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FALSUM COMMITTIT, QUI VERUM TACET

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Escrevinhação n. 821
A AGONIA DE HERÓDOTO
Reflexões sobre a narrativa histórica e a história da
narrativa

Redigida em 10 de abril de 2010, dia de Santa Madalena de


Canossa e de São Macário da Antioquia.

Por Dartagnan da Silva Zanela

"A história é êmula do tempo,


repositório dos fatos, testemunha do
passado, exemplo do presente,
advertência do futuro".
(Miguel de Cervantes)

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Pergunta: qual a função societal de um

historiador? Tal indagação torna-se delicada se nós

temermos a responsabilidade moral que advém da resolução de

sua proposição. De mais a mais qual é a obrigação moral de

toda pessoal que se dedica à atividade intelectual?

Simplesmente de ser fiel à procura pela verdade mesmo que

tal procura acabe depondo contra nossas convicções

pessoais, pois é a Ela que dedicamos a nossa procura, e não

a uma reles satisfação pessoal ou a defesa prolixa de uma

ideologia.

Dito isso, meditemos sobre a questão proposta,

meditação essa que é partilhada por muitos homens de estudo

que são significativamente mais aquilatados que o autor

destas turvas linhas. Tanto Eric Hobsbawn como Peter Burke

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nos lembra que a função basilar do historiador é a de

organizar a experiência pretérita vivida em sociedade para

que a geração atual possa localizar-se no tempo e no espaço

e assim refletir sobre si e compreender-se. Paul Johnson,

por sua deixa, nos lembra que a história deve sempre

responder as questões que estão prenhes na alma humana, ou

seja, todo historiador e bem como toda pessoa que deite sua

vista nas laudas da MAGISTRA VITAE, deve procurar suas

letras com o intento de solver delas uma lição perene para

a ventura humana e, necessariamente, para sua ventura

pessoal.

Neste sentido, quando se indaga sobre a

narrativa histórica, esta-se indagando sobre o volver do

olhar do historiador para uma nova gama de problemas e para

outros tantos que acabaram sendo desdenhados nas últimas

décadas da centúria passada, em especial o retorno a

história política, a biografia histórica e a micro-

história.

Ora, a micro-história não é uma novidade. Já no

século XIX o sociólogo Gabriel Tarde dedicava-se ao estudo

de temas inerentes à micro-sociologia. Norbert Elias e

Gilberto Freire já no começo do século XX dedicavam-se ao

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estudo das mentalidades e do cotidiano. Obviamente que

atualmente tais estudos estão cada vez mais disseminados na

academia, porém, houve pioneiros nesta seara e estes a

longa data vinha explorando esse viés que hoje é tão

estudado.

Quanto aos estudos biográficos, tivemos uma

grande contribuição da sociologia estadunidense onde a

partir da década de 60 voltou-se a atenção de modo especial

para elaboração do estudo da vida de figuras públicas, de

políticos. Tais estudos contribuíram significativamente

para a compreensão das mentalidades, das massas e,

inevitavelmente, no desenvolvimento de uma nova forma de se

pensar a história política. Nesta perspectiva, cremos que o

grande modelo de tal estudo veio justamente da

historiografia francesa, com a obra SÃO LUIS de Jacques Le

Goff.

Doravante, todas essas formas de estudo trazem

como contribuição a apresentação de novos métodos e objetos

de pesquisa e não um “retorno à narrativa”, visto que,

história é, em si, uma forma de narrativa. Aliás, que forma

de saber humano não se expressa recorrendo ao uso de

narrativas. De mais a mais, como procuramos expor, não

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tivemos um retorno a velhos métodos, mas sim, o uso de

novos procedimentos em objetos que eram até então de certa

forma desdenhados pela comunidade de estudiosos. Tal

relação, digamos assim, alquímica, geral toda uma nova gama

de elementos a serem explorados por todos aqueles que são

francamente ávidos pelo conhecimento de verte do seio desta

senhora que é a História.

E quanto à literatura? Eis aí um elemento

pouquíssimo utilizado no ensino da história. Muitas das

vezes desejamos alimentar a crença em uma pretensa

cientificidade do saber histórico e nos esquecemos que o

ensinar e o escrever história são uma forma de arte, de um

reto fazer com vistas a obter uma determinada perfeição

que, no caso, aproxima a alma humana de uma realidade

pretérita para perceber e sentir a nossa humanidade na

Humanidade.

Neste sentido a literatura tem uma contribuição

singular para nos dar por subsidiar o ensino de história

com o conteúdo imaginativo de determinados períodos

históricos para assim facilitar a compreensão do que será

ministrado especificamente na disciplina.

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Afirmamos isso, pois, nada está para a

compreensão sem antes estar disposto na imaginação.

Trocando em miúdos, não conseguimos compreender algo que

somos incapazes de imaginar. Não temos como compreender o

que é uma célula se não somos incapazes de imaginá-la do

mesmo modo que não estaremos aptos a compreender o que foi

a revolução Francesa se não formos capazes de imaginar a

sociedade francesa dos séculos XVII e XVIII.

Por fim, este é o caminho que singra a nau da

história, em seu ensino e em sua escrita. Partimos de um

porto inseguro, que são nossas inquietações e navegamos

pelo mar tenebroso de nossas investigações para chegarmos

até além mar, além de nossas expectativas imediatas, nos

encontrando com algo que fala muito mais sobre o que

realmente somos e que, na maioria das vezes, não

conseguimos enxergar. A esse encontro de si, consigo mesmo,

podemos chamar de sapiência e essa procura, a nosso ver, é

a única que pode dar algum sentido maior para a

investigação e o ensino da história, pois, através desta

perspectiva, faz-se da alma humana o seu ponto de partida e

a sua rota de chegada.

[continua]

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BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

BURKE, Peter. A escrita da história - novas perspectivas.


Tradução de Magda Lopes. São Paulo: UNESP, 1992.

FREIRE, Gilberto. Como e por que sou e não sou sociolólogo?


Disponível na internet: http://dartagnanzanela.k6.com.br

JOHNSON, Paul. Tempos Modernos. Tradução de Gilda de Brito Mac-


Dowell e Sérgio Maranhão da Matta. Rio de Janeiro: IL/Bibliex,
1994.

LE GOFF, Jacques. São Luis. Tradução de Marcos de Castro. Rio de


Janeiro: Record, 1999.

HOBSBAWN, Eric. Sobre História. Tradução de Cid Knipel Moreira.


São Paulo: Cia. das Letras, 1998.

REIS, José Carlos. Identidades do Brasil – de Varnhagen a FHC.


Rio de Janeiro: Ed. FGV, 1999.

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