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UNIÃO EUROPEIA

LINHA DE SEBENTAS
Direito da União Europeia

Índice
1. Introdução – A União Europeia ................................................................................................. 3
2. Os antecedentes da União Europeia ......................................................................................... 5
3. A União Europeia segundo o Tratado de Lisboa ..................................................................... 15
4. Revisão dos Tratados da União Europeia ................................................................................ 18
5. Os Princípios Fundamentais da União Europeia ..................................................................... 20
6. A Proteção dos Direitos Fundamentais da União Europeia .................................................... 27
7. A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia .......................................................... 31
8. A Organização Institucional da União ..................................................................................... 35
9. A aplicação jurisdicional do Direito da União – Tribunal de Justiça e Tribunais Nacionais .... 39
10. A eficácia interna do Direito da União – O princípio da aplicabilidade direta ...................... 45
11. O Primado do Direito da União Europeia .............................................................................. 53
12. O princípio da autonomia processual dos Estados-Membros e os seus limites: os princípios
da equivalência e da efetividade................................................................................................. 57
13. Atos Jurídicos da União ......................................................................................................... 58
14. Os procedimentos decisórios: processos legislativos e a “comitologia” .............................. 65
Repetitório de perguntas ............................................................................................................ 71

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1. Introdução – A União Europeia

A União Europeia tem como género próximo uma organização internacional, na


medida em que tem como base de elementos de Direito Internacional Público, porém
do ponto de vista funcional distingue-se muito da generalidade destas, aproximando-se,
em muitos aspetos, de um Estado federal.

A U.E aproxima-se de um Estado federal através do exercício da função legislativa


e reguladora através da participação dos órgãos que representam os Estados-Membros
e da própria U.E. Apesar da função legislativa ser a função principal também exerce
funções executivas e jurisdicionais; Porém a U.E não se assemelha em tudo de um
Estado, como se vê, por exemplo, pelo facto de não ter força coativa própria, sendo que
são os Estados que a possuem. A União cria direitos e obrigações para os particulares,
muitas vezes sem intervenção normativa dos Estados-membros. Esta tem uma grande
pluralidade de poderes públicos, tais como os que decorrem dos tribunais e da sua
administração própria. A somar a isto é ainda dotada de mecanismos que permitem a
homogeneidade da aplicação do seu Direito.

Não cabe à U.E fixar a sua própria competência, sendo esta fixada pelos Estados-
Membros através dos tratados. Não obstante isto a competência da União é
extremamente vasta, sendo que existem matérias que são da sua competência exclusiva
e outras que são partilhadas entre a U.E e os Estados-Membros. O regime jurídico de
base da U.E assenta em dois tratados essenciais de cariz jurídico-internacional:

 Tratado da União Europeia (T.U.E) – assinado em Maastricht em 1992 e


revisto várias vezes, sendo a versão mais recente a que foi estabelecida
pelo Tratado de Lisboa

 Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (T.F.U.E) – assinado


em Roma em 1957 sob a designação de “Tratado que institui a
Comunidade Europeia”. Este foi revisto e atualizado com o Tratado de
Lisboa, fazendo substituir as Comunidades Europeias, definitivamente,
pela União Europeia.

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Para além dos dois tratados referidos, importa também dar destaque à Carta dos
Direitos Fundamentais que foi aprovada em 2000, porém sem força jurídica na altura. O
Tratado de Lisboa, por força do seu artigo 6º, estabeleceu que esta tem valor jurídico
igual ao dos Tratados, sendo que a União reconhece todos os direitos, liberdades e
princípios enunciados na referida carta. Estes são os três principais instrumentos
jurídicos do estatuto jurídico-político da U.E.

Desde o início que foi discutida a necessidade de dotar a União de uma


Constituição, à semelhança das Constituições dos vários Estados. Esta posição é
justificada com base em dois argumentos: (i) a necessidade de limitar, num texto único,
os poderes da U.E, devido à grande amplitude destes e (ii) a vasta de presença de
elementos constitucionais presentes nos três principais instrumentos jurídicos da U.E:

 Catálogo de Direitos Fundamentais – agora formal e material, mas quase


desde o início da existência da União material.

 Regulação do poder político exercido através de vários órgãos: (i)


Parlamento Europeu que visa representar os cidadãos dos Estados-
Membros da U.E; (ii) o Conselho da União Europeia e o Conselho Europeu
que asseguram a representação dos Estados-Membros em si junto da
U.E; (iii) a Comissão Europeia que exerce o poder executivo da U.E; (iv) os
Tribunais Europeus que garantem a aplicação do Direito da U.E

 Princípios Fundamentais, isto é os princípios basilares sobre os quais a


União assenta

 Mecanismos de revisão dos tratados da U.E – estes garantem que os


tratados só são revistos seguindo determinados processos e que não são
alterados por elementos que são inferiores aos tratados

 Regras sobre a produção de normas presentes no artigo 288º do T.F.U.E

O elenco acima mencionado é característico de qualquer constituição, mas no caso da


U.E, os diferentes elementos encontram-se distribuídos entre o T.U.E, o T.F.U.E e a Carta
dos Direitos Fundamentais.

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2. Os antecedentes da União Europeia

Desde sempre que existiram projetos para a construção de uma Europa Unida, tendo
todos eles acabado por falhar. Porém as circunstâncias no pós-II Guerra Mundial
proporcionavam mais do que nunca a unificação da Europa para fazer face à nova ordem
internacional que estava a surgir. Pela primeira vez na História a Europa tinha perdido o
lugar de comando dos destinos do Mundo, estando agora essa chefia entregue a dois
pólos: o soviético e o americano. A somar a isto todos os países europeus que não se
encontravam sob o domínio da U.R.S.S enfrentavam problemas comuns – problemas
políticos, económicos, sociais e de defesa – e só em conjunto é que seria possível
ultrapassar eficazmente tais problemas.

O caminho para a unidade europeia deveria ser feito com base numa potencialização
do lastro comum europeu do ponto de vista cultural, político e histórico para que a
situação que originou a II Guerra Mundial não se repetisse. Os vários países europeus
começaram a entender que sozinhos não seriam capazes de fazer face ao Mundo que
resultou do fim da Guerra e que teriam de se unir. Para que a referida União resultasse
efetivamente as querelas e pretensões nacionalistas teriam de ser abandonadas de vez,
sendo que a ideia da Europa Unida teria de ser superior à ideia do Estado-Nação.

O Discurso de Churchill em 1946 foi um marco importante para a construção da


Europa. Não que o discurso dissesse algo de novo, mas as circunstâncias em que foi feito
demonstraram-se determinantes. Neste discurso Churchill lança um veemente apelo à
união dos povos europeus e sendo assim possível a criação de uns “Estados Unidos da
Europa”. Através da criação destes a Europa poderia, em primeiro lugar, assegurar a paz
no seu continente. Essa ideia foi, teoricamente, cumprida uma vez que os países que
foram associados a esta ideia nunca mais se envolveram em guerras, porém esta
aconteceu mais vezes no continente europeu (Ex: desmembramento da Jugoslávia).
Porém Churchill não considerava que o Reino Unido devesse ter o seu papel nas relações
internacionais junto da Europa Unida, mas sim junta da Commonwealth, sendo a União
da Europa para os países da Europa Continental. O agrupamento europeu poderia criar
um sentido de patriotismo europeu e um instituto jurídico de cidadania europeia. Esta
só será possível se fossem esquecidos os crimes e loucuras do passado e se houvesse

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um ato de fé dos europeus na Europa. Do ponto de vista concreto deveriam ser dados
alguns passos entre os quais se destacam os seguintes:

 Parceria entre a França e a Alemanha – desde a guerra franco-prussiana que


estas duas nações haviam guerreado ferozmente levando à destruição da
Europa. Assim sendo era importante o entendimento entre ambos. Apesar
disto as pequenas nações contam tanto como as grandes e a honra de todos
é vista através da contribuição para a causa comum.

 Garantir a existência de quatro liberdades essenciais entre os países da


Europa Unida: circulação de bens, serviços, pessoas e capitais.

 A construção da Europa Unida tem de ser feita o mais depressa possível, pois
no momento existe paz, mas as ameaças ainda permanecem.

 Deve haver uma contribuição cada vez maior para o fortalecimento da ONU
e o contributo da Europa passaria pela criação de um Conselho da Europa
(Tratado de Londres)

 Nunca fechar a porta à entrada de outros Estados europeus, apesar de


naquele momento não quererem/poderem

A proposta de Churchill levou a certos desenvolvimentos no sentido de construir


a Europa Unida, sendo que a 5 de Maio de 1948 é assinado um tratado de defesa entre
5 Estados europeus e a 16 de Abril do mesmo ano é criado a OCDE para a aplicação do
Plano Marshall. Até que entre 7 e 10 de Maio de 1948 é organizado o Congresso de Haia
que visava discutir a “ideia europeia” e concentrou um inúmero conjunto de
personalidades marcantes e muitos dos “pais fundadores” da Europa Unida. Este
Congresso deixou a evidência de que existiam duas correntes de pensamento sobre qual
deveria ser o modelo escolhido para a construção da Europa:

 Corrente federalista – pretendia a criação imediata de uma verdadeira


federação política, ou seja a criação dos Estados Unidos da Europa, onde
os Estados-Membros dos E.U.E seriam equiparados aos Estados dos E.U.A

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 Corrente pragmática – dava maior enfâse às vantagens dos contactos


intergovernamentais e defendia que a unificação Europeia deveria ser
progressiva através de uma cooperação cada vez mais estreita entre os
Estados soberanos

A principal divergência entre as duas correntes está ligada com o princípio da


soberania, sendo que essa dificuldade se pode enunciar da seguinte forma, segundo o
Professor Mota Campos: “Como conciliar o objetivo da unificação da Europa, a que
todos pareciam aspirar – mas que necessariamente implicaria a aceitação de instituições
dotadas de poderes supranacionais efetivos – com a permanência e intangibilidade da
soberania dos Estados, por definição avessos a todas as formas de ingerência externa
nos assuntos de cada um?”.

Apesar desta divergência o Congresso de Haia foi muito importante na


construção da União Europeia e deixou certas ideias estabelecidas entre as quais se
destacam: (i) A Alemanha teria de fazer parte, pois tal presença é fulcral para o sucesso
da união da Europa, (ii) independentemente da corrente escolhida, teria de existir um
parlamento europeu de forma a existirem posições comuns e tomadas através de um
meio democrático, (iii) à construção da Europa Unida era fulcral que esta estivesse
dotada de uma carta de direitos fundamentais comuns a toda a Europa, (iv) era
necessário também a criação de um Tribunal de Justiça capaz de aplicar sanções
necessárias para fazer cumprir a carta.

Com o Tratado de Londres de 1949 é criado o Conselho da Europa. Órgão ainda


existente e que é autónomo e independente da U.E. Esta organização regional paralela
à U.E tem características funcionais, estruturais e organizacionais distintas às da U.E. O
seu nascimento é claramente marcado por uma matriz de cooperação
intergovernamental afastando-se assim das lógicas federais de transferência de
soberania, sendo que entre os aspetos que mostram a não-adoção do federalismo
destacam-se os seguintes:

 Estrutura institucional bastante simples composta por um comité de ministros e


cujas decisões têm de ser unânimes, sendo que cada Estado tem o direito de
veto.

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 A somar a isto existe uma assembleia de cariz meramente consultivo, mas cujo
impacto é muito reduzido nas decisões do Comité de Ministros.

Este comité não pode criar regras obrigatórias criadoras de direitos e obrigações
para os Estados, podendo antes criar soft law que só entra em vigor nos Estados se estes
o entenderem e pode também dirigir recomendações aos Estados.

O artigo 1º da Convenção de Londres estabelece que “A finalidade do Conselho da


Europa é a de realizar uma união mais estreita entre os seus membros a fim de
salvaguardar e promover os ideais e os princípios que são seu património comum, e de
favorecer o respetivo progresso económico e social”. Este artigo não revela nenhuma
intenção dos seus signatários de promover a integração política dos Estados e nenhuma
referência é feito ao propósito dos Estados de pôr em comum os seus direitos
soberanos.

Outro marco de importância fundamental para a construção europeia e onde se


encontra muito do ADN da U.E é a Declaração Schuman. Esta veio propor a criação de
uma federação europeia. A Declaração Schuman não tem qualquer força jurídica, pois é
sim um apelo, porém tem um forte carácter histórico e inspirador para a União Europeia
e vem reforçar o discurso de Churchill no que toca à importância de uma Europa Unida
para a paz mundial. O processo de construção da Europa não poderá ser feito de uma
vez só, nem através de um Constituição, pois o que é realmente necessário é um
conjunto de realizações concretas que vão, passo a passo, construindo a Europa. Sendo
que dessas realizações concretas, no imediato, deveriam realçar-se as seguintes:

 Solidariedade de facto entre os povos europeus, ou seja estes deveriam fazer


um verdadeiro ato de fé ao confiarem na União da Europa

 Eliminação da oposição existente entre a França e a Alemanha

Estes dois países há cerca de 1 século que tinham vários problemas entre si,
sendo que o principal problema era de base económica levando a muitos outros
problemas. Assim sendo a solução para o referido problema seria a de permitir o
controlo bilateral da produção de matérias-primas fundamentais para o
desenvolvimento de qualquer futuro esforço de guerra ou prossecução de objetivos de

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domínio económico, consistindo em “colocar o conjunto da produção franco-alemã do


carvão e do aço sob o controlo de uma alta autoridade comum, numa organização
aberta à participação de outros países da Europa”. Esta seria a primeira etapa para a
construção da federação Europeia e levaria a que uma guerra entre a Alemanha e a
França fosse materialmente impossível e impraticável, visto que a unificação económica
levaria a uma unificação política. A Alta Autoridade teria o poder de emitir decisões
vinculativas para a França, Alemanha e os outros países aderentes e caber-lhe-ia as
seguintes funções:

 Modernização da produção e melhoria da sua qualidade

 Fornecimento de carvão e aço em quantidades idênticas

 Desenvolvimento da exportação comum

 Harmonização no progresso das condições de vida da mão-de-obra

Os princípios e os compromissos essenciais seriam objeto de um tratado de


direito internacional, para que se começasse a definir o estatuto jurídico da União e para
introduzir um conjunto de novidades do ponto de vista institucional e jurídico. A Alta
Autoridade seria responsável pelo funcionamento de todo o regime, isto é esta seria o
órgão para a qual seriam feitas todas as transferências de soberania necessárias. A Alta
Autoridade seria composta por personalidades independentes, ou seja esta seria
composta por pessoas dos diferentes Estados-Membros, mas cuja sua legitimidade para
estarem neste órgão proveria dos seus conhecimentos acerca da realidade da economia
do carvão e do aço e não de uma escolha política dos Estados para os representarem.

A proposta francesa foi adotada levando às negociações entre a França, a


Alemanha, a Itália, a Bélgica, a Holanda e o Luxemburgo e culminando com a instituição
da Comunidade Europeia do Carvão e do Aço com a assinatura do Tratado de Paris a 18
de Abril de 1951, entrando depois em vigor a 25 de Julho de 1952 e no próprio tratado
estava estabelecido que este deveria vigorar durante 50 anos. Os aspetos característicos
de uma organização “parafederal” estão com efeito claramente marcados no Tratado:
transferência de determinadas competências estatais para uma Alta Autoridade
comunitária dotada de amplos poderes para agir tanto sobre os Estados-Membros como

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sobre as empresas nacionais dos sectores do carvão e do aço; produção legislativa


autónoma e consequente sobreposição de ordens jurídicas; possibilidades abertas às
instituições comunitárias de procederem elas próprias a revisões do Tratado; submissão
dos Estados-membros à legislação de origem comunitária e a rigoroso controlo
jurisdicional do exato cumprimento das obrigações por eles assumidas no âmbito da
CECA.

No preâmbulo do Tratado CECA encontram-se elencadas as razões, os objetivos


e as realizações concretas que iriam constituir a CECA. Neste encontram-se inclusive
expressões transcritas da própria Declaração Schuman. Do ponto de vista da
organização institucional a CECA foi organizada com base num quadro institucional
quadripartido:

 Uma Alta Autoridade, antecessora da Comissão Europeia e assistida por


com um comité consultivo, tinha competência decisória independente da
vontade dos Estados;

 Um Assembleia Comum, antecessora do Parlamento Europeu, cujos


membros são escolhidos a partir dos Parlamentos Nacionais;

 Um conselho especial de Ministros;

 Um Tribunal de Justiça que representa o controlo, a limitação e a


fiscalização do poder.

A CECA era composta por órgãos de decisão política que eram controlados por
órgãos de decisões jurisdicionais. Com estes órgãos independentes face à vontade dos
Estados-Membros coexistiam também órgãos representantes dos Estados-Membros.
Este quadro institucional é bastante mais complexo que o do Conselho da Europa,
distinguindo-se assim o intergovernamentalismo do federalismo.

À Alta Autoridade cabia verificar que o tratado seria cumprido. Era composta por
9 membros e estes exercem as suas funções de forma independente, tendo em conta o
interesse geral da comunidade e não podem aceitar instruções dos governos e não
podem praticar atos contrários às suas funções supranacionais. O Tribunal pode demitir

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os membros da Alta Autoridade que deixem de preencher os requisitos necessários para


que o sejam. É do tratado da CECA e da Alta Autoridade que nasce o direito comunitário
derivado: as decisões, atuais regulamentos, são obrigatórias em todos os seus
elementos; as recomendações, atuais diretivas, são obrigatórias quanto aos fins e não
quanto aos meios.

A Assembleia representava, até ao Tratado de Lisboa, os povos dos Estados


Membros, depois deste passou a representar os cidadãos europeus. O número de
membros desta é determinado pela população dos Estados-membros e está dotada de
instrumentos de controlo típico do parlamentarismo.

O Conselho é o órgão representativo dos Estados-Membros e cujo objetivo é o


de harmonizar as posições da Alta Autoridade com as dos Governos. No seio do
Conselho o voto é ponderado, sendo que na altura a justificação radicava em razões
demográficas e económicas, porém atualmente apenas radica em questões
demográficas. Em questões de especial sensibilidade para a soberania dos Estados há
casos em que o Conselho pode vetar decisões da Alta Autoridade, porém tal situação é
de cariz excecional não sendo regra.

O Tribunal garante o respeito do Direito na sua interpretação e aplicação do


tratado, sendo que o sistema jurisdicional é composto pelos tribunais comuns dos
Estados-Membros e pelo próprio Tribunal da CECA.

Este avanço foi extremamente significativo, porém face aos grandes anseios de
união europeia anteriormente expressos, uma integração limitada aos sectores do
carvão e do aço constituía, sem dúvida, um projeto modesto. Porém a criação da CECA
veio desbloquear uma situação de impasse, pondo em movimento uma engrenagem,
que naturalmente, pelo simples jogo dos fenómenos económicos e políticos a que daria
lugar, acabaria por ultrapassar o quadro apertado de uma organização sectorial.

Face ao aumento do poderio soviético a Europa sentiu necessidade de se


defender e de alargar a união económica a uma união militar, pelo que a 27 de Maio de
1952 foi assinado o Tratado da Comunidade Europeia da Defesa, porém este nunca
entrou em vigor, visto que carecia da retificação de todos os Estados-Membros da CECA

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e a França não o fez. Apesar a ideia original ter surgido por iniciativa francesa, esta foi
dada no auge do poderio soviético que, à data prevista para a retificação, tinha
acalmado devido à morte de Estaline. Com esta não entrada em vigor do Tratado da
Comunidade Europeia de Defesa a Europa Unida atravessa a sua primeira crise, que só
seria resolvida em 1955 através da Declaração de Messina e da posterior criação da CEE
e da Euratom.

A Declaração de Messina foi a base de lançamento para a saída da crise europeia.


Nesta era acentuada a ideia de que a construção europeia tinha de ser feita, em primeiro
lugar, pela via económica e que esta via carecia de um mercado comum com liberdade
de circulação para todos os produtos exceto o carvão e o aço (CECA) e os produtos
atómicos (Euratom).O mercado comum nasce com o Tratado de Roma de 1957 (Tratado
CEE) que atualmente ainda vigora, apesar das várias alterações existentes, sob a
designação de Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia. Com este mercado
comum os números respeitantes à produção e às trocas intercomunitárias e
internacionais melhoraram de forma acentuada; a nova entidade económica europeia
toma rapidamente forma; e em face de um acolhimento popular francamente favorável,
o “facto europeu” começa a impor-se no interior e no exterior da Comunidade.

O Tratado CECA tinha instituído um mercado comum de âmbito limitado e é


encarado como um “tratado-lei”, pois todo o regime estava estabelecido no tratado,
bastando à Alta Autoridade executar e administrar de forma vinculada ao Tratado. Por
oposição o Tratado da CEE deveria ser encarado como um Tratado-constituição, pois
estabelece os princípios gerais e remete para outros órgãos com funções legislativas a
aplicação e o desenvolvimento. O quadripartido institucional seria mantido, mas em vez
da Alta Autoridade existiria a Comissão e passando a ser o Conselho o principal órgão
decisório envolvendo escolhas com ampla discricionariedade legislativa, contudo estava
condicionado pela iniciativa legislativa da comissão. No seio do Conselho existe voto
ponderado, que ainda hoje existe, mas devido ao peso atribuído a cada país, nunca um
Estado grande poderia bloquear o Conselho, sendo as decisões tomadas por maioria
qualificada.

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Entre os dois tratados verifica-se um aumento da corrente intergovernamental


em função da novidade e dos objetivos propostos pela TCEE que criavam maiores
questões à soberania dos Estados.

Os países europeus desejavam dar maior voz à Europa na cena internacional e


para tal era fulcral unir politicamente a Europa dando força ao peso económico que
estava a ser alcançado. Este desejo resulta na declaração de Bad Godesberg que levou
à criação do Conselho Europeu que está consagrado no artigo 15º do Tratado da União
Europeia e nesta, pela primeira vez, os altos representantes dos Estados intervieram.
Esta declaração marca o momento da viragem da união económica para a união política;
Esta viragem já havia sido tentada, mas só nesta altura é que as circunstâncias a
proporcionaram devido ao facto da união económica estar bem encaminhada e devido
ao momento de particular tensão que a Guerra Fria atravessava. Só a Europa Unida, em
conjunto com os E.U.A, é que seria capaz de fazer frente aos perigos que a U.R.S.S
representava. Para tal teriam de coexistir dois métodos de integração europeia: (i) o
método comunitário que resultaria através das Comunidades Europeias e pela via da
integração económica e (ii) o federalismo europeu que levaria à cooperação política em
matérias de política externa, defesa, etc.

O método comunitário é executado através da transferência de soberania para


uma entidade supranacional – as Comunidades. Estas têm uma autonomia decisória
relativamente às matérias para as quais são competentes, mas não é uma autonomia
total havendo também intervenção dos órgãos que representam os Estados-Membros.
Por esta via o Direito Comunitário tem uma força jurídica elevada, levando à sua
aplicação face aos Estados e aos particulares e tendo ainda a capacidade de derrogar o
direito nacional se este for contrário ao comunitário. A declaração de Bad Godesberg
aproxima-se da corrente do intergovernamentalismo, pois propunha reuniões regulares
entre os chefes de Estado sendo as mesmas preparadas pelos Ministros dos Negócios
Estrangeiros e ainda defendia que deveriam ser os órgãos representantes dos Estados
os principais protagonistas. Esta declaração não originou nenhum tratado formal de
cooperação política, devido a uma posição implacável da parte dos países do BENELUX
que alegavam que seguir os moldes propostos por aquela declaração levaria ao fim do
método comunitário.

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Até 1987 a cooperação política foi sendo feita com base num registo informal e
baseado em boas práticas. Porém nesse ano entrou em vigor o Ato Único Europeu. Este
novo tratado surge da necessidade clara de novos impulsos para a criação da tão falada
União Europeia e que tais impulsos careciam de uma adaptação do sistema institucional
comunitário. Devido aos sucessivos alargamentos da CEE, esta perdera a sua
homogeneidade pelo que os processos comunitários de decisão encontravam-se já
inadequados para um conjunto de doze Estados-Membros.

O Ato Único Europeu apresenta a particularidade de ser um “2 em 1”.


Formalmente este tratado é só um, porém na prática acaba por se desdobrar em duas
partes distintas: 1ª parte destina-se a rever os tratados da CEE e a 2ª parte é um tratado
de cooperação política. O Ato Único Europeu surge como uma solução de compromisso
entre as duas posições contraditórias que se afirmavam na Europa tendo sido
impulsionado pela declaração solene sobre a União Europeia. Com o Ato Único Europeu
a Europa Unida passava a conceber-se do seguinte modo: as comunidades são o núcleo
duro da União Europeia, enquanto a cooperação política, que tem a sua base jurídica
definida no título III do A.U.E, seria uma camada envolvente. As comunidades tinham
instituições próprias diferentes das da cooperação política, sendo as desta
materializadas nas figuras dos ministros dos negócios estrangeiros dos Estados-
Membros.

Porém a plena realização do mercado interno e a eficaz aplicação das novas


políticas comuns instituídas pelo A.U.E aconselhavam o estabelecimento no quadro
comunitário de uma união económica e monetária, servida por uma moeda única. A
existência desta união ampliava a projeção da entidade comunitária na cena
internacional e exigia, inevitavelmente, o reforço e o aperfeiçoamento dos mecanismos
preexistentes de definição e execução de uma política externa da Comunidade. Também
no seio de uma união cada vez mais estreita dos Estados Europeus, a posição dos
cidadãos não podia ser menosprezada, convindo por isso assegurar-lhes um estatuto
mais consistente de cidadãos de uma Comunidade de Estados, com o indispensável
reforço da salvaguarda dos seus direitos fundamentais. Concluindo era preciso redefinir
os objetivos do projeto inicial de integração através de um alargamento e de um
aprofundamento dos mesmos.

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A procura pela solução destas preocupações começou com o Tratado de


Maastricht. Com este Tratado, que foi assinado em 1992, surgiriam as disposições
relativas à PESC (Política Externa e de Segurança Comum). A cooperação alargou-se
também aos domínios da Justiça e dos Assuntos Internos (JAI). Com este tratado a União
Europeia passou a ter três pilares: (i) as Comunidades Europeias reguladas numa
perspetiva de supranacionalidade, (ii) a PESC cujo domínio jurídico é extremamente
intergovernamental e (iii) a JAI, cuja regulação é feita por um misto das duas correntes
anteriores. Apesar do primeiro pilar ser mais forte que os outros, todos estavam
regulados pelo mesmo quadro jurídico-institucional.

3. A União Europeia segundo o Tratado de Lisboa

“A União substitui-se e sucede à Comunidade Europeia”. Esta disposição encontra-


se no artigo 1º do Tratado da União Europeia e surge com o Tratado de Lisboa após o
falhanço do Tratado que estabelecia uma Constituição para a Europa. Antes deste estava
disposto que a União se fundava nas comunidades, na JAI e na PESC tendo todas um
quadro institucional único, porém com níveis de supranacionalidade diferentes. Quanto
mais intergovernamental é certa parte da União, mais secundários são os órgãos
supranacionais da U.E para esse domínio. Nos domínios onde predomina o
intergovernamentalismo não existe equilíbrio de poderes, havendo o predomínio dos
órgãos representantes dos Estados-Membros. O artigo 1º do Tratado da União Europeia
é fulcral para perceber o funcionamento atual da União. Este traz diversas mudanças ao
entendimento que deve ser dado à U.E; Com este o núcleo da União, isto é aquela parte
que estava sobre o domínio do método comunitário, expande-se a outros domínios que
antes eram de cariz intergovernamental.

A exceção ao método comunitário encontra-se no artigo 24º do T.U.E. Este


determina que as disposições relativas à PESC estão à margem do método comunitário,
sendo porém as disposições ao abrigo da PESC uma periferia da União. Assim sendo,
atualmente, todas as matérias da União são executadas em moldes comunitários, à
exceção da PESC que continua a ser executada em moldes intergovernamentais. Ainda
assim esta foi “contaminada”, de uma forma ligeira, pelo método comunitário, sendo
esta observável no quadro normativo e no quadro institucional. O 2º parágrafo do artigo

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24º mostra a especificidade da PESC. Este determina que o processo decisório está na
“mão” dos Estados-Membros uma vez que as decisões têm de ser tomadas por
unanimidade estando assim reservados para cada Estado o direito de veto. A Comissão,
como órgão supranacional por excelência da União, é afastada do domínio da PESC. A
Comissão é a representante externa da União em todos os seus domínios, à exceção da
PESC e também não pode adotar atos legislativos neste domínio, vendo-se claramente
a negação método comunitário. O Parlamento, que regra geral assume um papel de co-
legislador, na PESC também está afastado. Por fim o Tribunal de Justiça da União não
tem competência para avaliar as disposições daquele domínio, fora nas exceções do
artigo 40º do T.U.E e do 275º do T.F.U.E. Esta permissão de fiscalização por parte do
Tribunal demonstra a pequena “contaminação” do método comunitário no seio da
PESC.

Face a isto e segundo o número 1 do artigo 31º do T.U.E as decisões relativas à PESC
são tomadas pelo Conselho e pelo Conselho Europeu, deliberando por unanimidade,
salvo disposição em contrário (podem haver decisões tomadas por maioria qualificada)
e afastando a adoção de atos legislativos. Os Estados podem abster-se de votar, mas
deve haver a consciência de que apesar da abstenção a decisão tomada vincula a União,
logo os Estados não devem tomar qualquer tipo de atuações que venham a colidir com
a ação da União baseada na referida decisão ou que a dificultem. Caso haja abstenções
de, no mínimo, um terço dos Estados e que esse terço reúna um terço da população da
União, então a decisão não é adotada. O nº 2 deste artigo estipula mais uma das
“contaminações” feitas pelo método comunitário no âmbito da PESC ao elencar um
conjunto de situações em que podem ser adotas decisões naquele domínio, mas por
maioria qualificada e não por unanimidade. Porém estas decisões que podem ser
tomadas por maioria qualificada e que o são feitas pelo Conselho, para seguirem este
molde têm de, primeiro, ser tomadas por unanimidade no Conselho Europeu.

Na parte final do nº2 do artigo 31º encontra-se consagrado um importante


contrapeso às decisões tomadas por maioria qualificada e cujas origens podem ser
encontradas no “Compromisso do Luxemburgo”. Até ao Ato Único Europeu existiu uma
grande dificuldade por parte dos Estados em aceitarem decisões que não tinham tido o
seu acordo. Através do que estava estabelecido nos tratados, a partir de Junho de 1965

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Direito da União Europeia

o Conselho passaria a decidir por maioria qualificada abandonando a unanimidade,


nomeadamente em matérias do âmbito da PAC e nestas a França iria ficar em minoria
devido aos ideais do Governo Francês. Com isto gerou-se a “crise da cadeira vazia”, na
qual os franceses deixaram de marcar presença nas reuniões do Conselho levando ao
não funcionamento deste. Isto leva a que seja feita uma declaração comum sobre o
processo de decisão no seio do Conselho dos Estados-Membros, relativa àquelas
matérias que deveriam passar a ser tomadas por maioria qualificada, sendo que esta
declaração surge como uma derrogação ao previsto no Tratado. Assim sendo as decisões
que passariam a ser tomadas por maioria qualificada podem vir a ser tomadas por
unanimidade caso um dos Estados invoque matérias de extremo interesse nacional.
Nesses casos serão procuradas decisões mais harmonizadoras para que haja acordo de
todos os Estados. Se este acordo não existir a decisão não se toma (posição francesa) ou
é tomada através da maioria qualificada. Porém foi a posição francesa que acabou por
vencer acabando estipulada no Ato Único Europeu no nº2 do artigo 31º do T.U.E, na
medida em que este estabeleceu que, por razões vitais e expressas de política nacional,
uma decisão que seria para ser tomada por maioria qualificada (no âmbito da PESC)
passa a sê-lo por unanimidade no seio do Conselho Europeu. A questão da unanimidade
veio retirar importância ao Conselho, pois a constante busca da unanimidade levou a
que muitas decisões não fossem tomadas. O nº 3 do artigo 31º atribui a competência do
Conselho Europeu poder aumentar a lista de casos em que o Conselho delibera por
maioria qualificada, porém esse aumento tem de ser adotado por unanimidade.

Tudo isto levou a que a “porta comunitária” da PESC, que já era estreita, fique ainda
mais estreita devido ao carácter modesto e ténue da influência do método comunitário
neste domínio sendo impossível negar a essência muito forte do método
intergovernamental no seio da PESC.

Sintetizando, politicamente, a União é caracterizada por um pluralismo de poder


entre os órgãos que representam os Estados-Membros (Conselho Europeu e Conselho
de Ministros), o órgão que representa os cidadãos (Parlamento Europeu) e o que
representa a própria União (a Comissão Europeia). Este pluralismo leva a uma dualidade
fundamental entre poder político/governo e poder jurisdicional, o qual culmina no
Tribunal de Justiça da União. Do ponto de vista normativo, a União caracteriza-se por

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Direito da União Europeia

ter um direito suscetível de se projetar diretamente na esfera jurídica dos particulares,


criando direitos e obrigações, que faz sem mais parte integrante do direito dos Estados-
Membros e que se encontra dotado de primado sobre o destes.

4. Revisão dos Tratados da União Europeia

Este é o domínio da União Europeia em que o seu regime jurídico se assemelha com
os regimes utilizados para rever os tratados de Direito Internacional Público do que os
regimes utilizados para rever as constituições dos Estados Federais como os E.U.A ou o
Brasil. Nestes a revisão é feita por um órgão da federação, carecendo depois de uma
maioria de 3/5 dos Estados a retificar a revisão, ficando os restantes vinculados à mesma
a partir do momento em que a referida maioria é conseguida.

No caso da União Europeia a revisão dos tratados encontra-se regulado no artigo


48º do T.U.E existindo os processos de revisão ordinária (nºs 2,3,4,5) e simplificados (nºs
6 e 7) (art.48º/1).

Segundo o artigo 48º/2 o Governo de cada Estado-Membro, o Parlamento


Europeu ou a Comissão podem submeter ao Conselho projetos de revisão dos Tratados
(T.U.E e T.F.U.E). O Conselho envia ao Conselho Europeu e este decide, por maioria
simples, se as propostas podem ou não passar à fase da análise. Caso a decisão seja
tomada nesse sentido e o alcance das alterações o justifique é convocada uma
Convenção ad hoc e mista, ou seja com representantes dos vários órgãos da União e dos
Estados Membros (art.48/3). Esta Convenção só tem competência para dirigir
recomendações a uma conferência de representantes dos Governos dos Estados-
Membros cujo mandato é fixado pelo Conselho Europeu. Este pode no entanto, decidir
por maioria simples, não convocar uma Convenção quando o alcance das alterações não
o justifique, passando-se diretamente para a Conferência dos Representantes dos
Governos dos Estados-Membros. Nesta conferência de cariz intergovernamental a
unanimidade deve ser alcançada relativamente às alterações a introduzir nos Tratados.
Estas entraram em vigor após a sua ratificação por todos os Estados-Membros em
conformidade com as respetivas normas constitucionais. (art.48º/4). Caso se passem
dois anos da assinatura do Tratado e 4/5 dos Estados o tenham ratificado e um ou mais
Estados se tenham deparado com dificuldades em proceder à referida ratificação, o

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Direito da União Europeia

Conselho Europeu analisa a questão fazendo uma certa pressão política sobre esses
Estados-Membros para que o ratifiquem, mas isso não tem efeitos jurídicos. (art.48º/5).

Os processos de revisão simplificados são dois e encontram-se consagrados no


nº6 e 7 do artigo 48º do T.U.E. Estes processos só vigoram para as matérias para as quais
cada um dos processos está especificamente habilitados e a sua simplificação ocorre ao
nível de não serem convocados órgãos ad hoc, sendo o processo conduzido pelo
Conselho Europeu – o órgão mais intergovernamental da União, mas ainda assim um
órgão desta. As matérias abordadas nestes processos de revisão, apesar de importantes,
não têm a importância daquelas que podem ser revistas no processo de revisão
ordinário.

No primeiro processo podem os Governos dos Estados-Membros, o Parlamento


Europeu ou a Comissão submeter ao Conselho Europeu projetos de revisão de todas ou
de parte das disposições da parte III do T.F.U.E, relativas às políticas e ações internas da
União. Pode então o Conselho Europeu decidir, desde que seja por unanimidade, alterar
todas ou parte das disposições da Parte III do T.F.U.E. Essa decisão só entra em vigor
após aprovação pelos Estados-Membros e não pode aumentar as competências
atribuídas à União pelos Tratados. Este já foi utilizado em 2011 devido a uma decisão do
Conselho Europeu que levou à alteração do artigo 136º do T.F.U.E criando assim o Fundo
Europeu de Estabilidade Financeira.

O segundo processo tem um objeto de aplicação ainda mais reduzido, não


relativamente aos Tratados em si, visto que se pode aplicar a todo o T.F.U.E e ao título
V do T.U.E, mas sim àquilo que pode efetivamente ser revisto. Este processo vigora em
duas vertentes: (i) Quando o T.F.U.E ou o Título V determine que o Conselho delibera
por unanimidade num certo domínio ou em determinado caso, o Conselho Europeu
pode adotar uma decisão que autorize o Conselho a deliberar por maioria qualificada
nesse domínio ou nesse caso. Isto só não se pode aplicar às disposições referentes ao
domínio militar ou de defesa; (ii) Quando o T.F.U.E determine que o Conselho adota atos
legislativos de acordo com um processo legislativo especial, o Conselho Europeu pode
adotar uma decisão autorizando a adoção dos referidos atos de acordo com o processo
legislativo ordinário. As decisões tomadas no âmbito deste segundo processo são

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Direito da União Europeia

comunicadas aos parlamentos nacionais, bastando a oposição de um Estado-membro


para que a decisão não seja tomada. Se no espaço de seis meses não houver qualquer
oposição por qualquer Estado-membro a decisão é adotada. Ao contrário dos outros
processos em que era preciso uma atuação positiva dos Estados, neste basta que não
haja qualquer atuação. Esta opção faz pender estes processos mais para o método
comunitário, mas a possibilidade de veto pelos parlamentos nacionais ainda se configura
como um forte traço da corrente intergovernamental no seio deste processo de revisão.

A lógica subjacente à revisão dos Tratados da União Europeia é semelhante à do


Direito Internacional Público, uma vez que os Estados intervém nesta revisão na sua
qualidade de sujeitos de Direito Internacional. Ainda assim os diversos processos de
revisão só podem acontecer nos moldes previstos no artigo 48º do T.U.E. É importante
ainda referir que a própria União, enquanto sujeito de Direito Internacional
independente dos Estados, também intervém nos processos de revisão.

5. Os Princípios Fundamentais da União Europeia

A ordem jurídica da União Europeia assenta, naturalmente, em princípios


fundamentais que visam orientar todas as normas da União. O artigo 1º do T.U.E
consagra o princípio da abertura e da transparência, segundo o qual as decisões da
União devem ser tomadas de uma forma tão aberta quanto possível e ao nível mais
próximo possível dos cidadãos. Este princípio tem vindo a evoluir de forma positiva ao
longo do desenvolvimento da União tendo para isso contribuído muito a integração dos
países escandinavos. Este artigo 1º estabelece, como já foi anteriormente referido, que
os Tratados da União têm o mesmo valor jurídico e que a União Europeia substitui-se e
sucede-se às Comunidades Europeias, visando-se o alargamento do método
comunitário.

O artigo 2º do mesmo Tratado elenca os valores da União, sendo que estes se


aplicam sempre à U.E e aos Estados-membros quando estes estejam a atuar no âmbito
da União Europeia, ou seja quando estiverem a aplicar o direito da U.E. Os valores da
União são: dignidade da pessoa humana, liberdade, democracia, igualdade, Estado de
Direito, respeito pelos direitos do Homem, inclusive os direitos das pessoas
pertencentes a minorias. Todos estes valores têm de ser comuns aos Estados-membros,

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Direito da União Europeia

não podendo existir contradições entre os princípios aqui expressos e os princípios


consagrados nas constituições dos Estados-Membros. Obviamente que a U.E não é uma
união de constituições, pelo que pode haver pluralismo constitucional (ver mais adiante
acórdão OMEGA), ou seja os princípios são comuns, mas não uniformes admitindo-se
adaptações consoante a identidade do país. Estes valores concretizam-se através de
uma sociedade europeia caracterizada pelo pluralismo, a não-discriminação, a
tolerância, a justiça, a solidariedade e a igualdade entre homens e mulheres. Este último
ponto tem sido uma das grandes preocupações na produção legislativa da União, sendo
uma das grandes vitórias neste âmbito a colocação da Bélgica na senda da consagração
da igualdade salarial entre homens e mulheres. Por último a Carta de Direitos
Fundamentais da União Europeia (C.D.F.U.E.), que só ganhou força vinculativa e igual
aos Tratados com o tratado de Lisboa, auxilia bastante à concretização do corolário
deste artigo.

O artigo 3º do T.U.E refere-se aos objetivos da União, sendo os principais a promoção


da paz, dos seus valores e o bem-estar dos seus povos. Estes estão elencados no nº1 do
referido artigo, sendo que nos números seguintes desse artigo são referidas formas de
concretização destes objetivos principais. A ordem apresentada nestes números traduz
a importância de cada objetivo para a União. Assim sendo, atualmente e ao contrário do
que já aconteceu, hoje as preocupações económicas já não são as primeiras da União.
No nº2 do artigo 3º é referido a importância do espaço de liberdade, segurança e justiça
sem fronteiras internas que é proporcionado aos cidadãos da União Europeia. Este é um
objetivo puramente político, vindo seguido, no nº3 do artigo 3º, do grande objetivo
económico referente ao mercado interno. A interpretação que se deve retirar da
mudança de organização deste artigo (anteriormente o objetivo económico era o
primeiro) é a de que com o estreitar da cooperação política só vale a pena referir o
mercado interno da União Europeia, estando este enquadrado num espaço de
liberdade, segurança e justiça sem fronteiras internas. O nº 4 estabelece que a U.E é
também uma união económica e monetária cuja moeda é o euro.

Conforme resulta do nº 5 a União também participa na cena internacional na qual


afirma e promove os seus valores e interesses e contribui para a proteção dos seus
cidadãos. Porém, uma vez que os Estados-Membros não transferiram para a União os

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Direito da União Europeia

seus poderes de representação externa, esta participação da U.E na cena internacional


ocorre em conjunto com a participação dos Estados que a compõem. Em paralelo com
isto importa referir que o nº2 do artigo 34º estabelece que os Estados-Membros da
União e que estejam também representados no Conselho de Segurança da ONU devem
defender os interesses da União, sem prejuízo do que lhes incumbe cumprir nos termos
da Carta das Nações Unidas. Para finalizar este artigo deve apenas ser referido que o nº
6 determina que a União prossegue os objetivos pelos meios adequados, em função das
competências que lhe são atribuídas pelos Tratados.

O artigo 4º/2 do T.U.E consagra a cláusula da identidade constitucional dos Estados.


Este consagra a igualdade dos Estados perante os Tratados e o respeito pelas funções
essenciais do Estado, nomeadamente as que se destinam a garantir a integridade
territorial, a manter a ordem pública e a salvaguardar a segurança nacional, sendo esta
da exclusiva responsabilidade de cada Estado-membro (monopólio da coerção). Esta
questão levanta um problema de incoerência face ao espaço de liberdade, segurança e
justiça assegurado pela União. Existe uma clara incompatibilidade entre a existência
deste espaço assegurando pela U.E e a exclusiva responsabilidade em matéria de
segurança por parte dos Estados. Para que o referido espaço fosse efetivamente
assegurado pela União teriam de existir forças de segurança desta.

O artigo 4º/1 em articulação com o artigo 5º consagra o princípio da atribuição. Este


estabelece que a União não dispõe de competência geral, goza apenas das
competências que pelos Tratados lhe foram atribuídas, ou seja é titular de uma
competência de atribuição. O T.F.U.E é o tratado onde se encontram a maioria das
normas de competência, sendo que aquelas que estão inseridas no T.U.E dizem respeito
à PESC. Estas normas de competência, devido à sua natureza, são também normas de
procedimento. Assim sendo a União vê a sua competência ser fixada pelos Estados-
Membros pela via dos Tratados e tudo o que não estiver determinado que é da
competência da U.E é então da competência dos Estados. As competências podem ser
exclusivas ou partilhadas, sendo que quando é nestes últimos moldes tem regras
específicas. Porém estas competências não estão absolutamente delimitadas, pelo que
as competências comunitárias têm vindo a aumentar. Este aumento tem-se verificado
quer pela utilização que tem sido dada ao artigo 352º do T.F.U.E, quer pela aplicação,

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Direito da União Europeia

encorajada pelo Tribunal de Justiça, do princípio das competências implícitas. O artigo


5º do T.U.E deve ser interpretado em conjunto com o 352º do T.F.U.E, pois este é uma
cláusula de flexibilidade no âmbito das competências da União. Este artigo permite à
União legislar sobre uma matéria que venha prevista nos Tratados, mas que não é da
competência desta. A U.E para legislar tem sempre de apresentar que tem base jurídica,
presente no Direito da U.E, para o fazer, logo este artigo só pode ser utilizado após ser
provado e demonstrado que não há qualquer base jurídica para aquela matéria. O
Tribunal de Justiça exerce um controlo apertado sobre as decisões que resultem da
aplicação deste artigo. O Tribunal pode determinar que o ato tomado ao abrigo do artigo
352º poderia ter sido tomado ao abrigo de outro artigo de atribuição de competência
(que eventualmente não permitiria a abordagem àquela matéria da maneira que foi
abordada). Caso tal aconteça o ato é nulo e é retirado da ordem jurídica europeia. Não
obstante destas exceções a CIG que aprovou o Tratado de Lisboa revelou uma enorme
desconfiança relativamente às competências da União, sendo tal comprovado pelo
texto da Declaração nº 24 que estabelece o seguinte: “A Conferência confirma que o
facto de a União Europeia ser dotada de dotada de personalidade jurídica não a
autorizará de forma alguma a legislar ou agir para além das competências que lhe são
atribuídas pelos Estados-Membros nos Tratados”, sendo esta a primeira explicitação em
termos tão taxativos do princípio da atribuição.

Esta ambiguidade na definição rigorosa das competências, propiciadora da


ingerência da União em domínios que os Estados consideravam seus, está na origem do
princípio da subsidiariedade destinado precisamente a acautelar o risco da crescente
redução da esfera das competências estatais. Este princípio encontra-se consagrado no
nº3 do artigo 5º do T.U.E e aplica-se no âmbito das matérias de competência partilhadas
entre os Estados e a União. O artigo estabelece que “nos domínios que não sejam sua
competência exclusiva a União intervém apenas se e na medida em que os objetivos da
ação considerada não possam ser suficientemente alcançados pelos Estados-Membros
(...), podendo contudo, devido às dimensões ou aos efeitos da ação considerada, ser
melhor alcançada ao nível da União”. Apesar disto a aplicação deste princípio levanta
dificuldades referentes quer face à sua explicitação, quer face à repartição das
atribuições e das correspondentes responsabilidades. A forma mais eficaz de controlo

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do respeito por este princípio é o de permitir aos parlamentos nacionais a possibilidade


de fiscalizar se os atos legislativos da U.E, quando tomados no domínio das
competências partilhadas, respeitam este princípio. Através da Declaração 18 (as
declarações são anexos aos tratados que não têm força jurídica vinculativa, por oposição
aos protocolos, que apesar de também serem anexos aos Tratados têm uma força
jurídica igual à destes) o próprio legislador da U.E tem o poder de ele próprio verificar
se determinado ato legislativo vai contra o princípio da subsidiariedade, ou seja se os
parlamentos nacionais não detetarem a violação, é conferido ao legislador comunitário
o poder/dever de auto tutela durante a vigência da legislação em questão.

Relativamente à competência exclusiva da União, o artigo 2º/1 do T.F.U.E determina


que nessas matérias só a União pode legislar e adotar atos juridicamente vinculativos;
Caso os Estados-Membros o queiram fazer naquelas matérias têm de ser autorizados
pela União. O artigo 3º/1 elenca as matérias de competência exclusiva da U.E, que são
uma ínfima parte das competências da U.E: (i) União Aduaneira, (ii) estabelecimento das
regras de concorrência necessárias ao funcionamento do mercado interno, (iii) política
monetária para os Estados-Membros cuja moeda seja o euro, (iv) conservação dos
recursos biológicos do mar, no âmbito da política comum de pescas e (v) política
comercial comum. Porém, por força do artigo 3º/2, a competência exclusiva da União é
mais extensa do que a elencada no número anterior. Este veio constitucionalizar uma
decisão do Tribunal de Justiça seguindo um critério formal/processual, aumentando
assim substancialmente as competências da União, ao permitir que esta celebre acordos
internacionais nas mais diversas matérias. Para tal ser possível é preciso que esteja
previsto num ato legislativo da União, que seja necessária para dar possibilidade ao
exercício de uma competência interna ou que seja suscetível de afetar regras comuns
ou de alterar o alcance das mesmas. Sintetizando a competência para celebrar acordos
internacionais resulta de necessidades básicas da U.E para que esta possa efetivar certas
decisões e medidas suas. Por esta via chega-nos também o princípio do paralelismo de
competências. Este determina que se o Tratado atribui competência interna à União em
certa matéria, então, implicitamente, também lhe atribui competência externa essencial
para concretizar essa matéria.

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Este princípio e o artigo 3º/2 chegam-nos por intermédio do acórdão AETR (1971).
A situação verificou-se no âmbito da política de transportes, prevista no tratado como
um dos domínios de ação da U.E, onde já tinha sido adotado um regulamento em
matéria de transportes rodoviários. Para que este regulamento fosse verdadeiramente
efetivo ter-se-ia de celebrar um acordo de Direito Internacional com a Suíça, pelo facto
de esta não ser um Estado-Membro e devido à sua localização geográfica no centro da
Europa. A questão colocada era sobre a quem competia concluir o acordo com a Suíça:
se a própria U.E ou os Estados-Membros. O tratado, à época, não previa nenhuma
norma específica que atribuísse à Comunidade competência para concluir acordos de
Direito Internacional. Face a isto e face ao facto de o tipo de competência da União ser
uma competência de atribuição, o Conselho veio dizer que “à partida teriam de ser os
Estados-Membros bilateralmente com a Suíça, a concluir o acordo”. Porém o Tribunal
de Justiça não entendeu assim estabelecendo o princípio do paralelismo de
competências. Com isto os Estados-Membros deixam de poder estabelecer acordos
internacionais com países terceiros em matérias exclusivas da União. O contrário só
poderá acontecer em casos concretos e expressamente autorizados, como por exemplo
o que se encontra previsto no Protocolo nº 23.

Este Protocolo vem estabelecer uma exceção ao princípio anteriormente


relativamente ao estabelecimento de acordos internacionais em matérias sobre as quais
a União tenha legislado. A matéria em questão são as fronteiras externas da União,
sendo estas reguladas pelo código das fronteiras externas de origem comunitária, logo
a União estaria habilitada para fazer todos os acordos internacionais que se revelassem
essenciais para o cumprimento deste código. Porém tendo em conta da sensibilidade da
matéria para a soberania dos Estados e da necessidade destes assegurarem a realização
nas suas fronteiras externas e que tal pode vir a carecer da cooperação de países
terceiros, foi anexado ao Tratado de Lisboa este Protocolo veio estabelecer que as
disposições referentes a essa matéria contidas na alínea b) do nº2 do artigo 77º do
T.F.U.E. não prejudicam a competência dos Estados membros para negociar ou celebrar
acordos com Estados terceiros, desde que esses acordos se conformem com o direito
comunitário e com os demais acordos internacionais pertinentes. O estabelecimento
desta exceção é possível uma vez que estamos perante um Protocolo, logo tem a mesma

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força jurídica do preceito que resulta do artigo 3º/2 do T.F.U.E. Uma vez que estamos
perante uma exceção não podem ser feitas aplicações analógicas para outras situações
com base neste Protocolo e o mesmo deve ser alvo de uma interpretação restritiva. Caso
este Protocolo não existisse os Estados não poderiam celebrar acordos internacionais
sobre esta matéria. O acórdão Omega é de bastante importância para a compreensão
do princípio do pluralismo constitucional, ou seja aquele que afasta a conceção da U.E
como uma união de constituições. Este acórdão resulta de um pedido de reenvio de uma
questão prejudicial feito pelo supremo tribunal administrativo alemão ao tribunal de
justiça europeu. O pedido feito pelo tribunal alemão versava sobre problemas de
interpretação do direito comunitário face a um despacho administrativo da autoridade
policial de Bona. Por outro lado a matéria de facto em relação ao caso reportava-se ao
encerramento por parte da referida autoridade policial das instalações de uma empresa
(Omega) onde se jogava laser tag, ou seja onde se simulavam homicídios. O argumento
invocado para o encerramento era o de que as atividades praticadas violavam o
princípio da dignidade da pessoa humana. Por outro lado a empresa Omega alegava que
a restrição imposta pela autoridade policial de Bona viola o princípio comunitário da
liberdade de prestação de serviços. A somar a isto acrescentavam que no Reino Unido
(país de onde eram provenientes os equipamentos utilizados) não havia qualquer tipo
de restrições em termos de acesso a esta atividade. Com base nisto a questão prejudicial
chega a Tribunal de Justiça dividida em duas questões separadas:

 Será a proibição de um atividade económica por razões assentes na


proteção de valores fundamenais consagrados na Constituição nacional,
como no caso concreto, a dignidade humana, é compatível com o direito
comunitário?

 Será que “a faculdade de que dispõem os Estados-Membros de restringir,


pelas referidas razões, liberdades fundamentais garantidas pelo Tratado, ou
seja as liberdades de prestação de serviços e de circulação de mercadorias
da condição de essa restrição se basear numa conceção do direito comum
a todos os Estados-Membros?

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Para além disto também o artigo 56º do T.F.U.E motivava o pedido de


interpretação, pois este estabelece que as restrições à livre prestação de serviços na
União seriam proibidas em relação aos nacionais dos Estados-membros estabelecidos
num Estado membro que não seja o do destinatário da prestação, sendo que o despacho
administrativo vinha então, no entender da empresa Omega, violar este artigo. Por
outro lado era alegado que a restrição era fundamentada com motivos de ordem pública
justificada no T.U.E e assim compatível com o direito comunitário, não obstante o facto
da liberdade de prestação de serviços ser uma liberdade fundamental. Com base no
artigo 267º do T.F.U.E, o tribunal alemão reenviou a questão para o tribunal de justiça.
Relativamente à decisão do Tribunal de Justiça este vem confirmar que ambos os
princípios são fundamentais para a ordem jurídica europeia e face a isto ambos teriam
de ser postos em concordância prática, podendo existir diferenças quanto ao modo de
garantir a proteção dos direitos fundamentais. Segundo o Tribunal os direitos
fundamentais não têm de ser protegidos, em igual intensidade, em todos os Estados-
Membros. Uma vez que se entendia que, na Alemanha, o princípio da dignidade da
pessoa humana é estruturante e de importância quase transcendental, justificando
assim medidas restritivas àqueles jogos, então havia fundamento, à luz daquele
ordenamento jurídico, para aplicar restrições aos jogos a matar. O argumento de que no
Reino Unido não havia qualquer restrição, não terá grande relevo dado que a União
admite o pluralismo constitucional, ou seja diferentes intensidades de proteção do
princípio da dignidade da pessoa humana (perspetiva dinâmica, em rede, in progresso
das constituições dos Estados-membros da U.E). A adoção deste princípio só é
admissível com base na prevalência de um direito fundamental sobre outro se passar no
teste da proporcionalidade. Qualquer que seja a restrição a fazer ou a concordância
prática a efetuar tem de ser sempre avaliado à luz do princípio da proporcionalidade.

6. A Proteção dos Direitos Fundamentais da União Europeia

Os Tratados fundadores não consagraram nenhum catálogo de direitos


fundamentais, sem prejuízo do reconhecimento de certas liberdades e princípios que
foram considerados como exigidos pelo processo de integração económica e social que
se tinha em vista. Coube inicialmente ao Tribunal de Justiça a responsabilidade de
preencher essa lacuna através de uma longa série de acórdãos onde, apesar de nem

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sempre de forma unânime, consolidou a seguinte posição: “de acordo com uma
jurisprudência constante, os direitos fundamentais fazem parte integrante dos princípios
gerais de direito cujo respeito o Tribunal assegura na conformidade das tradições
constitucionais comuns aos Estados-Membros e dos instrumentos internacionais a que
estes tenham aderido ou para a celebração dos quais tenham cooperado”. A 5 de Abril
de 1977 os Presidentes do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão das
Comunidades Europeias consideraram útil e oportuno, devido à fase que atravessavam,
subscrever uma declaração comum relativa aos direitos fundamentais: “A Assembleia,
o Conselho e a Comissão sublinham a importância primordial que ligam ao respeito dos
direitos fundamentais tal como estes resultam, designadamente, das Constituições dos
Estados-membros e da Convenção Europeia de Salvaguarda dos Direitos do Homem e
das Liberdades Fundamentais. No exercício dos seus poderes e na prossecução dos
objetivos das Comunidades Europeias, eles respeitam e continuarão a respeitar esses
direitos.” Devido à sua importância esta Declaração foi considerada pelo Tribunal de
Justiça como fonte de direito comunitário.

O acórdão Stauder é de extrema relevância no âmbito dos direitos fundamentais,


pois marca o ponto de viragem na proteção destes na Europa Unida. Até 1969 (data do
acórdão Stauder) as questões colocadas pelos tribunais nacionais ao Tribunal de Justiça
eram sempre perguntas sobre se certas decisões violavam direitos fundamentais à luz
das constituições nacionais e a estas perguntas o Tribunal afirmava que não poderia
responder, visto tratarem-se de questões de direito interno. O caso concreto
reconduzia-se ao facto de que as pessoas com baixos rendimentos na Alemanha poderia
adquirir produtos em excesso mediante apresentação de uma senha com o seu nome.
Esta possibilidade de adquirir produtos era benéfica, pois ajudava pessoas com
dificuldades, porém violava claramente o direito à privacidade, pois as pessoas nessas
situações teriam de expor o seu nome para que fossem ajudadas. Face a isto o tribunal
administrativo alemão perguntou ao Tribunal de Justiça não se aquela situação viola o
direito fundamental, mas sim se é válida e compatível com os princípios gerais do direito
comunitário vigente. No seu ponto 3 o acórdão vem determinar que a pessoa deve ser
identificada por um número, mas não pelo seu nome e morada podendo assim ter uma
senha individualizada que proíbe o excesso, pois uma senha nominada violaria a

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privacidade e seria excessiva. Porém a identificação nominativa dos beneficiários não é


proibida, ou seja aqueles que querem podem ser identificados pelo seu nome, porém
esta identificação é que também não pode ser imposta. É assim conferido um espaço de
liberdade e decisão aos cidadãos sobre de que forma querem ser identificados. Até à
existência de um catálogo de direitos fundamentais da União (algo que surge em 2000
com a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia), esta teve de se basear nas
tradições constitucionais comuns aos Estados-Membros e nos instrumentos de Direito
Internacional Público a que os Estados estivessem vinculados, nomeadamente a
Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH).

Atualmente o principal artigo do Tratado da União Europeia que se refere aos


direitos fundamentais é o artigo 6º. Até ao aparecimento deste a proteção jurídica dos
direitos fundamentais era feita meramente por via jurisprudencial. O nº3 do referido
artigo estabelece que os direitos fundamentais da União Europeia não são apenas
aqueles que se encontram consagrados na Carta, alargando-os a outras fontes de
direitos fundamentais, tais como a CEDH e as Liberdades Fundamentais que resultam
das tradições constitucionais comuns aos Estados-membros.

O artigo 6º/2 é também bastante importante uma vez que consagra a adesão da
União Europeia à CEDH, sendo que essa adesão não altera as competências da União,
tal como definidas nos Tratados. A grande mais-valia que se obtém, no âmbitos dos
direitos fundamentais, em se ser parte da CEDH é a possibilidade dos particulares
poderem recorrer, em última instância, para o TEDH, caso considere que o Estado lesou
um dos direitos consagrados na CEDH. Esta adesão por parte da União justifica-se pelo
facto desta poder, através dos poderes que exerce, afetar a esfera jurídica dos
particulares. Com a referida adesão os particulares passam a poder recorrer para o TEDH
face a decisões da U.E e aos tribunais desta. A União ainda não é parte da CEDH, apesar
de tal estar para breve, porém tal significa que atualmente os particulares ainda não
podem recorrer para o TEDH face a atos da União. As dificuldades relativas à adesão da
U.E à Convenção foram, em primeiro lugar, relativas à necessidade de rever a
Convenção, pois esta só previa que fossem partes nela Estados. Após esta alteração teve
de ser assinado um tratado entre a U.E e os Estados-membros que estes tiveram de
ratificar. Do ponto de vista político, a adesão da União à CEDH significará a convergência

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Direito da União Europeia

europeia no domínio dos direitos fundamentais, bem como a partilha séria de valores
em toda a Europa. Tal como já foi referido foi a progressiva transformação da União
numa entidade política, dotada de poder político, segundo o modelo do Estado, que
tornou evidente a necessidade de um controlo internacional dos direitos humanos.
Porém e não obstante os pontos de convergência entre a ordem jurídica da União e a
da CEDH, também se encontram aspetos em que as divergências entre elas são visíveis,
pelo que a União se rodeou de cautelas para não ser “sugada”, por uma ordem jurídica,
especializada em direitos humanos. Estas cautelas encontram-se expressas no
“Protocolo respeitante à adesão da União à CEDH”. Assim sendo, na ótica da União, o
acordo de adesão deve, em primeiro lugar, preservar as características próprias da
União e do seu direito, com especial relevo para a consagração de regras específicas
relativamente à participação da União nas instâncias de controlo da CEDH e a criação de
mecanismos necessários para assegurar que os recursos interpostos sejam
corretamente dirigidos contra os Estados-membros ou contra a União (artigo 1º). Em
segundo lugar, o acordo deve assegurar que as atribuições e competências da União não
sejam afetadas pela adesão à CEDH (artigo 6º/2 do T.U.E e artigo 2º). Em terceiro lugar,
a situação dos Estados-membros não deve ser afetada, designadamente, no que diz
respeito aos seus protocolos, às medidas tomadas pelos Estados-membros em
derrogações da CEDH e às reservas (artigo 2º). Por último, a adesão à CEDH não deve
afetar o artigo 344º do T.F.U.E, o qual impõe aos Estados-membros a obrigação de
submeterem todos os diferendos relativos à interpretação ou aplicação dos Tratados a
um modo de resolução nele previsto (artigo 3º). A adesão à CEDH por parte da U.E não
deve ser encarada como o assumir de que a Convenção protege direitos que a Carta não
protege. Esta adesão deve ser encarada como uma possibilidade de realizar um
escrutínio externo aos atos da União.

O artigo 6º/1 é da máxima importância, pois vem atribuir ao à Carta dos Direitos
Fundamentais da União Europeia (C.D.F.U.E) o mesmo valor jurídico dos Tratados. Esta
é uma novidade resultante do Tratado de Lisboa, pois entre 2000 e a entrada em vigor
deste a Carta não tinha valor jurídico vinculativo, pelo que o seu estatuto jurídico
aproximava-se do soft law da União. Porém, atualmente, a Carta faz parte integrante do
hard law, dado que a sua força jurídica é idêntica à dos Tratados da União. Porém, o

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facto de à Polónia e ao Reino Unido só se aplicarem as disposições da Carta que sejam


coincidentes com as do seu direito interno, tal como consta de um Protocolo, pode levar
à interpretação de uma violação do princípio da igualdade entre cidadãos da União, sem
nenhuma justificação razoável. Porém como consta do preâmbulo do Protocolo, os dois
Estados não pretendiam esse resultado, logo o valor do Estado de Direito não fica
extremamente fragilizado. Concluindo o artigo 6º deve ser considerado como um
avanço no sentido da constitucionalização da União.

7. A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia

Com esta Carta, pela primeira vez a União dispõe de um texto proclamatório de
direitos fundamentais. A Carta elenca vários direitos fundamentais e de diferentes
gerações. Esta organização inter-geracional da C.D.F.U.E leva a que sejam consagrados
diferentes tipos de direitos fundamentais. A Carta encontra-se dividida em sete títulos:
(i) Dignidade, (ii) Liberdades, (iii) Igualdade, (iv) Solidariedade, (v) Cidadania, (vi) Justiça
e (vii) Disposições gerais que regem a interpretação e aplicação da Carta. A atribuição
de força jurídica à Carta traz várias vantagens, sob a forma das seguintes características:

 Visibilidade e certeza – a positivação dos direitos, antes dispersos por várias


fontes e carentes da certificação jurisprudencial de relevância comunitária,
coloca o “bloco da fundamentalidade” da União Europeia acessível ao
conhecimento direto dos destinatários;

 Centralidade – a Carta completa a evolução da era da união política, fazendo


com que esta assuma definitivamente o centro das preocupações europeias
ao concretizar a autonomização dos direitos em relação ao vínculo
económico;

 Coerência sistemática e axiomática – a Carta partiu de uma base plural e


heterogénea para chegar a uma proclamação de direitos que é, por um lado,
tendencialmente completa, e é, por outro lado, impulsionada por uma
concreta Ideia de Direito partilhada pelos Estados-membros e pela União
Europeia que são, na sua essência, uns e outra, comunidades políticas de
Direito

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Direito da União Europeia

O Tratado de Lisboa proporciona um desenvolvimento qualitativo do sistema de


proteção de direitos através da consagração da Carta como texto vinculativo e, ao
mesmo tempo, mantém a adequada flexibilidade inter-normativa do sistema pela via
criativa e aberta aos princípios gerais de Direito.

O Título VII elenca disposições bastante importantes ao regerem a interpretação


e a aplicação da C.D.F.U.E. De um ponto de vista sumário, estas acolhem princípios gerais
e critérios aplicativos que visam impedir um alargamento das competências da União
(artigo 51º/2), que limitam a vinculação dos Estados-membros pelos direitos da Carta à
situação em que “aplicam o direito da União” (artigo 51º/1) e que, aspeto de sumo
relevo, salvaguardam o nível mais elevado de proteção dos direitos, ainda que tal
signifique a prevalência sobre a Carta de disposições garantidoras do Direito
Internacional dos Direitos do Homem ou das Constituições dos Estados-membros.

O artigo 51/1 determina que as disposições da Carta aplicam-se às instituições,


órgãos e organismos da U.E sempre e aos Estados-membros quando apliquem o Direito
da União, como por exemplo quando transpõem diretivas ou quando executam atos
juridicamente vinculativos da U.E. O artigo 291º do T.F.U.E determina que os Estados-
membros têm de tomar todas as medidas de direito interno necessárias à execução dos
referidos atos da União. Da articulação destes dois artigos resulta que os Estados-
membros atuam frequentemente em execução de atos da U.E. Atualmente mais de
metade da atividade executiva dos Estados é dirigida a executar atos da União. Porém,
nem sempre os Estados-membros têm de aplicar o direito da União. Existem diferentes
disposições que levam a que, por vezes, o direito da U.E não seja aplicado,
nomeadamente por razões de ordem pública, segurança pública e saúde pública, são as
chamadas cláusulas derrogatórias de aplicação do direito da União. Estas ações
restritivas de aplicação do direito da U.E também se submetem à avaliação do artigo
51º/1, ou seja quando as liberdades fundamentais são derrogadas têm de o ser tendo
em consideração a Carta, pois os Estados-membros quando derrogam direito da União
estão no âmbito de aplicação deste. Só quando a atividade dos Estados-membros se
encontra fora desse âmbito de aplicação é que a Carta não pode escrutinar a ação
destes. Se um Estado-membro se encontrar a aplicar exclusivamente direito nacional
então essa atuação não pode ser escrutinada à luz do direito da U.E.

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Direito da União Europeia

O artigo 52º da C.D.F.U.E corresponde ao artigo 18º da C.R.P, ou seja estabelece


que o conteúdo essencial de um direito fundamental não pode ser aniquilado pela sua
restrição. Acórdão exemplificativo da aplicação deste artigo é o acórdão Zambrano. Ruiz
Zambrano era colombiano e vivia na Bélgica sendo que teve um filho, ao qual lhe foi
atribuída a nacionalidade belga, pelo que o recém-nascido era cidadão da União.
Posteriormente ao nascimento do filho, as autoridades belgas pretendiam expulsar o
colombiano, mas este alegou que a ação de expulsão aniquilaria o conteúdo
fundamental do direito do seu filho, uma vez que se o pai fosse expulso, o filho também
o teria de ser. O Tribunal de Justiça veio dar razão a Zambrano dado que se se
confirmasse a expulsão do pai então o direito do filho de permanecer no território do
Estado belga (que lhe era concedido por ser um cidadão da União) ficaria atingido no
seu conteúdo essencial. O artigo 52º/3 refere-se aos direitos da C.D.F.U.E que são
correspondentes aos da CEDH; quando tal acontece o seu sentido e no âmbito são
iguais, porém o direito da U.E pode estabelecer-lhes uma proteção mais ampla do que
a consagrada na CEDH, mas nunca mais reduzida, porém este aumento de proteção tem
de ocorrer por via legislativa.

O artigo 53º deve ser interpretado de forma cuidada, pois de uma interpretação
literal deste resulta que a C.D.F.U.E poderá sempre ceder face às constituições dos
Estados-membros e esta interpretação levaria à conclusão que a Carta não tem validade
autónoma e que teria uma força jurídica muito reduzida. Esta interpretação não é a
melhor, visto que esta deve ser articulada com a jurisprudência do Tribunal de Justiça e
sempre que desta resultar um certo sentido para a proteção de determinado direito, as
Constituições internas, mesmo que tenham um sentido contrário, não podem ser
invocadas. Este artigo ao permitir tornar jurídicos compromissos políticos levaria a que,
no limite, os Estados-membros poderiam invocar uma proteção mais ampla do seu
direito interno levando assim uma derrogação do direito comunitário. Esta conclusão é
possível retirar-se do acórdão Melloni, uma vez que este consagrou que quando existe
uma solução legislativa europeia (que resulte do consenso dos Estados-membros e
adotada por unanimidade) e se for considerada legítima pela C.D.F.U.E não pode ser
deturpada pelos Estados-membros ao invocarem uma maior proteção do seu direito
interno para não a aplicarem.

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Direito da União Europeia

Nos casos em que certos direitos se encontrem previstos quer na Carta quer nos
Tratados, o artigo 52º/2 da Carta vem estabelecer que esses direitos se exercem de
acordo com os termos que estão estabelecidos nos Tratados. O artigo 45º da C.D.F.U.E
é uma disposição análoga do artigo 20º do T.F.U.E que versa sobre a liberdade de
circulação e permanência nos Estados-membros. Este direito tem origem no
ordenamento jurídico dos E.U.A que, em 1941 no caso Edwards vs. California, veio
estabelecer que uma pessoa, desde que tenha cidadania americana, pode circular
livremente por todos os Estados. No caso da União Europeia o direito não é absoluto
conhecendo um importante limite: cada Estado-membro dispõe da prerrogativa de
impedir a entrada e permanência de cidadãos de outros Estados-membros no seu
território. Esta prerrogativa remete-nos uma vez mais para o acórdão Zambranno.
Zambranno e a sua mulher fugiram da Colômbia para a Bélgica onde procuraram o
estatuto de refugiado, porém o mesmo foi-lhes recusado. Apesar da recusa
permaneceram na Bélgica onde, apesar de não serem cidadãos, arranjaram emprego,
pagaram impostos e se foram integrando. Estes tiveram dois filhos que, ao nascerem
em território belga, adquiriram a cidadania belga e, consequentemente, a cidadania da
União. As autoridades belgas pretendiam expulsar a família Zambranno tendo por base
os artigos 20º e 21º do T.F.U.E e a ausência de cidadania europeia dos pais Zambranno.
Esta questão era de direito interno e não de direito comunitário, porém o Tribunal de
Justiça da União decidiu introduzir uma exceção ao considerar que, apesar de ser uma
questão interna, o Direito da União deveria intervir. O Tribunal utilizou o argumento de
que os principais beneficiários dos direitos consagrados nos artigos invocados pelas
autoridades belgas eram os filhos do casal, pois se os seus pais forem expulsos da União
eles, que são cidadãos da U.E vêm esse seu direito fundamental anulado e estes só
podem restringidos, mas nunca ver o seu fim anulado. A intervenção por parte do
Tribunal foi para salvaguardar o conteúdo essencial do direito de cidadãos da União,
pois aquelas crianças em concreto, com a expulsão dos pais não teriam outra opção se
não a de ir com eles, vendo assim o seu direito anulado.

Em relação ao mesmo direito importa ainda ter em atenção o acórdão McCarthy.


A Senhora McCarthy era cidadã inglesa e irlandesa (dupla-nacionalidade), mas nunca
tinha exercido o seu direito de circulação, ou seja nunca tinha viajado de um Estado-

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membro para outro. Esta casou com um cidadão caribenho, mas porém este, segundo
o direito britânico, não poderia residir em Inglaterra sem uma autorização de residência.
Devido à falta de exercício do direito de circulação o artigo 21º não podia ser invocado,
pois está numa situação puramente interna. Face a isto o Tribunal de Justiça veio
determinar que a Senhora pode ficar no Reino Unido, mas sem o marido. Esta decisão
não ofende o direito fundamental de ser cidadã da União, pois a Senhora McCarthy não
depende do seu marido para a sua subsistência, como os filhos do casal Zambranno
dependiam dos seus pais. Esta é principal razão para a diferença entre as decisões deste
acórdão e do acórdão Zambranno, ou seja o Tribunal optou por determinar a
permanência do casal Zambranno no território da União por considerar que a decisão
em contrário iria anular o conteúdo fundamental de um direito fundamental. Por outro
lado a expulsão do marido da Senhora McCarthy não implicava a anulação do direito
fundamental da mesma, uma vez que o conteúdo essencial desse direito não seria
anulado.

8. A Organização Institucional da União

A União Europeia é uma associação de Estados que corresponde em larga medida, e


com todas as ressalvas já referidas a este aspeto anteriormente, ao conceito clássico de
uma organização internacional intergovernamental, ou seja uma associação
permanente de Estados soberanos, constituída por tratados internacionais de tipo
clássico com vista à prossecução de objetivos comuns aos seus membros, através de
órgãos próprios habilitados, a exprimir, na conformidade do respetivo pacto constitutivo
e das pertinentes regras de Direito Internacional, uma vontade própria, juridicamente
distinta da dos Estados que a compõem.

Cabe aos órgãos representativos da União (as Instituições) exprimir, no âmbito das
respetivas competências e na conformidade do Direito que a rege, a vontade desta
particular organização institucional. Atualmente a União Europeia dispõe dos seguintes
órgãos:

a) Órgãos de direção e execução – aos quais cabe, com a liberdade de


apreciação necessária a quem atua no plano político, fazer as opções e tomar
as grandes decisões sobre a evolução do processo de integração europeia

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Direito da União Europeia

exercendo, nomeadamente as funções legislativa e executiva. Esses órgãos


são quatro:

I. Conselho Europeu, constituído pelos Chefes de Estado ou de


Governo dos países membros;

II. Conselho, constituído por representantes dos Estados-membros,


de nível ministerial;

III. Parlamento Europeu, composto por representantes (eleitos) dos


cidadãos dos Estados-Membros;

IV. Comissão, constituída por altas personalidades nomeadas pelo


Conselho Europeu no termo de um processo em que cabe ao
Parlamento Europeu um papel determinante.

b) Órgãos de controlo:

I. De controlo orçamental e de controlo político, a cargo do


Parlamento Europeu;

II. De controlo jurisdicional, a cargo do Tribunal de Justiça da União


Europeia e também do Tribunal Geral, incumbidos de “assegurar
o respeito do Direito na interpretação e aplicação” dos Tratados.

III. De controlo financeiro, a cargo do Tribunal de Contas, ao qual


compete a fiscalização da cobrança das receitas e da regularidade
da efetivação das despesas das Comunidades

IV. De controlo monetário, a cargo do Banco Central Europeu

Como já foi referido a União não tem competência para fixar a sua própria
competência, o que significa que vigora, na ordem jurídica europeia, o princípio da
competência de atribuição. As normas que atribuem as competências à União, para
além de normas de competência são simultaneamente normas de processo, uma vez

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Direito da União Europeia

que indicam a forma como a competência atribuída deve ser exercida. Existem dois tipos
de competências:

 Exclusivas – as matérias que são de competência exclusiva da União


encontram-se elencadas no artigo 3º/1 do T.F.U.E. Apesar de
aparentemente ser um leque reduzido, este é substancialmente
aumentado pela cláusula consagrada no nº2 do mesmo artigo;

 Partilhadas – as matérias que são de competência partilhada entre a


União e os Estados-membros encontram-se elencadas no artigo 4º do
T.F.U.E. O artigo 2º/2 do mesmo Tratado define este tipo de competência
como a possibilidade de a União e os Estados-Membros poderem legislar
e adotar atos juridicamente vinculativos nessa matéria Porém neste
domínio das competências partilhadas existem limites que são fulcrais
para o correto funcionamento da ordem jurídica europeia.

Um desses limites é o de que a União só pode legislar sobre matérias de competência


partilhada quando for expressamente autorizada pelo princípio da subsidiariedade.
Disto resulta, por intermédio do artigo 5º/3 do T.U.E, que a União só pode intervir nestas
matérias “apenas se e na medida que os objetivos da ação considerada não possam ser
suficientemente alcançados pelos Estados-membros”. Como garante da aplicação deste
princípio surge o legislador da União, ou seja o Parlamento Europeu, a Comissão
Europeia e o Conselho. Neste âmbito reveste-se de bastante importância o “Protocolo
relativo à aplicação dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade”. O
artigo 5º deste Protocolo, que consagra a necessidade da elaboração de “uma ficha com
elementos circunstanciados que permitam apreciar a observância dos princípios da
subsidiariedade e da proporcionalidade” é principalmente dirigida à Comissão, pois esta
detém o monopólio da iniciativa legislativa da União. O artigo 2º determina que a
Comissão, antes de propor um ato legislativo em matéria de competência partilhada,
deve proceder a amplas consultas de forma a garantir o princípio da subsidiariedade. Da
articulação entre o artigo 4º e o artigo 6º resulta que a Comissão tem a obrigação de
enviar os seus projetos de atos legislativos quer ao Conselho Europeu, quer ao
Parlamento Europeu, bem como aos Parlamentos nacionais. Qualquer Parlamento

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Direito da União Europeia

nacional pode emitir um parecer fundamentado em que exponha as razões pelas quais
considera que o projeto em questão não obedece ao princípio da subsidiariedade. Em
consequência desta possibilidade conferida aos Parlamentos nacionais, o artigo 7º/2
determina que caso haja pareceres fundamentados a representarem 1/3 dos votos
atribuídos aos Parlamentos nacionais o projeto de ato legislativo deve ser reanalisado.
Em consequência da apresentação dos referidos pareceres a Comissão pode manter,
alterar ou retirar o projeto. Caso decida mantê-lo tem de fundamentar essa decisão de
forma inequívoca e absolutamente explícita. Caso a Comissão mantenha o projeto e este
chegue a ato legislativo, podem os países apresentar recurso para o Tribunal de Justiça,
caso considerem que o princípio da subsidiariedade continua a ser violado.

Caso o ato legislativo seja aprovado pelo teste da subsidiariedade que


consequências jurídicas existem para os Estados-membros, agora que o referido ato
vigora como lei europeia? Quando tal acontece os Estados-membros deixam de poder
exercer a sua competência naquela matéria, tal como resulta da segunda parte do nº2
do artigo 2º do T.U.E. ao determinar que “os Estados-membros exercem a sua
competência na medida em que a União não tenha exercido a sua” (Princípio da
preempção). Ainda o mesmo artigo determina que “os Estados-membros voltam a
exercer a sua competência na medida em que a União tenha decidido deixar de exercer
a sua”, ou seja os Estados-membros voltam a poder exercer a sua competência, caso o
ato da União seja revogado. Para que tal aconteça deve haver iniciativa da Comissão,
tendo que haver acordo com o Parlamento e com o Conselho, como resulta da
Declaração nº18 anexa à ata final da CIG que aprovou o Tratado de Lisboa.

No seio da União existe também uma separação horizontal dos poderes desta,
sendo que esta separação obedece a alguns princípios. O primeiro desses é o princípio
do equilíbrio institucional previsto no artigo 13º/2 do T.U.E que determina que “Cada
instituição atua dentro dos limites das atribuições que lhe são conferidas pelos Tratados,
de acordo com os procedimentos, condições e finalidades que este estabelecem.” Este
princípio, posto em relevo pelo Tribunal de Justiça, está baseado na ideia de que a
repartição de poderes no quadro da União Europeia deve ser rigorosamente respeitada
por cada Instituição e dele decorre que (i) no exercício dos poderes que lhe foram
reconhecidos pelos Tratados, cada Instituição deve respeitar o lugar e o papel que lhe

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Direito da União Europeia

cabem segundo o sistema neles estabelecidos e também que (ii) uma Instituição não
pode ser privada do exercício de um poder que lhe caiba em proveito quer de outra
Instituição, quer de um organismo não previsto pelos Tratados, mesmo quando a criação
de um tal organismo não seja em si ilegal. O princípio do equilíbrio institucional constitui,
pois, no quadro da União, uma apreciável contrapartida do princípio clássico da divisão
de poderes cuja falta de rigor no seio da União traria, sem dúvida, um défice
democrático e uma falha no sistema de garantias do cidadão. Este equilíbrio
institucional deve assentar numa base de cooperação leal entre as diversas instituições,
sendo que existe uma interdependência entre os diversos órgãos da União, sendo
exemplo desta caber ao Parlamento Europeu nomear o Presidente da Comissão
Europeia. O princípio da cooperação leal é igualmente importante no âmbito das
relações internas entre as diferentes instituições da União. Em primeiro lugar este não
se trata apenas de não interferir em competências alheias, mas também de cooperar
sempre que for conveniente. Este princípio é essencial no processo legislativo, dado o
carácter triangular do legislador da União, uma vez que estres três órgãos têm de
colaborar e articular-se, chegando a acordo, uma vez que só assim poderão ser criadas
leis. Neste sentido criam-se acordos-quadro institucionais que resultam do consenso
entre as instituições, para o estabelecimento das boas práticas de relacionamento, no
âmbito das competências em que são chamados a colaborar. Por outro lado a
independência manifesta-se, por exemplo, na faculdade das instituições poderem
determinar o seu auto-regulamento em matéria de funcionamento.

9. A aplicação jurisdicional do Direito da União – Tribunal de Justiça e


Tribunais Nacionais

A ordem jurídica instituída na União não seria verdadeiramente eficaz se as normas


que a integram não beneficiassem de sólida garantia jurisdicional do respeito que lhes
é devido por parte de todos os seus destinatários (órgãos da União, Estados e simples
particulares). Os tratados que lançaram as bases da atual União Europeia, atribuíram
aos tribunais dos Estados-membros um papel da maior relevância: o de aplicarem, como
tribunais comuns, o direito da União. Este ao estar vocacionado para ter uma eficácia
superior à do direito internacional público, e cujos destinatários seriam não só os

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Direito da União Europeia

Estados-membros, mas também os particulares. Desde o início da construção da Europa


Unida que se foi verificando uma europeização dos tribunais nacionais, vinculados à
aplicação de um “direito comum europeu”. Como tal foi instituído um único tribunal
central concebido como um tribunal especial e exclusivamente dotado das
competências que os tribunais nacionais não podem exercer de modo adequado, entre
as quais se destaca a competência de garantir a interpretação e aplicação uniformes do
direito comunitário em todos os Estados-Membros. Devido à opção da não-adoção de
um modelo judicial federal entre o Tribunal de Justiça e os tribunais nacionais
estabeleceu-se uma relação de cooperação e não de hierarquia. Disto resulta, em
primeiro lugar, que o Tribunal de Justiça não funciona como tribunal de recurso das
decisões dos tribunais nacionais. No âmbito da “cooperação entre juízes” surgiu um
conjunto de “obrigações europeias” que se aplicam aos tribunais nacionais. As
diferentes “obrigações” podem ser reconduzidas à obrigação nuclear de garantir a plena
eficácia do direito da União, mas estas explicam-se pelas próprias características do
sistema jurisdicional da União.

Os tribunais nacionais funcionam como os tribunais comuns da União Europeia, algo


que também se justifica com o facto de uma parcela considerável das normas dos
Estados-membros ter origem comunitária, cabendo assim aos tribunais internos aplicar
o direito da União nos litígios que ocorram no quadro das relações entre particulares e
os Estados-membros. Esta organização teve por base a ideia de subsidiariedade, ou seja
apenas ficaram reservadas ao Tribunal de Justiça as competências insuscetíveis de
serem atribuídas aos tribunais dos Estados-Membros. Com isto estes tribunais passaram
a acumular com a sua qualidade de tribunais encarregados de aplicar o respetivo direito
nacional a qualidade de tribunais encarregados de aplicar genericamente o direito da
União. Daqui resulta que quando os tribunais atuam nesta última qualidade adquiriram
competência quer para desaplicarem o direito nacional contrário ao direito da União,
quer para suspenderem a sua aplicação com idêntico fundamento. Este papel foi
considerado irrevisível, uma vez que segundo o Tribunal de Justiça, os Estados-membros
não podem, por acordo internacional criar nenhum órgão jurisdicional que prive os
tribunais nacionais “da sua missão de aplicação do direito da União, na qualidade de
juízo de direito comum da ordem jurídica da União e, assim, da faculdade prevista no

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Direito da União Europeia

artigo 267º do T.F.U.E, ou mesmo eventualmente, da obrigação de reenvio prejudicial


no domínio em questão”.

Uma das competências que se encontra reservada ao Tribunal de Justiça é a de


garantir a interpretação e a aplicação uniformes do direito da União. Este ao ser um
direito novo, complexo e regido por princípios específicos leva a que sejam frequentes
as dúvidas de interpretação das normas europeias por parte dos juízes nacionais. Uma
vez que a relação entre o Tribunal de Justiça e os tribunais nacionais é de cooperação e
não de hierarquia, é conferida aos juízes nacionais a faculdade de submeter a questão
em análise e sobre a qual tem dúvidas ao Tribunal de Justiça para que este se pronuncie
sobre a questão. Se estivermos perante uma dúvida que surja num tribunal nacional que
decida em última instância esta faculdade converte-se em obrigação. O principal
objetivo desta faculdade/obrigação, que tem o nome de reenvio prejudicial, é a de
garantir uma interpretação e aplicação uniformes do corpo de normas jurídicas que
constitui o direito comum do conjunto dos Estados-Membros.

De forma a uma correta aplicação do artigo 267º do T.F.U.E há que compreender a


noção de jurisdição. Esta foi construída por via da elaboração de uma noção comum de
“jurisdição” com base em critérios que têm a sua origem no acórdão Vaasen-Göebbels.
Assim sendo existem os seguintes cinco critérios para qualificar um órgão nacional como
jurisdição para efeitos do referido artigo: (i) a origem legal do órgão em causa; (ii) a
permanência e o carácter obrigatório da jurisdição; (iii) a observância de regras
processuais respeitadoras do princípio do contraditório, em termos equiparáveis aos
seguidos nos tribunais de direito comum; (iv) o julgamento dos casos em que esse órgão
intervém, na conformidade das regras de direito aplicáveis; (v) a natureza jurisdicional
do ato que o órgão é chamado a adotar. O Tribunal orienta-se no sentido de que o direito
de utilizar o artigo 267º deve ser reconhecido às jurisdições nacionais mesmo quando
as regras internas a isso se oponham. Este artigo impõe aos órgãos jurisdicionais
nacionais cujas decisões não sejam suscetíveis de um recurso judicial previsto no direito
interno a obrigação de reenviar ao Tribunal de Justiça sempre que seja suscitada perante
eles uma questão de interpretação do direito da União.

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Direito da União Europeia

O reenvio prejudicial não constitui uma via processual aberta aos particulares, ou
seja não é um processo entre partes, mas sim entre juízes (nacionais, por um lado, e
europeus, por outro) de caráter ternário: (i) o juiz nacional suspende o processo
principal e coloca a questão prejudicial ao Tribunal de Justiça, independentemente de
as partes lhe terem solicitado que o faça ou não; (ii) o Tribunal de Justiça responde-lhe;
(iii) o juiz nacional resolve o processo principal aplicando obrigatoriamente a decisão
prejudicial proferida por aquele. Disto resulta que as partes não têm o direito de fazer
chegar ao Tribunal de Justiça uma questão prejudicial, como também não têm o direito
de se oporem a que o juiz nacional lha remeta. Assim sendo é o juiz que decide se haverá,
ou não, lugar ao reenvio prejudicial, independentemente do que as partes pretendam a
esse respeito. Apesar disto está reservada para as partes a possibilidade de
apresentarem observações, na qualidade intervenientes, no decurso do processo que
se abre perante o Tribunal de Justiça, dando-lhe a conhecer o modo como entendem
que a questão prejudicial deve ser resolvida. Em nome da boa cooperação com os
tribunais nacionais, o Tribunal de Justiça estabeleceu uma presunção de pertinência, ou
seja que à partida todas as questões deste âmbito são pertinentes. Tal presunção só
pode ser afastada em casos excecionais: (i) quando se verifique, de forma manifesta,
que a interpretação solicitada do direito da União não tem qualquer relação com a
realidade ou com o objeto do litígio no processo principal pendente perante o tribunal
nacional; (ii) quando o problema for hipotético; (iii) quando o Tribunal de Justiça não
disponha dos elementos de facto e de direito necessários para responder utilmente às
questões que lhe são colocadas. Nestes casos excecionais, o Tribunal de Justiça declara
inadmissíveis tais questões prejudiciais.

Existem certos casos em que os tribunais nacionais se encontram obrigados ao


reenvio prejudicial. O primeiro desses casos é aquele em que a questão prejudicial de
interpretação ou validade é “suscitada em processo pendente perante um órgão
jurisdicional nacional cujas decisões não sejam suscetíveis de recurso judicial previsto no
direito interno” (artigo 267º 3º parágrafo T.F.U.E). Se um tal órgão jurisdicional não fosse
obrigado a reenviar a questão prejudicial em causa, podendo resolvê-la sozinho, gorar-
se-ia o objetivo de interpretação e aplicação uniforme do direito da União, uma vez que
da decisão deste não poderia haver recurso para outro tribunal nacional que suscitasse

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a questão ao Tribunal de Justiça, isto uma vez que este Tribunal não funciona como via
de recurso. Este conceito não engloba apenas os tribunais nacionais que se encontrem
no topo das respetivas hierarquias judiciárias, mas todos aqueles que concretamente
possam decidir em última instância, independentemente do lugar que ocupem nessas
hierarquias, como resulta do acórdão Costa/ENEL. Porém há quem, como o Professor
Mota Campos, considere que os tribunais de instância não estão sujeitos à obrigação de
reenvio, mesmo quando julguem em causas que não admitem recurso, defendendo a
sua posição com os seguintes argumentos:

 Um erro de interpretação cometido pelos tribunais inferiores num


julgamento insuscetível de recurso não é de molde a comprometer
seriamente a unidade de interpretação do direito da União;

 Impor o reenvio naqueles moldes significaria uma enorme sobrecarga de


trabalho para o Tribunal de Justiça e um considerável alongamento dos
processos nacionais que, pela sua natureza e reduzido valor, precisamente
aconselham a um julgamento rápido;

 No acórdão Costa/ENEL não foi tomada uma posição frontal e definitiva,


algo que foi motivado em parte por o Tribunal se encontrar perante uma
questão que nunca havia sido levantada;

 Não são os tribunais, julgando em causas de pouca relevância e que por


isso mesmo não admitem recurso, que estabelecem a jurisprudência que
pode pôr em risco a interpretação uniforme do direito da União, sendo
que para além disso a função de fixar a jurisprudência incumbe
fundamentalmente aos tribunais supremos;

 Mesmo uma interpretação literal do artigo 267º T.F.U.E não impõe a


obrigatoriedade do reenvio, uma vez que este pode ser interpretado no
sentido da natureza do tribunal e não com a natureza do processo, pelo
que a regra geral é a de que as decisões dos tribunais inferiores são,
normalmente, suscetíveis de recurso;

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Direito da União Europeia

 O juiz que julga nos casos em que não há recurso pode reenviar, se assim
o entender; se não reenvia, é porque assim o entende e decide; e não há
forma de o obrigar, precisamente porque das suas decisões não há
recurso.

Existem, contudo, exceções à obrigatoriedade do reenvio. Os tribunais que estão


obrigados a reenviar questões prejudiciais ao Tribunal de Justiça podem ser dispensados
de as reenviar, nos casos em que aquela o haja admitido. Assim sendo para que haja
dispensa o tribunal nacional de última instância tem de estar perante uma das seguintes
eventualidades:

 Falta de pertinência da questão suscitada no processo – se o tribunal


nacional que o litígio em questão não deve ser decidido de acordo com
normas da União, mas tão-somente na conformidade com disposições
do direito interno, é evidente que não pode ser-lhe imposta a obrigação
de solicitar a interpretação ou apreciação da validade de uma norma,
que no entender do juiz, é desprovida de interesse para o julgamento
da causa;

 Existência de anterior decisão interpretativa do Tribunal de Justiça –


Foi o próprio Tribunal de Justiça a estabelecer que a observância do
artigo 267º T.F.U.E não é obrigatória quando tenha sido anteriormente
proferida uma decisão de interpretação da norma em causa ou de
apreciação da validade do ato impugnado. Porém, apesar de não
obrigatório, o reenvio continua a ser possível: o tribunal nacional pode
não se dar por satisfeito com a interpretação anteriormente fornecida
pelo Tribunal de Justiça ou considerar que o acórdão proferido não é
suficientemente explícito, sendo-lhe portanto facultado solicitar de
novo a interpretação do Tribunal de Justiça;

 Total clareza da norma – As duas exceções elencadas resultam de casos


em que não existe questão de interpretação, ou porque não há lugar ao
Direito da União, ou porque o Tribunal já se pronunciou eliminado
dúvidas a tal respeito.

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Direito da União Europeia

 Porém podemos estar perante situações em que a norma aplicável é


perfeitamente clara não suscitando a mínima dificuldade de
interpretação pelo que seria desrazoável forçar o tribunal nacional a
reenviar ao Tribunal de Justiça. Isto resulta do acórdão CILFIT no qual o
Tribunal de Justiça estabeleceu que há obrigação de reenvio “a menos
que tenha concluído que a aplicação correta do direito comunitário se
impõe com tal evidência que não deixa lugar a qualquer dúvida razoável.
A existência de tal eventualidade deve ser avaliada em função das
características próprias do direito comunitário, das dificuldades
particulares que a sua interpretação apesenta e do risco de divergência
de jurisprudência no interior da Comunidade”.

O acórdão interpretativo do Tribunal de Justiça tem força obrigatória e vincula o


juiz nacional que recorreu ao Tribunal de Justiça. Este considera ainda que a
interpretação que fornece ao juiz nacional só é vinculativa no processo em que foi
solicitado a pronunciar-se. Porém a autoridade do acórdão pode ultrapassar o quadro
do caso concreto funcionando como uma das exceções à obrigação do reenvio pelos
tribunais supremos para o Tribunal de Justiça. Assim sendo quando ocorra tal situação
a jurisdição nacional pode fazer uma das duas seguintes coisas:

 Ou considerar-se dispensada de repor a questão de interpretação já


decidida, limitando-se por isso a fazer aplicação da norma da União tal
como ela foi interpretada pelo Tribunal de Justiça;

 Ou reenviar ao Tribunal de Justiça para obter dele a confirmação ou a


modificação da interpretação anteriormente fornecida.

10.A eficácia interna do Direito da União – O princípio da aplicabilidade


direta

Intimamente ligado com o tema anterior surge a questão da eficácia interna do


Direito da União, isto porque os tribunais funcionam como o principal garante dos
Tratados, competindo-lhes assim a obrigação de conferir ao direito da União uma
eficácia e uma justiciabilidade idênticas à que que caracteriza normalmente o direito

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Direito da União Europeia

estadual, chamando-se a isto o “federalismo jurídico”. Esta expressão justifica-se, uma


vez que do ponto de vista da eficácia o direito da União e o de uma Federação (como os
E.U.A ou o Brasil) são idênticos. Isto porque nestes sistemas federais as leis emanadas
dos órgãos centrais são aplicáveis diretamente em todo o território, no caso de conflito
entre leis locais e a lei federal os órgãos de aplicação devem dar primazia a este última
e as normas do direito federal beneficiam de uma interpretação uniforme e de uma
uniforme apreciação da validade, garantido por um tribunal supremo habilitado a
assegurar a unidade do ordenamento jurídico do Estado. Para que estas questões
tenham um efetivo cumprimento é necessário que exista aplicabilidade direta das
normas federais, pois se esta não existisse os tribunais nunca se veriam confrontados
com um conflito de normas. A aplicabilidade direta pressupõe ainda a primazia da lei
federal, pois se esta não existisse as normas emanadas dos órgãos centrais da federação
ver-se-iam, em caso de conflito, subordinadas à lei local, ficando por isso, no caso de
oposição entre elas, excluída a sua aplicação.

É certo que a União Europeia não é uma federação de Estados, porém a prossecução
dos objetivos enunciados nos Tratados exigia a aplicação uniforme do Direito da União
como direito comum a um conjunto de Estados que pretendem realizar a sua integração
económica, sendo que esta aplicação uniforme implica:

 Que as normas do direito da União (quer as dos Tratados quer as produzidas


pelas Instituições) se integrem automaticamente, de pleno direito, na
ordem jurídica interna dos Estados e passem aí a ser invocáveis pelos
sujeitos de direito que nisso tenham interesse, podendo ser aplicadas pelos
tribunais nacionais como se de normas internas se tratasse;

 Que a regra do direito da União, apta a reger a situação concreta a que a


sua aplicação seja requerida, exclui a aplicação de qualquer norma nacional
contrária;

 Que as normas de direito da União beneficiem, em todos os Estados-


Membros, de uma interpretação uniforme e de uma uniforme apreciação
de validade.

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Direito da União Europeia

O Tribunal de Justiça veio consagrar o princípio da aplicabilidade direta como um


princípio essencial da ordem jurídica da União. Através dos acórdãos resultantes de
diferentes questões colocadas a este Tribunal, o mesmo conseguiu definir critérios para
a aplicabilidade direta que permitiram aos particulares beneficiar largamente do seu
estatuto de sujeitos do direito da União Europeia. O primeiro fundamento da
essencialidade deste princípio foi a de conferir aos agentes económicos do mercado
interno não se vissem impossibilitados de invocar perante as jurisdições nacionais as
disposições dos Tratados e dos atos normativos das Instituições da União e, portanto,
de fazer valer, nas suas relações recíprocas e em face dos próprios Estados, os direitos
que nesses textos jurídicos pudessem fundar. Uma vez que os particulares não podem
recorrer diretamente para o Tribunal de Justiça e que este apenas foi dotado pelos
Tratados de uma competência de atribuição, a inexistência do princípio da aplicabilidade
direta seria uma enorme desvantagem para a garantia da salvaguarda institucional. Se
este não existisse seria muito complicado aos particulares fazerem valer os seus direitos
emanados do direito da União face ao direto estadual. Caso o princípio da aplicabilidade
direta não existisse os particulares apenas poderiam fazer valer os seus direitos
dirigindo-se à Comissão expondo-lhe as suas razões de queixa e tentando convencê-la a
desencadear no Tribunal de Justiça, ao abrigo do artigo 258º do T.F.U.E, na sua
qualidade de guardiã da legalidade que lhe é conferida pelo artigo 17º do T.U.E, uma
ação por incumprimento contra o Estado-membro responsável pela ofensa dos seus
direitos comunitários.

Com o princípio da aplicabilidade direta é possível aos particulares invocar


direitos que existem na sua esfera jurídica por via do direito da União como se esses
mesmos direitos tivessem origem estadual, sendo a consagração deste princípio
predominantemente de origem jurisprudencial, sendo o primeiro acórdão e um dos
mais importantes sobre o assunto, o acórdão Van Gend en Loos.

Este acórdão que data de 1963 radica no primitivo artigo 12º do Tratado CEE
(agora 30º do T.F.U.E) que dispunha o seguinte: “Os Estados-Membros abster-se-ão de
introduzir entre si novos direitos aduaneiros de importação e de exportação ou encargos
de efeito equivalente e de aumentar aqueles que já aplicam nas suas relações comerciais
mútuas”. No caso concreto um importador holandês foi obrigado a pagar um montante

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Direito da União Europeia

superior ao que pagava à data da entrada em vigor do Tratado da CEE. O particular


reclamou para a jurisdição holandesa competente na matéria, solicitando a restituição
do que, a seu ver, tinha pago a mais, baseando-se no referido artigo. A jurisdição
holandesa viu-se assim confrontada com a questão de saber se uma disposição do
Tratado de Roma, como o artigo 12º, que era expressamente dirigida aos Estados da
Comunidade sem aparentemente visar os seus nacionais, deveria ser interpretada como
suscetível de originar a favor deste o direito de exigir o respeito pelos Estados da
cláusula de “stand still” que essa disposição estabelecera. Face a isto o tribunal holandês
submeteu ao Tribunal de Justiça a questão prejudicial de saber “se o artigo 12º do TCEE
produz um efeito direto ou, noutros termos, se os litigantes podem fazer valer com base
nesse artigo direitos individuais que ao juiz nacional cumpra salvaguardar”.

Na decisão proferida no acórdão Van Gend en Loos o Tribunal de Justiça veio


estabelecer que o Tratado de Roma, ao contrário de outros instrumentos de Direito
Internacional Público é “mais do que um acordo meramente gerador de obrigações
recíprocas entre os Estados-Membros”, pelo que os nacionais também podem invocar
diretamente direitos provenientes de disposições do Tratado. O Tribunal considerou
então o artigo 12º diretamente aplicável, por entender que:

 O Tratado, cuja finalidade é a de organizar um mercado comum, afeta


não apenas os Estados signatários, mas também necessariamente, os
produtores desse mercado;

 Ao associar os povos europeus ao funcionamento dos órgãos


comunitários, o Tratado confirma que eles são diretamente interessados
nas atividades da Comunidade;

 A Comunidade integra, no quadro da ordem jurídica que institui, tanto os


Estados como os seus particulares, na medida em que o direito
comunitário está vocacionado para conferir direitos e impor obrigações
não apenas aos Estados, mas igualmente aos seus particulares;

 O artigo 267º do Tratado, que confia ao Tribunal de Justiça a


interpretação em última instância das regras comunitárias invocadas

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Direito da União Europeia

pelos litigantes perante as jurisdições nacionais, não teria sentido se de


tais regras não pudessem, em princípio, resultar para esses litigantes
direitos suscetíveis de ser invocados nos tribunais internos. A somar a isto
a “vigilância dos particulares, interessados na salvaguarda dos seus
direitos, cria um controlo eficaz que acresce ao controlo que os artigos
258º e 258º T.F.U.E confiam à diligência da Comissão e dos Estados-
Membros”.

Sob um prisma de política judiciária, é clara a vontade do Tribunal de Justiça de


envolver os particulares no objetivo de conferir plena eficácia ao direito da EU ou, por
outras palavras, de o aplicar como se ele fosse direito interno. Com este acórdão o
Tribunal de Justiça criava para os tribunais nacionais a necessidade de recorrerem
sistematicamente ao reenvio prejudicial para lhe submeterem questões sobre o sentido
e o alcance do direito da União, com vista a determinar quais as disposições criadoras
de direitos subjetivos para os particulares, a proteger obrigatoriamente por aqueles
tribunais. Este acórdão veio “destronar” os governos dos Estados-Membros enquanto
donos da execução dos Tratados da União e do direito derivado, lançando as bases para
o estabelecimento do pleno efeito do direito que decorre dos instrumentos jurídicos da
U.E

Em diversos acórdãos posteriores a este, a jurisprudência do Tribunal de Justiça


formou-se no sentido de reconhecer que as disposições dos tratados comunitários que
impõem aos Estados-Membros uma obrigação precisa, incondicional e perfeitamente
determinada, originam a favor dos particulares o direito de exigir deles, perante as
competentes jurisdições nacionais, o respetivo cumprimento. Até ao acórdão
Simmenthal (1978) o Tribunal de Justiça nunca determinou uma noção deste princípio,
tendo só estabelecido os critérios da aplicabilidade direta, isto é as exigências ou
condições a que a norma comunitária deveria satisfazer para poder ser considerada
como diretamente aplicável:

 Positividade da norma – tem que se tratar de uma regra de direito


positivo, de uma precetiva e não meramente programática;

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Direito da União Europeia

 Suficiência da norma – para além de se tratar de uma norma de direito


positivo, impõe-se que tal disposição seja por si só suficiente, que
contenha todos os elementos necessários para ser efetivamente
aplicada pelos tribunais nacionais à situação concreta em julgamento.
Ou seja impõe-se que não seja preciso adotar, no quadro da União ou da
ordem jurídica nacional medidas regulamentares ou legislativas
complementares;

 Incondicionalidade da norma – deve impor aos Estados uma obrigação


incondicional e precisa, sendo que porém qualquer falta de clareza pode
ser afastada através do reenvio prejudicial. Uma norma será
incondicional quando está excluída qualquer margem de apreciação e
intervenção por parte dos Estados-Membros;

 Precisão da norma – o princípio da aplicabilidade direta pressupõe a


precisão da obrigação imposta pela norma, visto que as jurisdições
nacionais não estão habilitadas (dado o imperativo da interpretação e
aplicação uniformes do direito da União por que o Tribunal de Justiça é
responsável), a suprir uma eventual deficiência da norma;

 Aptidão da norma para conferir direitos subjetivos – a regra em si tem


de revelar aptidão para conferir diretamente aos particulares direitos ou
obrigações que os tribunais nacionais pudessem ser chamados a
salvaguardar ou a impor.

Tal como referido foi com o acórdão Simmenthal que o Tribunal de Justiça
consagrou uma noção de aplicabilidade direta ao determinar que tal princípio significa
“que as normas comunitárias produzem a plenitude dos seus efeitos, de modo uniforme
em todos os Estados-Membros, a partir da sua entrada em vigor e durante todo o
período da respetiva vigência. Assim estas disposições constituem uma fonte imediata
de direitos e obrigações para todos os seus destinatários, quer se trate de Estados-
membros ou de particulares que sejam titulares de relações jurídicas às quais se aplique
o direito comunitário. Isto vale igualmente para o juiz que no âmbito das suas
competências tem, enquanto titular de um órgão de um Estado-membro, por missão

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Direito da União Europeia

proteger os direitos conferidos aos particulares pelo direito comunitário”. Assim sendo
são três os componentes desta noção:

1. Não há sujeição a qualquer processo nacional de receção, mas vigoram


na ordem jurídica interna porque só assim é garantida “a plenitude dos
seus efeitos de maneira uniforme em todos os Estados-Membros” e
porque sem vigência dessas normas os tribunais nacionais não poderiam
ser solicitados a aplica-las;

2. A produção de um efeito direto/imediato na esfera jurídica dos sujeitos


de direito comunitário, efeito esse que consiste no reconhecimento de
um direito ou na imposição de uma obrigação a favor ou a cargo daqueles
“que sejam titulares de relações jurídicas às quais se aplique o direito
comunitário”. Assim legitimados processualmente, os sujeitos de direito
comunitário ficam autorizados a invocar em juízo a norma comunitária
que confere direitos ou impõe obrigações aos seus destinatários;

3. A salvaguarda, pelo juiz nacional, dos direitos conferidos aos particulares


por uma norma comunitária que tendo entrado em vigor na ordem
jurídica interna passa a fazer parte integrante, em posição de primazia do
“corpus juris” de que os tribunais nacionais são órgãos.

Devido ao caráter profundamente jurisprudencial deste princípio convém


sintetizar a conceção da sua noção à luz da jurisprudência do Tribunal de Justiça:

 As disposições do Direito da União, independentemente da sua fonte, a


partir do momento em que entram em vigor na ordem jurídica da União
inserem-se automaticamente, de pleno direito, na ordem jurídica interna
dos Estados-Membros, passando consequentemente a fazer parte, em
posição de primazia, do complexo jurídico que todos os órgãos do Estado,
nomeadamente os órgãos jurisdicionais, são obrigados a acatar;

 Tais disposições desde que cumpram os critérios anteriormente vistos


atingem todos os sujeitos da União, na respetiva esfera jurídica,
habilitando-os a invoca-las perante os tribunais nacionais sempre que

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Direito da União Europeia

nisso tenham interesse legítimo que os autorize a demandar ou


contradizer;

 Este “interesse legítimo” não suscita dúvida alguma quando uma


disposição da União é “apta e por si mesma suficiente” para conferir aos
particulares direitos ou para lhes impor obrigações suscetíveis de tutela
jurisdicional (efeito direto da norma)

 Porém podem existir outros casos em que exista um interesse legítimo


em invocar uma norma que não produza na esfera jurídica individual o
apontado efeito direto que se traduz no reconhecimento de um direito
subjetivo. Isto decorre do acórdão Simmenthal que, para além do que foi
visto anteriormente, determina também que “por força do princípio do
primado do direito comunitário (será abordado adiante), as disposições
do Tratado e os atos das Instituições têm por efeito, nas suas relações
com os Estados-Membros, não apenas tornar inaplicável de pleno direito,
devido ao simples facto da sua entrada em vigor, qualquer norma de
direito interno que lhes seja contrária, mas também impedir a formação
de novos atos legislativos nacionais, na medida em que estes seriam
incompatíveis com as normas comunitárias”.

 As disposições de um acordo concluído entre a União e um país terceiro


devem ser consideradas como diretamente aplicáveis sempre que
estabelecem uma obrigação clara e suficientemente precisa, que não
esteja subordinada, na sua execução ou nos seus efeitos, à intervenção
de qualquer ato posterior

Como já foi analisado o princípio da aplicabilidade direta abrange também os


particulares, enquanto cidadãos da União. Assim sendo existem dois tipos de
aplicabilidade direta: (i) a vertical, isto é aquela que pode ser invocada pelos particulares
contra o Estado e (ii) horizontal, ou seja aquela que pode ser invocada contra outros
particulares, no âmbito das relações entre estes. Existem apenas uma ressalva, que será
abordada mais adianta no que respeita às diretivas. Estas, impondo obrigações apenas
ao Estado, (as obrigações para os particulares apenas podem decorrer dos atos

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Direito da União Europeia

nacionais de aplicação das diretivas) não podem ser invocadas por um particular contra
outro particular para fazer valer um direito subjetivo a que não corresponderia qualquer
obrigação da parte demandada.

Toda a norma que produz um efeito imediato traduzido na atribuição de um


direito e na imposição a outrem da correspondente obrigação é diretamente aplicável,
ou seja uma norma deste cariz é aquela que os particulares estão habilitados a invocar
perante as jurisdições nacionais. Assim sendo podem ser invocáveis perante os tribunais
nacionais:

 As normas suscetíveis de criar direitos ou impor obrigações aos


particulares, direitos e obrigações esses que os tribunais podem ser
chamados a salvaguardar quando surja um diferendo nas relações entre
particulares ou entre estes e o Estado;

 As normas que embora, não produzindo por si mesmas qualquer efeito


imediato, poderão ser invocadas em juízo por qualquer sujeito de direito
que tenha interesse legítimo em solicitar ao juiz, que controle a
compatibilidade das normas internas que o afetam com a ordem jurídica
da União para excluir a aplicação das que se revelem contrárias ao direito
da União.

11.O Primado do Direito da União Europeia

Para uma correta compreensão deste princípio é preciso relembrar que a ordem
jurídica da União Europeia é um ordenamento autónomo, ou seja distinto quer da
ordem internacional quer das diferentes ordens jurídicas dos seus Estados-Membros.
Esta autonomia implica que cabe à União definir as suas relações com as outras ordens
jurídicas segundo os seus próprios critérios e princípios, ou seja sem subordinação às
leis ordinárias ou constitucionais dos Estados-membros. Como também já foi abordado
as normas da União são integradas na ordem jurídica interna dos Estados para aí serem
efetivamente aplicadas pelos tribunais nacionais que funcionam como tribunais comuns
da ordem jurídica da União, já que o Tribunal de Justiça dispõe apenas das competências
específicas que lhe foram atribuídas.

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Direito da União Europeia

Quando um juiz nacional, na qualidade de juiz europeu, se depara com a


oposição entre uma disposição de origem comunitária e outra de origem interna e que
ambas são aplicáveis ao caso concreto o deverá fazer o juiz? Um juiz de um Estado
Federado não teria problema, uma vez que este tem a obrigação de aplicar o direito
federal em detrimento do direito do Estado federado, mas isto assim acontece porque
se encontra expressamente consagrado nas Constituições de tal forma. Porém os
Tratados da União Europeia não contêm uma regra de conflitos explícita, a determinar
ao juiz interno que resolva a favor do direito da União qualquer eventual oposição entre
este e o direito nacional. Contudo o primado do direito da União era uma necessidade
lógica para o sucesso e futuro da União, ou seja se o direito da União não fosse aceite
como hierarquicamente superior ao direito nacional, o primeiro estaria condenado a
existir apenas como uma categoria residual de direito incapaz de se impor face às ordens
jurídicas nacionais e só vigorando na medida em que não se opusesse ao direito nacional
e incapaz de desempenhar a função determinante que desempenha no processo de
integração a que os Estados-Membros aceitaram comprometer-se. O pleno acatamento
de tais normas e, portanto, a aceitação da sua primazia sobre qualquer norma interna
contrária, era uma condição irrecusável para este processo. A disponibilidade para
abdicar de certos privilégios inerentes ao princípio da soberania de cada Estado era algo
que logicamente estava inerente ao processo de integração europeia e que para tal
tinha de permitir um primado do direito da União.

Este princípio surge também como uma consequência inevitável da atribuição de


amplas competências à União Europeia. Nos domínios a que as mesmas se reportam e
no âmbito em que estas são efetivamente exercidas, a União passou a ter o exclusivo da
adoção de atos (legislativos e outros) indispensáveis ao cumprimento da sua missão, e
esta, sem o princípio do primado revelar-se-ia ineficaz, tal como a uniformidade da
aplicação das disposições emanadas da União seria algo ilusório. O direito da União
“contém em si uma exigência existencial de primazia; se ele não consegue em todas as
circunstâncias superiorizar-se ao direito nacional, é ineficaz, e portanto, inexistente”.

À semelhança do princípio da aplicabilidade direta, o princípio do primado tem


também a sua origem na jurisprudência constante do Tribunal de Justiça e coube a este
impô-lo às jurisdições dos Estados que, por seu turno, acabaram por acolhê-lo e

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respeitá-lo. Importa também notar que o princípio do primado está intimamente ligado
com o da aplicabilidade direta, uma vez que se o direito da União se destina a produzir
efeitos internos imediatos e a criar direitos individuais que os órgãos jurisdicionais
devem salvaguardar, tal só se tornará possível, em muitos casos, se o direito nacional
contrário, anterior ou posterior, constitucional e infraconstitucional, puder ser
desaplicado pelos mesmos órgãos jurisdicionais em prol do direito da União. A somar a
isto a obrigatoriedade da decisão prejudicial proferida pelo Tribunal de Justiça leva a
que o juiz nacional possa ter que desaplicar o direito nacional sempre que aquela
decisão o leve a concluir pela sua incompatibilidade com o direito da União.

O primeiro acórdão que importa analisar no âmbito da consagração do princípio


do primado é o acórdão Costa/ENEL. Este surge em consequência de um caso em que
o Tribunal Constitucional italiano determinou que se aplicava o princípio lex posteriori
derogat priori, ou seja o juiz nacional estava obrigado a aplicar qualquer lei que viesse,
posteriormente, dispor em contrário do que estabelecia o Tratado. Coube ao Tribunal
de Justiça, por meio deste acórdão estabelecer as relações entre o direito interno e o
direito da União, bem como apresentar a justificação da superioridade da ordem jurídica
da União sobre as ordens jurídicas nacionais. O Governo italiano contrapôs afirmando
que, como não existia na ordem jurídica interna nenhuma disposição a conferir a
primazia do direito internacional, o primado do direito comunitário não existia uma vez
que a ordem interna carecia de um princípio jurídico para tal e este não era possível
extrair do direito positivo interno. Coube então ao Tribunal fornecer esse princípio
baseando-se, quer na natureza específica da ordem jurídica comunitária, quer nas
exigências próprias dessa mesma ordem jurídica:

 Argumento retirado da natureza específica da ordem comunitária –


Ao criar uma Comunidade de duração ilimitada, dotada de atribuições
próprias, de personalidade, de capacidade jurídica e de representação
internacional e, mais precisamente, de poderes reais resultantes de
uma transferência de atribuições dos Estados para a Comunidade, tais
Tratados limitaram, embora em domínios restritos, os seus direitos
soberanos e criaram, assim, um corpo de direito aplicável aos seus
cidadãos e aos próprios Estados. Assim sendo a natureza específica

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desta ordem que foi instituída leva a que, em caso de conflito, tenha
de prevalecer o direito comunitário face ao direito nacional;

 Argumento retirado das exigências próprias da ordem jurídica


comunitária – “A força executiva do Direito Comunitário não poderia,
com efeito, variar de um Estado para outro ao sabor das legislações
internas ulteriores, sem pôr em perigo a realização das finalidades do
Tratado”; “As obrigações contraídas em virtude do Tratado que institui
a Comunidade não seriam incondicionais mas tão-somente eventuais
se pudessem ser postas em causa por atos legislativos ulteriores dos
signatários;

Esta solução apresentada pelo Tribunal de Justiça visou solucionar o problema da


fundamentação da primazia do direito comunitário e seria válida para todos os Estados-
Membros, quaisquer que fossem as disposições constitucionais respetivas. Trata-se de
uma solução comunitária que corresponde à própria noção e às exigências do mercado
interno que os Estados-Membros quiseram instituir. Após este acórdão o Tribunal não
se cessou de explicitar este princípio relembrando os Estados-membros que o princípio
do primado “se manifesta em relação a todas as normas nacionais, quaisquer que elas
sejam, anteriores ou posteriores, tornando portanto inaplicáveis de pleno direito todas
as disposições nacionais existentes”. O Tribunal frisou também, a partir do acórdão
Costa/ENEL, que a primazia se aplica a todas as autoridades do Estado, assim como aos
órgãos legislativos e jurisdicionais. Seguiu-se o acórdão Simmenthal que reflete um
novo e decisivo passo em frente no seu esforço para impor a todas as autoridades
nacionais a primazia absoluta e incondicional do Direito Comunitário. Por força do
primado as disposições diretamente aplicáveis têm por efeito não apenas “tornar
inaplicável de pleno direito, pelo simples facto da sua entrada em vigor, qualquer
disposição contrária da legislação nacional existente”, mas ainda “impedir a válida
produção de novos atos legislativos nacionais, na medida em que estes sejam
incompatíveis com as normas comunitárias”. Os juízes estão diretamente vinculado à
observância dos princípios do primado e da aplicabilidade direta. Incumbe-lhes, pois,
uma vez chamado a julgar no âmbito da sua competência, a obrigação de aplicar
integralmente o direito comunitário, deixando inaplicada qualquer disposição

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eventualmente contrária da lei nacional, quer esta seja anterior que seja posterior à
regra comunitária. Num outro acórdão, Comissão/Itália, o Tribunal havia declarado que
o direito comunitário “implica para as autoridades nacionais competentes a proibição,
de pleno direito, de aplicar uma disposição nacional que é incompatível com o Tratado
e, sendo caso disso, a obrigação de tomar todas as medidas para facilitar a realização
do efeito pleno do direito comunitário. A realização dos objetivos da Comunidade exige
que as normas de direito comunitário se apliquem de pleno direito, no mesmo momento
e com efeitos idênticos em todo o território da Comunidade, sem que os Estados-
Membros lhes possam opor seja que obstáculos forem”.

Resumindo resulta desta jurisprudência que a administração em geral tem o


dever de afastar a aplicação de qualquer disposição nacional, ainda que de natureza
constitucional, quando esta obste à aplicação efetiva do direito comunitário. O Tribunal
de Justiça teve já ocasião de reafirmar, por várias vezes, este dever da administração e
de o colocar em paralelo com o que impende sobre o tribunal nacional. Assim, uma
disposição nacional de qualquer fonte nunca poderá ser utilmente invocada em apoio
de um recurso de anulação dirigido contra um ato da União.

12.O princípio da autonomia processual dos Estados-Membros e os


seus limites: os princípios da equivalência e da efetividade

O facto de os tribunais nacionais serem simultaneamente os tribunais comuns da


União implica que, na falta de disposições adotadas pela União, tais tribunais, mesmo
quando atuam na segunda qualidade, estão vinculados ao direito processual e à
organização judiciária em vigor nesse Estado. É neste quadro que os particulares devem
procurar salvaguardar os direis que lhes atribui o ordenamento da União. Todavia
existem limites a este princípio da autonomia processual, uma vez que certas regras de
direito processual podem ter fundas repercussões no direito substantivo. Estes limites
têm origem em acórdãos prejudiciais do Tribunal de Justiça e são dois:

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Direito da União Europeia

 Princípio da equivalência – o direito processual nacional não pode fazer


distinções entre pretensões dos particulares baseadas no direito da União e
pretensões baseadas no direito nacional;

 Princípio da efetividade – mesmo não fazendo tais distinções, o direito


processual nacional não pode tornar o exercício de um direito decorrente do
ordenamento da União virtualmente impossível ou excessivamente difícil;

Como violação do primeiro princípio o direito da União determina que se


encontram os meios processuais em que, por exemplo, o particular é obrigado a
suportar custos e prazos superiores para exercer um direito da União face a um direito
interno. O particular lesado poderá, pois, invocar este princípio junto do tribunal
nacional para que este elimine a discriminação e restabeleça a igualdade. Em suma, o
respeito do princípio da equivalência pressupõe que a disposição processual em causa
aplique indiferentemente às ações baseadas em violação do direito da União e às
baseadas em direito interno com um objeto e uma causa semelhantes. Uma violação do
princípio da efetividade será quando a lei processual nacional, apesar de se aplicar
indistintamente às hipóteses de exercício de direitos tanto de fonte nacional como de
fonte europeia, faça tais exigências de prova documental que torne impossível, na
prática, o exercício do direito ao reembolso dos tributos indevidamente pagos,
garantido pelo ordenamento da União. Também aqui, o particular lesado poderá invocar
o princípio da efetividade do direito da União para se opor à aplicação da norma nacional
que exija tal prova. É ainda com base neste princípio que permite a desaplicação de uma
norma processual nacional que impeça o respetivo tribunal não só de recorrer ao
processo do artigo 267º T.F.U.E, como de apreciar oficiosamente a compatibilidade de
um ato de direito interno com um preceito de direito da União, quando este último não
tenha sido invocado dentro de um determinado prazo pelo particular.

Todas estas regras de origem jurisprudencial constituem fortes “impulsos


europeizantes” para os tribunais nacionais encarregados de lhes dar plena aplicação,
afastando, sempre que necessário, as regras de direito nacional que as contrariem.

13.Atos Jurídicos da União

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O artigo 288º/1 do T.F.U.E enumera as categorias de atos juridicamente


vinculativos que as instituições adotam para “exercerem as competências da União”,
bem como os dois tipos principais atos não vinculativos. Ainda assim esta enumeração
não esgota o elenco dos atos da União, visto que os Tratados e prática conhecem muitas
outras fontes de hard law e, sobretudo, de soft law. Há que ter em que conta que para
determinar a natureza jurídica de um ato, os tribunais da União não estão limitados pela
sua designação oficial, devendo antes em primeiro lugar atender ao seu objeto e
conteúdo. As fontes previstas neste artigo constituem o principal modo de produção de
direito derivado da União, seja ou não de natureza legislativa. Em cada caso, as normas
ou os princípios constantes do Tratado (art. 296º T.F.U.E) indicam que fonte ou fontes
podem ser usadas por cada instituição para a adoção de atos jurídicos. O artigo 288º/1
não reflete qualquer hierarquia de fontes do direito derivado da União, porém após o
Tratado de Lisboa as fontes previstas neste artigo podem assumir natureza legislativa
ou não, por exemplo, consoante as circunstâncias concretas da sua utilização. Os cinco
atos previstos no artigo 288/1 são: regulamentos, diretivas, decisões, recomendações e
pareceres.

O regulamento tem três características fundamentais: (i) caráter geral, (ii)


aplicabilidade direta e (iii) obrigatoriedade em todos os seus elementos.

Pelo seu caráter geral os regulamentos são equiparáveis aos atos legislativos
nacionais. Tal como estes, o regulamento estabelece regras, impõe obrigações ou
confere direitos a todos os que se incluam ou possam vir a incluir-se na categoria de
destinatários que o regulamente define em abstrato e segundo critérios objetivos. Todas
as pessoas (singulares, coletivas, empresas, Estados, etc) que se encontrem no seu
âmbito de aplicação estão por ele vinculadas.

A aplicabilidade direta de que este goza permite-lhe vigorar internamente


dispensando qualquer mecanismo de receção no ordenamento jurídico nacional,
incorporando-se neste automaticamente. Não há transformação em lei nacional tendo
de ser publicado, tal e qual como se encontra no Jornal Oficial da União Europeia, tendo
o Tribunal de Justiça determinado que “são contrárias ao Tratado todas as modalidades
de execução que possam ter como consequência levantar obstáculos ao efeito direto dos

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regulamentos comunitários e comprometer, assim, a sua aplicação simultânea e


uniforme no conjunto da Comunidade”. Um dos principais valores jurídicos que levou a
esta decisão foi o da certeza jurídica, ao considerar-se que este poderia ser lesado caso
houvesse várias republicações no seio da União, podendo levantar dúvidas e confusões
entre os cidadãos da União. A aplicabilidade direta depende apenas e exclusivamente
do preenchimento das condições de validade e vigência resultantes direta, imediata e
exclusivamente da norma da União: adoção por órgão competente, segundo processo
adequado, fundamentação, publicidade e, porventura, de vacatio legis.

O regulamento é ainda obrigatório em todos os seus elementos, ou seja os seus


destinatários não podem adaptar o seu conteúdo e o sentido das suas prescrições ao
ordenamento jurídico interno e o ato beneficia ainda de uma presunção de auto-
suficiência normativa. O regulamento é vinculativo quer quanto aos meios quer quanto
aos fins que o mesmo prescreve não sendo possível os destinatários alterare-los. Pode
suceder, no entanto, que o regulamento preveja atos secundários de execução ou que
os Estados-Membros possam adotar medidas de aplicação, inclusive reconhecendo para
o efeito poderes discricionários, mas as normas dos regulamentos que não deixem
qualquer margem de apreciação ou de regulamentação estão, em princípio, em
condições de produzir efeito direto no ordenamento interno, gerando direitos e
obrigações na esfera jurídica dos seus destinatários.

A Diretiva impõe aos Estados-Membros a realização de certos objetivos


concretos, deixando-lhes margem – maior ou menor – na escolha da forma e dos meios
para a sua implementação. Apesar de poderem conter uma disciplina geral, têm como
destinatários imediatos apenas os Estados-Membros. Estas só os vinculam “quanto ao
resultado a alcançar, deixando às instâncias nacionais a competência quanto à forma e
aos meios” para atingir esse resultado. Isso significa que o conteúdo da diretiva supõe,
em princípio, a possibilidade de diferenciações normativas do regime jurídico a
estabelecer nacionalmente. Estas são assim equiparadas à lei-quadro nacional. A criação
deste particular tipo de ato normativo revela, da parte dos autores dos Tratados, o
propósito de proporcionar às Instituições da União, uma alavanca mais flexível,
adaptada a objetivos menos ambiciosos da aproximação das legislações nacionais.

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Este ato obriga apenas os destinatários que ela própria designa, que sendo
sempre exclusivamente os Estados-Membros, podem ser todos eles, alguns ou apenas
um. Porém, mesmo podendo ser dirigida a todos os Estados, continua a ser um ato de
caráter individual, uma vez que os seus destinatários são certos e determinados. Faz
sentido que os Estados, habilitados a coordenar os respetivos comportamentos em
função de tais objetivos, devam ser os destinatários das diretivas. Nesta distinguem-se
dois níveis de regulamentação:

 A fixação, em termos vinculativos, do resultado a atingir é da


responsabilidade das Instituições da União;

 A determinação e adoção das medidas destinadas a alcançar tal resultado


incumbem aos Estados destinatários da diretiva

Com a diretiva relaciona-se também o princípio da subsidiariedade: o resultado


a atingir, comum aos Estados-Membros, deverá ser fixado a nível central, mas a
realização desse objetivo deverá ser alcançada, em cada um deles, mediante a utilização
das formas e meios que em cada um forem considerados mais convenientes e mais
conformes à sua situação interna e aos imperativos da sua ordem jurídica.

O Tribunal de Justiça entende que quando os particulares estejam em condições


de invocar uma diretiva contra o Estado (tópico abordado adiante) podem fazê-lo
qualquer que seja a qualidade em que este último tenha agido, ou seja a de autoridade
pública ou a de simples entidade patronal.

A Diretiva impõe aos Estados-membros uma “obrigação de resultado”, como já


foi visto e uma “obrigação de comportamento”, algo que resulta do próprio articulado
da diretiva e do artigo 4º/3 do T.U.E, segundo o qual deve haver uma boa cooperação
entre os Estados e a União. Desta obrigação de comportamento decorre que durante o
prazo de transposição de uma diretiva os Estados se devem abster de adotar medidas
suscetíveis de comprometer o resultado por ela prescrito. O Estado tem liberdade
quanto à forma pela qual opte para executar a diretiva, com a ressalva de que as simples
práticas administrativas, pela sua natureza modificável ao critério da administração e
desprovidas de publicidade adequada não podem ser consideradas como constituindo

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execução das obrigações que incumbem aos Estados no quadro da transposição de uma
diretiva.

A transposição destas deve ser correta, completa e com a especificidade,


exatidão e clareza requeridas para que seja satisfeita a exigência da segurança jurídica
e assegurado o seu efeito útil. Isto significa, quando se destinarem a criar direitos a favor
dos particulares, que estes tenham a possibilidade de conhecer todos os seus direitos e
de os invocar perante os tribunais nacionais.

Os Estados gozam, ao abrigo da disposição do artigo 288/1 do T.F.U.E, da


possibilidade de escolher, entre as medidas concretas suscetíveis de conduzir ao
resultado prescrito pela União, as que lhe pareçam as mais adequadas, as menos
perturbadoras da ordem interna e as mais conformes ao regime jurídico existente.
Apesar disto o Tribunal de Justiça exige um ato formal de transposição, o qual consiste
em muitos casos na adaptação da legislação nacional, a fim de garantir a plena eficácia
das diretivas, os Estados-Membros devem prever um quadro legal preciso no domínio
em questão. As disposições de uma diretiva devem ser aplicadas com caráter obrigatório
incontestável, com a especificidade, precisão e clareza necessárias, a de ser satisfeita a
exigência da segurança jurídica.

Da leitura do artigo 288º não resultava que a diretiva fosse diretamente aplicável
na ordem jurídica interna dos Estados-Membros, isto é, que ela pudesse por si própria
originar direitos individuais em benefício dos nacionais dos Estados destinatários. Do
ponto de vista formal, de facto, a recusa da aplicabilidade direta das diretivas teria uma
certa lógica, pois esta não poderia modificar só por si o direito nacional e alterar as
situações jurídicas que ela teve em vista. Só as regras de execução da diretiva é que
teriam a capacidade de originar para os particulares direitos e obrigações que os
tribunais nacionais estariam habilitados a salvaguardar ou impor. Porém a
jurisprudência do Tribunal de Justiça veio revelar as falhas desta tese.

A Diretiva gera para o Estado, a partir da sua vigência a nível da União, uma
vinculação imediata. Se o Estado-Membro estava obrigado a transpor a Diretiva e não o
faz, coloca-se numa situação de incumprimento, sancionável contenciosamente e não
pode, segundo o Tribunal de Justiça, prevalecer-se perante os particulares do seu

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próprio incumprimento. Assim sendo, se a Diretiva não transposta reunir as condições


de que depende o efeito direto de qualquer norma da União, o particular poderá invoca-
la jurisdicionalmente contra o Estado (nas duas vertentes abordadas), obtendo o
benefício da sua aplicação e a desaplicação das normas nacionais a que esta se
oponham. Neste âmbito assume bastante importância o princípio da interpretação
conforme, resultando que “ao aplicar o direito nacional, quer se trate de disposições
anteriores ou posteriores à diretiva, o órgão jurisdicional chamado a interpretá-lo é
obrigado a fazê-lo, na medida do possível, à luz do texto e da finalidade da diretiva, para
atingir o resultado por ela prosseguido”. Por força do mesmo princípio cabe aos tribunais
garantirem a plena eficácia da diretiva em causa e alcançar uma solução conforme ao
objetivo por ela prosseguido. Assim se obtém um “efeito direto indireto” que permite
em larga escala suprir a ausência de efeito direto horizontal da diretiva.

No acórdão Van Duyn uma particular holandesa que havia sido expulsa do Reino
Unido, com base em razões de ordem pública, recorreu para os tribunais ingleses
alegando que este ato correspondia a uma violação do princípio do “tratamento
nacional” que lhe deveria ser conferida pela diretiva 64/221, mas que não havia sido
transposta pelo Reino Unido. Nesta o artigo 3º/1 previa que “as medidas de ordem
pública devam ser fundadas exclusivamente sobre o comportamento pessoal do
indivíduo em causa, pretende limitar o poder discricionário que as legislações nacionais
atribuem em geral às autoridades competentes em matéria de admissão e expulsão de
estrangeiros.” Porém, a expulsão não se baseava neste preceito e o mesmo cria a favor
dos particulares direitos que estes devem fazer valer em justiça em qualquer Estado-
Membro e que às jurisdições nacionais cumpre salvaguardar, independentemente da
transposição ou não. Assim sendo sempre que as disposições de uma diretiva sejam
incondicionais e suficientemente precisas, os particulares têm o direito de as invocar
contra o Estado nos tribunais nacionais, quer quando este não tenha feito a sua
transposição para direito nacional nos prazos previstos quer quando tenha feito uma
transposição incorreta. Porém este efeito direto das diretivas só existe quando o prazo
para a transposição tenha findado e denomina-se de efeito direto vertical.

Por outro lado e através do acórdão Dori, é determinado que este efeito direto das
diretivas não se aplica entre particulares, ou seja não existe o efeito direto horizontal,

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uma vez que as diretivas vinculam os Estados-Membros. Os particulares só estão


vinculados a estas após a correta transposição.

No caso a Sra. Dori fez uma compra que não lhe interessava fora de um
estabelecimento comercial e posteriormente pretendia rescindir o contrato, baseando-
se numa diretiva que lhe dava tal direito. Este tinha caráter preciso e incondicional, logo
seria aplicável por via do efeito direto, contudo deste resultaria um dever para a
empresa (aceitar a rescisão) e esse dever seria com fundamento em direito comunitário
na sua origem e não em direito comunitário transformado em direito nacional, como
está previsto que aconteça. Assim sendo as diretivas não transpostas não têm efeito
direto horizontal, não podendo os particulares invocar os direitos que delas decorrem.
Concluindo para que uma diretiva tenha efeito direto são precisos três requisitos: (i) a
disposição tem de ser clara, precisa e incondicional, (ii) a diretiva não foi transposta e
(iii) o litígio em causa tem de envolver um particular e o Estado, não podendo versar
sobre dois particulares.

Ainda assim existe uma solução que se encontra relacionada com o princípio da
interpretação conforme: o juiz nacional deverá recorrer ao próprio direito nacional e
procurar interpreta-lo em conformidade com a diretiva não transposta, procurando uma
disposição que garanta o mesmo resultado. Caso tal não seja possível entra-se no
domínio da responsabilidade extracontratual do Estado por violação do direito da União.

Este princípio visa resolver as situações em que não há transposição de uma


diretiva que tem disposições incondicionais e precisas para os particulares e que, devido
à não transposição, lesa um destes. Assim sendo o Tribunal entendeu que para se aplicar
este princípio têm de estar verificados três pressupostos: (i) a disposição da diretiva
violada tenha por objetivo conferir direitos aos particulares; (ii) a violação seja
suficientemente caracterizada; (iii) exista um nexo de causalidade direto entre a
violação e o dano. O princípio também só se pode aplicar caso o juiz nacional não tenha
procurado interpretar normas nacionais de forma a dar-lhes o significado da diretiva.

Voltando aos atos da União importa ainda analisar as decisões. A definição desta
foi alterada pelo Tratado de Lisboa excluindo a obrigatoriedade de indicação de
destinatários, o que aumenta o número de matérias e situações em que poderá ser

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utilizada. A Decisão é, em princípio, um ato juridicamente obrigatório mas já não,


necessariamente, individual, podendo mesmo ter alcance geral, como sucederá no
domínio da PESC. Os seus destinatários tanto podem ser os Estados-Membros, como os
particulares. A decisão tem normalmente por finalidade aplicar as regras do direito da
União a casos particulares, sendo portanto equiparável a um ato administrativo. Estas
são obrigatórias em todos os seus elementos, sendo neste caso semelhante ao
regulamento. Do ponto de vista da aplicabilidade direta, as decisões que se destinem
aos particulares são por si próprias, direta e imediatamente, direitos e obrigações para
os respetivos destinatários e eventualmente para terceiros, que os tribunais nacionais
podem ser solicitados, na sua qualidade de tribunais comuns do direito da União, a
reconhecer e impor. Em princípio uma decisão da União não modifica por si própria a
ordem jurídica interna dos Estados, cabendo a estes modificarem a sua própria ordem
jurídica, por intermédio do que a decisão lhes impõe. A questão do efeito direto das
decisões é controverso dependendo da análise sobre a natureza, economia e termos da
disposição para determinar se da decisão emergem obrigações com caráter
incondicional e suficientemente claro e preciso.

14. Os procedimentos decisórios: processos legislativos e a


“comitologia”

Por força dos artigos 14º/1, 16/1 e 17/2 do T.U.E o Parlamento Europeu exerce
juntamente com o Conselho, a função legislativa, detendo a Comissão o monopólio da
iniciativa legislativa, tal como também se pode inferir pelo artigo 289º/1 que dispõe que
“o processo legislativo ordinário consiste na adoção de um regulamento, de uma diretiva
ou de uma decisão conjuntamente pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho, sob
proposta da Comissão”. A par deste processo existe o processo legislativo especial que,
segundo o nº2 do artigo 289º, acontece nos casos específicos pelos Tratados em que os
referidos atos jurídicos são adotados pelo Parlamento Europeu com a participação do
Conselho. Uma das grandes mudanças introduzidas por este artigo foi a previsão de atos
legislativos por oposição a atos não-legislativos, sendo que os primeiros constituem a
principal categoria de atos de direito derivado da União. Estes são caracterizados, em
primeiro lugar, pelo seu processo de formação. O processo legislativo inclui um regime

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de perfeição jurídica autónomo, cujo cumprimento não é mera condição de eficácia,


mas verdadeira condição de validade: os atos legislativos devem ser assinados pelo
legislador e publicados no Jornal Oficial da União Europeia. Da classificação de um ato
como legislativo decorrem ainda outras consequências:

 Valor Jurídico – na hierarquização formal dos atos de direito derivado


estes primam sobre os atos não-legislativos;

 Reserva de Lei – este estende-se ao domínio formal e material, sendo


que as matérias que só podem ser reguladas por ato adotado por
processo legislativo não podem ser reguladas por forma não legislativa;

 Delegação na Comissão – só estes atos é que têm o poder de delegar na


Comissão a adoção de atos não legislativos de alcance geral que alterem
ou completem “aspetos não essenciais do ato legislativo”

O processo legislativo ordinário é aplicável em todos os atos em que ao longo do


Tratado as suas disposições se submetam a tomada de decisão à tramitação prevista no
artigo 294º, tendo o processo inicio com a apresentação pela Comissão de uma proposta
ao Parlamento Europeu e ao Conselho.

Após a apresentação dá-se a fase da “primeira leitura”, onde o Parlamento


Europeu estabelece a sua posição e a transmite ao Conselho. Se este aprovar a posição
do Parlamento, o ato considera-se adotado com a formulação correspondente a essa
posição e o processo chega a seu termo. Porém o Conselho pode não aprovar a posição
do Parlamento Europeu e adota a sua própria posição e transmite-a ao Parlamento com
uma informação plena das suas razões.

Com isto chega-se à fase da “segunda leitura”. No prazo de três meses após a
transmissão da posição do Conselho, o Parlamento Europeu pode: (i) aprovar
expressamente a posição do Conselho ou (ii) não se pronunciar, o que é entendido como
uma aprovação tácita, sendo que em ambos os casos o ato considera-se adotado com a
formulação correspondente à posição do Conselho, chegando o processo ao fim. Porém
o Parlamento pode fazer uma de duas coisas: (i) rejeitar pura e simplesmente a posição
do Conselho, o que leva a que o ato proposto pela Comissão não foi adotado, ou (ii)

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propor emendas à posição do Conselho e também à Comissão que emite um parecer


sobre as emendas. Se todas estas forem aprovadas no prazo de 3 meses, o ato
considera-se adotado com a formulação decorrente das emendas propostas pelo
Parlamento Europeu. Se o Conselho não as aprovar todas é convocado o Comité de
Conciliação.

Este Comité reúne os 27 membros do Conselho e outros tantos membros


representando o Parlamento Europeu e tem por missão chegar a acordo sobre um
projeto comum de ato com base nas posições adotadas pelas duas Instituições em
segunda leitura. Esta conciliação deve ser alcançada em seis semanas e se esta não
resultar o processo termina, se por contrário do Comité sair um projeto comum
procede-se à “terceira leitura”.

Em sede desta terceira e última leitura o Parlamento Europeu e o Conselho


disporão cada um de seis semanas, a contar da aprovação do projeto comum par adotar

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nessa conformidade o ato em causa. Se nesse prazo uma das Instituições não o fizer o
processo chega, sem sucesso, ao seu termo.

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Há certos casos específicos em que os Tratados exigem um processo legislativo


especial, sendo que neste também são aplicáveis as disposições dos Tratados sobre o
papel da Comissão, ou seja novamente tem de ser esta primeiro a apresentar às outras
Instituições a proposta de ato. Nestes casos o ato em si é adotado por uma só das
Instituições, mas com a participação da outra. Neste âmbito, sempre que, por força dos
Tratados, o Conselho delibere sob proposta da Comissão, o Conselho só pode alterar
essa proposta deliberando por unanimidade (artigo 293/1). Em contrapartida, enquanto
o Conselho não tiver deliberado a Comissão pode alterar a sua proposta, uma ou mais
vezes, em qualquer fase do processo de adoção do ato (artigo 293/2). Em qualquer caso,
o ato jurídico adotado por processo legislativo especial constitui igualmente um ato
legislativo (artigo 293/3)

Nos termos do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), os


Estados-Membros põem em prática o direito europeu ao adotarem medidas de
execução de atos jurídicos nos respetivos direitos nacionais. Com efeito, e em
conformidade com os princípios de subsidiariedade e proximidade, as decisões devem
ser tomadas tão próximo quanto possível dos cidadãos.

Podem igualmente ser atribuídas competências de execução à Comissão para a


colocação em prática uniforme da legislação nos Estados-Membros, ou ao Conselho
para a execução dos atos relativos à Política Externa e de Segurança Comum (artigos
24.º e 26.º do Tratado da União Europeia (TUE). No exercício das suas competências de
execução, a Comissão é assistida pelos representantes dos Estados-Membros, reunidos
em comités, segundo o denominado procedimento de «comitologia».

Os comités, que constituem instâncias de debate, são compostos por


representantes dos Estados-Membros e presididos pela Comissão. Permitem a esta
instituição encetar um diálogo com as administrações nacionais antes de adotar
medidas de execução e assegurar-se, assim, de que estas medidas correspondem da
melhor forma possível à realidade do país em que vão ser aplicadas.

As relações entre a Comissão e estes comités são regidas em conformidade com


modelos previamente estabelecidos numa decisão do Conselho, a Decisão
«Comitologia». Esta decisão foi alterada diversas vezes. Em 1999, reconheceu ao

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Parlamento Europeu um direito de controlo relativamente à aplicação dos atos


legislativos adotados no âmbito do procedimento de co-decisão. Além disso, melhorou
a transparência do sistema, facilitando o acesso, por parte do Parlamento e do público,
aos documentos dos comités e impondo a inscrição dos mesmos num registo público. A
Decisão «Comitologia» foi de novo alterada em 2006, alteração essa que introduziu um
novo tipo de regra de exercício relativo às competências de execução: o procedimento
de regulamentação com controlo.

O Tratado de Lisboa prevê, agora, que as relações entre a Comissão e os seus


comités sejam organizadas com base num regulamento adotado pelo Parlamento
Europeu e pelo Conselho, no âmbito do processo legislativo ordinário. Até à adoção do
referido regulamento, aplica-se a Decisão «Comitologia» do Conselho, adotada em
2006.

A ideia essencial deste mecanismo é a de fazer participar as administrações


nacionais por vi dos seus representantes no exercício das funções executivas da União
por via dos comités, pois são as administrações nacionais que, por razões lógicas, melhor
sabem os problemas que se podem colocar à execução dos atos da União.

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REPETITÓRIO DE PERGUNTAS

1. O que foi o “Discurso de Zurique”? O que significou para o crescimento da Europa


em termos políticos?
2. Do Congresso de Haia resultaram várias recomendações politicas para a constru-
ção da Europa. Indique e explique os dois caminhos possíveis que foram identifi-
cados neste Congresso.
3. Como nasceu o Conselho da Europa? Quais são os seus objetivos?
4. O que foi a Declaração Schumann?
5. A CECA era composta por que países? No âmbito da CECA, o que era a “Alta Au-
toridade”?
6. O Tratado de Roma da Comunidade Europeia encontra fundamento em que de-
claração política? Quais as diferenças mais marcantes entre essa declaração e a
declaração Schumann?
7. Explique porque se considera “informal” a criação do Conselho Europeu no perí-
odo após a Declaração de Bad Godesberg?
8. O que significou para a construção da Europa, o Ato Único Europeu?
9. Explique o que significa a expressão, “As comunidades são o núcleo da União
Europeia”.
10. Em 1993 com a entrada em vigo do Tratado de Maastrich, a Europa passou a ter
“3 pilares”. Indique-os e explique-os.
11. Explique, em poucas palavras, as razões que levaram ao fracasso do Tratado que
estabelece um Constituição para a Europa.
12. Aponte as principais diferenças que o Tratado de Lisboa trouxe para o quadro
jurídico da União Europeia (fenómeno politico de integração).
13. Enumere os valores fundamentais da UE. Indique, também, os artigos que os
comprovam. (referimo-nos ao T.UE e ao T.F.UE).
14. Indique jurisprudência estudada nas aulas que sirva de elemento de estudo ao
direito da cidadania europeia consagrada nos Tratados. Explique, sumariamente,
o que essa jurisprudência ajuda a perceber sobre o direito referido.
15. Quais são os princípios “constitucionais” que norteiam a ação da União Euro-
peia?
16. Quais são as competências do Parlamento Europeu?
17. Explique as regras de deliberação do Conselho da União Europeia.
18. Qual é a composição da Comissão Europeia?
19. Como se desenrola o procedimento legislativo ordinário? Indique, ainda, os dife-
rentes tipos de atos que a União Europeia pode adotar no seu processo legisla-
tivo (direito secundário).
20. Em que consiste o envio prejudicial? Qual é a melhor interpretação a fazer do
artigo 267º do T.F.UE (use outras legislações e jurisprudência para justificar a
resposta corretamente).

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Queremos agradecer a todos os alunos


que tornaram possível a realização da
Linha de Sebentas AEFDUNL.
Informamos que não nos
responsabilizamos por possíveis erros
que as sebentas possam conter.
Qualquer sugestão que tenhas ou erro
que detetes por favor contacta a AE
através do dep.pedagogico@ae.fd.unl.pt.

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