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Ação Civil Pública em Matéria Tributária e Controle de Constitucionalidade
Ação Civil Pública em Matéria Tributária e Controle de Constitucionalidade
FACVLDADE DE DIREITO
Largo São Francisco
Curso de Pós-graduação
JUNHO, 2010
Resumo
A ação civil pública foi criada pela Lei nº 7.347/85 com o objetivo de permitir o
acesso à justiça de direitos de natureza coletiva, assim compreendidos os interesses ou
direitos difusos, os coletivos e os individuais homogêneos. A Constituição Federal de 1988
permite no artigo 129, III, que o Ministério Público proponha a ação civil pública “para a
proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e
coletivos”. A Lei nº 8.078/90 acrescentou à Lei nº 7.347/85 a possibilidade de se tutelar
por meio de ação civil pública qualquer interesse difuso ou coletivo. Nesse quadro, estuda-
se a validade do parágrafo único do artigo 1º da Lei nº 7.347/85, acrescentado atualmente
pela Medida Provisória 2.180-35 de 2001, parágrafo único este que proíbe a veiculação de
questão tributária em ação civil pública. Estuda-se em seguida a viabilidade de se
questionar a constitucionalidade de uma norma, em sede de ação civil pública. Por fim,
conclui-se a respeito da conjugação de ambos os mecanismos, ou seja, se controle de
constitucionalidade difuso e questões tributárias podem ser debatidos e julgados em ação
civil pública.
Palavras-chave:
ação civil pública; controle de constitucionalidade; direito tributário; direito
processual civil; código de defesa do consumidor.
Lista de Abreviações
Abreviação Significado
ACP Ação Civil Pública
ADC Ação Declaratória de Constitucionalidade
ADIn Ação Direta de Inconstitucionalidade
CDC Código de Defesa do Consumidor
CF Constituição Federal do Brasil
CF-88 Constituição Federal do Brasil, de 1988
CPC Código de Processo Civil
CPC-73 Código de Processo Civil, de 11-01-1973
LACP Lei da Ação Civil Pública, nº 7.347/85
MP Ministério Público
MP [xxx] Medida Provisória nº [xxx]
STF Supremo Tribunal Federal
STJ Superior Tribunal de Justiça
Sumário:
1.! Introdução! 4
2.! O controle de constitucionalidade no Brasil! 8
3.! Ação civil pública e controle de constitucionalidade! 10
4.! Ação civil pública e matéria tributária! 14
6.! Conclusão! 17
.! Referências bibliográficas! 19
1. Introdução
O instrumento da Ação Civil Pública foi criado com a Lei nº 7.347, de 24 de julho
de 1985 (a Lei da Ação Civil Pública, ou simplesmente “LACP”). Com o objetivo de
permitir o acesso à justiça a direitos de natureza coletiva lato sensu (que classificam-se
em direitos ou interesses coletivos stricto sensu, difusos e individuais homogêneos), foi
previsto no artigo 1º que devem ser tutelados danos causados a interesses ou direitos: I,
ao meio-ambiente, II, ao consumidor e III, a bens e direitos de valor artístico, estético,
histórico, turístico e paisagístico.
Assim, ao menos quando proposta pelo Ministério Público, a ação civil pública pode
ter como objeto a proteção de qualquer interesse difuso ou coletivo. Se acrescentarmos que
o artigo 5º, XXXV, da CF-88, prevê que “a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito”, então devemos concluir que nenhuma lei poderá
restringir o direito de acesso à justiça; mais que isso, nenhum instrumento processual
poderá ser proibido por lei, se ele for adequado para a situação do caso concreto, sendo
inócua tal vedação porque pode ser inconstitucional (NERY JR; NERY, 2007: 1577, n. 1
do coment. ao art. 1º da Lei nº 8.437/1992).
De tal sorte, não importa a natureza do direito, individual ou coletiva: ele deve ser
adjudicado com os instrumentos processuais adequados, em toda a plenitude do sistema
processual civil. Assim, nenhum direito coletivo poderá ter a sua judicialização restringida,
sob pena de afronta ao inciso XXXV mencionado. É o caso das ações civis públicas, em
matéria tributária e previdenciária, que não poderá ter seu cabimento restringido por uma
lei, quanto menos por uma Medida Provisória. Portanto, o parágrafo único do artigo 1º da
Lei nº 7.347/85 não pode ser considerado compatível com a Constituição Federal de 1988.
No que tange à legitimidade ativa, podem propor a ação civil pública: o Ministério
Público; a União, os Estados e Municípios; uma autarquia, empresa pública, fundação,
sociedade de economia mista ou associação civil. Alteração operada pela Lei nº 11.448, de
2007, previu a propositura da ação pelo Distrito Federal e pela Defensoria Pública.
Por fim, cabe apontar que o artigo 21 estabelece que “aplicam-se à defesa dos
direitos e interesses difusos, coletivos e individuais, no que for cabível, os dispositivos do
Título III da lei que instituiu o Código de Defesa do Consumidor”.
Vemos portanto que tais mecanismos são potenciais veículos para demandas que
envolvem questões individuais que são automaticamente idênticas para todos os
contribuintes do mesmo tributo, pela própria natureza da obrigação tributária — exige-se
previsão constitucional e legal para se tributar, normas de extrema abrangência e grande
implicação jurídica e repercussão social —, desde que se encontrem as pessoas na mesma
situação, nas mesmas condições.
aplicam-se as normas sobre as pessoas que são atingidas pela decisão judicial. De acordo
com a principal dessas regras, inserida no artigo 472 do Código de Processo Civil – CPC
(Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973), “a sentença faz coisa julgada às partes entre as
quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros”, ou seja, apenas os sujeitos
processuais são atingidos subjetivamente pela coisa julgada, segundo a regra geral.
Conforme será visto mais abaixo neste trabalho, a coisa julgada é estendida no caso das
demandas coletivas.
Por fim, cabe consignar que em âmbito federal, perante o STF, há cabimento
expresso para a Ação Declaratória de Constitucionalidade, inspirada na Ação Avocatória
introduzida pela Emenda nº 7 de abril de 1977, à Carta Constitucional de 1967, reavivada
com a Emenda Constitucional nº 3/93, em evidente movimento autoritário, em clara
oposição ao democrático procedimento da ADIn, de extirpação de uma lei ou ato com o
qual não se coaduna o sistema.
Nota-se portanto que não se trata de mera multiplicação dos efeitos de determinada
decisão, mas de evidente supressão da autonomia do juiz de direito. Embora não seja mais
essa a assumida função da Ação Declaratória de Constitucionalidade, certamente trata-se
de mais que mera inspiração, podendo se falar até mesmo em mesma natureza entre as
ações (ADC e avocatória).
A razão pela entendemos não ser a ADC um meio compatível com o Estado
Democrático de Direito pode ser explicitada por meio do seguinte quadro: quando uma
Ação Declaratória de Constitucionalidade é julgada procedente, poder-se-ia inferir que a
norma é constitucional, para todos os fins; todavia, uma outra ADC poderá ser proposta,
com outro fundamento, e esta poderá ser julgada improcedente, declarando-se
inconstitucional a norma e retirando-a do sistema; contrariamente, se uma ADIn for
julgada procedente, nenhuma outra ADC posterior poderá repristinar a norma; desta
forma, a ADC procedente dá para a norma uma suposta validade que ela não tem, sendo
que apenas mantém a presunção de constitucionalidade que é deferida a todas as normas,
até prova em contrário por meio do controle difuso ou concreto de constitucionalidade.
Feita essa ressalva — sobre a incompatibilidade da ADC com o Estado Democrático de
Direito, embora haja expressa previsão constitucional — o controle abstrato de
constitucionalidade se presta a obter unicamente a declaração da constitucionalidade ou
não da norma, com validade erga omnes.
de mérito, como uma premissa anterior ao julgamento do mérito, uma questão que
analisada leva diretamente à conclusão que se pretende.
quem nunca teve qualquer relação com o processo. Aliás, o artigo 103, III, do Código de
Defesa do Consumidor, demonstra que a eficácia erga omnes da ação civil pública não
deve ter o mesmo significado da ADIn, mas deve se limitar ao condenado e às vítimas do
dano e seus sucessores.
Por fim, a respeito da distinção entre Ação Civil Pública e Ação Direta de
Inconstitucionalidade, necessário trazer o entendimento de NELSON NERY JÚNIOR e ROSA
MARIA DE ANDRADE NERY, nestes termos (apud SÁ, 2002: 140–141):
Desta forma, hemos de conceber a ação civil pública como completamente distinta
da Ação Direta de Inconstitucionalidade, não havendo que se atribuir os efeitos de uma à
outra, ou se concluir que uma não possa coexistir com a outra. A função delas é distinta e
há diversas hipóteses em que o objetivo da ação civil pública não pode ser obtido com a
ADIn (qualquer obrigação de fazer ou indenização, por exemplo), de modo a justificar a
existência de ambos os instrumentos, cada qual com os seus objetivos (PALU, 2001: 281).
Mais que isso, não se deve impedir que a ação civil pública discute a
inconstitucionalidade de normas, em controle difuso de constitucionalidade. Por meio dele,
pode-se (e deve-se, sempre que necessário) argumentar em caráter prejudicial ao mérito a
inconstitucionalidade de normas, de modo a se impedir que normas ou atos
inconstitucionais sejam confirmados por decisões judiciais sob o falso pretexto de não se
poder discutir a afronta de normas ou atos à Carta Constitucional.
Por outro lado, a decisão proferida no bojo de uma ação civil pública pode se
assemelhar à ação direta de inconstitucionalidade, quando o pedido consista
exclusivamente em declaração de inconstitucionalidade. Neste único caso, concordamos
que não é a ação civil pública o meio idôneo para a declaração da inconstitucionalidade,
sendo que no presente trabalho essa hipótese é excluída de todo e qualquer raciocínio ou
conclusão.
Muito embora tenha sido inicialmente irrestrita a aplicação da ação civil pública,
operou-se alteração com a atual redação dada pela MP 2.180-35, de 2001, para se vedar a
ação civil pública em matéria tributária ou previdenciária.
Perfeita a afirmação de SÁ, pois o artigo 129, III, da Constituição Federal não traz
qualquer ressalva, e assim, a ação civil pública proposta pelo Ministério Público, para
tutela de direitos difusos e coletivos, não encontra qualquer limitador, sendo portanto
inconstitucional o parágrafo único do artigo 1º da Lei 7.347/85.
Por essa razão, se o Ministério Público propuser uma ação civil pública, esta poderá
veicular toda e qualquer matéria. Em razão do evidentemente contrário comando do tal
parágrafo único, a sua inconstitucionalidade deverá ser aduzida em caráter prejudicial ao
mérito.
Para citar um caso em que o tratamento coletivo teria sido muito mais eficiente do
que o individual, recordemos a inconstitucionalidade do §1º do artigo 3º da Lei nº 9.718,
de 27 de novembro de 1998. A celeuma jurídica toda decorre do alargamento da base de
cálculo das Contribuições para o PIS/PASEP (“PIS”) e para o Financiamento da
Seguridade Social (“COFINS”), que incidiam sobre o faturamento do empregador e, pela
Lei 9.718/98, passou a (supostamente) incidir sobre a receita bruta das empresas.
Ocorre que à época da edição desta lei a Constituição Federal dispunha no artigo
195, I, que a seguridade social será financiada por toda a sociedade, mediante recursos
fornecidos por contribuições sociais “dos empregadores, incidente sobre a folha de
salários, o faturamento e o lucro”. Esse era o fundamento constitucional e certamente a
receita bruta, conceito maior que o faturamento, não podia ser tributado pelas
contribuições sociais destinadas à seguridade social.
Apenas 4 anos mais tarde veio a Lei nº 11.941, de 27 de maio de 2009, convertida
da Medida Provisória nº 449, de 2009, revogando o §1º do artigo 3º da Lei nº 9.718/98.
Nota-se que foi percorrido um longo caminho desde a edição da lei, em 1998, até a sua
retirada do ordenamento jurídico, mesmo diante de conclamos doutrinários sobre a
Neste caso, o sistema processual brasileiro deveria ter sido seguido de acordo com
suas bases, especialmente pelo processo coletivo, permitindo-se que ações civil públicas
discutissem a matéria tributária de fundo, conhecendo-se a inconstitucionalidade, por
controle difuso, do artigo 3º da Lei nº 9.718/98.
Destarte, todos perdem com a proibição, que no nosso sentir é injustificável e, mais
do que isso, inconstitucional. O acesso à justiça, previsto no artigo 5º, XXXV, da
Constituição Federal, inclui também a necessidade de que seja dado um adequado
tratamento a direitos de natureza coletiva, conforme KAZUO WATANABE (in GRINOVER
et al., 2004: 834). Isso significa que os direitos coletivos devem ser adjudicados de alguma
forma, sob pena de violar o mencionado inciso XXXV do artigo 5º da CF-88.
6. Conclusão
. Referências bibliográficas
NERY JR., NELSON; NERY, ROSA MARIA DE ANDRADE. Código de Processo Civil
comentado e legislação extravagante. 10ª ed. São Paulo: RT, 2007.
NERY, ROSA MARIA DE ANDRADE; NERY JR., NELSON. Código de Processo Civil
comentado e legislação extravagante. 10ª ed. São Paulo: RT, 2007.