Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Gestão
ISSN: 1645-4464
revistas.indeg@iscte.pt
ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa
Portugal
Serra, Fernando
Os pilares da estratégia. Estudo de caso de cinco empresas líderes
Revista Portuguesa e Brasileira de Gestão, vol. 6, núm. 2, abril, 2007, pp. 70-81
ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa
Lisboa, Portugal
Os pilares da estratégia
Estudo de caso de cinco empresas líderes
por Fernando Serra
RESUMO: O desenvolvimento dos estudos de estratégia evoluiu significativamente nos últimos 50 anos, na tentativa de
orientar as organizações na busca pela vantagem competitiva. Depois das críticas de Mintzberg ao planejamento
estratégico na sua forma clássica na década de 1970, diversos autores preocuparam-se em definir taxonomias para
as escolas do pensamento estratégico. De seu trabalho, em geral, surge o caráter evolucionário e complementar
dessas escolas e até a proposta de integração de seus conceitos. O presente trabalho apresenta uma proposta de qua-
tro novas dimensões, denominadas pilares da estratégia: líder e equipe executiva; foco estratégico; aposta; e sus-
tentação pelos recursos. Estas dimensões, por sua vez, identificadas a partir de estudos de casos clássicos da lite-
ratura de estratégia, com referências escolhidas a partir da freqüência de citações em trabalhos acadêmicos
brasileiros. As organizações selecionadas para estudo foram Honda, Swatch, GE, Southwest Airlines e Microsoft. Os
pilares foram considerados elementos complementares e interdependentes que sustentam o sucesso de uma organi-
zação.
Palavras-chave: Estratégia, Dimensões da Estratégia, Vantagem Competitiva
y apoyo de los recursos. Estas dimensiones o elementos fueron identificados de clásicos casos de estudio originados
en la literatura estratégica. Fueron considerados elementos complementarios e interdependientes que sostienen el
éxito de una organización.
Palabras clave: Estrategia, Dimensiones de Estrategia, Ventaja Competitiva
O
estudo da estratégia se desenvolveu pela tentativa em número significativo das empresas de grande porte das que
explicar e buscar uma forma de dirigir as organiza- participaram do ranking da revista brasileira Exame – «Maio-
ções para a busca da vantagem competitiva, assim res e Melhores», em 1974, já estão fora da lista ou perde-
como pela deficiência de outras disciplinas nesse sentido ram seu posto de liderança. Por outro lado, empresas novas
(Kay, 1993). Apesar de não existir uma teoria de criação de como a Gol Transportes Aéreos, que se tornou a segunda
estratégias, como disseram Hamel e Prahalad, as organiza- empresa aérea mais lucrativa do mundo em cinco anos de
ções dos mais diversos setores e dimensões se utilizam de existência, aparecem e desafiam o futuro. Na pequena
roteiros para facilitar a elaboração e implementação de seus empresa a situação é ainda mais crítica. A maior parte delas
objetivos estratégicos (Serra et al., 2002). não chegam a durar um ano.
Depois das críticas de Mintzberg (1973) ao planejamento O presente trabalho tem o objetivo de apresentar novas
estratégico na sua forma clássica na década de 1970, diversos dimensões que considerem a integração das diversas esco-
autores, inclusive ele (Mintzberg et al., 2000), preocuparam-se las, chamadas aqui de pilares da estratégia. Estas dimensões
em definir taxonomias para as escolas do pensamento ou elementos foram identificados a partir de estudos de
estratégico. Desses trabalhos, surge o caráter evolucionário e casos clássicos da literatura de estratégia. Primeiramente
complementar dessas escolas e até propostas de integração de será apresentada uma síntese dos estudos de estratégia,
seus conceitos. Autores como Miles e Snow (1978) e Miller e destacando a evolução e complementaridade entre eles,
Whitney (1999) sugeriram elementos ou dimensões restritivas bem como as dimensões presentes nestes estudos. Em segui-
que influenciam o processo estratégico das organizações. da, a pesquisa é caracterizada a partir dos procedimentos
Explicar e compreender a estratégia e formas para metodológicos utilizados. Na sequência são apresentados
obtenção de vantagem competitiva, também se trata de um alguns casos clássicos da literatura da área de estratégia,
anseio dos executivos e empreendedores. O desempenho para que finalmente os pilares identificados nesta pesquisa
das empresas e seu ciclo de vida variam grandemente. Um sejam descritos.
Miller e Whitney (1999) e Miles e Snow (1998) são Quanto aos meios, a pesquisa é bibliográfica, pois foi
exemplos de autores que apresentam dimensões estra- desenvolvida com base em casos de empresas que serviram
tégicas estruturais. Estes autores são considerados na para subsidiar artigos e livros clássicos que representam as
escola de configuração na taxonomia de Mintzberg et al. escolas de estratégia. Casos como relatos de situações da
(2000). realidade empresarial vivida (Serra e Vieira, 2005). Pode ser
Miller e Whitney (1999) consideram dois conjuntos de ele- considerado um estudo multicaso (Yin, 1994), visto que se
mentos organizacionais que caracterizam a configuração de pretende generalizar uma proposição teórica, sem o uso de
uma organização: essência e sistemas de suporte (ver experimento, até pela natureza da pesquisa: descrever e
Quadro I). qualificar fatores comuns que possam explicar a vantagem
Miles e Snow (1978) consideram os elementos organiza- competitiva.
cionais como dimensões restritivas do processo estratégico. A seleção dos casos de empresas a serem estudadas se
São três dimensões restritivas que caracterizam o ciclo baseou na literatura considerada relevante nos estudos
adaptativo da organização: problema empreendedor – brasileiros de estratégia, a partir da pesquisa de Bignetti e
escolha do domínio de produto/mercado; problema de Paiva (2002), que estudaram as citações de autores de
engenharia – escolha das tecnologias de produção e dis- estratégia na produção acadêmica brasileira entre 1997 e
tribuição; problema administrativo – aspecto flexível 2001. Neste período, Michael Porter, Henry Mintzberg, Gary
(seleção das áreas para futuras inovações) e aspecto con- Hamel e C. K Prahalad foram os autores mais citados.
tínuo (racionalização de estruturas e processos). Estes são Bignetti e Paiva (2001) constataram, adicionalmente, que os
exemplos de elementos que auxiliam no diagnóstico das autores mais citados tinham suas obras traduzidas para o
organizações. idioma português. Os autores também ressaltam o crescente
interesse em assuntos, como gestão do conhecimento, visão
Procedimentos metodológicos baseada em recursos, competências distintivas e The Ba-
A pesquisa adotou uma abordagem qualitativa. Conforme lanced Scorecard, destacando autores como Nonaka e Ta-
taxonomia proposta por Vergara (1997), o tipo de pesquisa keushi, Leonard-Barton Wernerfelt e Kaplan e Norton
pode ser definida quanto aos fins e quanto aos meios de (Bignetti e Paiva, 2001).
investigação. Quanto aos fins, a pesquisa é explicativa, pois Além das escolhas feitas a partir das referências men-
objetiva esclarecer um novo conjunto de fatores que con- cionadas, «o efeito Honda», de Pascale (1984), que provo-
tribua para a explicação da vantagem competitiva. Para tal, cou uma grande discussão entre diversos especialistas acer-
também é descritiva, pois expõe as características de casos ca da estratégia prescritiva versus a estratégia emergente, foi
de organizações. selecionado por sua importância e relevância.
Quadro I
Conjuntos de elementos organizacionais
Sobre as empresas e o contexto dos casos • Existia um foco claro, uma aspiração, segundo Fujisawa
• Honda seu «sonho grandioso»;
A escolha da Honda, como uma das empresas a serem • Honda desenvolveu um motor de quatro tempos com o
avaliadas nos estudos de caso e informações publicadas, dobro da potência, o que aumentou a demanda forte-
vem do artigo «Perspectives on strategy: ‘The real story mente, forçando a organizar a empresa e a investir na
behind Honda’s success’» de Richard Pascale (1984). produção em massa;
O artigo que acabou por gerar uma discussão entre • Existiu uma equipe de executivos ligada ao líder que vai se
pesquisadores e consultores no CMR Forum (Mintzberg, formando.
Pascale, Goold e Rumelt, 1996), levou ao extremo a dis- Mintzberg et al. (2000) citam Rumelt para discutir a
cussão sobre estratégia prescritiva e emergente. questão se a Honda deveria ou não ter entrado no mercado
O artigo de Pascale (1984) desafia, então, as idéias em automobilístico em 1977. Considerando o mercado satura-
voga na época sobre a formulação de estratégia e uma das do, a pouca experiência com automóveis e a inexistência de
empresas de consultoria mais conceituadas, o Boston um sistema de distribuição para automóveis, numa análise
Consulting Group (Mintzberg e Quinn, 2001). usual e racional das fraquezas e ameaças, a empresa não
Rumelt (1996) analisou, adicionalmente, os conceitos trazi- deveria ter entrado num negócio, em que hoje se destaca.
dos por Hamel e Prahalad (1989, 1990), que liga o sucesso A entrada no mercado americano de motocicletas também
das motocicletas à entrada com sucesso no mercado de poderia ser considerada inadequada em 1959. Entretanto,
automóveis americano. O autor selecionou pontos-chave das criou um novo mercado nos EUA (Mintzberg et al., 2000).
três descrições da história da Honda: competência superior em
motores; sucesso com o motor de 50cc Supercub no Japão, • Swatch
antes de entrar no mercado americano; e sucesso na entrada Na década de 1980 e 1990, a Swatch e seu executivo
no mercado americano; e, com o tempo, transferiu seu suces- principal foram objeto de diversos casos e entrevistas. Em
so das motocicletas pequenas para as motocicletas maiores. especial, o livro de Hamel e Prahalad, Competindo pelo
Rumelt (1996) destaca, a partir dos casos, que o sucesso Futuro (1995), best-seller que ainda influencia a produção
dos negócios depende grandemente da geração de novos acadêmica nacional.
conhecimentos, e de possuir capacidade para reagir e usar O sucesso da Swatch está relacionado com a perda de
de forma rápida e inteligente a este conhecimento, o que se mercado da indústria de relojoaria suíça e sua re-ascensão
encaixa na visão de estratégia emergente. (Moon, 2004).
Concordando em parte com a abordagem de estratégia Na década de 1970, a americana Timex introduziu uma
prescritiva, o autor menciona que uma estratégia coerente é linha de relógios descartáveis e ascenderam as marcas
baseada em análises e compreensão de forças, como as japonesas Hattori-Seiko e Citizen. Com o aumento da
encontradas: economia de escala, experiência acumulada e demanda mundial de relógios de preço baixo, a fatia de
o desenvolvimento cumulativo de competências centrais ao mercado da marca suíça caiu para 42% (Moon, 2004).
longo do tempo. Em seu livro, Kim e Maugborgne (2005) apresentam a
Do artigo de Pascale (1984, 1996), pode-se destacar idéia que as organizações criam um novo espaço de merca-
ainda alguns elementos do estudo do caso: do, dentre outras formas, pela mudança do apelo tradi-
• Soichiro Honda era um gênio, inovador, com grande ego cional junto aos compradores; segundo os autores, este é o
e temperamental – características usuais empreendedoras. caso da Swatch.
Takeo Fujisawa, em 1949, ao prover dinheiro e forças de Hamel e Prahalad (1995) apresentam as empresas que
gestão de marketing e finanças, estabeleceu as bases para mudaram o futuro do setor a que se dedicaram. A Sociètè
o desenvolvimento da empresa. Os dois funcionando Suisse de Microelectronique et d’Horlogerie (SMH), empresa-
como equipe; -mãe da Swatch («Swiss» + «watch») foi formada em 1983,
pela fusão das duas maiores empresas de relojoaria suíças é associada aos seus CEO e à direção estratégica pessoal
em situação financeira precária na época (Moon, 2004). Seu imposta à companhia.
presidente e acionista, Nicolas Hayek, foi responsável pela Ghemawat (2000) aborda a evolução histórica da estraté-
idéia da criação da Swatch. Segundo Hamel e Prahalad gia mostrando o envolvimento da empresa no período pré-
(1995, p. 103), «a idéia do Swatch nasceu não de uma -Welch. A GE é um conglomerado diversificado em que seu
análise financeira cuidadosa, mas do desejo de reconstruir o maior negócio é o das turbinas aeronáuticas e inclui um
setor de relógios da Suíça, um objetivo com apelo emocional banco e negócios financeiros, além da NBC (Kay et al.,
óbvio para qualquer cidadão suíço ou europeu». 2003).
A maneira de pensar de Haiek era controversa por diver- Para Jack Welch, que foi CEO entre 1981 e 2001, a visão
sos motivos (Moon, 2004): pela integração vertical (cons- é o elemento central da estratégia. São dois elementos-
trução e montagem de um relógio de quartzo suíço de -chave da visão de Welch, segundo o relatório anual de
baixo-custo totalmente em território suíço); a equipe da 1988: tocar somente negócios que sejam o número um ou
Swatch decidiu que a caixa do relógio seria plástica (a Suíça dois nos seus mercados globais e o comprometimento em
era reconhecida pelo uso das ligas metálicas mais nobres desenvolver a sensitividade, a enxutez, a simplicidade e a
em seus relógios); a equipe da Swatch também decidiu que agilidade de uma pequena empresa.
o seu relógio teria uma única mensagem, atípica em relação Um dos marcos para o enfraquecimento do planejamento
a qualquer outra marca do mercado. estratégico na sua forma clássica foi o declínio de seu uso na
A Swatch apostou em design e coleções. Também apostou GE no início da década de 1980 (Mintzberg et al., 2000).
numa nova mensagem para o consumidor. Com tudo isso, Em 1988, Welch iniciou o programa de Work-Out na GE.
os custos totais de fabricação da Swatch eram quase 30% Nas palavras de Welch (Ulrich et al., 2003), o work-out per-
menores que os dos produtos de concorrentes de Honk-Kong mitiu que a auto-confiança da companhia florescesse.
(Kim e Maugborgne, 2000). Welch sempre deixou clara a importância de sua equipe
O uso de recursos com foco é fundamental nas palavras para a concretização de sua visão. Durante o período de sua
de Hayek: «Dizem que nossa administração é obcecada por administração, a GE procurou eliminar gorduras, inclusive
produtividade. Não somos obcecados. Mas mantemos nos- com downsizing. Foi uma época de decisões duras, de pro-
sos olhos no que importa. Não gastamos um centavo que dutividade e de crescimento da base da pirâmide (Kleiner,
não tenhamos que gastar» (Reavis, 2000, p. 4). 2003)
Ao longo do tempo e do desenvolvimento da Swatch,
Hayek sempre se aproximou das pessoas como um chefe • Southwest Airlines
carismático e competente (Moon, 2004; Zehnder, 1994). A escolha da Southwest Airlines, para ser apresentada
como estudo de caso, veio de um artigo polêmico. Em 1996,
• GE foi publicado na Harvard Business Review o artigo «What’s
A General Electric Co. tem sido um exemplo notável de strategy?» (Porter, 1996). O artigo foi escrito para responder
longevidade e competitividade. Por exemplo, é a única as críticas a seus trabalhos anteriores e acabou por receber
empresa que compunha e continua compondo o índice Dow ainda mais críticas. Por exemplo, pelo fato das empresas
Jones desde 1886. Todas as demais faliram ou foram incor- japonesas raramente terem estratégia ou por ter-se fixado
poradas por outros negócios (Waite, 2003). na escola do posicionamento sem considerar outros pontos
Kay, Mckiernan e Faulkner (2003) apontam a GE como a de vista (Mintzberg et al., 2000).
única empresa que, por si só, pode representar a evolução Porter (1996), em seu artigo, comenta o caso da Southwest
da estratégia em negócios. A GE tanto liderou como acom- Airlines Company. A empresa oferece vôos de curta distân-
panhou todos os grandes desenvolvimentos em adminis- cia, com baixo preço e ponto a ponto entre cidades de porte
tração estratégica das últimas quatro décadas. Esta evolução médio e aeroportos secundários de cidades grandes. Os
interface com o usuário e os principais aplicativos (Hamel e Considerando os aspectos relevantes dos casos, quatro
Prahalad, 1995, p. 188). elementos ou aspectos restritivos para uma estratégia de
Segundo Hamel e Prahalad (1995), a Microsoft tornou-se sucesso foram evidenciados em todos eles. Estes elementos
padrão no mercado para o DOS e a seguir para o Windows. foram chamados de pilares da estratégia: liderança e equipe
Isto colocou a empresa numa posição vantajosa para o executiva; foco estratégico; aposta e sustentação pelos recur-
desenvolvimento de aplicativos que também se tornaram sos. Sua identificação em cada caso está apresentada no
padrão universal, com o Office. Quadro II. Nas empresas estudadas, o sucesso acontece
O Dr. Doug McKenna, responsável pelos recursos porque todos os pilares estão sustentando a organização.
humanos da Microsoft entre 1993 e 2001, liderou pesquisa Um aspecto que ficou evidente em todas as situações, em
do Modelo de Competência da Microsoft, a partir do teste- cada caso com suas peculiaridades, em função do contexto
munho de 50 executivos-chave e do filtro de Bill Gates, que e das empresas, foi a importância das pessoas. Embora
levou a determinar seis fatores críticos de sucesso da empre- sejam consideradas de forma distinta em dois dos pilares,
sa (Bartlett e Wozny, 2001): abordagem de longo-prazo em «líder e equipe executiva» e «sustentação pelos recursos», é
relação às pessoas e tecnologia; obter resultados; excelência importante destacar que a busca pela vantagem competiti-
individual; paixão por produtos e por tecnologia; feedback va depende, em todos os casos, essencialmente das pes-
dos clientes; trabalho em equipe. soas. A importância dos colaboradores foi fundamental para
o desempenho de cada uma das empresas estudadas, e
Des(en)cobrindo os pilares foram preocupação, de uma forma ou de outra, de cada um
No ponto anterior foram apresentados, resumidamente, dos líderes e de sua equipe.
aspectos relevantes dos estudos de caso analisados de cinco
empresas de sucesso em determinadas situações. Dos casos • O papel do líder e da sua equipe executiva
apresentados, quatro envolvem o período em que o Não é o objetivo aqui descrever os conceitos de liderança
empreendedor atua na empresa. Um caso, entretanto, e as características dos líderes. O objetivo fundamental é
envolve uma empresa centenária, a General Electric. apresentar que o rumo das organizações e a busca pelo
prêmio da chegada são guiados e impulsionados por
Quatro elementos ou aspectos restritivos poucos personagens facilmente identificáveis, mesmo que
para uma estratégia de sucesso foram evidenciados exista um importante comprometimento por parte dos
em todos os cinco casos. Estes elementos demais colaboradores da organização. Aliás, este compro-
foram chamados de pilares da estratégia: liderança metimento é normalmente uma das conquistas deste grupo.
e equipe executiva; foco estratégico; A influência fundamental do líder, ao contrário do que se
aposta e sustentação pelos recursos. pensa, não é na formulação da estratégia, mas na visão e
direção que a empresa deve tomar, quer dizer, na intenção
Para o líder mudando, em geral o foco estratégico muda. estratégica (Hamel e Prahalad, 1989).
Esta mudança leva normalmente a uma nova composição A equipe de executivos, além do líder, parece influenciar
de equipe executiva. Sendo assim, a sucessão é fundamen- ainda mais significativamente a tomada de decisão estraté-
tal, não somente para o dimensionamento do foco, mas gica. Uma equipe com educação formal influencia a com-
para garantir que um novo líder possa ter a mesma com- plexidade administrativa e a adoção de ferramentas de
petência que seu predecessor em caso de sucesso. gestão sofisticadas. Além disso, são mais racionais, pois
Outro aspecto que influencia os resultados de uma orga- analisam as alternativas de forma mais completa e explícita.
nização é o crescimento. O crescimento é um grande perigo O fato de serem mais racionais não significa, aliás, pelo
para as organizações, pela sua forte influência sobre a inte- contrário, que grande parte das decisões não seja por
gridade de seus pilares, pela necessidade de revisão da impulso ou intuitivas (Papadakis e Barwise, 2002).
Quadro II
Pilares da estratégia
Organizações Honda Swatch GE Southwest Microsoft
Situação Entrada e liderança Formação Retoma da Formação Aproveitamento de
posterior da Honda e liderança da competitividade e liderança oportunidades e de
no mercado Swatch no mercado e evolução na indústria flexibilidade para
de motocicletas de relógios do trabalho dos de aviação em manter-se na
norte-americano. mundial de baixo CEO anteriores crise e saturada liderança pela
preço com para dos EUA. competência de
liderança dimensionamento seus recursos
de empresas do nível de humanos.
japonesas. descentralização
adequado.
Período Décadas de 1950 Décadas de 1980 e Décadas de 1980 e Décadas de 1970 Décadas de 1970
até 1970. 1990. 1990. até 1990. até 1990.
Líder Soichiro Honda Nicolas Hayek Jack Welch Herb Kelleher Bill Gates
(empreendedor) (empreendedor) (executivo) (empreendedor) (empreendedor)
Equipe Takeo Fujisawa Foi formando ao Formada ao longo Vice-presidente Paul Allen (sócio)
Executiva (sócio e executivo) longo do tempo, do tempo em James (Jim) Parker Steve Balmer
Inicialmente mais 3 em função função das e como Diretora (braço direito)
diretores e crescendo das necessidades competências Geral e de
pelas necessidades. de recursos pessoais, mérito Operações Collen
e desafios, por e desafios e citada Barret, ex-secretária
exemplo, o designer explicitamente de Herb (braço
Franco Bosisio, em seus livros. direito) mudando
preocupou-se e progredindo com
com a sucessão – a necessidade.
Haeyek Jr.
21 membros
do comitê executivo
no final do período.
Foco estratégico «Sonho grandioso» «Indústria suíça não «Vamos tocar «Velocidade do «Um computador
de perseguição pode morrer». somente negócios avião a preço de em cada mesa e
constante por que sejam o carro». em cada lar, todos
tecnologia. número um ou o rodando software
número dois nos Microsoft em cada
seus mercados computador».
globais».
Aposta Entrada no mercado Utilização dos Devido ao foco, Adoção de cadeia Tornar-se padrão
no futuro americano de recursos financeiros desfazer-se de uma de valor no mercado, sendo
motocicletas com no foco da estratégia. série de negócios completamente o primeiro ou o
comportamento de Desenvolver um em que não era, distinta da usual mais rápido a
consumo distinto relógio barato com nem poderia se na indústria. conquistá-lo em
e com concorrentes mão-de-obra suíça, tornar, competitiva Busca por um novo «oportunidades
fortes na década produzido o suficiente. mercado – usuários com externalidades
de 1950 e, integralmente na Viabilizar negócios de automóveis e de rede – caso
posteriormente no Suíça, com tecnologia de participação ônibus. haja, vantagens,
mercado saturado e mensagem na tradicional da GE para a grande
de automóveis na contra-mão da com queda de maioria dos
década de 1970. indústria. competitividade. consumidores, em
Sair do apelo Acabar com a dividir um padrão
funcional para o burocracia. comum».
emocional.
(Continua na p. 79)
Quadro II
Pilares da estratégia (continuação da página 78)
Organizações Honda Swatch GE Southwest Microsoft
Sustentabilidade Competência Viabilização Direcionamento Capacidade de Qualidade
pelos recursos em motores. de recursos dos recursos simplificar as do pessoal e estilo
Sucesso anterior financeiros financeiros para o atividades. da gerência.
e imagem de para o foco da estratégia. Emprego e Valorização dos
marca construída. empreendimento. Aquisição de novas valorização das recursos humanos.
Capacidade Desenvolvimento competências. pessoas. Padrão Utilização focada
de inovação. de competências. Inovação. de distribuição dos recursos.
Oportunismo. Desenvolvimento Participação e dos recursos que Inovação
Eficiência: e importância comprometimento possibilita que os e velocidade.
economia de escala dos recursos da base tempos em terra
e experiência humanos. da pirâmide. sejam menores.
acumulada. Capacidade Considerando
Destaque para de inovação recursos
a sustentabilidade tecnológica. individualmente,
financeira e de Competência os aviões, com
gestão de recursos em design. pouca vantagem,
no início por Clima pois são imitáveis,
Fujisawa. organizacional. mas os recursos
Imagem de marca. humanos não,
pois são específicos
da empresa.
Utilização focada
dos recursos.
Fonte: Autor
equipe executiva e pela pressão na sustentabilidade pelos Deve ser inspirador e claro, de modo a que a equipe con-
recursos. centre seus esforços para alcançá-lo (Serra, Torres e Torres,
2002).
• Para implementar algo é preciso ter foco
O foco estratégico é «concebido» por alguém e dissemi- • Apostando para ganhar
nado e executado na organização por uma equipe compro- A aposta está ligada ao risco para uma grande mudança
metida e ligada a um líder no processo, apresentando a ou, principalmente, para uma grande recompensa. Envolve
intenção estratégica da organização. Assim, a estratégia ameaças e fraquezas procurando mudar sua natureza e não
também significa escolha. Essa escolha implica numa se proteger ou atenuar, respectivamente. No levantamento
direção e, conseqüentemente, num rumo. Este rumo implica dos casos de sucesso e de longevidade, verifica-se que existe
numa aposta, em um risco a ser assumido pela organização uma aposta que não ignora os fatores desfavoráveis. Isto
como um todo para alcançar a recompensa desejada. não quer dizer que as forças e oportunidades não sejam
A intenção estratégica (Hamel e Prahalad, 1989) e a visão importantes, mas consideram o momento. Os desfavoráveis
de negócio (Collins e Porras, 1998) podem ser formas de são mais impactantes no futuro da organização e, por isto,
representação, mas não necessariamente. No caso da atenuam o problema fundamental da estratégia, ligado ao
Honda e da Southwest, os focos se expressam de formas dis- que pode e está por acontecer.
tintas, como um pretexto e como um padrão, respectiva- A aposta da organização para alcançar seu foco estratégi-
mente (Mintzberg e Quinn, 2001). co em qualquer setor é importante. Pode-se chamar isto de
O ser humano precisa ter um objetivo, algo que o puxe reinventar o negócio, como chamaram Hamel e Prahalad
para uma determinada direção e indique o seu progresso. (1995), ou então cria novas demandas nos setores, como
_______ (1996), «The Honda effect». California Management Affonso Editores, Rio de Janeiro, Brasil.
Review, Califórnia, vol. 38, n.º 4. ______ e VIEIRA, P. S. (2005), Estudos de Casos: Como
PORTER, M. (1986), Estratégia Competitiva: Técnicas para Redigir; Como Aplicar. EditoraLab, Rio de Janeiro, Brasil.
Análise de Indústria e da Concorrência. Editora Campus, Rio STAUFER, D. (1997), «What you can learn about managing from
de Janeiro, Brasil. Microsoft». Harvard Management Update, pp. 3-5.
_______ (1989), Vantagem Competitiva: Criando e VASCONCELOS, Flávio C. e CYRINO, Álvaro B. (2000), «Van-
Sustentando um Desempenho Superior. Editora Campus, Rio tagem competitiva: os modelos teóricos atuais e a convergência
de Janeiro, Brasil. entre estratégia e teoria organizacional». RAE – Revista de Admi-
_______ (1996), «What’s strategy?». Harvard Business Review, nistração de Empresas, São Paulo, vol. 40, n.º 4, pp. 20-37, Out.-
Boston, pp. 61-78, Nov.-Dec. Dez.
REAVIS, C. (2000), The Swatch Group: on Internet Time. VERGARA, S. C. (1997), Projetos e Relatórios de Pesquisa
Harvard Business School Publications, Boston, EUA, pp. 1-18. em Administração. Editora Atlas, São Paulo, Brasil.
RUMELT, R. (1996), «The many faces of Honda». California WHITTINGTON, R. (1993), What is Strategy and Does it
Management Review, Califórnia, vol. 38, n.º 4, pp. 103-111. Matter? Routledge, Londres, Reino Unido.
QUINN, J. B. (1980), Strategies for Change: Logical YIN, R. K. (2005), Estudo de Caso: Planejamento e
Incrementalism. Richard D. Irwin, Homewood, Illinois, EUA. Métodos. Editora Bookman, Porto Alegre, Brasil.
SERRA, F.; TORRES, M. C. e TORRES, A. (2002), Administração ZEHNDER, D. e NICHOLAS, G. (1994), Hayek. Harvard
Estratégica: Conceitos, Roteiro Prático e Casos. Reichmann & Business School, Boston, EUA, pp. 1-30.