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mobilidade urbana
Resumo: O conceito de mobilidade urbana ainda é muito recente no Brasil e os problemas a ele relacionados ainda não estão muito
claros para uma parcela significativa da população. Este artigo tem como objetivo identificar se isto também se verifica com técnicos e
planejadores trabalhando especificamente nos campos do planejamento urbano e de transportes. O estudo foi realizado em uma cidade
média brasileira, com uma ferramenta computacional concebida para ajudar na definição de um Sistema de Indicadores de Mobilidade
Urbana. Neste estudo de caso foram utilizadas técnicas de avaliação qualitativa que permitiram confrontar a percepção dos usuários
acerca do conceito de mobilidade urbana antes e depois do uso da ferramenta. A abordagem permitiu demonstrar que de fato havia
inicialmente uma visão parcial da mobilidade por parte dos técnicos. Também conduziu à conclusão de que parece ter havido uma
significativa ampliação no seu grau de conhecimento sobre o tema ao longo do processo.
Abstract: The concept of urban mobility is still recent in Brazil. As a consequence, the problems related to the concept are not clear
for a significant part of the population. The objective of this study is to examine if this is also the case for technicians and planners
working specifically in the fields of urban and transportation planning. The study was carried out in a Brazilian medium-sized city,
through an application with a computational tool originally designed to help in the construction of a System of Urban Mobility Indica-
tors. Qualitative analyses tools were applied for comparing the participants’ perception about the urban mobility concept before and
after the used of the tool. The approach was able to reveal that the professionals had indeed a partial view of mobility at the beginning
of the research. It also led to the conclusion that their knowledge about the theme evolved significantly during the process.
especializada destacam-se: a análise de conteúdo e a vras-chave. Segundo Bardin (1977), para realizar a
construção de mapas cognitivos. análise de um texto deve-se levar em consideração
todas as “palavras”, pois elas podem representar ele-
2.3.1. Análise de conteúdo
mentos chave (palavras-chave ou palavras-tema) de
A análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de análise cujo significado pode contribuir para uma de-
análise utilizadas principalmente nas Ciências Sociais. terminada análise.
No entanto, outras áreas de conhecimento também Na Análise de Associação, também denominada de
estão se apropriando destas técnicas para decodifica- co-ocorrências, procura-se extrair do texto as relações
rem as mensagens obtidas em entrevistas e questioná- entre os elementos da mensagem, ou seja, a relação de
rios. Na área de Planejamento dos Transportes, por associação entre dois ou mais elementos na mesma
exemplo, esta técnica foi utilizada por Sant’Anna unidade de contexto. Esta teoria foi esboçada por
(2007) para avaliar a percepção de usuários idosos Baldwin e defendida por Osgood. Osgood propõe o
com relação ao sistema viário. Segundo aquela autora, seguinte procedimento metodológico para a realização
a utilização da técnica de análise de conteúdo possibi- deste tipo de análise: i) escolher as unidades de regis-
litou ampliar o enfoque interdisciplinar (fenômenos tro – palavras-chave, temas; ii) escolher as unidades
sociológicos, psicológicos, físicos e técnicos) dos es- de contexto e o recorte do texto – numa mensagem
tudos de segurança de trânsito, permitindo assim que descontínua a unidade de contexto pode corresponder:
pudessem ser compreendidas as causas dos acidentes a uma carta, a um artigo, a uma entrevista, etc; iii)
de trânsito em relação à população idosa. codificar – realçar os elementos de cada fragmento
A análise de conteúdo é um “conjunto de técnicas para a obtenção de uma matriz que possam mostrar as
de análise das comunicações visando obter, por pro- co-ocorrências ou as associações; iv) calcular as co-
cedimentos, sistemáticos e objectivos de descrição do ocorrências e v) representar e interpretar os resultados
conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos – os resultados podem ser representados através de
ou não) que permitam a inferência de conhecimentos tabelas de contingência, quadros de redes e de núcleos
às condições de produção/recepção (variáveis inferi- (clusters analysis).
das) destas mensagens” (Bardin, 1977). Segundo
Henry e Moscovici apud Bardin (1977) “tudo o que é 2.3.2. Mapas cognitivos
dito ou escrito é susceptível de ser submetido a uma A metodologia desenvolvida por Eden (1989) apud
análise de conteúdo”. Pidd (2003) tem como objetivo auxiliar grupos no
Dentre as técnicas que compõem a metodologia de entendimento de problemas complexos, como por e-
análise de conteúdo para a análise de respostas para xemplo, na questão da tomada de decisão envolvendo
questões abertas destacam-se: Análise Temática, Aná- múltiplos participantes. Os Métodos SODA I e SODA
lise Léxica e Análise de Associação. A Análise Te- II (SODA – Strategic Options Development and A-
mática permite descobrir os principais sentidos da nalysis, cuja tradução é Desenvolvimento e Análise de
comunicação (respostas a questões abertas, entrevis- Ações Estratégicas) têm como objetivo decodificar as
tas, etc.), onde a presença ou freqüência de um deter- informações individuais (método SODA I) ou em gru-
minado índice (termo – frase ou palavra) pode ter al- po (método SODA II) através da construção de Mapas
gum significado no processo de análise. A Análise de Causa, também conhecidos como Mapas Cogniti-
Léxica é realizada através da identificação de pala- vos (ver Figuras 1 e 2). Os dois sistemas são parte da
MOBILIDADE
URBANA
Infra-estrutura
A pé Ruas
Meio de Desenvolver
Transporte Transporte Atividades
Calçadas
motorizado
Pessoas Veículos
Deslocamento Locomoção
Mapa 2 (Figura 6) pode-se observar uma ampliação De acordo com as respostas apresentadas nas Figu-
no elenco de Temas. Muitas das palavras-chave iden- ras 3 e 5 pode-se inferir que, tanto na definição de
tificadas nas respostas do questionário 2 representam mobilidade quanto na determinação dos problemas
os Temas considerados mais importantes na avaliação associados à mobilidade, os técnicos municipais não
dos participantes no Módulo I do sistema PLANUTS incorporaram o conceito de sustentabilidade em suas
(Crescimento Urbano, Sistema Viário, Acessibilidade definições. Aspectos ambientais, econômicos e sociais
Urbana, Impacto Ambiental, Mobilidade Urbana e não foram mencionados pelos avaliadores. Neste sen-
Estratégias Econômicas) e considerados os mais ur- tido, pode-se afirmar que a visão deste grupo ainda
gentes para o município, identificados nas avaliações estava associada ao antigo formato adotado no plane-
do Módulo III (Crescimento Urbano, População Ur- jamento de transportes no Brasil. Em contrapartida,
bana, Acessibilidade Urbana, Mobilidade Urbana e nos resultados apresentados nas Figuras 4 a 6 pode-se
Impacto Ambiental). observar uma ampliação das palavras-chave associa-
32 TRANSPORTES, v. XVI, n. 1, p. 25-35, junho 2008
MOBILIDADE
URBANA
Mobiliário Urbano Edificações
Locomoção Calçadas
Circulação
Preservar
Planejar
Novos Temas Recursos
Tema anterior
Estudar Otimizar
Tema cujo contexto não está associado à Recursos
Mobilidade Urbana
Quadro 3: Transcrição das respostas dos especialistas para a questão que trata da identificação dos problemas de Mobilidade Urbana
nos Questionários 1 e 2
QUESTÃO QUESTIONÁRIO 1A QUESTIONÁRIO 2
Quais os problemas da � Integração bairro a bairro, sem passar pelo � Falta de transporte público. Falta de manuten-
cidade que não estão inseri- centro. ção das vias de rolamento. Áreas com vazios
dos neste Plano (mobilida- � Falta integração desses planos. urbanos.
de)? (Questionário 1) � Falta de guias rebaixadas para cadeirantes.
� Forma de crescimento da cidade; prioridade
Calçadas com degraus no sentido longitudi-
do transporte coletivo; transporte de cargas.
nal. Mobiliário urbano próximo ao muro das
*********
casas. Falta de rampas em edifícios sem ele-
Este Plano foi elaborado ************************************* vadores. Falta de ciclovias.
para minimizar quais pro- � Barreiras físicas impostas pelos rios, ferrovias
� Falta de integração entre bairros.
blemas da cidade? (Questi- e rodovias. Cidade muito dispersa, com mui-
onário 1) � Transporte coletivo; rede viária; circulação de
bicicletas. tos vazios urbanos. Deficiência das estradas
rurais, nas calçadas e falta ciclovias. Sistema
X � Espera-se que tenha sido para possibilitar os de transporte coletivo com deficiências de
deslocamentos das pessoas proporcionando horário e rota. Renda de grande parte da po-
Cite alguns problemas conforto, segurança.
relacionados à Mobilidade pulação.
de sua cidade? (Questioná- � Transporte Coletivo. � Falta de interligação entre bairros (várias
rio 2) barreiras físicas), córregos, rodovias e ferro-
via. Bairros dispersos – cidade não compacta.
Falta de opções como ciclovia. Calçadas de
Objetivo - Identificar se
modo geral sem boa acessibilidade. Transpor-
houve um avanço no grau
te coletivo - alto custo.
de conhecimento dos parti-
cipantes com relação a
questão da mobilidade e do
planejamento dos transpor-
tes.
das à mobilidade. Algumas destas palavras-chave po- acontece nos casos aqui apresentados, todas as outras
dem ser encontradas inclusive em outros trabalhos, análises apontam para uma substancial diferença entre
como o de Steg e Gifford (2005), pelo fato de que elas os conceitos de Mobilidade Urbana antes e depois da
representam alguns dos problemas urbanos advindos atividade com a ferramenta computacional. A explica-
da utilização dos meios de transporte motorizados in- ção para essa diferença pode residir no fato de que o
dividuais (utilização do automóvel) e que têm afetado conceito inicial de Mobilidade Urbana dos técnicos
de maneira negativa a qualidade de vida da população. não era amplo. Por este motivo o exercício de capaci-
Esse mesmo padrão de variação foi observado na tação com a ferramenta computacional foi capaz de
análise das demais questões, cujos detalhes podem ser levar a tamanha ampliação da visão inicial.
encontrados em Magagnin (2008). A exemplo do que
Bicicletas Pessoas
Transporte Transporte Forma de
Cargas Coletivo Crescimento
da Cidade /
Conforto Segurança Expansão
Urbana
Centro (não)
Figura 5: Mapa Cognitivo 1 – Identificação dos problemas de Mobilidade Urbana extraídos do Questionário 1
Acidentes
PROBLEMA DE Meios de Transporte
Inadequada MOBILIDADE URBANA não motorizado
Sinalização
Insuficiente
Bicicleta Charrete
Trabalho e Lazer Aumento na Distância
Expansão Urbana
Rio Ferrovia Rodovia
Dispersão Espacial
Vazios Urbanos
Barreiras Físicas e Naturais
Poluição
Cidade
Zoneamento
Interligar bairros
Congestionament
Baixo investimento
Integrar bairros
Falta
Figura 6: Mapa Cognitivo 2 – Identificação dos problemas de Mobilidade Urbana extraídos do Questionário 2
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem ao CNPq, à CAPES e à FAPESP por contribuírem
para diferentes fases do desenvolvimento da pesquisa que deu origem a
esse artigo.