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1 INTRODUÇÃO1
No final dos anos 40 e inicio dos anos 50 foram divulgadas quatro obras que
passaram a ser referências obrigatórias sobre o Tambor de Mina:
a) o livro de Nunes Pereira sobre a Casa das Minas (PEREIRA, 1948);
d) e um artigo de Pierre Verger, que estivera em 1947 nas casas das Minas e de Nagô,
onde levantava a hipótese de que a primeira teria sido fundada por uma rainha do
Dahomé, vendida como escrava (VERGER, 1952).
Embora aqueles autores não tenham tratado apenas da Mina-Jeje, até bem pouco
tempo, falar em religião afro-brasileira do Maranhão era falar da Casa das Minas de São
Luís, o que parece ter sido também influenciado por Roger Bastide. Apesar de conhecer
a Casa das Minas mais pela literatura, Bastide teve oportunidade de conversar com Mãe
Andreza (que dirigiu a casa entre 1915 e 1954 e que conhecia profundamente os
fundamentos da Mina-Jeje). É possível que as palavras elogiosas dirigidas a ela em As
religiões Africanas (BASTIDE, 1971) e ratificadas em seus últimos trabalhos
(BASTIDE, 1974), tenham contribuído para direcionar para ela as atenções dos
pesquisadores. É bom lembrar que foi lendo Bastide que Sergio Ferretti chegou a ela e a
elegeu como seu principal objeto de pesquisa. Sergio Ferretti em Querentã de
Zomadonu (monografia de mestrado publicada em 1985, e com 2ª edição em 1996)
reuniu as informações fornecidas por outros pesquisadores e ampliou, em muito, o
conhecimento disponível sobre a Mina-Jeje (FERRETTI, S. 1996).
Além de possuir alguma relação com as culturas jeje e nagô (como é indicado em
dois dos nomes pelos quais era conhecido no povoado de Santo Antônio), o Terecô tem
sido também associado à cultura banto. Assim, a entidade espiritual Légua Boji, nos foi
apresentada por D. Antoninha (a mãe-de-santo mais antiga de Codó, falecida em 1997,
que foi nossa principal informante), como um preto velho angolano, e é conhecido em
São Luís, na Casa das Minas-Jeje como um vodum cambinda. Segundo Dona Deni,
atual chefe daquela casa, até meados dos anos 50 eram freqüentes as vindas de pessoas
de um terreiro cambinda de Cangumbá (povoado negro codoense ainda não localizado
por nós) para as festas de São Sebastião realizadas na Casa das Minas, e elas eram
acompanhadas por voduns da Mata como: Légua Boji, Rei Camundá e outros. A “linha
de Codó” é também associada em terreiros da capital à “nação” Caxias, reverenciada na
Casa de Nagô, que para uns líderes religiosos remete a Caxeu (na África) e para outros
ao município maranhense de mesmo nome (Caxias), de onde Codó foi desmembrado, e
que cujo nome pode ter sido também derivado de Caxeu.
Durante algum tempo acreditamos que a palavra Terecô poderia ter se originado da
imitação do som dos tambores da Mata (“terêcô, terêcô, terêcô”), em virtude de não
havermos encontramos nem Codó e nem em São Luís uma definição etmológica para
ela. Mais recentemente a antropóloga e lingüista baiana Yeda Pessoa de Castro,
comentando em conversa um dos nossos trabalhos, esclareceu que ela pode ser de
origem banto e ter sido derivada de “intelêkô” (?) e que ter o mesmo significado que
Candomblé. Em relação à denominação Pajé, dada também em Santo Antônio ao
Terecô, gostaríamos de lembrar que, além da cidade de Codó ter surgido em área que foi
muito habitada por índios e da palavra pajé ser de origem tupi, a denominação “pajé” foi
utilizada em notícias publicadas na imprensa maranhense e de outros Estados, no último
quartel do Século XIX, para designar a religião de negros (afro?) no Maranhão 5. De
qualquer modo, o emprego daquela palavra para designar Terecô pode sugerir a
existência nele de maior sincretismo com a cultura indígena do que a que ocorreu no
Tambor de Mina jeje ou nagô.
A memória dos codoenses registra uma fase inicial do Terecô em que os negros das
fazendas de algodão do Município de Codó realizavam seus rituais religiosos na “mata
do coco” (babaçu), longe da vista dos senhores, e uma fase após a abolição da
escravatura, quando os negros da cidade realizavam seus rituais às margens da Lagoa do
Pajeleiro (hoje desaparecida), ás escondidas da polícia, com quem entravam
freqüentemente em conflito. Tudo indica que os primeiros salões de Terecô da cidade de
Codó surgiram muito depois dos primeiros terreiros de Mina da capital e que não havia
ali terecozeiros muito afamados no até os anos quarenta, pois, alem de Costa Eduardo
(EDUARDO,1948) não ter feito referência a eles, nenhum pai-de-santo de Codó foi
lembrado pelo líder espírita Waldemiro Reis em obra publicada nos anos 50 sobre o
espiritismo no Maranhão, onde são citados nominalmente vários pais-de-santo e
curadores de São Luís e de outras cidades maranhenses (REIS, ca. 1954)6. Contudo,
analisando-se os relatórios da Missão Folclórica, criada por Mário de Andrade, que
percorreu o Norte e Nordeste no final da década de 30, pode-se verificar que no final da
década de 30 a “linha de Codó” já marcava sua presença em terreiros de Mina de São
Luís (Maximiana), de Belém (Sátiro), e que surgiu no Pará com o nome Babassuê
(ALVARENGA,1948; 1950)7.
c) existência de “poste central” nos barracões antigos (do povoado de Santo Antônio e
da sede do município), ausência neles de quarto de segredo (peji) e guarda de pedras de
assentamento das entidades espirituais em caixas de madeira (“urnas”);
d) linha de caboclo mais desenvolvida e chefiada por entidade que tem “uma banda
branca e uma banda preta”, de quem se afirma poder fazer o bem e o mal, embora não
pertença à ´linha negra´ (identificada com a Quimbanda);
e) abertura do toque com “Louvariê” e chamada dos encantados “com joelho em terra” e
com as mãos (e até a cabeça) encostadas no chão, de onde acredita-se vir a sua força;
j) toque iniciado à noite e continuado no dia seguinte (ou até o final da festa), sem
suspensão, e saída de médiuns incorporados para a rua, às vezes acompanhados de
tocadores e seus instrumentos musicais (a semelhança do que observamos em 1993 no
Benin, no festival de cultura do vodum Ouidah 92)10.
Embora o Terecô não possa ser confundido com a Mina, foi cruzado com ela e tem
sido comparado principalmente com a Mina-Jeje11. A escolha desta como termo de
comparação prende-se a várias razões: em primeiro lugar, é a mais conhecida na
literatura afro-brasileira e desde os anos 40 foi identificado no Terecô elementos da
cultura jeje (EDUARDO,1948). Em segundo lugar, na Casa das Minas-Jeje fala-se de
relações estreitas com um terreiro cambinda de Codó, que costumava visitá-la na festa
de São Sebastião até a morte de Mãe Andreza (ocorrida em 1954), de onde teria vindo
para ela o vodum Arrônivissavá, irmão de Dadarrô (FERRETTI,M. 1993:134n) ou seu
cunhado (FERRETTI,S. 1996). E, finalmente, existe pais-de-santo em São Luís que
consideram algumas entidade cultuadas no Terecô como voduns jeje na Mata ou como
ancestrais da família real do Dahomé. Assim, Légua Boji seria Légba e/ou Poloboji e
Pedro Angassu seria o rei Agassou (OLIVEIRA,1989).
3 CONCLUSÃO
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
--------. A Casa Fanti-Ashanti em São Luís do Maranhão. Rio de Janeiro, 1987. Tese
(Doutorado em Antropologia Social)-Museu Nacional-UFRJ, 1987.
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Desroche.
FERREIRA, Euclides Menezes. A Casa Fanti-Ashanti e seu alaxé. São Luís: Ed.
Alcântara, 1987.
--------. Encantaria de Bárbara Soeira: Codó, capital da magia negra?. São Luís: UFMA,
1997 (inédito)
LEACOCK, Seth and Ruth. Spirits of the deep: a study of an Afro-Brazilian Cult. New
York: The American Museum of Natural History, 1972.
LIMA, Lucienne. A cultura negra: alguns dos principais aspectos do Candomblé e suas
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OLIVEIRA, Jorge Itaci. Orixás e voduns nos terreiros de Mina. São Luís: VCR
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bolsa de trabalho-arte UFMA/FUNARTE; inédito).
5 Ver: Uma religião de que não gosta o governo. A Província de São Paulo, 10/11/1876.
6 Fala-se atualmente em Codó que o salão de Terecô mais antigo da cidade foi aberto
por Eusébio Jânsen, bem antes da abertura do salão de Maria Piauí, que afirma-se ter
chegado a Codó em 1936.
10 Em São Luís, relatos a respeito do já extinto Terreiro do Egito falam de tambores que
tocavam dia e noite sem parar. Observações também da festa de São Sebastião na Casa
das Minas-Jeje registram uma saída dos voduns para Casa de Nagô. Nesta festa são
cantadas algumas doutrinas em língua africana e em português com palavras africanas,
para relembrar a visita recebida no passado dos cambinda de Codó, onde se fala em:
Camundá, Boço Vandereji, Boço Jara, Boço Memeia, Boço Fama, Fina Jóia e em outras
entidades (FERRETTI,S. 1996; FERRETTI,M. 1993; 1997b).