Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Esta seria, talvez, a ocasião de se indagar: além da prosa, que poesia seria
escrita hoje para O caso do Convento das Mercês? Com que imagens, que sonoridade,
que métrica (ou ausência dela), seria possível descrever o mausoléu pretendido pelo
astuto interesse? Qual bardo falaria do promíscuo caso entre a memória e o poder? Quais
signos da morte seriam apropriados para tanto? Desconheço se Emílio se aventura com
as Musas... Em todo caso, desconfio que o (in)existente poema não sairá de lavra já
consagrada, pois 19 membros da Academia Maranhense de Letras assinaram um
manifesto defendendo a manutenção do Convento nas mãos da Fundação controlada
pelo “dono do mar”. Na ausência de poesia moderna, lembro a prosa poética do barroco
padre Antônio Vieira, voz sempre abalizada para cantar o Maranhão, desta vez em seu
Sermão do Bom Ladrão (1655).
“Encomendou el-rei D. João, o Terceiro, a S. Francisco Xavier o informasse do estado
da Índia, por via de seu companheiro, que era mestre do Príncipe; e o que o santo
escreveu de lá, sem nomear ofícios nem pessoas, foi que o verbo rapio na Índia se
conjugava por todos os modos... O que eu posso acrescentar, pela experiência que
tenho, é que não só do Cabo da Boa Esperança para lá, mas também das partes
daquém, se usa igualmente a mesma conjugação. Conjugam por todos os modos o
verbo rapio, porque furtam por todos os modos da arte, não falando em outros novos e
esquisitos... Finalmente, nos mesmos tempos, não lhes escapam os imperfeitos,
perfeitos, plus quam perfeitos, e quaisquer outros, porque furtam, furtaram, furtavam,
furtariam e haveriam de furtar mais, se mais houvesse. Em suma, que o resumo de toda
esta rapante conjugação vem a ser o supino do mesmo verbo: a furtar para furtar. E
quando eles têm conjugado assim toda a voz ativa, e as miseráveis províncias
suportado toda a passiva, eles, como se tiveram feito grandes serviços, tornam
carregados de despojos e ricos, e elas ficam roubadas e consumidas”.