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SOBRE AS CACHOEIRAS E OS CIRCUITOS ELÉTRICOS

12-02-2006

Micro/Macro

Sobre as cachoeiras e os circuitos elétricos

Marcelo Gleiser,
é professor de física teórica do Dartmouth College, em Hanover
(EUA), e autor do livro "O Fim da Terra e do Céu"

Eis algo que é parte indispensável de nossas vidas e que nos é


quase completamente indiferente: os circuitos elétricos. Claro, esse
desinteresse não se estende aos engenheiros elétricos ou aos
eletricistas, profissionais ou amadores. Mas a verdade é que, para a
maioria das pessoas, o que ocorre quando se acende uma lâmpada
ou se põe uma bateria numa lanterna ou num iPod é um mistério. O
prático não deixa de ser fascinante.

Circuitos elétricos são basicamente dispositivos em que cargas


elétricas podem circular. Uma cachoeira é uma analogia simples: no
caso, a força que impulsiona o movimento da água é a gravidade. A
água, como qualquer fluido, é composta de moléculas. Essas
moléculas têm massa e, portanto, são atraídas pela gravidade da
Terra. A cachoeira, ou queda d'água, existe devido a um desnível no
terreno (no leito do rio): o fluido cai em direção ao ponto mais baixo
possível. Para que a água suba o rio é necessário uma bomba que
trabalhe contra a força da gravidade. Podemos então imaginar um
circuito fechado de água, onde a água que cai é bombeada rio
acima.

Circuitos elétricos são como cachoeiras onde os elétricos


circulam, tal qual a água de um rio

Nos circuitos elétricos, o leito do rio é um fio ou outro material por


onde passa uma corrente composta por tantas cargas elétricas que
podemos também representá-las como um fluido: em geral, um
bando de elétrons viajando pelo fio. Mas o que provoca o
movimento dos elétrons? Não é a força da gravidade, mesmo que
tenham massa. O movimento das cargas elétricas é causado pela
força atrativa entre cargas opostas.

Tudo funciona como a força da gravidade: as coisas caem no chão


porque são atraídas pela Terra; para que cargas fluam numa
determinada direção num fio, criando uma corrente elétrica, têm de
ser atraídas mais para um lado do que para o outro. Para isso, liga-
se o início e o fim do fio aos pólos de pilhas ou outras fontes de
energia elétrica. Os pólos criam uma "inclinação" elétrica, que
provoca o movimento das cargas.

Pilhas têm dois pólos, positivo e negativo. Cargas elétricas


negativas, como os elétrons, são atraídas pelo pólo positivo.
Quando ligamos um fio aos dois pólos, fechamos o circuito: os
elétrons no metal do fio fluem na direção do pólo positivo da pilha.
Portanto, os dois pólos da pilha têm o mesmo papel que a
inclinação no leito do rio. Aliás, quanto mais potente a pilha, isto é,
quanto maior a diferença de voltagem entre seus pólos, mais rápido
os elétrons fluem.

Mas a pilha funciona como uma bomba também, transportando


cargas do pólo positivo ao negativo, permitindo assim que a
corrente continue a fluir no circuito. Isso ela faz usando energia das
reações químicas que ocorrem em seu interior, que essencialmente
empurram os elétrons para o pólo negativo, permitindo que corram
mais uma vez pelo fio de metal. (Aliás, se o circuito consistir apenas
da pilha e fio, rapidamente a pilha descarrega.)

E as lâmpadas, por que acendem? Olhe uma bem de perto: o


filamento nada mais é do que um fio, feito de tungstênio. Ao
passarem pelo filamento, os elétrons chocam-se com seus átomos,
fazendo-os vibrar. Essa energia extra recebida pelos átomos do
filamento acaba sendo transformada em radiação, parte dela visível
(a luz da lâmpada) e outra que sentimos como calor (radiação
infravermelha). Cada vez que ligamos um interruptor, fechamos um
circuito elétrico, dando início a essa intricada coreografia que
ilumina nossas noites e enche nossas casas de música.
Marcelo Gleiser é professor de física teórica do Dartmouth College,
em Hanover (EUA), e autor do livro "O Fim da Terra e do Céu"

Fonte:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe1202200602.htm

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