta capacidade como Marx para formular em seu nome “uma série de
princípios simples”, podendo servir de “base comum”[4]. Apenas deve-se lamentar que
a relação feita pelo autor dos estatutos e de seu admirável preâmbulo, fique apagada
pelos detalhes das habilidades às quais recorreu para deixar de lado o fatras [incoerentes
idéias] de Le Lubez e de Wolff.
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Na mesma carta de 4 de novembro, da qual acabamos de tirar dados tão instrutivos,


Marx conta para Engels de que forma na véspera foi visitar Bakunin, quem conhecia
desde 1843, porém não via desde 1848. Bakunin estava de passagem por Londres,
voltando da Suécia e indo para a Itália, onde tinha fixado sua residência, após o fracasso
da insurreição polonesa. Marx solicitou dele uma entrevista para renovar suas relações
de amizade. Eis aqui a passagem relativa a este encontro:

“Bakunin manda lembranças. Ele saiu hoje para a Itália, onde reside. Ontem o vi
novamente depois de dezesseis anos. Devo te dizer que isso me agradou muito. Acerca
dos acontecimentos na Polônia, diz que o governo russo tinha necessidade daquele
movimento para manter a tranqüilidade na Rússia, porém o governo não pensou que a
luta pudesse durar dezoito meses. O governo, portanto, foi quem provocou a
insurreição. São duas as causas que fizeram fracassar o movimento: a influência de
Bonaparte e a vacilação da aristocracia polonesa, que não quis proclamar, no início da
insurreição, clara e francamente, o socialismo rural. Bakunin diz que com o fracasso
polonês, quer apenas se ocupar do movimento socialista. Em poucas palavras, ele é um
dos poucos homens que nestes últimos tempos andou para frente.”

Bakunin, já na Itália, recebeu de Marx exemplares dos estatutos da Internacional, e


mesmo que o revolucionário russo, no começo, parecesse disposto a fazer propaganda
entre os italianos em favor da nova associação, preferiu dedicar-se a outro assunto mais
urgente e mais apropriado para o terreno sobre o qual deveria realizar sua ação: a
constituição de uma organização secreta destinada a combater os partidários de Mazzini,
como também a preparar um acordo internacional entre os socialistas revolucionários.
Mais adiante (em 1867) encontraremos Bakunin outra vez.

II. BUREAU DE PARIS (JANEIRO 1865) / CONFERÊNCIA DE LONDRES


(SETEMBRO 1865) / PRIMEIRO CONGRESSO DA INTERNACIONAL EM
GENEBRA (SETEMBRO 1865)

Os estatutos provisórios da Internacional impressos em Londres no mês de novembro


foram enviados para Paris pelo Conselho Geral (esse era o nome que dali em diante iria
ostentar o comitê nomeado em 28 de setembro; o texto em inglês o denominava Central
Council). O grupo dos filiados parisienses ficou constituído então, formando o Bureau
de Paris e foram nomeados secretários Tolain, E. Fribourg e Ch. Limousin. Os estatutos
traduzidos para o francês foram impressos e em 8 de janeiro de 1865 foram enviados
dois exemplares, um para o chefe da polícia e outro para o Ministro do Interior. Nesse
mesmo dia, o Bureau de Paris instalava-se em um modesto local na Rua de Gravilliers
número 44, que era composto de uma sala mobiliada com uma mesa de madeira branca
e duas cadeiras e situado no piso térreo, na parte de trás de um quintal.

Para evitar as perseguições ficou combinado que os filiados deviam figurar como
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membros de uma associação estabelecida na Inglaterra. O artigo 10 dos estatutos gerais


determinava que toda sociedade local deveria dirigir-se ao Conselho Geral de Londres,
e já que se formava um novo grupo na França, recomendava-se não manter
correspondência com Paris, mas a dirigir-se sempre ao Conselho Geral para obter todas
as referências que se precisasse.

Além dos três secretários correspondentes Tolain, Fribourg e Limousin, somou-se certo
número de filiados do Bureau de Paris, formando-se uma subcomissão, a qual não
poderia ser superior a vinte membros, número que não podia ser superado porque o
código penal, caso fosse ultrapassada essa cifra, exigiria uma autorização
governamental. Naturalmente houve, algumas vezes, mudanças no pessoal; Fribourg
cita de cor os nomes de dezoito operários que fizeram parte desta subcomissão: Debock,
tipógrafo; Bourdon, gravador; Heligon; Culetin; Perrachon; Camélinat; Guiard;
Fournaise, ótico; André Murat, mecânico; Eugène Varlin, encadernador; Bellamy;
Delorme, sapateiro; Mollin, dourador; G. Laplanche, cocheiro; Delahaye, chaveiro;
Chemalé; Gauthier, joalheiro; e Benoit Malon, diarista.

Em setembro de 1865 o Bureau de Paris era composto por não mais de quinhentos
filiados, tão grandes eram as travas legais que se opunham à propaganda.

O artigo 3 dos estatutos antecipava a reunião de um congresso geral na Bélgica em


1865, mas o Conselho Geral de Londres reconheceu que a convocação de um congresso
não era possível ainda, e limitando-se à realização de uma simples conferência que
aconteceu em Londres de 25 a 29 de setembro de 1865. Paris ficou representada nessa
conferência por Tolain, Fribourg, Ch. Limousin e o encadernador Varlin. Também
participaram dois delegados de Genebra, o francês Duplaix, encadernador, e o alemão J.
P. Becker, publicista, e um delegado de Bruxelas, César de Paepe, tipógrafo e estudante
de medicina. Os demais membros da conferência eram ingleses: Odger, Cremer,
Wheeler, Howell, Weston, e estrangeiros com domicílio em Londres, membros do
Conselho Geral, Le Lubez (secretário pela França); Vesinier e Dupont, membros do
ramo francês de Londres; Hermann Jung (secretário pela Suíça); Karl Marx (secretário
pela Alemanha); Eccarius, Wolff; Bobczinski etc. A conferência decidiu que o primeiro
congresso seria realizado em Genebra, na primavera de 1866, e votou sua ordem do dia.
Fribourg ao referir-se ao último dia da conferência nos conta que foi celebrado um chá
acompanhado de discursos, cânticos republicanos e finalizado com um baile, em que as
filhas de Karl Marx dançaram com os delegados franceses Varlin e Limousin. Nesta
festa, Karl Marx manifestou para Tolain e Fribourg o profundo ódio que sentia por
Proudhon, por causa das idéias anticomunistas que este sustentava.

Em uma das sessões da conferência houve uma acalorada discussão entre Vésinier e os
delegados de Paris, acerca da “questão polonesa”. Vésinier declarou que aqueles que
queriam separar esse assunto da ordem do dia do futuro congresso, não eram outra coisa
senão agentes bonapartistas. Esse conflito deu lugar, mais tarde, em setembro de 1866, à
separação de Vésinier e Le Lubez do Conselho Geral e à expulsão, em outubro de 1868,
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do ramo francês de Londres.

Em outubro de 1865 foi realizado em Liège o célebre congresso internacional de


estudantes socialistas, do qual participaram Germain Casse, Paul Lafargue, Tridon, os
irmãos Villeneuve, Jaclard etc.

Na primavera de 1866, aqueles que conduziam a Internacional perguntavam-se se era


realizável o congresso projetado. Marx, que por causa do seu mal estado de saúde foi
obrigado a abandonar o Conselho Geral durante três meses, escreveu para Engels, em 6
de abril, o seguinte:

“Devo te dizer com franqueza que a Internacional não vai bem, aumentando esse mal-
estar a impaciência dos franceses que querem realizar o congresso em finais de maio.
Além disso, as lideranças inglesas mostram-se frias e acho que pouco se importam com
o fracasso do congresso. Ficaremos como ridículos perante a Europa? O que faremos?”

No seu retorno a Londres, Marx conseguiu que o congresso não se realizasse até
setembro, porém não acreditava em seu êxito, a tal extremo que em 23 de abril escreveu
para Engels:

“Daqui farei todo o possível para que o congresso seja bem sucedido, porém não
participarei dele. Dessa forma, evito toda responsabilidade pessoal.”

Em julho de 1866 estourou a guerra entre a Prússia e a Áustria que iria acabar com o
triunfo da última em Sadowa, o que ocasionaria a anexação de Hannover, Hesse-Nassau
e Frankfurt à Prússia, e também a criação da Confederação da Alemanha do Norte com
um parlamento (Reichstag) eleito pelo sufrágio universal. Assim que foi vista a
possibilidade de que estourasse o conflito, os estudantes socialistas franceses assinaram
manifesto direcionado aos estudantes da Alemanha, Áustria e Itália, denunciando o
absurdo “de se matarem uns aos outros sob o estúpido pretexto do interesse nacional e
da diferença de raças”. Em 10 de junho, Vermorel publicava em seu jornal o célebre
artigo “A Greve dos Povos Contra a Guerra”. No dia 17, a Internacional de Paris redigiu
seu manifesto, em que expressava a esperança de que os povos não permitissem que a
fumaça dos canhões os cegasse, e que ouvissem a voz da solidariedade e da justiça. O
manifesto anunciava a próxima abertura do congresso operário, “este congresso em que
os trabalhadores abordarão essas graves questões, que a guerra, com suas horríveis
práticas, não consegue resolver”. Enfim, em 1º de julho, Paul Lafargue na Rive Gauche
acusava a guerra de contra-revolução e atacava o nacionalismo.

O armistício de Nikolsburg foi realizado em 26 de julho e a hegemonia da Prússia ficou


consolidada.

Neste momento, a atitude de Karl Marx foi estranha e deve ser conhecida. Em 7 de
junho, ele escrevia para Engels:
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“Eis a guerra. Será um milagre ela não começar. Os prussianos vão sofrer as
conseqüências de suas fanfarronices. A escória proudhoniana prega, para os estudantes
de Paris, a paz, avalia a guerra um anacronismo, considera as nacionalidades como vãs
palavras e ataca Bismarck e Garibaldi. Como polêmica contra a patriotada, sua ação é
útil e explicável, porém como discípulos de Proudhon [...] são simplesmente grotescos.”

Em 20 de junho, Marx escreve novamente para Engels:

“Ontem houve uma discussão sobre a guerra no Conselho da Internacional. Esta


discussão tinha sido anunciada com antecedência e a sala estava lotada. Os italianos
tinham enviado seus delegados. O debate ficou estabelecido, como era natural, sobre a
questão das nacionalidades em geral e acerca da atitude, que sobre esse assunto,
deveríamos tomar. A continuação do debate ficou suspensa para a próxima terça-feira.
Os franceses, muito numerosos, deram rédea solta a sua cordial antipatia contra os
italianos. Os representantes (não operários) da Jovem França declararam que as
nacionalidades eram „preocupações arcaicas‟. Eles professam um stirnerianismo[5]
proudhoniano. Professam a doutrina de dissolver tudo em pequenos grupos, que irão se
unir novamente para formar „sociedades‟, mas não um Estado. Enquanto é realizada
essa „individualização‟ e o „mutualismo‟ que irá acompanhá-la, o curso da história deve
ser suspenso em todos os países e esperar até que os franceses amadureçam para uma
revolução social. Eles farão o ensaio na presença dos demais povos e estes, subjugados
pelo exemplo, irão imitá-los. Exatamente o mesmo que esperava Fourier de seu
falanstério modelo.”

“Os ingleses riram muito quando ao tomar a palavra eu lhes disse que o nosso amigo
Lafargue, que suprimiu as nacionalidades, tinha nos falado em francês, idioma que não
é entendido por nove de cada dez ouvintes, e eu lhes demonstrei que para ele, a negação
das nacionalidades não é outra coisa senão a absorção de todas por parte da nação-
modelo: a França.”

Na primeira quinzena de julho foram verificadas em Londres várias manifestações


contra a guerra. Sobre elas vamos citar um trecho característico de uma outra carta de
Marx, de 7 do mesmo mês:

“As manifestações operárias em Londres, verdadeiramente fabulosas, comparadas com


tudo aquilo que temos visto desde 1849 até agora, são obra exclusiva da Internacional.
Mr. Lucraft, por exemplo, que comandou uma delas na Trafalgar Square é membro do
nosso Conselho. Aqui se vê a diferença do que se consegue pelo método que consiste
em agir permanecendo nos bastidores, oculto aos olhos do público, e o procedimento
dos democratas que se colocam publicamente e não fazem nada.”

A Internacional parisiense tinha feito grandes progressos; já contava com mil e duzentos
filiados, entre os quais figuravam alguns notáveis da burguesia republicana, como o
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filantropo Julio Simon, o historiador Martin, o prouhoniano Chaudey e o excelente


Carlos Beslay, já com setenta anos de idade.

Durante esse tempo, Karl Marx, em Londres, redigia, em nome do Conselho Geral, um
informe que foi traduzido para o francês pelo operário Eugenio Dupont, que tinha sido
nomeado delegado da França, substituindo Le Lubez.

O Bureau de Paris enviou onze delegados para o Conselho de Genebra (Bourdon,


Carmelinat, Chemalé, Culetin, Fribourg, Guirad, Malon, Murat, Perrachon, Tolain e
Varlin); Lyon enviou quatro (Baudy, Honoré Richard, Schettel e Secretan); Rouen, um
(Emilio Aubry), e Neuville-sur-Saóne, um (Baudrand). O Congresso foi formado, além
destes dezessete delegados da França, por seis do Conselho Geral (Odger, Carter, Jung,
Eccarius, Cremer e Dupont); vinte delegados de quinze seções da Suíça (entre os quais
estavam o doutor Pierre Coullery – por Chaux-de-Fonds, Jacques Guillame – por Le
Locle, Adhemar Schwitzguebel – por Sonvillier, Cornaz – por Lausane, o francês
Dupleix, o polonês Card e o alemão Becker – por Genebra e Karl Burkly – por Zurique
e Wetzikon); três delegados de quatro seções da Alemanha (Moll – por Colônia e
Solingen, Muller – por Stuttgart e Butter – por Magdeburg). Também participaram
quatorze delegados de onze sociedades filiadas ao Congresso, mas que não pertenciam à
Internacional. A presidência do Congresso ficou com Jung, operário relojoeiro suíço,
nascido em Saint-Imier (cantão de Berna), estabelecido em Londres e que falava
francês, inglês e alemão.

O Congresso de Genebra discutiu, emendou e adotou definitivamente os estatutos


gerais, que foram votados em três línguas: francês, inglês e alemão; o texto francês
diferenciava-se em algo do inglês e do alemão, mas ninguém reparou nisso. O
Congresso completou os estatutos com um regulamento. O Congresso foi mantido em
Londres e composto pelos mesmos membros do Conselho provisório, exceto Vésinier e
Le Lubez que por solicitação dos parisienses foram excluídos.

Entre as disposições dos estatutos que originaram interessantes debates, deve-se


destacar o artigo que determinava as condições que eram necessárias para poder se
tornar membro da Associação. Na Conferência de 1865, os delegados parisienses
tinham insistido para que somente aqueles trabalhadores que não tivessem outros
recursos além de seu salário, pudessem fazer parte da Internacional; eles queriam
manter afastados aqueles que eram denominados “trabalhadores do pensamento”, ou
seja, os que exerciam profissões liberais: advogados, poetas, novelistas, médicos,
artistas, jornalistas. Ingleses, suíços e belgas tinham manifestado o desejo de que fossem
admitidos todos aqueles que solicitassem ingressar na associação. Ficou decidido,
finalmente, que cada seção teria a liberdade, sob sua responsabilidade, “de dar à palavra
„trabalhador‟ toda a extensão de que seja suscetível” e que a admissão de mulheres
ficaria também a cargo de cada grupo. Quando foi o momento de votar em Genebra o
artigo, de conformidade com este acordo, que dizia: “Qualquer um que adote e defenda
os princípios da Associação, pode ser recebido como membro”, os delegados
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parisienses voltaram a atacar: o que deveria ser entendido pela palavra trabalhador? Os
trabalhadores intelectuais deveriam ser admitidos? A segunda pergunta foi respondida
afirmativamente pelos delegados do Conselho Geral, mas os delegados parisienses
opuseram-se, afirmando que essa medida deixaria exposta a Associação ao perigo de
que fosse invadida pelos ambiciosos. Os delegados suíços e alemães protestaram
firmemente e o artigo foi votado.

Porém, quando foi discutido o regulamento (artigos adicionais aos estatutos) que
acabava de ser elaborado por uma comissão, originou-se um novo debate sobre o
mesmo assunto, em relação a um artigo que determinava que todo membro da
Associação podia ser eleito um delegado nos congressos. Tolain declara que se era
indiferente admitir como simples membro da Associação toda classe de cidadãos, não
era igual quando se tratava de escolher um delegado, pois a classe operária mantinha
uma luta sem trégua contra a classe burguesa e era indispensável que todos os homens,
encarregados de representar grupos de trabalhadores, fossem também operários.
Perrachón chegou a dizer que para a Associação seria funesto admitir como delegado
um cidadão que não fosse um trabalhador. Cremer ficou surpreso de novamente ser
apresentado para discussão esse assunto, e manifestou que entre os membros do
Conselho Central havia vários cidadãos que, sem exercer nenhum trabalho manual,
tinham dedicado todas suas energias à Associação, até o extremo, e que sem eles não
teria sido possível o estabelecimento da Internacional na Inglaterra, e citou como
exemplo Karl Marx, manifestando que ele tinha consagrado sua vida para a vitória da
classe operária. Fribourg disse que poderia chegar o dia em que o Congresso “operário”
fosse formado em sua maioria por economistas, patrões, jornalistas, advogados, uma
coisa ridícula, que aniquilaria a Associação. Carter, apoiando Cremer, acrescentou,
respondendo a Fribourg, que o cidadão Karl Marx, compreendendo a importância deste
primeiro Congresso, em que de fato, apenas deveria haver operários, tinha recusado ser
delegado quando lhe foi oferecido a oportunidade pelo Conselho Central, porém os
homens partidários da causa do proletariado eram tão escassos, que não deveriam ser
recusados. Também expôs que a pretendida ciência econômica burguesa, dando
prestígio à burguesia, mantém esta classe no poder e, portanto, os homens que se
ocuparam da questão econômica e que reconheceram a justiça da nossa causa, devem
ser admitidos em nossos congressos, para que ajudem a derrubar a falsa ciência
econômica. Tolain, voltando a tomar a palavra, disse: “Como operário, agradeço ao
cidadão Karl Marx por não ter aceitado a delegação que lhe foi oferecida. Fazendo isto,
o cidadão Marx quis demonstrar que os congressos operários não devem ser compostos
senão por trabalhadores manuais. Se admitirmos aqui homens que pertencem a outras
classes, não deixarão de dizer que o congresso não representa as aspirações das classes
operárias, que não é formado por trabalhadores e acho que é útil mostrar para o mundo
que estamos adiantados o suficiente para poder agir por nós mesmos”. A emenda de
Tolain, sobre o requisito de que ser operário manual era preciso para poder ser eleito
delegado, foi rejeitada por vinte e cinco votos contra vinte.

A opinião íntima de Marx sobre o Congresso de Genebra, pode ser vista na seguinte
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carta que ele escreveu em 9 de outubro para o seu amigo Dr. Kugelmann, jovem médico
judeu residente em Hamburgo:

“Eu tinha grandes inquietudes sobre o primeiro congresso, em Genebra, porém ele teve
mais sucesso do que eu imaginava. A impressão na França, Inglaterra e América foi
inesperada. Eu não consegui ir, e também não quis, porém fui eu que redigi o programa
dos delegados de Londres. Eu o delimitei expressamente aos extremos que permitissem
um acordo imediato e uma ação comum dos operários, e que pudessem dar força e
impulsão às necessidades da luta de classes e à organização dos operários. Os senhores
parisienses tinham a cabeça cheia da mais vazia fraseologia proudhoniana. Eles falam
em ciência e não sabem uma palavra de nada. Sob o pretexto de liberdade e de
antigovernamentalismo ou de individualismo anti-autoritário, esses senhores, que
durante 16 anos estão sob o mais abominável despotismo, predicam, na realidade, o
vulgar regime burguês, idealizado ao modo proudhoniano. Não há dúvidas de que
Proudhon fez muito mal. Sua aparente crítica e oposição aos utópicos seduziram
primeiro a „juventude brilhante‟ e depois os operários, sobretudo os de Paris. Estes
delegados parisienses, ignorantes, vaidosos, cheios de pretensões, charlatões e enfáticos,
por pouco não fazem fracassar tudo, tendo eles participado do Congresso em número
muito elevado.”

Nessa carta já podemos ver Marx retratado de corpo inteiro.

III. REGULAMENTO E COMISSÃO DO BUREAU DE PARIS (OUTUBRO DE


1866) / SEGUNDO CONGRESSO DA INTERNACIONAL EM LAUSANE /
CONGRESSO DA PAZ E LIBERDADE EM GENEBRA (SETEMBRO DE 1867)

Depois do Congresso de Genebra, o Bureau de Paris publicou um regulamento que


instituía uma comissão administrativa composta por quinze membros, eleitos por
escrutínio de lista, devendo ser escolhidos entre eles, três correspondentes, um caixa e
um secretário-arquivista. A duração das funções da comissão seria da data de um
congresso até a realização do seguinte. Uma vez eleita a comissão, os três
correspondentes foram Tolain, Fribourg e Varlin, como caixa foi escolhido Heligon e as
funções de secretário-arquivista foram divididas, sendo nomeado Bourdon como
arquivista e Chemalé, secretário-geral. Os outros nove membros foram: Camélinat,
Murat, Perrachon, Fournaise, Gauthier, Bellamy, Guiar, Delahaye e Delorme.

Alguns incidentes aconteceram no começo do ano 1867. Primeiro a greve dos operários
do bronze em Paris (fevereiro) que ocasionou a viagem até Londres de Tolain e
Fribourg com três delegados dos grevistas, para solicitar o apoio das trade-unions: o
apoio foi concedido. A luta acabou com a vitória dos operários, o que teve grande
repercussão. Em 26 de março aconteceram grandes rebeliões em Roubaix; milhares de
operários tecelões, furiosos, quebraram as máquinas e incendiaram as oficinas. A
comissão de Paris lançou um manifesto em que depois de falar do problema que origina
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o emprego das máquinas na indústria e de desaprovar a destruição dos instrumentos de


trabalho, proclamava sua solidariedade com os explorados, expunha suas justas
reclamações e pedia para eles a ajuda moral e material dos trabalhadores. A greve dos
mineradores de Fuveau também produziu as mesmas manifestações.

Ao mesmo tempo, começaram a circular ruídos de guerra na França e na Alemanha por


razão de Luxemburgo, e um manifesto sobre esse assunto foi enviado para Paris pelos
operários alemães. Em 28 de abril foi respondido pelo Bureau parisiense, sendo a
resposta traduzida em várias línguas. Nela, afirmava-se “a solidariedade universal e a
aliança indestrutível dos trabalhadores”. Um outro acontecimento importante daqueles
dias foi o atentado em Paris contra o czar Alexandre II feito pelo polonês Berezowski. O
czar tinha ido visitar a Exposição Universal, que fora inaugurada em 1º de abril.

A Internacional realizou em Lausane seu segundo congresso na primeira segunda-feira


de setembro. A democracia européia, por sua vez, organizava sob o apoio de Garibaldi,
Edgar Quinet, Bakunin e Simon (de Tréveris) um Congresso da Paz e Liberdade que
deveria iniciar-se em 9 de setembro.

No congresso da Internacional em Lausane, a França esteve representada de maneira


mais completa. Paris enviou nove delegados: Tolain, Murat, Fribourg, Chemalé, Marly
(impressores de tecidos), Garbe (latoeiro), Pioley (mecânico), Reymond (litógrafo) e
Beaumont (cinzelador). Lyon era representada pelo mecânico Schettel e por Palix;
Neuville-sus-Saóne, por Rubaud (impressor de tecidos); Villefranche, por Chassin
(vinhateiro); Vienne, por Aillond. Marselha, Fuveau, Bordeaux, Rouen, Caen e Conde-
sur-Noireau enviaram como delegados Vasseur, Vézinaud, Aubry e Longuet. O
Conselho Geral enviou Dupont, quem presidiu o Congresso, Eccarius, Lessner e Carter.
Odger e Cremer chegaram quando as sessões já estavam para terminar. A Inglaterra
também enviou Watson, presidente da National Reform League e Swan, de Coventry.
Entre todos os delegados, também devemos citar os seguintes: de Paepe, de Bruxelas;
Dr. Kugelmann, de Hannover; o célebre Büchner, de Darmstadt; Dr. Coullery, de
Chaux-de-Fonds; James Guillaume, do Locle, que foi secretário e redigiu as atas do
Congresso; Perron (genebrino), Dupleix (francês), Becker, alemão, Karl Burkly, de
Zurique e os italianos Stampa e Tanari.

Esse congresso, animado por um espírito mais revolucionário do que o realizado no ano
anterior, produziu, sobre a maioria dos que participaram, uma impressão profunda; eles
sentiram despertar dentro de si, em contato com os delegados do proletariado dos
diversos países da Europa, uma vida nova e “vislumbraram pela primeira vez, em sua
realidade humana e científica, as grandiosas perspectivas da revolução social
universal.”[6]

A principal questão que foi discutida em Lausane foi a da propriedade. De Paepe expôs
a teoria da propriedade coletiva e foi combatido por Longuet, Chemalé e Coullery,
ficando suspendida a discussão do assunto até o próximo congresso, que seria realizado
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em Bruxelas. O Conselho Geral foi reeleito, sendo mantida a sua residência em


Londres, como única cidade que oferecia as condições indispensáveis.

O congresso da Internacional tinha convidado o Congresso da Paz que se realizava em


Genebra, e como resposta ao convite foi declarado que a causa principal das guerras era
a falta de equilíbrio econômico e que para suprimi-las não basta licenciar os exércitos,
mas modificar a organização social no sentido de uma distribuição mais eqüitativa da
produção. Uma delegação composta por três membros foi encarregada de apresentar
para o Congresso da Paz esta resolução e de manifestar que o congresso da
Internacional não iria aderir ao da Paz, caso não fossem aceitos os principais
enunciados. Nesse congresso de Lausane, os delegados de Paris desempenharam o papel
principal. Assim foi comentado por Vermorel no Courrier Français comemorando o
caráter sério destes operários, que não faziam discursos e que discutiam com
inteligência as mais difíceis questões econômicas.

Este elogio aos franceses irritou Marx; este havia passado a metade do verão corrigindo
as provas do primeiro volume do seu Capital, que estava sendo impresso na Alemanha.
Absorto com o seu livro, não tinha feito quaisquer intervenções nos assuntos da
Internacional durante o ano todo. Porém, ele já tinha sua revanche; os franceses que
aguardassem. É isso que ele anuncia numa carta para Engels de 11 de setembro:

“Irei pessoalmente ao próximo congresso de Bruxelas para dar o golpe fatal naqueles
burros proudhonianos. Acertei tudo diplomaticamente; eu não queria aparecer
pessoalmente antes de meu livro ter sido publicado e da Internacional ter se enraizado.
Além disso, no relatório oficial do Conselho Geral darei um jeito neles. Enquanto isso, a
Associação tem feito grandes progressos. O miserável Star, que queria nos ignorar por
completo, declarou ontem em sua matéria principal, que nós temos mais importância do
que o Congresso da Paz. Schulze-Delitzch não conseguiu impedir que sua
Arbeiterverein se juntasse a nós. Alguns cachorros sarnentos (Schweinsshunde) entre as
trade-unions inglesas, que declaravam que íamos longe demais, também se uniram a
nós. Além do Courrier Français, deram conta do Congresso, La Liberté, de Girardin, Le
Siecle, Le Monde, La Gazette de France, etc. Les choses marchent. E quando a
revolução chegar, pois está mais próxima do que parece, teremos em nossas mãos esse
poderoso instrumento. Compare esse resultado com o pouco que durante trinta anos
conseguiu adiantar Mazzini. E nós fizemos tudo isso sem dinheiro e tendo contra as
intrigas dos proudhonianos de Paris, as de Mazzini na Itália e Odger, Cremer e Potter
em Londres, que estão com inveja. Acrescente a isso que na Alemanha a Schuze-
Delitzsch e os lassalianos são contra nós. Podemos nos sentir satisfeitos!”

No mesmo dia, Engels escrevia para Marx acerca das correspondências direcionadas por
Eccarius ao Times, sobre o Congresso, correspondências nas quais o discípulo de Marx
tinha tentado ridicularizar os delegados de Paris:

“É preciso manter em segredo o nome das correspondências com o Times, porque se


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isso viesse à tona poderia causar um enorme dano para Eccarius. Além disso, antes de
escrever deveria se perguntar até que ponto a redação poderia explorar suas zombarias
para colocar o congresso no ridículo, e não alguns dos franceses.”

“Posto que você vem mantendo relações com Vermorel, daria para você conseguir que
ele não falasse tantas bobagens da Alemanha? É peculiar pedir que Napoleão III torne-
se liberal, burguesamente liberal, e que declare a guerra contra a Alemanha para libertá-
la da tirania de Bismarck! Esses crapauds que, mesmo no caso de fomentarem uma
revolução seriam obrigados a contar com a Alemanha, imaginam que bastaria expor um
pouco de liberalismo para que a França conseguisse desempenhar seu antigo papel.
Considero muito importante, justamente para o caso de acontecer uma revolução, que
esses senhores acostumem-se a nos tratar de uma outra maneira.”

No dia seguinte, Marx respondeu a Engels dessa maneira:

“Sou completamente da sua opinião, acerca daquilo que você me diz de Eccarius. Para
um operário de espírito crítico como ele, está faltando a destreza diplomática... Porém,
isso não vai prejudica-lo, pois as zombarias de Eccarius serão tomadas como do Times.”

“Esses feignants suíço-franceses, que estavam em grande número no congresso, são


aqueles que fizeram o jogo para os franceses faladores, graças às bobagens do velho
Becker... Mas isso não importa. O essencial não é o que foi falado no congresso, mas o
fato que foi verificado. Em nosso relatório geral já acertaremos esses safados de Paris...
No ano que vem, será feito o possível para levar vinte ingleses e trinta alemães para
Bruxelas. Quanto aos belgas, como não pode haver mais do que um delegado por cada
quinhentos membros, não serão muito numerosos. Além do mais, eles não me parecem
muito dispostos a se rebelar contra os parisienses.”

“Nota bene – O pior é que não temos ninguém em Paris que possa colocar-se em relação
com as seções francesas que são hostis aos proudhonianos. Se Dupont pudesse passar
algumas semanas em Paris, tudo se acertaria.”

A partir deste momento Marx quer tornar-se um ditador. Ele já considera a Internacional
como uma coisa própria e tem o cinismo de dizer para Engels: “Na próxima revolução
teremos (ou seja, eu e você) este poderoso instrumento em nossas mãos”.

Quando depois da guerra de 1870 homens clarividentes denunciaram o


“pangermanismo” de Marx e do Conselho Geral, Marx vangloriou-se disso. “Pois bem,
sim” – falava ele –, “eu sou alemão e um bom alemão; para mim, a ciência alemã
impôs-se no Conselho Geral: felicitem-se por isso!”. De fato, para o seu amigo Bolte, de
Nova Iorque, ele escreveu em 27 de novembro de 1871:

“Pretende-se que no Congresso Geral reine o pangermanismo e o bismarckismo. O fato


é que eu tenho a imperdoável culpa de ser alemão e exercer sobre o Conselho Geral uma
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influência intelectual decisiva. Reparem que no conselho o elemento alemão é,


numericamente, três vezes menor do que o elemento francês e inglês. Nosso crime
consiste, portanto, em que os elementos francês e inglês, em matéria de teoria, fiquem
dominados pelo elemento alemão; essa dominação, que é da ciência alemã, é suportada
muito bem por eles e até a consideram indispensável.”

Em 1880, quando se funde na França o “Partido Operário” de Guesde, Malon, Lafargue,


etc., Marx comprova com orgulho que o nascimento desse organismo político deve-se à
influência alemã. Em 5 de novembro de 1880 ele escreve o seguinte para Sorge:

“Malon viu-se obrigado a converter-se ao „socialismo moderno cientifico‟, ou seja, ao


socialismo alemão... A Emancipação, que começou a ser publicada em Lyon, será o
órgão do „Partido Operário‟, que se constituiu sobre a base do socialismo alemão...
Longuet tem trabalhado tão bem que conseguiu que Clemenceau esteja conosco,
conforme vimos em seu recente discurso pronunciado em Marselha... Não é necessário
que eu diga para você, pois você conhece a patriotada francesa, que os fios ocultos por
meio dos quais os leaders, de Guesde e Malon até Clemenceau, têm se mexido, devem
ficar entre nous. Nada, quando alguém quer agir para os senhores franceses, deve ser
feito anonimamente para não ferir o sentimento nacional.”

Como é edificante tudo isto!

No Congresso da Paz, em Genebra, a declaração da Internacional foi lida na tribuna por


James Guillaume na primeira sessão (segunda-feira 9 de setembro) e foi calorosamente
aplaudida por uma parte da assembléia. A leitura provocou o protesto de alguns
economistas: Molinari, Dameth, Cherbuliez, etc., protesto que foi lido no dia seguinte.
Naquele mesmo dia, Dupont, presidente do Congresso de Lausane, pronunciou um
enérgico discurso, cuja conclusão era a seguinte: “vocês acreditam que quando os
exércitos se dissolverem e se tornarem milícias nacionais, nós teremos a paz perpétua?
Não, cidadãos, a revolução de junho de 1848 está ali para responder essa pergunta...
Para estabelecer a paz perpétua é preciso aniquilar as leis que oprimem o trabalho,
aniquilar todos os privilégios, e fazer de todos os cidadãos uma só classe de
trabalhadores: em uma palavra, aceitar a revolução social com todas as conseqüências”.
Garibaldi, no dia 11, em uma conversa particular que teve com alguns delegados da
Internacional, fez esta declaração: “Concordo com vocês. Guerra às três tiranias:
política, religiosa e social. Os princípios de vocês são os meus”. Bakunin, que pela
primeira vez desde sua fuga da Sibéria em 1861, tinha a palavra em uma assembléia
pública, disse no dia 10 na tribuna: “A Rússia não se levantará senão aceitando os
princípios do federalismo e do socialismo apesar de M. de Molinari, que protestou
contra os socialistas”, e no dia seguinte Longuet, expondo por sua vez as idéias do
socialismo federalista, dizia: “Ontem, um exilado da Rússia do czar, um grande cidadão
da Rússia futura, Bakunin, expressava estas idéias com a autoridade do homem de ação
e do pensador”. Finalmente, no dia 12, Paepe lia um discurso em que ao declarar-se
republicano e federalista, acrescentava: “Porém, não queremos uma república nominal e
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uma federação ilusória. Queremos a república nos fatos, e sobretudo, nos fatos
econômicos...; queremos o federalismo não somente na política, mas também na
economia social”. O proudhoniano Chaudey, que teria preferido uma aproximação entre
a democracia burguesa e os trabalhadores socialistas, tentou num hábil discurso indicar
as condições de uma transação, e o organizador do congresso, Emilio Acollas, homem
sincero, distinto jurisconsulto, acreditou que a harmonia desejada já tinha sido
concretizada, pois escreveu o seguinte no Temps: “A política e a economia
reconciliaram-se na justiça”. Isto não era mais do que uma ilusão. No ano seguinte foi
necessário comprovar que entre o socialismo e a democracia burguesa havia um abismo
que nunca desapareceria.

IV. A INTERNACIONAL PERSEGUIDA EM PARIS (DEZEMBRO 1867) /


PROCESSO DA PRIMEIRA E DA SEGUNDA COMISSÃO PARISIENSE E
DISSOLUÇÃO DO BUREAU DE PARIS (MARÇO-JUNHO 1868) / TERCEIRO
CONGRESSO DA INTERNACIONAL EM BRUXELAS: SEGUNDO
CONGRESSO DA PAZ E DA LIBERDADE EM BERNA (SETEMBRO 1868)

O Bureau de Paris, conforme seu regulamento, renovou sua comissão administrativa


depois da realização do Congresso de Lausane. Eis os nomes dos quinze membros da
nova comissão: Chemalé, Tolain, Heligon, Camélinat, Hurat, Perrachon, Fournaise,
Gauthier, Bellamy, Guiard, Delahaye, Delorme, antigos membros reeleitos; e três
novos: Dauthier, Gérardin e Bastien. Fribourg, Varlin e Bourdon já não fazem parte da
comissão. Os três correspondentes agora são Murat, Camélinat e Gérandin.

Os acontecimentos na Itália ocupavam a atenção pública. Garibaldi, no Congresso da


Paz, tinha pedido que o Papa fosse destronado; tendo entrado na Itália disposto a
executar essa sentença, começou a efetuar publicamente o recrutamento de voluntários e
o governo italiano o prendeu em 24 de setembro, enviando-o para a ilha de Caprera, da
qual fugiu alguns dias depois. Detido novamente em Livorna em 3 de outubro, voltou a
escapar, indo para Florença no dia 21, onde iria tomar o comando de suas hostes para se
dirigirem a Roma. Napoleão III envia de Toulon tropas francesas a mando do general de
Failly para defender o Papa contra os garibaldistas. O povo parisiense, ao saber desta
notícia, começou a agitar-se, e em 4 de novembro uma grande manifestação foi
realizada no boulevard Bonne-Nouvelle, da qual participaram numerosos membros da
Internacional. Na véspera, em Mentana, os fuzis franceses tinham dizimado os heróicos
voluntários garibaldinos, e o próprio Garibaldi, detido pelas autoridades italianas após o
combate, foi preso e enviado novamente para Caprera.

O governo francês, que tinha tolerado a Internacional desde 1865, começou a inquietar-
se devido às tendências revolucionárias da associação, manifestadas publicamente pela
maioria dos seus delegados em Lausane e Genebra, e resolveu intervir. Em 30 de
dezembro foram realizadas visitas domiciliares nas casas de Tolain, Murat, Heligon e
Chemalé e foi aberta instrução. Ameaçados como representantes de uma sociedade não
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autorizada e como diretores de uma associação secreta, os membros da comissão


convidaram, em 9 de fevereiro de 1868, os filiados do Bureau de Paris para que
nomeassem uma nova comissão. Em 1º de março, ao publicar os nomes dos doze
candidatos, deram a conhecer que a comissão que iria ser eleita ficaria composta por
nove membros. Os votos foram recebidos no domicílio social até o dia 8 de março, e o
escrutínio tirou das urnas os seguintes nomes: Bourdon, Varlin, Malon, Combault,
Mollin, Landrin, Humbert e Granjón. Os três correspondentes foram Malon, Varlin e
Landrin, e como caixa foi nomeado Granjón. O Bureau de Paris transladou-se para
outro endereço, na rua Chapon.

Dois dias antes da nomeação desta nova comissão, os quinze membros da antiga
compareceram (em 6 de março) perante o Tribunal Correcional sob a acusação de
pertencerem a uma sociedade não autorizada pela lei. Em 20 de março foram
condenados a pagar uma multa de cem francos cada um e, além disso, foi declarada
dissolvida a “Associação Internacional dos Trabalhadores estabelecida em Paris com o
nome de Bureau Parisién”. Tendo sido apelada a sentença, a audiência imperial
confirmou, em 29 de abril, o julgamento do tribunal correcional.

Enquanto isso, a comissão eleita em 8 de março entendia que devia ser continuada a
obra de seus predecessores e encarregou-se, em primeiro lugar, de tentar restabelecer a
lista dos filiados, listas que tinham ficado em poder da polícia. Em 27 de março, a
comissão recebia de Genebra uma carta destinada a Varlin, solicitando apoio para a
greve de operários que tinha acabado de estourar nessa cidade. A comissão não vacilou
um instante: através da imprensa fez um chamado à solidariedade dos trabalhadores da
França, e logo recebeu importantes quantias para os grevistas. Um delegado de Genebra
chegou a Paris, de onde se dirigiu para Londres e lá solicitou o apoio das trade-unions,
sem poder conseguir um auxílio efetivo. Os tribunais imperiais continuavam
funcionando, pois se realizaram registros na Rua Chapon e na casa de Varlin, e tentou-
se processar os audazes que não se deixaram intimidar pela condenação anterior de seus
companheiros.

Em 22 de maio, os nove membros da segunda comissão compareceram perante o sexto


tribunal correcional: Varlin apresentou a defesa de todos e o tribunal, depois de ter
pronunciado novamente a dissolução da “Associação Internacional dos Trabalhadores
estabelecida com o nome de Bureau de Paris e domiciliada nesta cidade”, condenou os
acusados a três meses de prisão e cem francos de multa.

Os condenados apelaram ao tribunal imperial em 19 de junho, porém a condenação em


primeira instância foi confirmada no dia 24 do mesmo mês. Os nove membros da
comissão dissolvida ingressaram na prisão de Sainte-Pélagie em 15 de junho para
começar a cumprir a pena.

A Internacional, portanto, tinha cessado de ter existência legal em Paris; contudo, seus
filiados, individualmente, puderam continuar sendo membros da Associação como
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integrantes de uma sociedade estrangeira cujo domicílio ficava em Londres.

Porém, tinha chegado o momento em que, sob a impulsão do crescente


descontentamento da classe operária, e dos ataques cada vez mais freqüentes da
oposição republicana, a construção imperial começaria a vacilar. Uma nova lei sobre a
imprensa (11 de maio) deu certa liberdade para os jornalistas que logo a aproveitaram.
Em 30 de maio apareceu o primeiro número do semanário de Rochefort, a Lanterner,
cuja influência sobre a opinião foi enorme, e em 2 de junho Delescluze começava a
publicar Réveil. Uma outra lei (6 de junho) autorizou, sob certas condições, as reuniões
públicas. Em 18 de junho começa no Tivoli Vauxhall uma primeira série de reuniões
que depois continuou na Redoute (Rua J. J. Rousseau); outros salões foram abertos logo
depois, o Pré-au-Clercs, a Gaité-Montparnasse, a Vieux-Chéne (bairro Mouffetard), a
sala Moliere (bairro Saint-Martin), as Folies-Belleville e a sala Favié (Belleville), etc.;
os oradores que se apresentavam nestas assembléias, procediam alguns de 1848, como
Gustave Lefrançais, Briosne, Milliére, J. A. Langlois, Ch. Beslay, etc.; outros eram
membros da Internacional, como Chemalé, Tolain, Murat, Caméliat, Combault, etc., ou
blanquistas, como Jaclard, Cournet, Raoul, Rigault, Ranvier.

Bakunin, após a sua aparição em setembro de 1867 no Congresso da Paz, não tinha
regressado para a Itália. Ele tinha se estabelecido perto de Vevey, na Suíça, era membro
do Comitê Central da Liga da Paz e da Liberdade, e vangloriava-se com a esperança de
levar essa liga para o socialismo. No começo de julho de 1868 tinha conseguido que,
por meio do comitê, fosse votada uma declaração de princípios que, entre outras coisas,
enunciava a necessidade de “mudar radicalmente o sistema econômico atual”, para
atingir “a emancipação das classes operárias e a abolição do proletariado”. Em julho ele
conseguiu ser recebido como membro da seção central da Internacional de Genebra, e
chegando a um acordo com internacionalistas desta cidade, em particular com o alemão
Becker e o genebrino Perron, formou o projeto de uma aproximação entre a Liga da Paz
e a Associação Internacional dos Trabalhadores. Para tanto, fez decidir, no Comitê
Central da Liga que, através de seu presidente, seria encaminhado um convite ao
congresso geral da Internacional, que iria reunir-se em Bruxelas, no domingo 6 de
setembro, para enviar delegados ao segundo Congresso da Paz, de Berna. A Marx não
agradaram essas resoluções, pensou que fosse uma intriga de Bakunin para apoderar-se
da direção da Internacional e, desde esse momento, colocou-se em campanha contra o
revolucionário russo, como se verá mais à frente.

Certo número de sociedades operárias de Paris havia resolvido ter representação no


Congresso de Bruxelas. A Internacional, por outro lado, possuía em diferentes cidades
da França, como Rouen, Lyon e Marselha, grupos que não tinham sido perseguidos pelo
governo e que decidiram igualmente enviar delegados ao congresso. A perspectiva de
uma grande participação da França no congresso não era agradável para Marx, que
continuava imaginando que existiam intrigas para mudar o domicílio do Conselho Geral
e acreditava que um projeto havia sido feito pelos belgas, a fim de que ele fosse
transferido para Bruxelas. Em sua correspondência com Engels, encontra-se o eco
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dessas preocupações; em 29 de agosto ele escreve para comemorar que os membros da


comissão parisiense estão presos e não podem participar do congresso:

“Afortunadamente nossos velhos conhecidos de Paris estão trancados. O comitê


parisiense não enviará para Bruxelas mais do que um só delegado, porém os diferentes
grêmios enviarão oito ou nove.”

E no dia 12, ele escreve:

“O congresso, afortunadamente, termina amanhã. Tolain e outros parisienses querem


transferir o Conselho Geral para Bruxelas. Eles têm ciúmes de Londres. Contudo, um
grande progresso tem acontecido: os bravos belgas e os franceses, esses proudhonianos
que em Genebra e Lausane tinham declamado dogmaticamente contra as trade-unions,
agora são os mais fanáticos partidários delas. Os bravos belgas, apesar de toda sua
fanfarronice, não tinham previsto nada, tanto é assim que o correspondente do Daily
News procurou inutilmente durante três dias o local do congresso, e finalmente
conseguiu encontrá-lo pelo fato de ter achado, por acaso, Jung e Stepney (delegados
ingleses).”

Paris enviou treze delegados para Bruxelas: Tolain, Murat, Theisz, Roussel, Durand,
Pindy, Ansel, Delacour, Dauthier, Dosbourg, Flahaut, Tartaret e Henry. Além deles,
havia 5 delegados de outras partes da França: Alejandro Lemonnier, por Marselha;
Aimé Grinand, por Lyon; Albert Richard, por Neuville-sur-Saóne; Emilio Aubry, por
Rouen e Longuet, por Caen.

Da Inglaterra chegaram sete membros do Conselho Geral: Lucraft, Shaw e Cowell


Stepney, ingleses; Eccarius e Lessner, alemães; Dupont, francês; Jung, suíço; e um
delegado do ramo francês de Lourdes, Matens. A Alemanha enviou quatro delegados, a
eles somou-se um alemão que chegou de Genebra, Becker. Também participaram
cinqüenta e seis belgas, sete suíços-franceses e um espanhol, Marsal Anglora, mecânico
de Barcelona que representava a “Legião Ibérica do Trabalho”. O congresso foi
presidido por Jung e Dupont.

Sobre a questão da propriedade territorial, a maioria do congresso mostrou-se partidária


da propriedade coletiva da terra, mas por causa do grande número de abstenções, ficou
decidido que a questão seria estudada para que pudesse aparecer na ordem do dia do
congresso, que seria realizado no ano seguinte.

Acerca das máquinas, todos os delegados foram unânimes em declarar que deveriam
pertencer aos trabalhadores. Sobre a questão da guerra, o congresso, após ouvir um
relatório de Longuet, votou uma resolução que, entre outras coisas, dizia: “O Congresso
recomenda para os trabalhadores, sobretudo, que entrem em greve assim que a guerra
começar em seus respectivos países”. Em sua carta a Engels de 16 de setembro, Marx
caçoa desta resolução, qualificando-a de “bobagem belga”.
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Na última sessão do Congresso, Dupont, presidente, pronunciou um discurso que


finalizava com estas frases:

“Os clericais falam de nós: „Vão nesse congresso; declaram que não querem governos,
nem exércitos, nem religião‟. E eles dizem a verdade: nós não queremos governos,
porque os governos nos oprimem com impostos; nós não queremos exércitos, porque os
exércitos nos exterminam, e nós não queremos religião, porque as religiões afogam a
inteligência.”

O convite dirigido ao congresso da Internacional, em nome do comitê central da Liga da


Paz, pelo presidente deste comitê, Gustave Vogt, dizia que a liga queria “expressar sua
profunda simpatia e transmitir seus mais fervorosos desejos pelo sucesso da reforma
social, fim elevado para o qual tendia a Associação Internacional dos Trabalhadores”, e
acrescentava: “tenhamos valor, amigos, e todos juntos quebremos as barreiras que as
preocupações e instituições injustas ergueram entre as diversas partes do corpo social,
como as barreiras de ódio, em cujo nome os povos, formados para se respeitarem e para
se amarem mutuamente, têm se jogado uns sobre outros”. Desta vez, a maioria dos
delegados da Internacional opinou como os representantes do Conselho Geral de
Londres, que, inspirados por Karl Marx manifestaram que a Liga da Paz não tinha razão
de ser, assim, a Internacional, e como conseqüência o Congresso de Bruxelas, mesmo
com a oposição de uma minoria, votou uma resolução convidando a Liga da Paz para
que se unisse à Internacional. Unir-se à Internacional é o que já tinha feito Bakunin por
conta própria desde o mês de julho. Os membros da comissão parisiense, detidos na
prisão de Saint-Pelagie, Varlin, Malon, Combault, Landrin, Mollin, Granjón e Humbert,
opinaram com a minoria de Bruxelas e acreditaram que era seu dever protestar
publicamente; foi assim que enviaram ao Congresso de Berna um manifesto concebido
nestes termos:

“Cidadãos: vista a resolução tomada pelo Congresso de Bruxelas relativa à Liga da Paz
e da Liberdade, os que assinam, membros da Associação Internacional, acreditam:

1º - Que do ponto de vista dos princípios que servem de base para a Associação
Internacional, os delegados enviados ao congresso para deliberarem sobre determinada
ordem do dia, não tinham autorização para tomar uma resolução desta importância sem
consultarem seus grupos.

2º - Que do ponto de vista da liberdade, cuja conquista perseguimos, o direito de


considerar-se a única expressão das aspirações de uma época, não pode pertencer a
nenhuma associação isolada.

Portanto, é com prazer que reconhecemos a utilidade da Liga da Paz e da Liberdade,


como a da Associação Internacional, e acreditamos que a diversidade dos respectivos
elementos que as compõem, são contrários a sua fusão. Ao mesmo tempo, não
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aprovamos o convite dirigido à Liga pelos membros do Conselho de Bruxelas, para que
esta seja dissolvida; esta determinação não pode obrigar ninguém além de seus autores.

Aproveitamos esta ocasião para enviar-lhes a expressão de nossa simpatia.”

Em Berna, após um debate sobre o socialismo, em que a maioria tinha recusado uma
proposta apresentada por Bakunin, a minoria dos delegados, composta de 18 membros,
separou-se da liga e fundou, em 25 de setembro, a Aliança Internacional da Democracia
Socialista, declarando que se constituía como ramo da Associação Internacional dos
Trabalhadores, cujos estatutos aceitava. Essa minoria acreditava estar respondendo,
desse modo, ao convite feito pelo Congresso de Bruxelas.

V. GRANDES PROGRESSOS DA INTERNACIONAL / QUARTO


CONGRESSO, BASILÉIA (SETEMBRO 1869)

Os membros da segunda Comissão de Paris entraram na prisão de Saint-Pélagie para


cumprir pena em 15 de julho de 1868, saindo de lá em 15 de outubro. Um deles, Malon,
pouco tempo depois, fez uma viagem para a Suíça e durante essa viagem tornou-se
membro de uma sociedade secreta fundada em 1864 por Bakunin e alguns amigos. A
sociedade chamava-se Fraternidade Internacional e dela faziam parte na França, Élie e
Élisée Reclus, Aristides Rey e Alfredo Naquet. A participação de Malon naquela
sociedade secreta durou pouco tempo, pois a associação dissolveu-se em fevereiro de
1869, como resultado de um conflito entre alguns de seus membros. Uma nova
organização secreta foi formada imediatamente pelos primeiros fundadores da
sociedade dissolvida, Bakunin, Fanelli e Friscia; os irmãos Reclus não fizeram parte
dela, nem Perron, Joubovsky e Mroczkowsky, que tinham pertencido à Fraternidade;
mas, por outro lado, James Guillaume, Schwitzguebel, Varlin, Keller, Robin, Palix,
Sentiñón e Farga-Pellicer foram membros durante o ano 1869.

A casa de propaganda criada em Paris, em 1865, na rua de Gravilliers, já não existia,


mas o trabalho de difusão das idéias, por um lado, e o da organização operária, por
outro, não se detinha e ia aumentando. No bojo das sociedades de resistência,
organizadores como Varlin, Theisz, Pindy, Camelinat e Murat desenvolviam a maior
parte de sua silenciosa atividade, e a propaganda das idéias fazia-se agora nas reuniões
públicas, com um êxito que animava mesmo aqueles que a realizavam. Varlin,
Combault, Bourdon e Malon aceitaram colaborar em um periódico semanal que foi
fundado em Genebra em 1868, L‟Egalité, órgão da federação das seções suíço-francesas
da Internacional. Bakunin, Perrón e J. Guillaume foram seus principais redatores e
também colaboraram com ele de Paepe, Eccarius, Becker e mais adiante Robin. Em
uma das primeiras correspondências enviadas de Paris ao periódico, Combault falava do
movimento de reuniões públicas e, repetindo a frase dita em uma destas reuniões,
declarava que “a Associação Internacional dos Trabalhadores nunca havia estado tão
bem na França como depois de sua dissolução”. Entre outras provas daquilo que dizia,
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ele citava o fato de que, tendo iniciado uma greve na Basiléia em novembro de 1868, foi
suficiente que um membro da Internacional, Heligon, tivesse falado da greve em uma
reunião pública, para que todos os oradores tivessem a honra de narrar os sucessos da
Basiléia em todas as reuniões, o que originava contribuições e assinaturas em favor dos
grevistas.

“A dissolução do Bureau de Paris, agregava Combault, teve como resultado, ao


dispensar um grupo de afiliados regulares composto de algumas centenas de membros, a
ligação – em princípios e de fato – de tudo o que pensa e faz a população trabalhadora
de Paris, ainda que irregularmente.”

Como a ousadia dos oradores aumentava, o governo preocupou-se e tentou processar os


mais violentos. Na mesma correspondência que falamos, Combault escrevia:

“As perseguições multiplicam-se, as condenações são cada vez maiores; três e seis
meses de prisão é a pena ordinária que se aplica aos oradores. Nosso amigo Briosne, um
dos oradores mais capaz e mais estimado, acaba de ser condenado a um ano.”

Em outra correspondência de Paris no mesmo periódico (número de 3 de abril),


provavelmente escrita por Varlin, lemos:

“Os oito meses seguidos de discussões nas reuniões públicas fizeram ver que a maioria
dos operários reformadores é comunista. A palavra comunismo levanta tanto ódio no
campo dos conservadores como nas vésperas das jornadas de junho. Bonapartistas,
orleanistas, clericais e liberais unem-se para protestar com indignação... A grande
maioria dos oradores das reuniões públicas está ameaçada de prisão, sobretudo os que
proclamam o comunismo.”

Em 1869 deveria verificar-se a renovação do corpo legislativo e Paris preparava-se para


as eleições. Não é nossa intenção traçar aqui a história da luta eleitoral. É sabido que,
em novembro de 1868, o processo contra alguns periódicos que coletavam assinaturas
para elevar um monumento ao representante Baudin fez com que o nome de Gambetta
saísse da obscuridade, e a opinião pública designou-o, em seguida, como o candidato
por excelência das reivindicações democráticas; ao seu lado Rochefort, Emilio Ollivier
e o velho Raspali foram os candidatos favoritos do povo. Em uma correspondência
enviada ao L‟Egalité de Genebra, Varlin explicava a atitude que os socialistas
parisienses haviam tomado na luta eleitoral. Deste modo,

“O partido socialista não apresentou candidato para as eleições gerais, mas os oradores
socialistas comprometeram os candidatos radicais para que defendessem os interesses
do povo.”

“As eleições aconteceram nos dias 23 e 24 de maio; 92 opositores ao império foram


eleitos: Gambetta, em Paris e Marselha; Bancel, em Paris e Lyon; Rochefort fracassou.”
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Na classe operária as reivindicações expressavam-se por meio de greves, as de Genebra


(março-abril), Lausane (maio) e Bélgica (abril) tiveram grande repercussão em toda a
nação francesa. Em junho, os mineiros de Saint-Etienne, de Rive-de-Gier e de Firminy
declararam-se em greve; no dia 17 houve um sangrento choque entre a tropa e a
multidão exasperada que deixou um significativo número de mortos e feridos.

Esta matança impressionou profundamente a opinião pública e avivou os ódios contra o


governo imperial. Em julho, as operárias da indústria da seda de Lyon, em número de
8000, também se declararam em greve; sua enérgica atitude e as ajudas que chegaram
de todas as partes fizeram com que os patrões cedessem.

O congresso geral da Internacional deveria ocorrer na Basiléia no mês de setembro. As


sentenças dos tribunais não haviam dissolvido mais do que o Bureau de Paris; as seções
de províncias, por uma falta de lógica que demonstra a incoerência dos magistrados
bonapartistas, não haviam sido perseguidas, e, além disso, o direito de ser membro
individualmente da Internacional não havia sido negado aos que se afiliavam
diretamente em Londres, ou por meio de um correspondente do Conselho Geral
residente em Paris.

A sociedade de encadernadores e encadernadoras de Paris tinha se constituído


publicamente em seção da Internacional e não tinha sido perseguida. Em maio de 1869,
um manifesto assinado pelo seu presidente Varlin, compromete as outras sociedades
operárias de Paris a serem representadas no Congresso da Basiléia.

Além disso, várias sociedades operárias parisienses desejavam constituir-se em um


grupo de sindicatos, em uma câmara federal de sociedades operárias. Para tanto, foi
elaborado um projeto, datado de 3 de março de 1869 e assinado por Drouchon,
mecânico; Solideau, impressor e Theisz, cinzelador. Apresentado o projeto de 3 de
março em uma reunião de delegados dos diversos grupos corporativos, ele foi aprovado.
Uma segunda reunião aconteceu em 20 de maio, porém depois dessa data as autoridades
proibiram todas as reuniões. Os delegados de trinta sociedades operárias encaminharam
para o chefe de polícia, em 16 de julho, uma carta pedindo explicações; o chefe não
respondeu e então, em 23 de julho, escreveram para o Ministro do Interior, o que
também não obteve resultado. Em razão disto, perto do final do mês de agosto, as
sociedades operárias lançaram um enérgico manifesto. O manifesto dizia:

“Viver sob esta tutela é indigno de nós. Não podemos sofrer por mais tempo esta
situação, e portanto, convencidos de que ninguém pode limitar o círculo de nossos
estudos e de nossa ação, nós, delegados das sociedades operárias de Paris pedimos,
como um direito primordial, inalienável, o direito de reunião e de associação sem
restrição alguma, e nos declaramos resolvidos a prosseguir, por todos os meios a nosso
alcance, a discussão do projeto dos estatutos de nossa federação.”
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O Congresso da Basiléia foi realizado de domingo, 5 de setembro de 1869, até domingo,


12 dos mesmos mês e ano. Doze sociedades operárias de Paris foram representadas, e
eram as seguintes.

A seção dos operários e operárias encadernadores (delegado, Varlin, encadernador); os


operários do bronze (delegado, Landrin); a sociedade de previsão e de solidariedade da
joalheria (delegado, Durand, joalheiro); a sociedade de resistência dos latoeiros
(delegado, Roussel, latoeiro); a câmara sindical dos marmoristas (delegado, Flahaut); a
câmara sindical dos mecânicos (delegado, Murat); a câmara sindical dos carpinteiros
(delegado, Pindy); a sociedade de resistência dos impressores litográficos (delegado,
Franquin); a câmara sindical dos torneiros em metal (delegado, J. A. Langlois); a
câmara sindical e profissional dos sapateiros (delegado, Dereure); a Associação
“liberdade dos carpinteiros” (delegado, Fruneau); e os operários marmoristas (delegado,
Tartaret). Além deles, Mollin foi como delegado do círculo parisiense dos proletários
positivistas e Chemalé, dos filiados parisienses da Internacional.

As províncias enviaram treze delegados: Dosbourg, Aubry, Creusot, Piéton, Bourseau,


Outhier, Richard, Palix, Bakunin, Monier, Foureau, Tolain e Boudet. Da Alemanha
chegaram sete delegados, entre eles Rittinghausen e W. Liebknecht, acrescentando
também Becker, Goegg, Janasch, Greulich e Hess. A Bélgica foi representada por
Brismeé, Hins, de Paepe, Bastim e Robin; a Suíça francesa enviou onze delegados, entre
eles Heng, Brosset, J. Guillaume, Schwitzguebel e Fritz Robert; a Suíça alemã enviou
onze também, e a Áustria dois (Neumayer e Overwinder); da Itália foi apenas um
enviado, Caporusso; da Espanha, dois: o tipógrafo Farga-Pellicer e o médico Santiñón, e
os Estados Unidos mandaram Cameron, delegado da National Labour Union. O
Conselho Geral de Londres foi representado por seis dos seus membros: Applegarth,
Lucraft, Cowell Stepney, Eccarius, Lessner e Jung, que presidiu o Congresso.

Sobre a questão da propriedade territorial, o congresso aprovou por 54 votos a 4 que a


“sociedade tem o direito de abolir a propriedade individual do solo, que deve pertencer
à comunidade”. Cinco delegados de Paris, Varlin, Flahaut, Franquin, Dereure e Tartaret,
votaram pelo sim, e quatro pelo não, sendo eles Tolain, Pindy, Chemalé e Fruneau; os
outros seis delegados abstiveram-se de votar.

Sobre a abolição da herança, trinta e dois votos manifestaram-se em conformidade com


a proposição da comissão, que dizia: “o direito de herança deve ser completa e
radicalmente abolido”. Dois delegados de Paris, Varlin e Dereure votaram pelo sim, sete
pelo não (Tartaret, Tolain, Pindy, Chemalé, Frumeau, Murat e Langlois), os seis
restantes abstiveram-se. Apenas 19 votos obteve a proposição do Conselho Geral
redigida por Marx. Essa proposição continha simplesmente a indicação sobre sucessões
e limitação do direito de legar. Todos os delegados de Paris votaram contra esta
proposição, com exceção de quatro, que se abstiveram.

A questão da herança tinha sido incluída na ordem do dia do congresso a pedido do


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comitê federal de Genebra, e Marx tinha visto nisso o resultado de uma intriga de
Bakunin. Em 27 de julho de 1869 Marx disse a Engels: “Esse russo, é claro, quer se
tornar ditador do movimento europeu. É melhor ele ter cuidado, se não será
excomungado oficialmente”. E Engels respondeu: “O gordo Bakunin está por trás disso
tudo, é evidente. Se esse maldito russo pensa realmente, com suas intrigas, colocar-se ao
mando do movimento operário, devemos evitar que ele possa fazer dano”. Na
Comunication Confidentielle (Confidentielle Mittheilung) de 29 de março de 1870,
Marx diz que se o Conselho Geral consentiu em incluir a questão da herança na ordem
do dia do congresso “foi para poder acertar um golpe decisivo em Bakunin”. Tendo
recaído o golpe contra Marx (pois sua contra-proposição não conseguiu mais do que
dezenove votos), compreende-se sua fúria. Depois do voto, Eccarius, que sabia do
segredo, deixou escapar esta exclamação: “Marx ficará muito descontente”. Essa frase
foi guardada por Bakunin, que a ouviu pessoalmente.

Os delegados de Zurique, Bürkly e Greulich, tinham proposto a inscrição, no programa


do congresso, de uma questão que não figurava nele; a da legislação direta pelo povo, e
até tentaram colocá-la à frente da ordem do dia. Esses delegados foram apoiados pelos
alemães Goegg, Rittinghausen, Liebknecht, e combatidos por Robin, Schwitzguebel,
Bakunin, Fritz Roberts, Hins, Murat, Dereure. O Congresso decidiu que a questão seria
discutida após esgotar a ordem do dia, caso houvesse tempo (e não houve).

O debate sobre as sociedades de resistência foi o que melhor colocou em destaque a


concepção federalista e antiestatista da maior parte dos operários franceses, suíço-
românicos, belgas, espanhóis, italianos, frente à qual se erguia a idéia estatista dos
socialistas-democratas alemães, suíços e ingleses. Contudo, sem se deterem por sobre
teorias relativas à sociedade futura, os delegados comprovaram, na resolução votada,
que o congresso com unanimidade reconhecia a necessidade das sociedades de
resistência, como também a de sua federação e a utilidade de criar entre elas um laço ao
redor das nações, através do Conselho Geral da Internacional.

O Congresso da Basiléia fez compreender para a Europa que a Internacional não era
uma simples sociedade de estudos, limitada a discutir academicamente questões de
imprecisa filantropia, mas a organização de combate pela qual o proletariado iria
marchar para sua emancipação. Fribourg, no livro que escreveu em 1871 em que tentou
justificar sua deserção e a de uma parte de seus amigos, sugeriu que depois do
Congresso da Basiléia “era evidente para todos que Marx, o comunista alemão,
Bakunin, o bárbaro russo e Blanqui, o autoritário, formavam o triunvirato onipotente,
fazendo com que a Internacional dos fundadores franceses estivesse morta, bem morta”.
Mas isso não era assim: a Internacional parisiense tivera outros fundadores que não
foram homens como Tolain e Fribourg, os quais eram estranhos para o verdadeiro
socialismo; ela podia citar outros militantes como Varlin, Pindy, Langevin, Avrial,
Landrin, Theisz, Delacour, e os operários de Paris iriam demonstrar para o mundo no
ano seguinte, sua completa capacidade.
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O Congresso decidiu a proposta dos delegados parisienses, de que o próximo congresso


da Internacional acontecesse em Paris, na primeira segunda-feira do mês de setembro de
1870. Esse acordo foi decidido por unanimidade e era como uma espécie de desafio a
Napoleão III. A primeira segunda-feira do mês de setembro era dia 5: a República tinha
sido proclamada na véspera.

NOTAS:

1. Manifesto eleitoral em que certo número de operários de Paris tinha apresentado a


candidatura de Tolain para o Corpo Legislativo.

2. Este documento é aquele que foi chamado de Inaugural Address e foi traduzido e
publicado em francês em 1866 com o título de Manifeste de l’Association Internationale
des Travailleurs.

3. Carta de Marx de 4 de novembro de 1864.

4. Palavras de Bakunin em sua “Política da Internacional”.

5. De Stirner (Max), filósofo alemão, autor da célebre obra O Único e sua Propriedade.

6. Frase do Memoire de la Federation Jurasienne.

Texto original “La Internacional de los Trabajadores: desde su fundación hasta el


Congreso de Basilea”, publicado em outubro de 1946, pela editora El Libro em
Havana, Cuba.

* Tradução Martin Russo


* Revisões: Felipe Corrêa e Victor Calejon

FONTE: www.anarkismo.net

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