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Boletim Técnico da Escola Politécnica da USP Departamento de Engenharia de Construgao Civil ISSN 0103-9830 BT/PCC/92 Concreto Projetado: O Controle do Processo de Projegao Antonio Figueiredo Paulo Helene Sao Pauio - 1993 Opresente trabalho ¢ parte da dissertagao de mestrado apresentada pelo Eng? Antonio Domingues de Figueiredo, sob orientagda do Prof, Dr. Paulo Melene: “Cancreto projetado: fatores intervenien- tes no controle da qualidade do proceso”. AA integra da dissertagao encontra-se & disposi¢ao com 0 autor ena biblioteca de Engenharia Civil da Escola Politécnica/USP. Figueiredo, Antonio boningues de Conereto projetade: o controle do proceso de pro jJecda / A.D. de Figueiredo, .R.L, Helene. -- Sac Paulo : EPUSP, 1993, 34p. -- (Boletim Tecnico da Escola Politécnica da USP, Departamento de Engenharia de Conscrucdo Civil, BI/PCC/92) L.Conereto projetado 2.Materiais de construcio 1. Helene, Paulo Roberto do Lago t.tniversidade de Sao Paulo. Escola Politécnica. Departamento de Engenharia de Construgao Civil 11T.Tfeulo IV. Série cpp 691.32 691 CONCRETO PROJETADO: © CONTROLE DO PROCESSO DE PROJEGAO Antonio D, Figueiredo Paulo Helene RESUMO Conereto projetado é aquele pneumaticamente transportado e projetado a alta velocidade, sobre uma superficie, sendo auto-compactado. Assim, denota-se que suas propriedades sao dependantes do processo de projegao utilizado. Desta forma, para se controlar a gualidade do material, é importante ter-se o conhecimento do seu processo de produgao (se por via seca ou umida, equipamentos e mao-de-obra, etc.) © das propriedades especificas do concreto projetado (como a reflexao, o desplacamento e a liberagdo de po¢ira ou névoa) e as respectivas formas de controle. Finalnente, para a obtengao de um material de boa qualidade, € fundamental seguir as recomendagdes para o controle do processo de projegdo como um todo. ABSTRACT Shotcrete is concrete pneumatically conveyed and projected at high speed onto a surface, compacting itself. Thus its properties depend on the shooting process. It is important to know the shooting process (wet or dry-mix process, equipaments and working crew, etc.), the specific properties of shotcrete (rebound, sloughing and dust generation) and respective mean of control. Finally, to obtain a good quality material, it is very important to follow the recommendations on all shotcreting process quality control. SUMARIO 1. INTRODUGAO 2. 0 PROCESSO DE PROJECAO . 2.1. PROCESSOS DE PROJEGAO DISPONIVEIS 2.2. BQUIPAMENTOS DE PROJECAO POR VIA SECA 2.2.1. Maquina de projegao 2.2.2. Sistema de alimentacao 2.2.3. Dosadores de aditivo 2.3, OPERACAO DO PROCESSO 2.3.1. Equipe de projecao 2.3.2. Operagdo da maquina de projecao 2.3.3. Cuidados com as mangueiras 13.4. Umidificagdo da mistura + PROPRIEDADES DO CONCRETO PROJETADO IMPORTANCIA E FORMA DE CONTROLE :_REFLEXAO 2. Dinamica da reflexao 2.1. Fatores que influenciam a reflexdo 12.2. Variagdo do traco em fungéo da reflexdo 3. Bfeito do processo de projecao 4. Oclusao da reflexdo 5. Controle da reflexao + DESPLACAMENTO - Causas dos desplacamentos : Controle do despiacamento através da consisténcia : POETRA E NEVOA Causas da produgao de poeira e névoa Controle da poeira e da névoa + HOMOGENEIDADE 1. Defeitos tipicos 1.1. Efeito de sombra 1.2. Laminagao 1.3, Inmperfeicoes superficiais 22. Variagao das propriedades 3. 3 3 3 ole 22. ontrole da homogeneidade a. Controle visual 2. Controle da pega e endurecimento 3. Controle da resisténcia a compresséo DERENCIA 1. Causas da falta de aderéncia +2. Controle da aderencia 4, A QUALIDADE DO PRODUTO 1. INTRODUCAO As definicédes sobre concreto projetado tém, come ponto en comum, 9 fato de serem uma descrigao Go processo de projegao. 0 "American Concrete Institute (ACI) Committee 506" no seu “Guide to Shotcrete"(+) define concreto projetado como “argamassa ou concreto pneumaticamente projetado a alta velocidade sobre uma superfici Neste caso tem-se uma definicdo mais sucinta e abrangente, pois insere a possibilidade de utilizar ou nado agregados graudos @ optar pelo processo de projecdo, se via seca ou umida. No Brasil a Associacdéo Brasileira de Normas, Técnicas (ABNT) através da Comissao de Estudos CE 18:306'?) fez uma boa Gefinicéo contemplando todos estes aspectos: "o concreto projetado ¢ um concreto com dimensao maxima do agregado Superior a 4,8 mm, transportado atraves de uma tubulagao e projetado, sob pressdo, a elevada velocidade, sobre uma superficie, sendo compactado simultaneamente". © que fica claro nestas definigoes de concreto projetado é a sua total interdependéncia com o processo de projecéo, o que constitui o enfoque principal deste trabalho. 2. 0 PROCESSO DE PROJECAO Como aierta o aci'!], "o sucesso da aplicagaéo do concreto projetado requer um equipamento com operacao e manutengao apropriada”. Portanto, ¢ fundamental o conhecimento do processo de projecao, para que se possa tirar o maximo Proveito do equipamento, o qual sera estudado neste item. 2.1. PROCESSOS DE PROJECAO DISPONIVEIS © processo de projecdo pode ser classificado segundo o tipo de equipamento utilizado. Ele define em que condigoes se ird trabalhar com o material, bem como as propriedades que ele iré apresentar. Assim, com os equipamentos disponiveis atualmente séo possiveis dois tipos basicos de processos de projegaéo: o via seca (dry mix) e o via umida (wet mix). © processo de projegaéo por via seca é assim chamado pelo fato do concreto ser levado a maquina de projecao seco. Neles uma mistura de agregados e cimento é conduzida por ar Comprimido através de um mangote até o bico de projecao, onde ¢ entéo adicionada a agua (Figura 1.). Existe uma grande possibilidade de variacao deste esquema basico, que aparece em linha cheia no diagrama da Figura 1. As variagées, apresentadas na figura através de jlinhas tracejadas, se concentram nas diferentes possibilidades de adicao de aditivos aceleradores ou da agua no processo. Existe una terceira denoninaggp, de processo de projecdo no Brasil chamada via semi-umida'?). Na verdade, este processo consiste num caso especial da via seca, pois se utiliza o mesmo equipamento modificando-se apenas o local de entrada de agua na mistura. Na chamada via semi-imida além da entrada de agua no bico se dispde de outra que ocorre a alguns metros antes do bico no mangote atraves de um anel prée-umidificador. Besta forma, neste trabalho dar-se-4 preferéncia pela utilizagao do termo pre-umidificagao para designar este procedimento. No caso dos cauipamentos de projegéo por via tmida, © concreto chega & bomba com toda a agua necessaria jd misturada, sendo o ar comprimido utilizado para acelerar a projecéo no bico e, em alguns casos, para pressurizacao de camaras da bomba de concreto ou mesmo para transporte da mistura umida pelo mangote. Na Figura 2, se encontra um Giagrama do esquema basico do processo de projegdo por via amida (em linha cheia) e algumas variantes do mesmo (em linha tracejada). Na Tabela 1. se encontra uma comparacao resumida dos dois processos. ‘GONCRETO PROMETADO EQUIPMENTS DE MiSTURA [ative Tames SPOASTIFICANTE muncore/ co FIGURA 2: Diagrama do processo de projegdo por via umida. TABEL Fatores ligados & projegao por via seca # umidal?), FATOR VIA SECA VIA UMIDA 1. EQUIPAMENTO | -nenor investimento total -manutengao simples e pouco fregiente -ficil operacadol® vmenos equipamentos | | no local de trabalho -menor desgaste de bico, nangueiras e | bomba para a mesma | produgao |;consumo de ar até | 60% menor 2.MISTURA ! 3.PRODUCAO E -na obra ou na usina -possibilidade de uti- lizagao de misturas pré-dosadas -desempenho alterado pela umidade da arcia -raramente ultrapassa -na usina e apurada -a umidade da areia nao interfere no | processo +2-10m7/h na projegao ALCANCE, os 5m7/h no campo. manual | -pode transportar ma- |.até 20m*/h na proje- terial a maiores dis-/ cao mecanizada-roba tancias 4-REFLEXAO | .15-40% para paredes | .baixa reflexdo que verticais +20-50% para o teto socorre formagdo de bolsées de material refletido -variagao do trago na estrutura por perda intensa de agregado pode ser menor que 10% nao ocorre formagao de bolsées de mate- rial refletido -peguena perda ae agregado 5. QUALIDADE -alta resisténcia de- vido ao baixo fator a/c -menor homogeneidade do material «depende da experién- cia da méo-de-obra maior dificuldade para obter grandes resisténcias (alto fator a/c) -naior honogeneidade na qualidade 6. VELOCIDADE, DE IMPACTO -maior com melhor ade~ sdo e facilidade de aplicagdo no teto -maior facilidade de compactagao do material -geralmente adequada para emprego en tu- neis e minas «material menos com- pacto, geralmente 7. ADITIVOS sem pd adicionados na betoneira ou antes da cuba de alimentacao -liquidos adicionados no bico de projegao -utiliza-se apenas os aditivos Viguidos TABELA,,1: Fatores ligados a projecdo por via seca e timidal4?. (continuagao). FATOR VIA SECA VIA UMIDA | j8-PORTRA & +grande producéo de }-muito pouca formagao NEVOA, poeiral de poeira -dificuidade de visua-|.melhor visibilidade lizacao do trabalho | .pode produzir nevoa -formagao de ambiente | de aditivo liquido insalubre em tineis | de alta alcalinidade (exige ventilacao) e@ téxica exigindo ventilacao 9.VERSATILI- |.pode ser utilizada | .pode ser utilizada | DADE | para jateamento de como sistema de bom- areia, projecao de beamento convencinal argamassa e materiais| de concreto | refratarios e { recobrimentos | 10.FLEXIBILI-|.facilidade de inter- |.exige planejamento DADE rupgdo com pouca ou | cuidadoso para mini- nenhuna perda de mizar perdas por in- material interrupgao do -ajustavel as condi- | trabalho goes da superficie |.apresenta dificulda- (em presenca de d4gua)| de de operacdo em superficie molhada (exige maiores teo- res de aditivos aceleradores) 2.2. EQUIPAMENTOS DE PROJEGAO POR VIA SECA Entende-se aqui como equipamento de projegao aquele composto pela maquina de projecdo © todos os acessérios necessarios Para a condugao do processo. Chama-se maquina de projecao a “bomba" de concreto projetado propriamente dita. 2.2.1. Maquina de projecao A maquina de projecéo via seca que é utilizada na quase totalidade das obras de tuneis e em grande parte das obras de recuperagdéo de estruturas e de revestimentos em geral 6 a de rotor de camaras (Figura 3.). Esta é a tinica maquina de projegdo de concreto via seca fabricada no Brasil pela ESTE Industrial e Comercial ttda(®). Neila a mistura seca 6 Jancada na cuba alimentadora onde é mantida em movimento pelos bracos rotativos de um agitador (Figura 3.). Da cuba alimentadora a wistura vai, por gravidade, para as camaras do rotor. No rotor a mistura faz um giro de 180°, chegando ao lado oposto da entrada, onde ¢ impulsionada por uma corrente de ar comprimido, descendo para o interior da tubulagaéo. Um outro jato de ar comprimido carreia a mistura através do mangote até o bico de projecao, no quat é entao adicionada a aqua. (A) REGISTROS DE AR MISTURA SECA (2) CUBA DE ALIMENTACKO. (C) ROTOR (D) MANGOTE (E) REGISTRO DE AGUA ENTRADA DE AR ENTRADA DE AGUA FIGURA 3: ESquema de funcionamento da mdquina de projecao com rotor de camaras. 2.2.2. Sistema de alimentacao A alimentagaéo da maquina de projecdo com a mistura seca pode ser feita de diversas formas, dependendo do equipamento disponivel para isto e mesmo do lay-out da obra. 0 que é importante notar é que este sistema deve proporcionar uma alimentagéo o mais continua possivel, para que se evite problemas de interrupgaéo das atividades do trabalho. Uma alternativa seria a utilizagéo de alimentadoras continuas, cuja justificativa basica seria a garantia de um fluxo constante de mistura seca, o gue possibilita uma dosagem controlada de aditivo, quando utilizado em ps. Alén disso, se obtém uma maior produtividade, poupando os operdarios de um trabalho extenuante, com reducéo das perdas de material. As alimentadoras continuas podem ter um sistema de carreamento do material provido de esteira rolante ou de rosca-sem-fim (Figura 4.). Outro tipo de alimentagéo continua, que pode ser executada quando o lay-out da obra assim o permite, é¢ a alimentacao direta da betoneira a maquina de projecdo através de dutos (Figura 5.}. Além de prdtica, este sistema garante o teor e a homogeneidade da mistura do aditivo acelerador de pega em pé, uma vez que sua dosagen pode ser feita diretamente na betoneira. outro sistema que poderia ser utilizados ¢ 0 chamado pre- bagging, ja empregado no Canadal’), que possibilita o emprego de microssilica e aditivo de maneira mais eficiente. Este sistema, consiste no fornecimento da mistura totalmente seca em sacos de 30kg ou em embalagens pldsticas de 1600kq. Como o processo de mistura é industrial, evita-se o problema da umidade responsdavel pelo fenémeno da pré-hidratagao, que seria agravado pela presenga dos aditivos. CORREIA OU ROSCA-SEM-PIM A aa __wsoussn ob provecRO il Tt == ZI | FIGURA 4: Esquema de alimentadora continua. BETONEIRA MXQUINA DE PROSECAO sscaatieads \ FIGURA 5: Esquema de alimentagao continua por conduto. 2.2.3. Dosadores de aditivo Este equipamento é de grande importancia na produgdo de concretos projetados com boa uniformidade. Compde-se basicamente de um veservatcrio e um dispositive de langamento do aditivo na esteira ou rosca-sem-fim da alimentadora, o qual pode ser de varios tipos. 2.3, OPERAGAO DO PROCESSO © conhecimento da operagéo do processo de projecao é fundamental para a obtengao de um concreto projetado de boa qualidade. Na projegao por via seca, a primeira pergunta que se deve fazer, e que é de importancia vital para o bom andamento do trabalho, é quem executara o servico? Assim é fundamental saber como a equipe de trabalho deve se organizar e, principalmente, como esta qualificada. A experiéncia profissional e a formacdo da mdo-de-obra é um requisito que Molinari j4 chamava a atencdo em 1948(8), @ vem sendo realcada ao longo do tempo. Isto se deve ao fato do mangoteiro sero responsdavel pelo controle da umidificagao do material, que 6é o principal fator determinante das propriedades do material e da variagdo destas. Além disso, © mangoteiro deverd receber em suas maos um fluxo constante de mistura seca (cimento mais agregados) para que a dosagem de agua, que é fornecida sempre numa vazao constante, ocorra de maneira simples e adequada garantindo a homogeneidade do material na estrutura. Crom(?) aponta como condigéo para se obter o desejado fluxo constante o fato de se possuir equipamento e material adequade e uma equipe bem treinada. Além disso, devem ser tomados alguns cuidados na aplicagdo para que o material que ficar na estrutura esteja homogéneo e isento de falhas. 2.3.1. Equipe de projegao!!) A equipe de projecdo é apontada pelo act‘) como o elemento mais importante para que se obtenha uma aplicacéo de concreto projetado bem sucedida. Uma equipe basica 6 composta por um encarregado, um mangoteiro, um assistente de mangoteiro, um operador de méquina de projegao, um operador de betoneira, ajudantes e um encarregado de acabamento, quando este servico é necessdrio. Estas funcées devem ser preenchidas de acordo com as necessidades especificas do trabalho, podendo caber mais de uma fungéo a uma unica pessoa ou ser atribuida a um grupo de pessoas. © encarregado de projegao tem a funcdo de pianejar ¢ organizar o trabalho da equipe, manter as condicées de seguranca ¢ monitorar os procedimentos de controle de qualidade. Ele ¢ © responsdvel pelas condigées de funcionamento e manutencdo do equipamento, como a regulagem Go dosador de aditivos por exemple, e¢ pela motivacao e fiscalizagao do trabalho de toda a equipe. Por isso ele é normalmente wn mangoteiro veterano, capaz de desempenhar qualquer tarefa dentro da equipe. © mangoteiro tem um papel chave em todo © processo. Ele é o responsavel pela aplicagéo do material e, aiém de controlar a quantidade de 4gua adicionada ao material, garante que o fluxe de ar estd ocorrendo de maneira uniforme e na vazao © pressao adequadas para a boa compactacdo. £ o primeiro a perceber a ocorréncia de problemas e, portanto, encarregado de transmitir ao restante do grupo as informagées e pedidos necessarios a manutengdo das boas condicées de operacdo. Isso traz & tona o problema da comunicacao, normalmente executada por gestos, que em certas condigées pode se tornar dificil, principalmente quando o material é transportado a grandes’ distancias ©, 9g, condigoes de visualizagdo se tornam mais dificeis. ryan(t0) “apontou uma série de gestos que podem ser utilizados pelo mangoteiro para expressar informagées importantes (Figura 6.)- © mangoteiro tem, acima de tudo, a responsabilidade de conhecer e executar a aplicagaéo adequadamente, evitando problemas como a iaminagdo, a reflexao excessiva, o efeito de sombra, a ociusaéo da reflexdo, os desplacamentos e as imperfeicées superficiais. movEMsN70 08 REBER: = unente « pressic ae 900 ‘styn. BE vasrtavo: + Eneupamente ~ Eetou erente + © entupunente fei senade = A preetlo ge ar ee =n alinent pe (10) | re FIGURA 6: Sinais do mangoteiro

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