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INSTITUTO DE FILOSOFIA E TEOLOGIA SANTA CRUZ

CURSO DE FILOSOFIA
FILOSOFIA POLÍTICA
PROF. ME. JOÃO LOURENÇO BORGES NETO

GABRIEL TOMÁS SILVA

A JUSTIÇA VIRTUOSA NA ESTRUTURAÇÃO DA CIDADE

Para o processo de estruturação de uma cidade, sobretudo no período grego, é


impossível não falar das influências da justiça platônica. Com a justiça é possível dividir os
trabalhos e colocar cada um no seu lugar devido, mas para que haja tal organização é
necessário a presença de um legislador, que tendo o olhar na justiça, governará a cidade.
A organização da cidade é sempre colocada a partir de uma ideia de bem 1, e os efeitos
que esse Bem causa na vida dos cidadãos. Pela ideia de Bem defendida por Platão, os
governantes são aceitos na pólis pelo fato de visarem às necessidades dos subordinados,
prezando pelo bem de alheios e não do próprio interesse. Em relação ao salário, há uma
consequência, visto que o governante sempre age pelo bem dos súditos, tudo o que adquire
não é para as próprias honrarias e sim para o bem daqueles que o serve.
Uma vez que o governante exerce sua função com excelência, ele torna-se sábio e sabe
tratar aqueles que lhe são semelhantes com igualdade, entretanto, aqueles que geram a
desordem e a confusão são tratados como lhes cabem.
Platão quer que o governante e povo possam visar às noções de bem e perceber que a
formação da cidade a partir da justiça virtuosa, que tem fundamento na segunda noção, é a
melhor forma de garantir a coletividade.2
A ideia de que cada cidadão deve exercer a função ou a arte que lhe foi atribuída desde
o nascer continua, agora, um pouco mais reafirmada. A visão de cidade vai se alargando, e
com isso a necessidade de uma melhor estruturação, por isso, o cidadão que exerce
rigorosamente a arte, com a qual nasceu, por toda vida, pode torna-se um artífice perfeito.
Com isso então Platão propõe uma estruturação para o trabalho.
A estruturação hierárquica de organização da cidade é proposta da seguinte maneira:
na primeira estão os governantes, na segunda os guardiões, de onde são escolhidos os
governantes, e a terceira é composta pelos artesãos e outros, os quais são responsáveis pela
produção e subsistência da cidade. A relação entre essas classes não será outra que não seja a

1
Platão concebe três ideias de Bem que para nossa investigação não há tanta relevância, contudo, os interessados
pelo assunto podem encontrar as concepções na obra I A República.
2
Encontramos no Livro X (Mito de Er) a importância da escolha.
relação hierárquica. Isso tudo para garantir uma boa formação daqueles que se dedicam à sua
estrutura, ou seja, a educação ocupa um papel importantíssimo na formação da pólis.
A questão da novidade é elucidada na obra de Platão. Para ele, um rico ou um pobre
que tem uma novidade pode gerar um desiquilíbrio na manutenção da cidade justa, por isso a
cada um cabe cumprir com excelência cada uma das atividades que lhe são cabíveis.
Não são as regras que faz um bom legislador, mas o cumprimento destas regras. Para o
legislador ideal é necessário o maior cuidado para não se instaurar na cidade certas doenças,
como a da divisão e da novidade.
Analisando a responsabilidade que o legislador tem perante a cidade que governa, se
faz necessária a condução deste legislador à totalidade, fazendo com que conheça as ciências.
Esta condução se faz necessária, porque o ato de governar deve sempre estar de acordo com a
estrutura da cidade, para que trilhe um caminho de sabedoria. A cidade se torna sábia quando
o governante sabe que o conhecimento é necessário e aprende a ser sábio. A classe dos
governantes pode ser pequena, mas é por meio dela que advém a sabedoria de uma cidade.
Depois de tratar da areté que compete aos governantes no processo de estruturação,
tratemos da areté que cabe aos guardiões.
A classe dos guardiões é representada em uma sociedade pela sua coragem, e está é a
areté dos guardiões. Por meio dos guardiões, uma cidade inteira é corajosa, porque estes
desempenham com afinco a sua função na estrutura de organização da cidade. Com a
coragem, o guardião apreende também outras virtudes, como a da prudência, se distanciando
dos prazeres e desejos.
Tais virtudes desempenham este papel nos guardiões porque não são guardas somente
do que chamamos de inimigos externos, sobretudo guardam a cidade dos inimigos que podem
surgir internamente, causando uma desordem.
Como última areté para estruturar uma sociedade, direcionamos o olhar a terceira
classe de cidadãos. A virtude age na vida do cidadão e o direciona e esclarece o ser para
aquilo que foi destinado em sua cidade. Podemos dizer que o cidadão torna-se ‘senhor de si
mesmo’, ou seja, é possuidor de um autodomínio frente ao que leva a destruição da pessoa e,
sobretudo da cidade. Esse ‘senhor de si mesmo’ que podemos denominá-lo de virtude da
temperança, que está presente não nos governados, mas de maneira profunda nos governante.
Por meio da temperança, cada qual se ajusta em seu meio/classe, e especialmente, colabora na
coabitação das diferentes classes, de modo que vivem juntas em vista de um fim semelhante.
Por fim, a justiça se encontra desde a concepção da cidade, uma vez que ela rege todas
as outras, e regendo todas as outras se torna a justiça virtuosa. Essa relação das virtudes com a
justiça virtuosa, Platão descreve da seguinte maneira:

seria difícil se distinguir se era a concordância de opiniões dos governantes e dos


governados, se a preservação, mantida entre os guerreiros, da opinião legítima
acerca do que se deve ou não recear, ou a sabedoria e vigilância existentes nos
chefes, ou se o que as tona mais perfeita é a presença, na criança, na mulher, no
escravo, no homem livre, no artífice, no governante, no governado, da noção de que
cada um faz o que pertence, e não se mete no que é dos outros. (PLATÃO, 2001,
433c-d)

A justiça, como base fundante da cidade, faz com que os homens se limitem a ocupar-
se do que é seu, e assim a cidade trabalha na perfeita harmonia.

REFERÊNCIAS

PLATÃO. A República. 9 ed. Fundação Calouste Gulbenkian, 2001.

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