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Poder Judiciário

Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO


ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRATICA A J^ / \ T> T-\ Ã i"\
REGISTRADO(A) SOB N° A L U K U A U

*01842266*

Vistos, relatados e discutidos estes autos de AGRAVO


INTERNO N° 738.636.5/9-01, da comarca de SÃO PAULO, em que é (são)
Agravante(s): FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Agravado(a)(s)- EDNA OSÓRIO DUQUE DE ALMEIDA

A C O R D A M em Décima Primeira Câmara de Direito

Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, proferir a seguinte

decisão. "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, POR VOTAÇÃO

UNÂNIME", nos termos do voto do relator em anexo.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores LUÍS


GANZERLA (Revisor) e FRi^CISGe-VICENT&ROSSI (3o Juiz)
SãctPaulo, 28 de lulho de 2008. '

PIRES DE-ARAUJO
Presidente e Relator
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

AGRAVO INTERNO N° 738.636.5/9-01 V.15.730


Agravante FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Agravada- EDNA OSÓRIO DUQUE DE ALMEIDA
Comarca São Paulo

AGRAVO INTERNO - DECISÃO MONOCRÁTICA MANTIDA -"A jurisprudência


dos Tribunais superiores, a despeito de que dissidie quanto a natureza da norma
inscrita no art 196 da Constituição Federal de 1988, vale dizer, se norma de
eficácia contida (ou restringivel) ou se norma programahca, e consensual em que
se aplique ela de imediato, pois, ainda a entender-se programatica, essa norma
'não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de
o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela
coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu
impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental
ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado' (AgRg no RExt 271 286
-STF -T Turma -Min Celso de Mello, cfr, em acréscimo, RExt 264 269 -STF -V
Turma -Min Moreira Alves, RExt 247 900 -STF -decisão do Min Marco Aurélio,
RExt 267 612 -decisão do Min Celso de Mello, REsp 212 346 -STJ -2' Turma -
Min Franciulh Netto, RMS 11 129 -STF -2 a Turma -Min Francisco Peçanha
Martins, REsp 625 329 -STF - 1 ' Turma -Min Luiz Fux)"- RECURSO
IMPROVIDO.

Cuida-se de agravo contra a decisão monocrática deste


Relator (fls 152/159), que negou seguimento, por improcedêncla, aos
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recursos oficial e voluntário, mantendo a sentença como proferida em


primeira instância.
Pleiteia a agravante a reforma da decisão agravada,
sustentando, em síntese, que não há omissão estatal, "pois existe programa
paradigma na condução do tratamento da doença" (fls. 162), bem como que o
"remédio solicitado é fornecido pela rede pública de saúde, mas para tratamento
de patologias diversas da apresentada pela impetrante".
É o relatório
Não há como se afastar a responsabilidade da Fazenda do
Estado pelo fornecimento do medicamento pleiteado, uma vez que a
apelada tem direito ao pleno atendimento à saúde, por força do art 196,
da Constituição Federal É de se consignar, outrossim, que a
Jurisprudência vem entendendo ser de direito o fornecimento gratuito de
medicamentos às pessoas destituídas de recursos, assegurando o direito à
vida e à saúde.
Ora, como se lê da decisão ora atacada*
"... Não há que se falar em inexistência do direito líquido e certo
da impetrante, eis que conforme documento de fls. 15, o medicamento pleiteado
na inicial, foi prescrito por médico que atende a paciente-impetrante, sendo
certo que o tratamento é de sua inteira responsabilidade
Anota-se, outrossim, que o fato da prescrição médica não ter sido
subscrita por médico do SUS não afasta o direito líquido e certo da impetrante
de receber o medicamento gratuitamente.
Ademais, não é curial que pessoas enfermas, sem que houvesse
negativa da Administração, viessem se socorrer do Poder Judiciário, para obter a
proteção do seu direito à vida.
Assim, diante da hipossuficiência da impetrante para tal
aquisição, cumpre ao Estado - parte passiva legítima para responderjuacãcr-r

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suprir o atendimento conforme se demonstrará.


De outro lado, a questão foi bem debatida pela Douta
Procuradoria Geral de Justiça, ín Apelação Cível n.° 373.865 5/1-00: 'A Fazenda,
em suas razões recursais, sustenta a ilegitimidade passiva e a ausência de ato
ilegal, visto que não está autorizado o SUS a fornecer o citado medicamento,
justamente, porque não padronizado pelo Ministério da Saúde. Ainda que o
Ministério da Saúde não tenha padronizado o medicamento em tela, nem
tampouco a ANVISA o tenha registrado, não é razão para que a
responsabilidade pela aquisição do medicamento seja atribuída ao ente da
União, quando a própria Constituição responsabiliza solidariamente as três
esferas de governo'.

Com efeito, o Judiciário admite que compete à Administração


implementar política pública de saúde e destinar os recursos públicos segundo a
conveniência da Administração. Todavia, não se pode anuir que a
Administração descumpra as Constituições Federal e Estadual, além de normas
infraconstitucionais.
Assim, dispõe a Constituição Federal, em seu art 196, que*
'A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante
políticas sociais e econômicas que visem a redução do risco de doença e de
outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua
promoção, proteção e recuperação'.
E a Constituição Estadual, em seu art. 219, dispõe que:
'A saúde é direito de todos e dever do Estado.
Parágrafo único - O poder Público Estadual e Municipal
garantirão o direito à saúde, mediante. (...) 2 - acesso universal e igualitário às
ações e ao serviço de saúde, em todos os níveis (..) 4 - atendimento integral do
indivíduo, abrangendo a promoção, preservação e recuperação de sua saúde 7
Atendendo a essa finalidade, o art. 198 da Constituição Federal
estatui que 'as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede
regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de
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acordo com as seguintes diretrizes. (...)


II - atendimento integral, com prioridade para as atividades
preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais.'
Aludidos dispositivos da Carta Magna Federal refletiram na
Constituição Estadual de 1989, sendo certo que em seu art 223, incisos I e V,
dispôs que
'Art. 223 - Compete ao Sistema Único de Saúde, nos termos da
lei, além de outras atribuições'
I - A assistência integral à saúde, respeitadas as necessidades
específicas de todos os seguimentos da população;
(...)

V - A organização, fiscalização e controle da produção e


distribuição dos componentes farmacêuticos, imunobiológicos,
hemoderivados e outros de interesse para a saúde, facilitando à
população o acesso a eles/
E, ainda, a lei regulamentadora do Sistema Único de Saúde - SUS,
qual seja a Lei 8 080/90, em seu art 6o, inciso I, letra d, estatui que
'Art 6o - Estão incluídos ainda no campo de atuação do Sistema
Único de Saúde - SUS*
I - A execução de ações:

d - de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica '


Desta forma, verifica-se a existência de inúmeras normas legais a
amparar o direito pleiteado pela impetrante, sendo certo que o Estado está
obrigado a obter recursos fmanceiros para viabilizar a distribuição dos
medicamentos necessários a fim de aumentar a expectativa de vida dos
pacientes
Ademais, a distribuição de medicamentos mencionada pelo art.
223, mciso V, não significa o fornecimento de medicamentos disponíveis
exclusivamente no sistema de saúde brasileiro, mas daqueles que>ejam capazes,
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de debelar ou minimizar as causas e conseqüências da doença apresentada pelo


paciente.
E, ainda, conforme parecer da douta Procuradoria Geral de
Justiça, in Apelação Cível n° 531 436.5/5-00: 'o fornecimento do medicamento
não trará conseqüências ao Administrador, quanto a sua responsabilidade fiscal,
visto que a aquisição dos remédios enquadra-se na hipótese de dispensa ou
mexigibilidade de licitação (art 24, mciso IV, da Lei n 8 666/93)/
A jurisprudência é nesse sentido, conforme já julgado por esta
Turma Julgadora, com o voto didático e brilhante do Des. RICARDO DIP - in
verbis:
'A jurisprudência dos Tribunais superiores,
a despeito de que dissidie quanto à natureza da norma
inscrita no art. 196 da Constituição Federal de 1988, vale
dizer, se norma de eficácia contida (ou restnngível) ou se
norma programática, é consensual em que se aplique ela
de imediato, pois, ainda a entender-se programática, essa
norma 'não pode converter-se em promessa constitucional
inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando
justas expectativas nele depositadas pela coletividade,
substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu
impostergável dever, por um gesto irresponsável de
infidelidade governamental ao que determina a própria
Lei Fundamental do Estado' (AgRg no RExt 271 286 -STF -
T Turma -Mm Celso de Mello, cfr, em acréscimo, RExt
264.269 -STF -I a Turma -Mm Moreira Alves, RExt 247.900
-STF -decisão do Mm. Marco Aurélio; RExt 267.612 -
decisão do Mm. Celso de Mello; REsp 212 346 -STJ -I
Turma -Min. Franciulh Netto; RMS 11129 -STF -2 a Turma
-Mm Francisco Peçanha Martins, REsp 625 329 -STE--¥-^

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Turma -Mm. Luiz Fux) '*

E prossegue:
'Norma programática, ou talvez de
aplicação imediata —tal a entende o Mm Franciulh Netto,
do eg. Superior Tribunal de Justiça (cfr REsp 212 346) — ,
acaso de eficácia contida (rectius* restnngível, na
referência de Michel Temer), a do art. 196, CF, não pode,
em todo caso, ser limitada por práticas administrativas
que, em vez das diretrizes dessa norma constitucional,
lancem-se a tardias sendas burocráticas, reticentes em
atender a um direito fundamental, como se arrola o da
saúde (art 6°, CF), sobretudo posta em risco manifesto
uma vida humana, vida que é o mais nobre dos bens da
personalidade.

Por fim, o fato de, no curso do processo, se


ter alterado a espécie dos medicamentos a fornecer não
implica mudança indevida do objeto genérico do pleito,
nem, pois, decisão extra ou ultra pehta (cfr., a título
ilustrativo, REsp 625.329 -STJ - I a Turma - Min Luiz
Fux) '2
Por fim, ressalte-se que, ao ser concedida a segurança para
determinar que a autoridade impetrada forneça o medicamento necessário ao
paciente, conforme relatório médico, não exorbita o seu poder junsdicional, eis
que não cabe à Administração Pública, sob o argumento da conveniência e
oportunidade, deixar de cumprir o que a Constituição Federal lhe impõe como
dever Tem-se, portanto, que o direito à saúde é um interesse público subjetivo

i TJ5P - Ap Cível 209 351-5/3-00 - 11a Câmara Direito Público


2
Idem

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do cidadão, podendo sua tutela ser realizada judicialmente Nesse sentido é a


orientação do Supremo Tribunal Federal.
'O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa
jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria
Constituição da República (art. 196).'3 (fls. 153/158).
Do exuostOTnega-se provimento ao recurso

^2^7
PIRES DE ARAÚJO
'Relator

3
Recurso Extraordinário 271 286/RS, Relator Ministro Celso de Mello, Informativo STF n 210, de
22/11/2000, p 3

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