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H E R M ENÊUTICA JURÍDICA

Hélcio Corrêa

GADAMER E A EXPERIÊNCIA
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HERMENÊUTICA
GADAMER AND THE HERMENEUTICAL EXPERIENCE
Vinícius Silva Bonfim

RESUMO ABSTRACT
Visa demonstrar a importância da experiência hermenêutica The author intends to show the importance of hermeneutical
para Hans-Georg Gadamer, na busca pela autonomia do indiví- experience to Hans Georg Gadamer, in his quest for the
duo, enquanto ser lançado no mundo. autonomy of the individual, as a human being who has been
Demonstra que o cerne da teoria de Gadamer é explicar como thrown into the world.
escapar do círculo fechado das opiniões prévias e que a propos- He demonstrates that the main point of Gadamer’s theory
ta é manter um constante interpretar até que os conceitos pré- revolves around both explaining how to curb the closed circle
vios, ao longo da comunicação, sejam substituídos por outros of prejudgment and keeping interpretation on a regular level,
conceitos novos, mais adequados. so as to allow preconceptions to be replaced with other newer,
more suitable concepts, during communication.
PALAVRAS-CHAVE
Hermenêutica jurídica; Gadamer; Heidegger; tradição; experiên- KEYWORDS
cia; verdade; horizonte; hermenêutica da finitude; história efeitual. Legal hermeneutics; Gadamer; Heidegger; tradition; experience;
truth; horizon; hermeneutics of finitude; effectual history.

Revista CEJ, Brasília, Ano XIV, n. 49, p. 76-82, abr./jun. 2010


1 INTRODUÇÃO Gadamer afirma que a possibilidade do outro ter direito, é
Hans-Georg Gadamer é a figura decisiva no desenvolvi- a alma da hermenêutica (GRONDIN, 1999, p. 201). Para ele, a
mento da hermenêutica no século XX. Profundamente influen- hermenêutica é o reconhecimento de uma estrutura ontológica
ciado pela filosofia de Martin Heidegger, ele demonstrou, em (universal) do homem histórico.
Verdade e Método, a natureza da compreensão humana, e que Aqui neste ensaio, primeiramente, far-se-á uma interpre-
a linguagem passa a ser vista, após a virada linguística, como tação da Hermenêutica da Finitude: o encontro do limite
meio para a compreensão do indivíduo no mundo, de forma a na consciência da história para compreensão de conceitos
ser observada como processo de aprendizagem intersubjetivo. básicos e de pressupostos basilares para o entendimento da
Ele se apoia nos ensinamentos de Heidegger, sobre o Dasein teoria; no item seguinte, apontar-se-á a importância da histó-
(ser-aí), isto é, a condição do sujeito se ver imerso em um con- ria efeitual como base da experiência hermenêutica, uma
texto histórico-linguístico, condição de possibilidade que molda forma de evidenciar o indivíduo como ser histórico no processo
e fornece um horizonte de sentidos1. da experiência; o terceiro item visa, tão somente, esclarecer a
Ele renuncia à interpretação de um método único para se tradição na fusão dos horizontes por meio da pergunta e
alcançar a verdade, mas admite tão somente que há uma pré- da resposta, a maneira que Gadamer trabalha o método de
direção para ela, mediante o entendimento dos fundamentos interpretação; por último, para finalizar, a conclusão de todo o
linguísticos. Ao contrário de Heidegger, a análise de Gadamer tema trabalhado.
da compreensão do sentido não parte semanticamente da
abertura linguística ao mundo, mas pragmaticamente da busca 2 A HERMENÊUTICA DA FINITUDE: O ENCONTRO DO LIMITE NA
por entendimento mútuo entre autor e intérprete (HABERMAS, CONSCIÊNCIA DA HISTÓRIA
2004, p. 86). Nesse sentido: Heidegger só se interessa pela A partir da análise de alguns pontos da obra Verdade e
problemática da hermenêutica histórica e da crítica histórica Método, este artigo propõe demonstrar a maneira pela qual o 77
com a finalidade ontológica de desenvolver, a partir delas, a processo de confronto permite que o novo venha à luz pela
estrutura prévia da compreensão. Nós, ao contrário, uma vez mediação do antigo. Constituindo assim um processo de co-
tendo liberado a ciência das inibições ontológicas do conceito municação cuja estrutura corresponde a um método discursivo,
de objetividade, buscamos compreender como a hermenêuti- dialógico, linguístico. A partir deste ponto, Gadamer demons-
ca pôde fazer jus à historicidade da compreensão (GADAMER, tra a pretensão da hermenêutica à universalidade (GADAMER,
2005, p. 354). 2003). Mas antes de adentrar na análise destes pontos, é neces-
Demonstra, além disso, que, onde se tinha uma relação sário, para que a exposição tenha uma ordem lógica, uma breve
sujeito-objeto, agora tem-se uma relação sujeito-sujeito (FER- contextualização de sua teoria.
NANDES; PEDRON, 2008).
O cerne da teoria gadameriana é explicar como escapar Gadamer afirma a insustentabilidade da ideia
do círculo fechado das opiniões prévias. Necessariamente, a
de conhecimento universalmente válido, de
compreensão do que está no texto, da linguagem, precisa da
elaboração prévia de um projeto que será constantemente re- uma verdade absoluta que poderia ser
novado para que se tenha avanço na penetração do sentido. A generalizada a partir de uma experiência
proposta é manter um constante interpretar até que os concei-
tos prévios deixem de sê-los, e ao longo da comunicação, sejam particular e histórica.
substituídos por outros conceitos novos mais adequados. Aqui
encontra-se um papel fundamental do diálogo, consonante É fundamental demonstrar alguns conceitos básicos da teo-
Gadamer: Nós nos aproximamos mais da linguagem quando ria de Gadamer para que se tenha uma compreensão adequada
pensamos no diálogo. Para que um diálogo aconteça, tudo do conteúdo exposto.
precisa se afinar. Quando o companheiro de diálogo não nos Para Gadamer, aquele que quer compreender, fazer uma
acompanha e não vai além de sua resposta, mas só tem em interpretação correta, adotar um comportamento reflexivo dian-
vista, por exemplo, com que meios de contra-argumentação te da tradição, tem de proteger-se da arbitrariedade de intuições
ele pode limitar o que foi dito ou mesmo com que argumenta- repentinas e da estreiteza dos hábitos de pensar imperceptíveis
ções lógicas ele pode estabelecer a refutação, não há diálogo e voltar seu olhar para “as coisas elas mesmas” (GADAMER,
algum – um diálogo frutífero é um diálogo no qual oferecer 2005). Quer dizer que aquele que pretende compreender
e acolher, acolher e oferecer conduzem, por fim, a algo que não pode entregar-se de antemão ao arbítrio de suas próprias
se mostra como um sitio comum com o qual estamos fami- opiniões prévias, mas deve estar disposto a deixar que estas
liarizados e no qual podemos movimentar uns com os outros lhe digam algo. Para Gadamer tem de haver, antes de tudo, a
(GADAMER, 2005, p. 46). apropriação de opiniões prévias e preconceitos pessoais, pois

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é fundamental dar-se conta dos próprios pressupostos, a fim duo não é só racionalidade, mas também sentimento, caracte-
de que o próprio texto possa se apresentar em sua alterida- rística que faz com que o sujeito se torne sujeito por estar no
de, confrontando assim, a verdade do texto com as opiniões interior de um mundo. Mundo aqui compreendido como tudo
prévias pessoais do interprete (GADAMER, 2005, p. 358). aquilo que se expressa no ôntico, todas as experiências intelec-
Conforme Gadamer: É verdade que os preconceitos que nos tuais, ou, em outras palavras, abertura do Dasein. Nesse senti-
dominam frequentemente comprometem o nosso verdadeiro do: Afirmar “verdades eternas” e confundir a “idealidade” da
reconhecimento do passado histórico. Mas sem uma prévia pré-sença, fundada nos fenômenos, com um sujeito absoluto
compreensão de si, que é nesse sentido um preconceito, e sem e idealizado pertencem aos restos da teologia cristã no seio da
a disposição para uma autocrítica, que é igualmente fundada problemática filosófica, quer de há muito não foram radical-
na nossa autocompreensão, a compreensão histórica não se- mente expurgados (HEIDEGGER, 2002, p. 299). Compreender
ria possível nem teria sentido. Somente através dos outros é será, então, a possibilidade de interpretar a partir da particula-
que adquirimos um verdadeiro conhecimento de nós mesmos ridade dos mundos. O mundo efetivo da Dasein vai influenciar
(GADAMER, 2003, p. 12). a interpretação. Conforme Stein: O elemento transcendental de
Por esse motivo que as teorias de Heidegger, Husserl e Ga- que Heidegger fala, entretanto, não é mais o elemento do “eu
damer trouxeram grandes desenvolvimentos para a psicanálise2. penso” kantiano, que acompanha todas as nossas afirmações.
Ao contrário do que a princípio parece, Gadamer não pro- É um elemento que substitui, justamente, a consciência que
põe um método para se alcançar a verdade, pelo contrário, en- está presente na apercepção kantiana, pondo, em lugar des-
tende que a busca de uma verdade universalmente válida ame- sa consciência, o próprio Dasein enquanto ser-aí, como o aí
aça cobrir a realidade da compreensão, direcionando-a para um onde está o velamento e o desvelamento, a partir de onde se
ideal de conhecimento que ela jamais concretiza. Veja passa- coloca a questão da verdade. É, nesse sentido, o conceito de
gem a respeito: A experiência do mundo sócio-histórico não se “mundo”, que se aproxima do conceito do aí, o qual passa
eleva ao nível de ciência pelo processo indutivo das ciências a ser caracterizado, desde o começo da obra de Heidegger,
naturais. O que quer que signifique ciência aqui, e mesmo que um pouco no sentido prático: mundo é aquilo onde nós nos
em todo conhecimento histórico esteja incluído o emprego da movemos, onde nós nos arranjamos, onde nós lidamos com
experiência genérica no respectivo objetivo de pesquisa, o co- as coisas. Justamente, esse tipo de conceito de mundo prático
nhecimento histórico não aspira tomar o fenômeno concreto é o que está direta e fundamentalmente ligado ao conceito de
como caso de uma regra geral. O caso individual não se limita verdade (STEIN, 1993, p. 21).
78 a confirmar uma legalidade, a partir da qual, em sentido práti- Importa salientar que Heidegger é de fundamental impor-
co, se poderia fazer previsões. Seu ideal é, antes, compreender tância para o entendimento da teoria de Gadamer, destarte,
o próprio fenômeno na sua concreção singular e histórica. Por será lembrado constantemente como forte influência para a
mais que a experiência geral possa operar aqui, o objetivo não hermenêutica contemporânea. Para Stein, Gadamer procura
é confirmar nem ampliar essas experiências gerais, para se demonstrar, em sua hermenêutica filosófica, além daquilo que
chegar ao conhecimento de uma lei – por exemplo, como se pensamos e queremos, e sim, além do que nos determina: E
desenvolve os homens, os povos, os estados –, mas compre- este além não é simplesmente o processo cultural histórico,
ender como este homem, este povo, este estado é o que veio etc., mas é exatamente isto: de, pelo fato de a verdade ter esse
a ser; dito genericamente, como pode acontecer que agora é caráter histórico e estar ligada à histórica do ser, não é intei-
assim (GADAMER, 2005, p. 38). ramente exprimível na idéia da compreensão do ser e de que
algo determina essa compreensão do ser e nos limita. Nesse
Gadamer reconhece que a tarefa de controlar a sentido, a verdade é apresentada como verdade finita, não
apenas enquanto ligada ao Dasein, mas enquanto o Dasein é
história efeitual não pode ser completamente
o lugar de emergência da história do Ser que limita a compre-
resolvida, ou seja, a história efeitual não está ensão do Ser (STEIN, 1993, p. 29).
ao dispor do intérprete, o intérprete está mais Segundo Grondin, o princípio da história efeitual de Ga-
damer possui um status que pode deduzir quase toda a sua
submisso a ela do que tem consciência.
hermenêutica (GRONDIN, 1999, p. 190). Ele é tão importante
que tem de ser desenvolvido como uma nova disciplina. Reco-
Gadamer afirma a insustentabilidade da ideia de conheci- nhecer o nosso passado é fundamental para a compreensão
mento universalmente válido, de uma verdade absoluta que e formação do conhecimento. A história efeitual expressa, em
poderia ser generalizada a partir de uma experiência particular seu primeiro nível, a exigência de tornar consciente a própria
e histórica. Ele aponta para a dificuldade de compreensão dos situação hermenêutica, isso para controlá-la. Esta é a compre-
indivíduos na medida em que as ciências naturais são utilizadas ensão de preconceito de Heidegger. Gadamer reconhece que
como referência para a experiência social. Seguindo a linha de a tarefa de controlar a história efeitual não pode ser completa-
raciocínio, a verdade da vida é anterior à verdade científica. mente resolvida, ou seja, a história efeitual não está ao dispor
Heidegger, ao questionar a aplicação das ciências naturais do intérprete, o intérprete está mais submisso a ela do que tem
na fenomenologia, entende que esta se volta para as coisas consciência. Ela continua atuando até onde nós tentamos neu-
como elas são na consciência dos indivíduos e faz uma apro- tralizá-la, pertencemos à história mais do que ela nos pertence3.
priação da tradição pelo método fenomenológico. O infinito em Nos dizeres de Gadamer (2005, p. 360): É só o reconhe-
Heidegger é a ausência de domínio da razão, ou seja, o indiví- cimento do caráter essencialmente preconceituoso de toda

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compreensão que pode levar o proble- manece fundamentalmente aberta para positivo e o resultado; só assim a dialé-
ma hermenêutico à sua real agudeza. A toda e qualquer nova experiência – não tica é desenvolvimento e progresso ima-
história efeitual possui a função de uma só no sentido geral de correção de er- nente (HEGEL, 1997, p. 33).
instância basilar para cada compreen- ros, mas porque a experiência está es- Para Hegel, esse movimento dialético
são, ela dá clareza àquilo que parece ser sencialmente dependente de constante que é realizado pela consciência e com
questionável. confirmação, e na ausência dessa confir- ela mesma para se chegar a uma nova
Gadamer adverte que a descoberta mação ela se converte necessariamente conclusão, é a experiência. Apresenta-se
da finitude do conhecimento não gera noutra experiência diferente (GADAMER, aqui mais uma passagem respeitável de
nenhum obstáculo ao próprio conheci- 2005, p. 460). Hegel que contribui para o momento
mento, pelo contrário. A apreciação do Para Gadamer quando se considera dialético da experiência e a emancipa-
caráter universal e especificamente her- a experiência na perspectiva de seu re- ção indivíduo: A atitude do pensamento
menêutico da nossa experiência de mun- sultado, passa-se por cima do verdadeiro ingênuo é simplesmente a de se limitar
do dedica-se à hermenêutica da finitude. processo de experiência. A formação da à verdade publicamente reconhecida,
experiência dá-se, antes, pelo fato de as com uma confiante convicção, e de,
3 A HISTÓRIA EFEITUAL COMO BASE DA falsas universalizações serem constan- sobre esta firme base, estabelecer a
EXPERIÊNCIA HERMENÊUTICA temente refutadas pela experiência, as sua conduta e a sua posição na vida. A
Após a abordagem do que é história coisas tidas como típicas são destipifica- esta atitude simples desde logo se opõe
efeitual e de alguns pontos basilares da das. A experiência é vista como um saber a dificuldade que resulta da infinita di-
teoria gadameriana, adentramos, a partir mais amplo, não é um simples engano versidade de opiniões, que não permite
de agora, o conceito de experiência e a que é visto e corrigido. distinguir e determinar o que nelas po-
essência da experiência hermenêutica,
como conceitos dependentes entre si. A essência da hermenêutica está na pergunta, é claro que
Gadamer faz uma análise da cons­
toda experiência pressupõe a estrutura da pergunta. O
ciência da história efeitual como estrutu-
ra da experiência. Para ele, uma experi- conhecimento de que algo é ou não é como acreditávamos
ência só é válida, na medida em que se inicialmente pressupõe a passagem pela pergunta.
confirma; nesse sentido, sua dignidade
repousa no princípio que reza que ela Nos dizeres de Gadamer, uma mes- derá haver de universalmente válido; fa- 79
pode ser reproduzida. ma coisa não pode voltar a ser uma cilmente se pode, no entanto, imaginar
O fato de que a experiência seja válida experiência nova, para que isso ocorra, que esta dificuldade, verdadeira e seria-
enquanto não é contradita por uma nova tem de haver um fato inesperado para mente, provém da natureza das coisas.
experiência, caracteriza, evidentemente, proporcionar uma nova experiência de Mas, na realidade, aqueles que julgam
a essência geral da experiência, indepen- quem já é experimentado. Aquele que tirar partido desta dificuldade ficam na
dentemente de que se trate de sua pro- experimenta se torna consciente de sua situação de não ver a floresta por causa
dução científica no sentido moderno ou experiência, ganha um novo horizonte das árvores: estão em face de um obstá-
da experiência da vida cotidiana tal como dentro do qual pode se converter em culo e de uma dificuldade que eles mes-
vem realizando desde sempre. Gadamer experiência. Hegel dá a esse processo, mos ergueram (HEGEL, 1997, p. XXVI).
explicita muito bem ao dizer que: A ex- que inverte a consciência, o nome de Experiência é, portanto, consciência
periência não é a própria ciência, mas é dialética. A dialética da experiência tem da finitude humana. Ou seja, conhecer
sim um pressuposto necessário para ela. a sua consumação não em um saber seus limites, saber que não é senhor
É preciso que ela já esteja assegurada, concludente, mas pelo contrário, na do tempo nem do futuro. O homem
isto é, as observações individuais de- abertura à experiência que é posta em experimentado sabe seus limites e a
vem mostrar regularmente os mesmos funcionamento pela própria experiência. insegurança dos seus planos. O fato de
resultados. É só quando já se alcançou a O diálogo se caracteriza como a arte de o experimentado possuir uma abertura
universalidade, a qual está em questão colocar à prova. Nos ensinamentos de para novas experiências é que constitui
na experiência, que se pode colocar a Hegel: O princípio motor do conceito – as fases do processo de experiência. As-
pergunta relativa à razão e, por conse- enquanto não é simplesmente análise sim, as experiências não chegam ao fim,
guinte, o questionamento que conduz mas também produção das particulari- adquirindo então uma nova forma de
a ciência. Assim, pois, repetimos nossa dades do universal – é o que eu chamo saber. Gadamer reconhece a importância
pergunta: que universalidade é essa? É de dialética. Não se trata de uma dialé- da teoria de Hegel para a construção da
evidente que se refere ao comum indi- tica que dissolve, confunde, perturba um experiência. Observe: Este é o ponto em
ferenciado de muitas observações que princípio ou um objeto apresentado ao que Hegel nos aparece como testemu-
se torna possível uma certa capacidade sentimento ou à consciência imediata e nha importante. Na Fenomenologia do
de previsão (GADAMER, 2005, p. 459). apenas cuida em deduzir o contrário. [...] Espírito mostrou como faz suas expe­
Diz mais: A experiência só se realiza nas A dialética superior do conceito consiste riências a consciência que quer adquirir
observações individuais. Não se pode em produzir a determinação, não como certeza de si mesma. O objeto da cons­
conhecê-la numa universalidade prévia. um puro limite e um contrário, mas ti- ciência é o em-si, mas o em-si, só pode
É nesse sentido que a experiência per- rando dela, e concebendo-o o conteúdo ser conhecido tal como se apresenta

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para a consciência que experimenta. Assim, a experiência mentos típicos a partir da observação do comportamento do
que experimenta faz precisamente esta experiência: o em-si seu próximo, que, graças a essa experiência, pode prever atitu-
do objeto é o em-si “para nós”(GADAMER, 2005, p. 463). de do outro. Resumindo, é a experiência que, pela observação
A experiência ensina a saber o que é real. Ela faz reconhecer que é fundada na consciência de história efeitual, permite uma
que toda expectativa e toda planificação dos seres finitos, é, por análise solipsista, solitária, individual da compreensão. A segun-
usa vez, finita e limitada. da consiste em compreender o outro partindo do sentido de
Aqui a experiência já ganha uma característica qualitativa que é antecipado e apreendido a partir da posição do outro.
nova, já entendida como essência histórica do homem. Nesse Reconhecê-lo como pessoa, mas a compreensão deste continua
sentido, é pressuposto da experiência que se frustrem muitas sendo um modo de referência para si mesmo. Pretende, inclu-
expectativas, pois é a partir disso que ela é adquirida. O fato sive, compreendê-lo melhor que ele mesmo se compreende. A
de a experiência ser dolorosa e desagradável não é uma visão crítica a essa compreensão é que reduz o outro (tu) a objeto de
pessimista, mas, advém da própria essência da experiência. O cálculo, ou seja, é uma ilusão considerar o outro como instru-
homem experimentado evita o dogmatismo, já aprendeu com mento que se pode abrangir com vistas a dominar totalmente.
tantas experiências que já possui capacitação para voltar a fazer Para Gadamer, essa pretensão de compreender o outro, anteci-
mais experiências, está aberto para realmente viver. pando-lhe, cumpre a função de manter a distância a pretensão
do outro. Mas para chegar à terceira e mais elevada maneira de
A lógica da pergunta e da resposta que nos faz experiência hermenêutica, necessário se faz compreender que
compreender um texto é interpretar a pergunta a tradição possa pensar a sua própria historicidade. Na verdade,
a tradição não restringe a liberdade de conhecer, antes disso,
que é colocada por ele. Isso significa que a ela a torna possível. Esse conhecimento e reconhecimento é o
pergunta é a referência para a compreensão, que perfaz a abertura à tradição própria da consciência da histó-
ria efeitual. Como disciplina Gadamer: A compreensão implica
daí, conquista-se o horizonte hermenêutico. sempre uma pré-compreensão que, por sua vez, é prefigurada
por uma tradição determinada em que vive o intérprete e que
O caminho da hermenêutica é buscar, então, na experiência modela os seus preconceitos. Assim, todo encontro significa a
hermenêutica, os elementos que antes tínhamos distinguido na “suspensão” de meus preconceitos, seja o encontro com uma
análise da experiência. Essa experiência hermenêutica tem a ver pessoa com quem aprendo a minha natureza e os meus limi-
com a tradição. A tradição é linguagem, fala por si mesma. O tes, seja com uma obra de arte (“não há um lugar em que não
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intérprete está envolvido em uma história dentro da qual não possa ver-te, deves mudar a tua vida”) ou com um texto; e é
possui controle completo. Desta feita, afirma-se que o homem impossível contentar-se em “compreender o outro”, buscar e
está mais para a história que a história para o homem. Impor- reconhecer a coerência imanente aos significados-exigências
tante salientar que o conceito de história efeitual é como um do outro (GADAMER, 2003, p. 13).
princípio que pode deduzir quase toda sua hermenêutica. Nos A diferença entre a segunda maneira de compreender e a
dizeres de Gadamer: [...] a consciência da história efeitual ultra- terceira é que esta última tem um autêntico correspondente da
passa a ingenuidade desse comparar e igualar, deixando que experiência do tu. Não adentrar nas pretensões do outro é que
a tradição se converta em experiência e mantendo-se aberta permite que lhe diga algo. Para que isso seja viável, é necessária
à pretensão de verdade apresentada por essa. A consciência a abertura daquele que nos fala quanto do contrário. Aquele
hermenêutica tem sua consumação não na certeza metodoló- que permite que lhe diga algo deve estar aberto de maneira
gica sobre si mesma, mas na comunidade de experiência que fundamental. A tradição, para Gadamer, tem de ser analisada
distingue o homem experimentado daquele que está preso aos não no sentido de uma alteridade do passado, mas de deixar
dogmas. (GADAMER, 2005, p. 472). valer suas pretensões, reconhecer que ela, tradição, possui algo
Isso caracteriza a história efeitual. A verdadeira experiência en- a nos dizer.
contra a capacidade de fazer com que a autoconsciência de uma Para maior exploração do tema, iremos dissertar agora so-
razão encontre o seu limite, a consciência da sua historicidade. bre a primazia hermenêutica da pergunta, posteriormente da
Após dissertar sobre alguns pontos basilares da teoria gada- pergunta e da resposta. Mais precisamente o modelo da dialéti-
meriana, trabalhar-se-á agora o conceito de tradição. ca hegeliana na qual explicamos anteriormente.
Aqui Gadamer demonstra a importância da pergunta e,
4 A TRADIÇÃO NA FUSÃO DOS HORIZONTES POR MEIO DA por suposto, o conceito de pergunta na análise da situação
PERGUNTA E DA RESPOSTA hermenêutica. A essência da hermenêutica está na pergunta, é
Para Gadamer, a tradição deve funcionar como um “tu” claro que toda experiência pressupõe a estrutura da pergunta.
(alteridade). É linguagem que chega pela experiência herme- O conhecimento de que algo é ou não é como acreditávamos
nêutica, ela fala por si própria. Utilizar a tradição para alcançar a inicialmente pressupõe a passagem pela pergunta.
compreensão é fundamental, pois não há uma relação de apro- Da mesma maneira que a negatividade dialética da experi-
priação pelo intérprete do texto, mas um diálogo, seguido de ência encontra sua ideia de experiência consumada (consciên-
perguntas e respostas, no qual o intérprete participa, “ouvindo” cia de finitude e limitação) também a forma lógica da pergunta
o que o texto tem para dizer4. e resposta (negativa) encontra sua essência no saber que não se
Gadamer define em três tipos de experimentar e compre- sabe. Essa essência de toda pergunta, ao dar sentido de orien-
ender o tu (tradição). A primeira maneira é a que detecta ele- tação para que a resposta tenha sentido e ser pertinente é o

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modo singular da realização da experiên- preparação prévia, conhecimento prévio. ra compreensão implica na reconquista
cia hermenêutica (GADAMER, 2005). O segundo ponto é considerar que as dos conceitos de um passado histórico
Gadamer demonstra como fazer per- respostas são mais interessantes que as de tal modo que esses contenham tam-
gunta é tão importante e mais difícil que perguntas, como na solução de enigmas, bém nosso próprio conceber. Gadamer
dar a resposta. Observe: Para pergun- por exemplo. O que se procura na teo- denomina esse procedimento de fusão
tar, é preciso querer saber, isto é, saber ria gadameriana é o âmbito do aberto, de horizontes (GADAMER, 2005, p. 488).
que não se sabe. E no intercâmbio de do conhecimento, e isso se realiza na Gadamer apresenta essa passagem
perguntas e respostas, de saber e não ideia, pois, a partir dela pressupõem-se como ponto fundamental de seu racio-
saber, descrito por Platão ao modo de perguntas. O que a pergunta faz é nos cínio: A dialética da pergunta e da res-
comédia, acaba-se reconhecendo que conduzir para o aberto e tornar possível posta que descobrimos na estrutura da
para todo conhecimento e discurso em a resposta. Segundo Gadamer, toda ideia experiência hermenêutica nos permitirá
que se queira conhecer o conteúdo tem a estrutura de pergunta. agora determinar mais detidamente o
das coisas a pergunta toma a diantei- A lógica da pergunta e da resposta que caracteriza esse tipo de consciência
ra. Uma conversa que queira chegar a que nos faz compreender um texto é in- chamado consciência da história efei­
explicar alguma coisa precisa romper terpretar a pergunta que é colocada por tual. Isso porque a dialética de pergunta
essas coisas através de uma pergunta ele. Isso significa que a pergunta é a refe- e resposta que expusemos acima apre-
(GADAMER, 2005, p. 474). rência para a compreensão, daí, conquis- senta a relação da compreensão como
Por essa razão, Gadamer entende ta-se o horizonte hermenêutico. Observe uma relação recíproca semelhante à
que a dialética se concretiza na forma de o entendimento de Gadamer: A recons- relação dá na conversação. É verdade
pergunta e resposta, pois todo conhe- trução da pergunta à qual responde de- que um texto não nos fala como o faria
cimento tem de passar pela pergunta. terminado texto não pode ser tomada, tu. Somos só nós, que compreendemos,
Pergunta quer dizer colocar em aberto. evidentemente, como uma mera reali- que temos de trazê-lo à fala a partir de
O sentido da pergunta só é realizado a zação de metodologia histórica. Ao con- nós mesmos. Mas já vimos que esse tra-
partir do momento em que deixa pairar trário, o que vem primeiro é a pergunta zer-à-fala, próprio da compreensão, não
uma resposta, deixa em aberto aquilo que o texto nos coloca, sermos atingidos é uma intervenção arbitraria de uma
que se quer perguntar. Importante frisar pela palavra da tradição, de modo que iniciativa pessoal, mas refere, por sua
que a pergunta, para que tenha abertura, para compreender essa tradição preci- vez, como pergunta à resposta latente
precisa estabelecer seu horizonte, sua samos sempre realizar a tarefa da au- do texto. A latência de uma resposta 81
delimitação. Por isso a pergunta pode ser tomediação histórica do presente com pressupõe, por sua vez, que aquele que
verdadeira ou falsa na medida em que a tradição. Assim, na verdade, a relação pergunta foi atingido e se sente interpe-
consegue ou não levar o assunto para o entre pergunta e resposta se inverteu. O lado pela própria tradição. Esta é a ver-
âmbito do verdadeiro aberto. Gadamer que é transmitido e nos fala – o texto, dade da consciência da história efeitual.
afirma: A decisão da pergunta é o cami- a obra, o vestígio – impõe, ele próprio, Na medida em que nega o fantasma de
nho para o saber. Uma pergunta é de- uma pergunta, colocando nossa opinião um esclarecimento total, e justo por isso,
cidida pela preponderância de motivos em aberto. Para poder responder a essa a consciência dotada de experiência his-
a favor de uma possibilidade e contra a pergunta que nos é colocada, nós, os tórica está aberta para a experiência da
outra; mas isto ainda não é o conheci- interrogados, temos que começar, por história. Descrevemos sua maneira de
mento completo. Só se alcança o saber nossa vez, a perguntar. Procuramos re- realizar-se como a fusão de horizontes
da coisa ela mesma quando se dissol- construir a pergunta a que responderia do compreender que faz a intermedia-
vem as instâncias contrárias e quando aquilo que é transmitido. Todavia, não ção entre o texto e seu intérprete (GA-
se desmascara a incorretura dos argu- poderemos fazê-lo se não superarmos, DAMER, 2005, p. 486). De acordo com
mentos (GADAMER, 2005, p. 474). com nossas perguntas, o horizonte Gadamer há fusão de horizontes quando
Saber é ir ao encontro dos opostos, histórico assim caracterizado. A recons- esse exercício de pergunta e resposta
é saber pensar as possibilidades como trução da pergunta a que o texto deve descrito acima ocorre de maneira ima-
possibilidades, entender que o saber é responder está, ela mesma, situada nente. Quando há uma troca de informa-
fundamentalmente dialético. De acordo dentro de uma interrogação com o qual ções em que sempre a pergunta toma a
com Gadamer, todo perguntar e todo procuramos responder à pergunta que dianteira, ela deixa por aberto o novo, a
querer pressupõem um saber que não se a tradição nos coloca (GADAMER, 2005, busca pelo conhecimento, a continuida-
sabe. O que conduz uma pergunta de- p. 487). de da linguagem. Pois toda experiência
terminada é um saber não determinado. Observe que, para Gadamer, com- é confronto, já que ela opõe o novo ao
Ao demonstrar a questão das per- preender um texto é perguntar o que ele antigo. Não quer dizer que o “novo” pre-
guntas, Gadamer faz uma pergunta fun- está nos perguntando, interpretá-lo, mas valecerá, que se tornará uma verdadeira
damental para adquirir conhecimento: sem fechar as hipóteses interpretativas. experiência, ou se o antigo, costumeiro
Como é possível, então, chegar ao não Mas para que ocorra essa interpretação é e previsível, reconquistará a sua existên-
saber e ao perguntar? Gadamer já de necessária uma reconstrução da pergun- cia. Em outras palavras, podemos dizer
plano estabelece que, para que se pos- ta que é transmitida, ou seja, superar o que quando se considera a tradição para
sa chegar a esse ponto, é necessário ter horizonte histórico que a própria tradição fazer a pergunta e, ao mesmo tempo, o
uma ideia, e para isso, mister é ter uma nos coloca. Para que se tenha a verdadei- texto faz a mesma pergunta, o texto e

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a tradição fundem seus horizontes. Ou seja, se o texto tenta intercâmbio constante entre passado e presente. Segundo o historicismo,
uma consciência histórica especificamente desenvolvida deveria ser capaz
responder a uma pergunta e, ao tentar interpretar esse texto
de emancipar-se desse condicionamento e possibilitar, dessa forma, uma
levamos a tradição em consideração para buscarmos a resposta, fase objetiva na história. Isso contradiz o que Gadamer afirma sobre a histó-
é como se o texto e a tradição estivessem olhando para o mes- ria efeitual, somos mais ser do que consciência (GRONDIN, 1999, p. 191).
mo lugar, olhando na mesma direção e, assim, com horizontes 4 Na medida em que cada intérprete se situa num novo horizonte, o evento
que se traduz linguisticamente na experiência hermenêutica é algo novo
fundidos. que aparece, algo que não existia antes. Neste evento, fundado na linguis-
Esse é o exercício da pergunta e da resposta no que tange ticidade e tornado possível pelo encontro dialético com o sentido do texto
à fusão de horizontes. transmitido, encontra a experiência hermenêutica a sua total realização
(PALMER, 1986, p. 211).

5 CONCLUSÃO
A forma com que Gadamer trabalha a relação da história REFERÊNCIAS
efeitual como uma consciência da historicidade do indivíduo que COELHO JUNIOR, Nelson. Encontros e desencontros. Revista Filosofia e Psica-
nálise, São Paulo, Ano I, n. 6, p. 25, 2008.
busca, por suas experiências, compor, em uma relação intersubje- FERNANDES, Bernardo Gonçalves; PEDRON, Flávio Quinaud. O poder judiciá-
tiva, um novo conceito de tradição, levou o estudo da linguagem rio e(m) crise. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2008.
a uma evolução sem precedentes. A experiência hermenêutica, GADAMER, Hans-Georg. Verdade e método. Tradução de Flávio Paulo Meurer
como o surgimento do novo, é fundamental para o crescimento (revisão da tradução de Enio Paulo Giachini). 7. ed. Petrópolis: Vozes, Bragança
Paulista: EDUSF, 2005. (Coleção pensamento humano).
do ser enquanto participante de uma pluralidade cultural. Para se ________; FRUCHON, Pierre (Org.). O problema da consciência histórica.
chegar a essa nova experiência, Gadamer afirma incessantemente Tradução de Paulo César Duque Estrada. 2. ed. Rio de Janeiro: FGV, 2003.
que é necessário estar aberto para o novo, para a experiência, ________. Hermenêutica em retrospectiva. Tradução de Marco Antônio Casa-
nova. Petrópolis: Vozes, 2007.
para a quebra de expectativa, pois o novo deixaria de sê-lo se não GRONDIN, Jean. Introdução à hermenêutica filosófica. Tradução de Benno Dis-
tivesse que se afirmar contra alguma coisa. chinger. São Leopoldo: Unisinos, 1999 (Coleção Focus).
Para a realização dessa nova formulação do conceito de HABERMAS, Jürgen. Verdade e justificação: ensaios filosóficos. Tradução de Mil-
ton Camargo Mota. São Paulo: Loyola, 2004. (Humanística; 7).
tradição, mister se faz observar a relação da pergunta e da res- ________; SAVIDAN, Patrick (Org.). A ética da discussão e a questão da ver-
posta como o meio comunicativo do eu com o tu. A relação na dade. Tradução de Marcelo Brandão Cipolla. São Paulo: Martins Fontes, 2004.
busca com a alteridade para o acréscimo de experiência que (Coleção Tópicos).
se faz com a criação da pergunta. Ele buscou nesse encontro HEIDEGGER, Martin. Ser e tempo. Tradução de Márcia Sá Cavalcante Schuback.
12. ed. Petrópolis: Vozes, 2002
de conceitos a busca para uma compreensão onde se faz o ser HEGEL, Georg Wilhelm Friedrich. Princípios da filosofia do direito. Tradução de
82 ontológico (universal). Orlando Vitorino. São Paulo: Martins Fontes, 1997. (Clássicos. Filosofia).
Gadamer afirma que esse processo de confronto em que há PALMER, Richard. Hermenêutica. Tradução de Maria Luísa Riberio Ferreira. Lis-
boa: Edições 70, 1986. (O saber da filosofia; 15).
a possibilidade de o velho ser substituído pelo novo, constitui STEIN, Ernildo. Seminário sobre a verdade: lições preliminares sobre o artigo 44
uma comunicação cuja estrutura corresponde ao modelo dialé- de Sein und Zeit. Petrópolis: Vozes, 1993.
tico. A partir daí, ele leva a pretensão da hermenêutica à univer-
salidade. Por este motivo é que o processo de comunicação é Artigo recebido em 9/7/2009.
importante, pois o homem e, consequentemente, a sociedade, Artigo aprovado em 11/11/2009.
se constituem pela linguagem.

NOTAS
1 Horizonte é o âmbito de visão que abarca e encerra tudo o que é visível
a partir de um determinado ponto. [...] A linguagem filosófica empregou
essa palavra, sobretudo desde Nietzsche e Husserl, para caracterizar a vin-
culação do pensamento à sua determinidade finita e para caracterizar,
com isso, a lei do pregresso de ampliação do âmbito visual. Aquele que
não tem um horizonte é um homem que não vê suficientemente longe
e que, por conseguinte, supervaloriza o que lhe está mais próximo. Pelo
contrário, ter horizontes significa não estar limitado ao que há de mais
próximo, mas poder ver além disso. Aquele que tem horizontes sabe va-
lorizar corretamente o significado de todas as coisas que caem dentro
deles, segundo os padrões de próximo e distante, de grande e pequeno. A
elaboração da situação hermenêutica significa então a obtenção do hori-
zonte de questionamento correto para as questões que se colocam frente
à tradição (GADAMER, 2005, p. 452).
2 [...] como ponto de partida o trabalho pioneiro de psiquiatras como Ludwig
Binswanger (1881-1966), que construíram suas formações por meio do
contato simultâneo com as obras de Freud, Husserl e Heidegger. O caso
Binswanger é particularmente ilustrativo, já que sendo amigo pessoal de
Freud e tendo trabalho como psiquiatra e psicoterapeuta, buscou incessan-
temente trazer para o debate psicanalítico as concepções fenomenológicas,
inicialmente de Heidegger e Husserl. (COELHO JUNIOR, 2008, p. 25).
3 Importante citar aqui a crítica ao historicismo, que teve origem positivista.
Ele tentou objetivar a história excluindo o sujeito interpretante, algo que é
inconcebível para Gadamer. Em outras palavras, é como se a história pu-
desse ser interpretada de uma só maneira. O historicismo exclui a possi-
bilidade de interpretação na nossa situação presente, ou seja, não há um Vinícius Silva Bonfim é advogado, em Belo Horizonte-MG.

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