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Avaliação pré-operatória

pediátrica

Júlia M. Paes de Carvalho


Luciano A. M. Pinto

Resumo das crianças antes das cirurgias ou de quaisquer


procedimentos anestésicos1.
A elaboração de risco cirúrgico para a
A morbidade e a mortalidade relacionadas
população pediátrica apresenta peculiaridades
à anestesia sofreram um acentuado declínio nos
inerentes a esta faixa etária. Essas peculiaridades
últimos anos. Ainda assim, o risco de eventos
relacionam-se com a prevalência de condições
adversos é maior em lactentes e crianças meno-
crônicas distintas das encontradas na população
adulta e com a ocorrência comum de eventos res quando comparado ao encontrado em crian-
agudos em crianças. O profissional envolvido ças maiores e adultos; a incidência da parada
na avaliação pré-operatória pediátrica deve estar cardíaca durante o procedimento anestésico na
familiarizado com esses conceitos, tornando-se população pediátrica é três vezes maior que a da
apto a atuar criteriosamente na seleção de exa- população adulta. A incidência de complicações
mes e indicação de condutas perioperatórias. anestésicas na população infantil é de 0,7 em
PALAVRAS-CHAVE: Risco cirúrgico; Exa- 1000 procedimentos, mas pode chegar a 4,3 em
mes pré-operatórios; Cirurgia pediátrica. 1000 procedimentos nos menores de um ano8.
As principais complicações durante o ato anes-
Introdução tésico em crianças relacionam-se aos eventos
O preparo pré-operatório das crianças e respiratórios (43-53%). A taxa de mortalidade
adolescentes possui particularidades que o nas crianças que sofreram algum evento adverso
diferencia da avaliação da população adulta. durante o procedimento anestésico é maior que
É fundamental que essas informações sejam a encontrada na população adulta acometida por
disseminadas e conhecidas por todos os que algum evento similar (50% e 35%, respectiva-
lidam com a população pediátrica submetida mente). No período de recuperação anestésica
a intervenções cirúrgicas, incluindo anestesis- a complicação mais comum é a ocorrência de
tas, cirurgiões e pediatras gerais. O pediatra vômitos (77% das complicações relatadas)4,8.
assistente deve desempenhar um papel ativo
na avaliação e preparação clínica e psicológica Avaliação pré-operatória
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A avaliação pré-operatória busca identi- por exemplo: detecção de anormalidades sem
ficar potenciais fatores que aumentem o risco manifestações clínicas que possam ter impacto
de complicações durante e após o ato cirúrgi- no risco de morbidade e mortalidade cirúrgicos,
co e que estejam associados com uma maior estabelecimento de valores laboratoriais basais
morbidade ou mortalidade. A maior parte das que poderão sofrer alterações e necessitarão de
crianças previamente hígidas necessita de uma monitorização no pós-operatório, e, finalmente,
avaliação pré-operatória mínima, composta ba- por questões médico-legais13.
sicamente por anamnese e exame físico16, sendo Façamos agora uma análise crítica dos
desnecessária a solicitação rotineira de exames exames costumeiramente solicitados e suas
complementares11. possíveis indicações na clientela pediátrica.
A anamnese deve contemplar a história da
doença atual; as doenças crônicas subjacentes
Hematócrito e hemoglobina
que podem influenciar o ato anestésico ou A avaliação hematológica rotineira de
cirúrgico; o uso atual ou pregresso de medica- crianças saudáveis antes de uma cirurgia ele-
ções, com especial ênfase no uso de salicilatos tiva não é necessária. As alterações discretas
ou outros antiinflamatórios; o conhecimento de nos valores de hemoglobina (Hb>9,5g/dL)
alergias medicamentosas ou a substâncias que podem não ser diagnosticadas clinicamente,
contenham látex (balões ou bexigas); o relato sendo detectadas por vezes somente através
de experiências anestésicas anteriores, com a do exame laboratorial. Esse achado, porém,
descrição de dificuldades ou complicações ocor- não altera a conduta anestésica e a evolução
ridas durante o procedimento; a história familiar pós-operatória1,4,11. Além disso, a maioria das
de complicações relacionadas à anestesia, como crianças com alguma alteração hematimétrica
hipertermia maligna ou paralisia prolongada detectada durante o pré-operatório acaba por
após anestesia (indicando possível deficiência não receber nenhum acompanhamento especí-
de pseudocolinesterase), bem como história de fico para investigar e tratar essa condição, o que
sangramentos e doenças neuromusculares1. A pode acarretar questões éticas e médico-legais10.
anamnese deve ainda ser dirigida para a pesqui- Ainda assim, este é o exame laboratorial solici-
sa de algumas condições clínicas que possam ter tado com maior frequência no pré-operatório
impacto no procedimento anestésico e cirúrgico, pediátrico4.
como veremos mais adiante. A determinação do hematócrito e da hemo-
globina tem seu emprego nas situações de risco
Exames complementares no aumentado para anemia: lactentes menores de
pré-operatório um ano (principalmente os prematuros), jovens
Embora inúmeros estudos demonstrem a do sexo feminino após a menarca e pacientes
inexistência de benefícios na solicitação rotinei- com doenças crônicas. A determinação do
ra e indiscriminada de exames complementares hematócrito e da hemoglobina basal também
no pré-operatório de pacientes saudáveis2, esta é
é indicada quando a intervenção cirúrgica
uma prática comum e adotada por diversos pro-
proposta está associada a grande perda san-
fissionais, instituições e serviços pediátricos10.
Definimos como exame de rotina todo aquele guínea1,4,10,11. Nos demais casos, o exame deve
que é solicitado na ausência de uma indicação ou ser solicitado somente quando houver suspeita
propósito clínico específico1,2. A simples triagem clínica de anemia12,13.
pré-operatória não deve ser considerada uma Devemos, todavia, considerar que a preva-
indicação clínica consistente2. lência de anemia carencial na população abran-
Há diversas justificativas teóricas para a gida pelos estudos norte-americanos e europeus
solicitação rotineira de exames pré-operatórios, é possivelmente diferente da encontrada na

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população brasileira. Isso decorre das diferenças Urinálise
nas condições gerais de vida da população, no
A justificativa utilizada para a realização
acesso aos serviços de saúde e no emprego da
rotineira da análise do sedimento urinário inclui
profilaxia universal com ferro no primeiro ano
a identificação e o tratamento das crianças com
de vida. Logo, são necessários mais estudos na-
infecção urinária ou doença renal não diagnos-
cionais para definir a prevalência de anemia na
ticada10. Esse exame, porém, apresenta baixa
população cirúrgica pediátrica de nosso país e
sensibilidade e especificidade para a detecção
para corroborar ou não a indicação da inclusão
de qualquer doença assintomática que possa ter
deste exame em uma rotina pré-operatória.
algum impacto sobre a conduta perioperatória1.
Coagulograma Assim sendo, a análise da urina deve ser reser-
vada para procedimentos urológicos específicos
Os questionamentos acerca da realização
ou na presença de sintomas urinários2.
rotineira do coagulograma já foram tema de
inúmeras publicações. Radiografia de tórax
A utilização de exames de triagem como o A Academia Americana de Pediatria re-
tempo de sangramento, o tempo de protrombi- comenda a eliminação deste exame da rotina
na, o tempo parcial da tromboplastina e a conta- pré-operatória desde o início dos anos 80.
gem plaquetária não tem valor preditivo positivo Todavia, o aumento na incidência da infecção
para identificar a ocorrência de sangramento pelo HIV e a coinfecção com a tuberculose
durante o ato cirúrgico ou no pós-operatório3. trouxe à tona a discussão acerca da proteção
Estes testes apresentam, ainda, uma alta taxa das demais crianças internadas. Ainda assim,
de resultados falso-positivos, acarretando em considerando que a tuberculose na criança é na
investigações clínicas desnecessárias e aumen- maior parte dos casos, uma infecção paucibaci-
tando o estresse familiar no pré-operatório. lar e que o exame radiológico rotineiro pouco
O coagulograma deve ser solicitado quando acrescenta à avaliação do risco pré-operatório
a anamnese ou o quadro clínico do paciente do paciente10,12, a solicitação deste exame deve
indicarem a possibilidade de uma doença da ser reservada para os pacientes sabidamente
hemostasia, quando o procedimento proposto portadores ou com suspeita de doenças cardía-
possa induzir distúrbios hemostáticos (bypass cas ou pulmonares12,13.
cardiopulmonar) ou quando a ocorrência de
qualquer pequeno sangramento possa acarretar
Teste de gravidez
danos permanentes (como na cirurgia oftalmo- Embora não exista nenhuma recomendação
lógica e nos procedimentos neurocirúrgicos). específica para a solicitação de testes de gravidez
Outras indicações incluem as hepatopatias em jovens menores de 15 anos, deve-se ter em
crônicas, a desnutrição, o uso de antiagregantes mente a prevalência da gravidez na adolescência
plaquetários ou anticoagulantes, ou o uso crô- e em nosso meio. O exame deve ser considerado
nico de antibióticos que levem à depleção dos após a menarca e sexarca quando houver sus-
fatores de coagulação13. peita clínica de gravidez ou história de atraso
Não existe consenso na literatura quanto à menstrual10.
realização rotineira desses exames antes da ton-
silectomia e/ou adenoidectomia. A Academia
Validade dos exames
Americana de Cirurgia de Cabeça e Pescoço Os exames laboratoriais realizados com
Otorrinolaringológica recomenda a realização indicação bem estabelecida podem ser utili-
deste exame somente quando a história ou o zados para a elaboração do risco cirúrgico por
exame clínico da criança apontam para uma até seis meses, desde que não ocorra nenhuma
diátese hemorrágica3. modificação significativa no quadro clínico do

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paciente2. tratamento deve ser iniciado 48 horas antes da
cirurgia e deve ser feito preferencialmente com
Condições clínicas especiais a administração oral do medicamento, pois
em pediatria não há evidência de benefício da corticoterapia
inalatória nesta situação. Recomenda-se o uso
Algumas condições clínicas prevalentes na
da prednisona ou prednisolona na dose diária
população pediátrica devem ser identificadas na
de 1mg/kg, por três dias. Alguns autores tam-
avaliação pré-operatória. Passamos a considerar
bém indicam corticoterapia oral para todas as
as mais importantes.
crianças que tenham recebido algum tratamento
Asma farmacológico para asma no último ano16.

A incidência da asma vem aumentando e Infecção das vias aéreas


até 40% das crianças com seis anos apresentam superiores
hiperreatividade brônquica, sendo que 18%
A população pediátrica apresenta uma
utilizam medicamentos para o controle da en-
maior incidência de laringoespasmo e bronco-
fermidade14. A asma é uma das doenças crônicas
espasmo quando comparada com a população
que mais frequentemente podem complicar o
adulta8. As infecções das vias aéreas superiores
desfecho das crianças submetidas à anestesia
(IVAS) e o período de recuperação que as segue
geral8. O broncoespasmo durante o ato ope-
estão associados a um aumento ainda maior na
ratório tem graves repercussões, pois dificulta
probabilidade de ocorrência desses eventos.
a ventilação, levando a hipercarbia, acidose,
As IVAS associam-se também com o aumento
hipóxia, colapso cardiovascular e óbito.
A hiperreatividade brônquica pode persistir na incidência da queda de saturação da hemo-
por semanas após o controle da crise. Logo, há globina e hipoxemia, que podem, todavia, ser
um aumento no risco de ocorrência de eventos prontamente revertidas com a administração
adversos durante o ato operatório tanto durante de oxigênio inalatório1.
as exacerbações agudas quanto nas semanas que O procedimento anestésico pode ser rea-
a sucedem14. lizado mesmo na presença de IVAS, o que se
O tratamento da criança asmática deve sem- justifica pela frequência com que as crianças
pre ser revisto e otimizado no período pré-ope- apresentam esta condição e pelas consequ-
ratório, mesmo nas situações em que o paciente ências emocionais e financeiras advindas do
encontra-se estável, com controle adequado dos cancelamento de uma cirurgia14. De uma forma
sintomas e das exacerbações. As crianças com geral, o procedimento poderá ser realizado na
asma intermitente, que utilizam medicamentos presença de coriza nasal hialina ou tosse seca,
somente nos casos de crise, devem iniciar o uso
no caso de pequena intervenção cirúrgica e na
de beta-agonistas inalatórios ou orais de três a
ausência da necessidade de intubação traqueal
cinco dias antes do procedimento operatório. Já
durante o procedimento. É indicado o cancela-
as crianças com asma persistente que utilizam
mento do procedimento quando a criança tem
esteróides e beta-agonistas de forma regular
devem ser orientadas a intensificar o tratamento, menos de um ano de idade, ou quando a IVAS é
ou associar novos medicamentos ao esquema8. acompanhada de rinorreia purulenta, tosse pro-
O emprego dos glicocorticóides no preparo pré- dutiva, sibilos ou sintomas gerais (febre, cefaleia,
operatório é capaz de reduzir os eventos adver- irritabilidade, dificuldade para alimentar-se,
sos desencadeados pelos procedimentos do ato prostração).
anestésico (laringoscopia, intubação traqueal, As alterações na reatividade das vias aéreas
aspiração das vias aéreas, estímulos reconheci- podem persistir por até sete semanas após a
dos para a ocorrência de broncoespasmo)14. O resolução do episódio agudo de infecção respi-

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ratória, principalmente nas crianças com quadro comum e levanta a seguinte questão: trata-se
associado de asma, exigindo uma atenção espe- de um sopro inocente ou é um sinal de doença
cial na indicação de procedimentos operatórios cardíaca congênita não diagnosticada? A defi-
durante este período14. nição da presença de uma doença cardíaca é
fundamental para a previsão de possíveis even-
Displasia broncopulmonar tos hemodinâmicos durante a cirurgia (inversão
A displasia broncopulmonar (DBP) au- de shunt esquerdo-direito, embolia paradoxal)
menta o risco de broncoespasmo e de queda na e para a definição da necessidade de profilaxia
saturação de oxigênio durante o ato operatório antibiótica para endocardite bacteriana4,8,14.
ao longo de todo o primeiro ano de vida do Alguns dados simples da anamnese au-
lactente. Além disso, as alterações ocorridas xiliam na resposta a essa pergunta. Deve-se
no leito vascular pulmonar dessas crianças as indagar sobre a prática regular e a tolerância a
tornam mais suscetíveis à vasoconstricção pul- atividades físicas e brincadeiras com crianças
monar exagerada, desencadeada por estímulo da mesma faixa etária, a ocorrência de ciano-
hipóxico8. A função pulmonar dessas crianças se ou episódios sincopais em repouso ou em
deve, sempre que possível, ser otimizada durante situações de esforço (choro, alimentação) e a
o preparo pré-operatório e é fundamental que presença de sinais sugestivos de insuficiência
após o ato cirúrgico a monitorização cardiorres- cardíaca em crianças (lentidão para alimentar-
piratória seja estendida por até 48 horas. se, sudorese inespecífica, edema palpebral pela
manhã, baixo ganho ponderal)8,9,14. O exame
Anemia falciforme
físico também poderá auxiliar na diferenciação
Os pacientes com doença falciforme com- entre o sopro inocente e a doença cardíaca. A
põem uma população de risco especialmente criança deve ser auscultada na posição supina
aumentado no que tange ao ato anestésico. e em decúbito, a cronologia dos sons cardíacos
Diversas situações que podem ocorrer durante deve ser bem definida e o sopro bem caracte-
o procedimento cirúrgico são fatores desen- rizado, todos os pulsos devem ser palpados e a
cadeantes para o afoiçamento das hemácias e pressão arterial aferida em todos os membros.
deflagradores de uma crise vasooclusiva, tais Outros sinais sugestivos de insuficiência car-
como: hipóxia, hipercarbia, acidose, hipotermia, díaca devem ser pesquisados (hepatomegalia,
hipovolemia e estados de hipoperfusão8,9. As estertores crepitantes). Nos casos duvidosos,
complicações podem ser prevenidas através de pode ser necessário ampliar a avaliação com
um preparo adequado dessas crianças no pré- exames complementares (eletrocardiograma,
operatório, período em que pode ser indicado ecocardiograma, radiografia de tórax, saturação
o aumento do hematócrito basal e a redução de oxigênio) e parecer do especialista1,8.
do nível de hemoglobina S, que não deve ultra-
passar 30%. Esses objetivos são atingidos com Prematuridade
a hemotransfusão simples ou com a exsangui- As principais preocupações relacionadas ao
neotransfusão parcial. A conduta adotada será lactente nascido antes do termo são a presença e
determinada pelo hematócrito e pela eletrofo- o impacto da BDP e a ocorrência de apnéia pós-
rese de hemoglobina do paciente8,9,14. operatória. Os principais fatores associados com
A presença do traço falcêmico não tem
o aumento do risco de apnéia no pós-operatório
qualquer impacto sobre o prognóstico anesté-
sico e operatório1,8. desses pacientes são a presença de anemia (he-
matócrito < 30%), o relato de apnéia prévia, a
Sopro cardíaco idade gestacional corrigida no momento do pro-
O achado de um sopro sistólico durante cedimento e a idade gestacional ao nascimento1.
o exame físico de uma criança é um evento O risco de apneia no pós-operatório pode

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ser reduzido com a administração prévia de com as que podem ingerir líquidos de baixa
cafeína ou teofilina, através da escolha de anes- osmolaridade até duas horas antes da cirurgia.
tesia local em vez de geral ou pela postergação Essa conduta reduz o risco de desidratação e
da cirurgia até que o lactente atinja entre 48 hipoglicemia nas crianças no momento do ato
e 60 semanas de idade gestacional corrigida, operatório. As diretrizes atuais recomendam
desde que o procedimento proposto não tenha jejum de oito horas para sólidos, seis horas para
urgência. as fórmulas infantis, quatro horas para o leite
Outra preocupação inclui os prematuros materno e duas horas para líquidos de baixa
previamente submetidos à intubação traque- osmolaridade6,7,8.
al. Estes pacientes podem ser portadores de
estenose subglótica, dificultando a intubação Consentimento Informado
pré-anestésica e a extubação pós-anestésica e
O artigo 46 do Código de Ética Médica
aumentando assim o risco de complicações pe-
determina que é vedado ao médico “efetuar
rioperatórias. A presença dessa condição pode
ser suspeitada na história clínica quando houver qualquer procedimento médico sem o esclare-
relato de crupe ou estridor. cimento e o consentimento prévios do paciente
Essas crianças devem ser obrigatoriamente ou de seu responsável legal, salvo em iminente
monitorizadas de forma intensiva no período perigo de vida”5.
pós-anestésico por no mínimo 24 horas9. O consentimento informado tem como base

Alergia ao latéx o princípio ético do respeito à autonomia do


paciente e objetiva habilitá-lo na tomada de de-
A preocupação com a alergia ao látex deve
cisões da forma mais substanciada possível. No
ter início no preparo pré-operatório, durante
caso da população pediátrica, o consentimento
a anamnese. Deve-se indagar sobre história
é geralmente obtido dos pais ou responsáveis
de alergia a produtos contendo látex (edema e
hiperemia peribucal ao tentar insuflar balões), legais, acreditando-se que estarão sempre deci-
especialmente nas crianças com maior risco dindo em prol do melhor para o bem estar da
para o quadro (crianças com espinha bífida, criança. Com o desenvolvimento da capacidade
malformações do trato urinário, atopia e as cognitiva de tomar decisões ao longo dos anos,
submetidas a múltiplos procedimentos cirúrgi- a criança a partir do período escolar deve ser
cos)9. A maior parte dos relatos de anafilaxia ao informada, consultada e estimulada a participar
látex em crianças é naquelas com espinha bífida no processo decisório acerca do seu tratamento,
(73%), provavelmente em decorrência da expo- ainda que o consentimento final seja de um
sição repetida à substância através de múltiplos adulto legalmente competente.
procedimentos cirúrgicos e cateterismo vesical
Quando o médico assistente acredita que os
intermitente.
responsáveis estejam optando por uma conduta
Jejum inaceitável, que poderá acarretar danos à saúde
da criança, é seu papel contatar os órgãos de
É bastante comum encontrarmos nas pres-
defesa da criança e adolescente, a fim de que
crições de crianças internadas a recomendação
de “jejum após a meia-noite” na véspera de suas medidas legais cabíveis sejam tomadas15.
cirurgias. Essa conduta anacrônica carece de
fundamentação científica. Já foi demonstrado
Conclusão
que não há diferença no volume residual ou no Muito embora a avaliação pré-operatória
pH gástrico das crianças mantidas em jejum pediátrica tenha o mesmo objetivo da avaliação
por mais de oito horas quando comparados realizada na população adulta, algumas dife-

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renças no seu processo executório são bastante R.D. Miller’ s anesthesia 6th ed. Churchill
Livingstone – Elsevier, 2005. Chap.60.
evidentes. Devemos ser criteriosos e judiciosos
Disponível em http://www.mdconsult.com.
na indicação de exames complementares, uma Acessado em 01 de Março de 2008.
vez que vimos que em sua maior parte são des- 8. MAXWELL, L.G. Age associated issues in
necessários e nada acrescentam às decisões pe- preoperative evaluation, testing, and planning:
rioperatórias nesta faixa etária, sendo somente pediatrics. Anesthesiology Clin N Am 2004;
22:27-43.
fatores estressores para o jovem paciente. Além
disso, o médico elaborador do risco cirúrgico 9. MAXWELL, L.G., YASTER, M. Perioperative
management issues in pediatric patients.
deve conhecer as doenças crônicas do candi- Anesthesiology Clin N Am 2000; 18:601-32.
dato ao procedimento, otimizando o esquema
10. PATEL, R.I., DeWITT, L., HANNALLAH, R.S.
terapêutico sempre que necessário, e deve ainda Preoperative laboratory testing in children
estar habituado a lidar com as intercorrências undergoing elective surgery: analysis of current
practice. J Clin Anesth 1997; 9:569-75.
agudas comuns em crianças, evitando assim
o cancelamento desnecessário e traumático de 11. PATEL, R.I., HANNALLAH, R.S. Laboratory
tests in children undergoing ambulatory
uma cirurgia eletiva, evento sempre ansiosa- surgery: a review of clinical practice and
mente aguardado pela criança e seus familiares. scientific studies. Ambulatory Surgery 2000;
8:165-9.
Referências 12. SMETAMA, G.W. Preoperative medical
evaluation of the healthy patient. Disponível
1. AMERICAN ACADEMY OF PEDIATRICS em http:www.uptodateonline.com. Acessado
SECTION ON ANESTHESIOLOGY BRIDGES em 06 de Março de 2008.
COMMITTEE. Evaluation and preparation
of pediatric patients undergoing anesthesia. 13. SMETAMA, G.W., MACPHERSON, D.S. The
Pediatrics 1996; 98:502-8. case against routine preoperative laboratory
testing. Med Clin N Am 2003; 87:7-40.
2. A M E R I C A N SOCIETY OF
ANESTHESIOLOGISTS TASK FORCE ON 14. VON UNGERN-STERNBERG, B.S., HABRE, W.
PREANESTHESIA EVALUATION. Practice Pediatric anesthesia – potential risks and their
advisory for preanesthesia evaluation. assessment: part I. Pediatric Anesthesia 2007;
Anesthesiology 2002; 96:485-96. 17:206-15.
3. ASAF, T., REUVENI, H., YERMIAHU, T. et al. 15. WAISEL, D.B., TRUOG, R.D. Ethical and legal
The need for routine pre-operative coagulation aspects of anesthesia care. In: MILLER, R.D.
screening tests (prothrombin time PT/patial Miller’s anesthesia 6th ed. Churchill Livingstone
thromboplastin time PTT) for healthy children – Elsevier, 2005. Chap.89. Disponível em http://
undergoing elective tonsillectomy and/or www.mdconsult.com. Acessado em 01 de
adenoidectomy. Int J Pediatr Otorhinolaryngol Março de 2008. Paginação não disponível.
2001; 61:217-22.
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4. BURD, R.S., MELLENDER, S.J., TOBIAS, care. In: KLIEGMAN, R.M., BEHRMAN, R.E.,
J.D. Neonatal and childhood perioperative JENSON, H.B. et al (Org). Nelson textbook of
considerations. Surg Clin N Am 2006; 227-47. pediatrics 18th ed. Saunders-Elsevier, 2007,
5. CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO p.460-75.
ESTADO DO RIO DE JANEIRO. Código de
Ética Médica, 16 ed. CREMERJ: Rio de Janeiro,
2007, p.16.
Abstract
6. COTÉ, C.J. NPO after midnight for children – a The elaboration of preoperative evaluation
reappraisal. Anesthesiology 1990; 72:589-92. for the pediatric population shows inherent pe-
7. COTÉ, C.J. Pediatric anesthesia. In: MILLER, culiarities of this age group. These peculiarities

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relate to the prevalence of chronic conditions tive management.
distinct of those found in the adult population
and with the common occurrence of acute
illness in children. The healthcare provider
KEYWORDS: Preoperative evaluation;
involved in pediatric preoperative evaluation
should be familiarized with these concepts, in Preoperative testing; Pediatric surgery.
order to become able to act with criterion in the
selection of preoperative testing and periopera-

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TITULAÇÃO DOS AUTORES

Editorial Artigo 2: A necessidade de


Haroldo Coelho da Silva exames complementares pré-
Médico da Unidade Docente Assistencial de Clínica
Médica FCM - UERJ
operatórios
Márcia C. B. Ladeira
Mario Fritsh T. Neves
Professora Auxiliar do Departamento de Clínica
Professor Adjunto do Departamento de Clínica
Médica FCM - UERJ
Médica FCM - UERJ
Endereço para correspondência:
Wille Oigman Márcia Cristina B. Ladeira
Professor Titular de Clínica Médica FCM - UERJ Av. 28 de Setembro, 77 – 3º andar – Vila Isabel
Rio de Janeiro, RJ / CEP 20551-030
Artigo 1: A consulta clínica Telefone: 2587-6631
Email: ladeira.marcia@gmail.com
pré-operatória
Haroldo C. da Silva Artigo 3: Fármacos no pré-
Médico da Unidade Docente-Assistencial de operatório
Clínica Médica HUPE - UERJ Rodrigo F. Garbero
Raphael M. G. M. Gonçalves Professor substituto do Departamento de Clínica
Médica da FCM - UERJ
Professor Substituto do Departamento de Clínica
Médica FCM - UERJ Luiz A. Vieira
Professor Assistente do Departamento de Clínica
Endereço para correspondência: Médica da FCM - UERJ
Haroldo Coelho da Silva
Hospital Universitário Pedro Ernesto – Endereço para correspondência:
Departamento de Clínica Médica Av. 28 de Setembro, 77 – 3º andar – Vila Isabel
Av. 28 de Setembro, 77 – 3º andar – Vila Isabel Rio de Janeiro, RJ / CEP 20551-030
Rio de Janeiro, RJ / 20551-030 Telefone: 2587-6631
Telefone: 2587-6631 Email: rogarbero@hotmail.com
Email: harcoelho@terra.com.br

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Artigo 4: Avaliação Serviço de Cardiologia do HUPE-UERJ.

cardiovascular em pré- Endereço para correspondência:


Eduardo C. Barbosa
operatório de cirurgia Hospital Universitário Pedro Ernesto – Setor de
Arritmias
não-cardíaca Av. 28 de Setembro, 77 – 2º andar – Vila Isabel
Ronaldo A.O.C. Gismond Rio de Janeiro, RJ / 20551-030
Professor Substituto do Departamento de Clínica Telefone.: 2587-6631
Médica FCM-UERJ. Email: correabarbosa@terra.com.br

Mario F. Neves Artigo 7: Manejo pré-


Professor Adjunto do Departamento de Clínica
Médica FCM-UERJ.
operatório dos pacientes com
Endereço para correspondência: doença endócrina e doença
Mario Fritsch Neves renal crônica
Hospital Universitário Pedro Ernesto
Departamento de Clínica Médica Manoel R. A. de Almeida
Av. 28 de Setembro, 77 sala 329 – Vila Isabel Professor Assistente do Departamento de Clínica
Rio de Janeiro, RJ / CEP 20551-030 Médica.
Telefone: 2587-6631
Email: mfneves@uerj.br Filipe S. Affonso
Professor Assistente do Departamento de Clínica
Artigo 5: O Paciente Médica.

hipertenso Endereço para correspondência:


Manoel Ricardo A. de Almeida
Daniel Arthur B. Kasal Hospital Universitário Pedro Ernesto
Professor substituto no Departamento de Clínica Departamento de Clínica Médica
Médica. Av. 28 de Setembro, 77 – 3º andar – Vila Isabel
Rio de Janeiro, RJ / CEP 20551-030
Wille Oigman Telefone: 2587-6631
Professor Titular do Departamento de Clínica Email: mraalmeida@uol.com.br
Médica.
Endereço para correspondência: Artigo 8: O Paciente com
Wille Oigman
Hospital Universitário Pedro Ernesto doença pulmonar
Departamento de Clínica Médica Agnaldo J. Lopes
Av. 28 de Setembro, 77 sala 329 – Vila Isabel
Chefe do Setor de Provas de Função Respiratória
Rio de Janeiro, RJ / CEP 20551-030
Telefone: 2587-6631 do HUPE-UERJ.
Email: oigman@rio.com.br
José Manoel Jansen
Professor Titular de Pneumologia FCM-UERJ
Artigo 6: Risco cirúrgico
Endereço para correspondência:
em pacientes com arritmias Agnaldo J. Lopes
cardíacas Hospital Universitário Pedro Ernesto
Serviço de Pneumologia
Eduardo C. Barbosa Av. 28 de Setembro, 77, 2º andar – Vila Isabel
Professor Assistente da Disciplina de Cardiologia Rio de Janeiro, RJ / CEP: 20551-030
da FCM - UERJ. Telefone.: 2587-6537
Responsável pelo Setor de Arritmias Cardíacas do Email: phel.lop@uol.com.br

10 Revista do Hospital Universitário Pedro Ernesto, UERJ


Artigo 9: Recomendações Artigo 10: Avaliação pré-
profiláticas para pacientes operatória pediátrica
cirúrgicos Júlia M. Paes de Carvalho
Alan Mekler Médica Residente de Pediatria da FCM-UERJ

Professor substituto do Departamento de Clínica Luciano A. M. Pinto


Médica FCM-UERJ
Professor Assistente do Departamento de Pediatria
Aloysio G. da Fonseca da FCM-UERJ

Professor Assistente do Departamento de Clínica Endereço para correspondência:


Médica FCM-UERJ Júlia M. Paes de Carvalho
Rua Gal. Artigas, 72/301 / CEP 22441-140
Endereço para correspondência: Telefone: 021 9626-5466
Aloysio G. da Fonseca
Hospital Universitário Pedro Ernesto Email: juliapc@terra.com.br
Departamento de Clínica Médica
Av. 28 de Setembro, 77 sala 329 – Vila Isabel
Rio de Janeiro, RJ – CEP 20551-030
Telefone: 2587-6631
Email: aloysiofonseca@ajato.com.br

Ano 6, Julho / Dezembro de 2007 11

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