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Textos:

DENZIN, Norman K.; LINCOLN, Yvonna. Grounded Theory: Objectivist and


Contructvist Methods. In: Handbook of qualitative research (2 ed). Sage Publications, Inc.,
London, 2000.

Capítulo escrito por Kathy Charmaz. Os métodos da grounded theory foram


desenvolvidos por Glaser e Strauss e consistem em diretrizes sistemáticas e indutivas para
coletar e analisar dados para construir estruturas teóricas intermediárias que explicam os
dados coletados. O rigor dessa abordagem oferece aos pesquisadores qualitativos um conjunto
de direcionamentos para construir um quadro teórico que explique as relações entre conceitos.
O trabalho de Glaser e Strauss, com o surgimento da grounded theory, foi revolucionário.

Suas estratégias incluem a) coleta e análise de dados simultaneamente, b) processo de


codificação de dados em duas etapas, c) métodos comparativos, d) escrita voltada à
construção de análises conceituais, e) amostragem para refinar as ideias teóricas que surgem
do pesquisador e f) integração do quadro teórico. A relevância da grounded theory está na
oferta de explicações analíticas de problemas atuais e de processos básicos durante a pesquisa.
É uma estratégia durável e flexível.

Diversas publicações explicavam os procedimentos para o uso da grounded theory,


que ganhou uma grande audiência. Contudo, o que a grounded theory era e o que ela deveria
ser estavam sendo contestados. Os criadores desse método o colocaram em uma direção
conflitante. Glaser tinha uma posição que se aproximava mais do positivismo tradicional
(objetiva, realidade externa, observador mais neutro), ao passo que Strauss e seu coautor
Corbin tinham uma posição pós-positivista (dar voz aos respondentes, representá-los o
máximo possível). Para Glaser, Strauss e Corbin estavam forçando dados e as análises através
das duas pré-concepções, questões analíticas, hipóteses e técnicas metodológicas. Glaser
argumenta que o propósito da grounded theory é gerar teoria, e não verificá-la; sua abordagem
é mais comparativa e com ênfase no processo.

Os métodos da grounded theory evoluíram em diferentes formas, dependendo das


perspectivas e tendências de seus aderentes. Deve-se adotar e refinar os métodos para estudos
futuros sobre universos empíricos.

O poder da grounded theory está nas ferramentas utilizadas para compreender os


mundos empíricos. A abordagem construtivista reafirma o estudo das pessoas em seu
ambiente natural e direciona a pesquisa qualitativa para se distanciar do positivismo. Três
argumentos: 1) as estratégias da grounded theory não precisam ser rígidas ou prescritivas, 2)
um foco no significado enquanto se usa a grounded theory levará a uma maior compreensão
interpretativa e 3) pode-se adotar as estratégias da grounded theory sem abraçar a inclinação
positivista de antes... Profissionais da grounded theory também modificaram suas abordagens
ao longo do tempo.

Estratégias da Grounded Theory:


1) em relação aos dados: ela especifica estratégias analíticas, não métodos de coleta de
dados; diversas técnicas da grounded theory podem ser utilizadas com diferentes formas de
coleta de dados (observação, entrevista, conversas, gravações públicas, jornais...).

2) codificação dos dados: a análise começa cedo, eles são codificados assim que são
coletados; isso ajuda a ganhar uma nova perspectiva sobre o material e a focar nas coletas
futuras de dados. Gerar códigos de ação facilita a fazer comparações, uma das principais
técnicas da grounded theory.

3) Escrevendo o memorando: esse é o passo intermediário entre a codificação e o


primeiro rascunho da análise completa. São elaboradas premissas, ações e processos com base
nas informações codificadas.

4) Amostragem teórica: utilizado para desenvolver as categorias emergentes,


identificar a relevância das mesmas, suas propriedades, quais explicam melhor o objeto de
estudo, entre outros aspectos, para tornar essas categorias utilizáveis. O objetivo dessa etapa é
refinar as ideias, não aumentar o tamanho da amostra original. Ajuda a identificar premissas
conceituais; é uma etapa fundamental para o desenvolvimento da teoria formal. Quando uma
categoria for saturada (novos dados são alocados em categorias já concebidas), os
memorandos são atualizados.

5) análise com assistência do computador: oferecem auxílio para a codificação e


integração dos dados. Programas de análise de dados podem ser utilizados para mapear
relações, mas alguns autores expressam preocupação quanto à qualidade desses programas.

Algumas críticas existentes abrangem a natureza do método e suas limitações. Uma


crítica é que seus métodos são insuficientes para respeitar os entrevistados e para retratar as
suas histórias. De forma geral, as críticas desafiam os autores na representação dos sujeitos,
na autoridade para interpretar a vida desses sujeitos, e na voz de escrita também. Dessa forma,
os métodos da grounded theory encobrem os significados das histórias dos respondentes.

A grounded theory se alimenta do trabalho de campo e da análise qualitativa. As


forças de seus métodos estão em: estratégias para guiar o pesquisador passo a passo durante o
processo analítico, natureza auto-corretiva do processo de coleta de dados e na ênfase nos
métodos comparativos. A questão de pesquisa inicial pode ser concreta e descritiva, mas o
pesquisador consegue desenvolver questões mais profundas ao analisar os dados coletados. A
análise da grounded theory conta uma história sobre pessoas, situações e processos sociais e é
o pesquisador que conta essa história.

Os estudos de grounded theory normalmente estão entre uma metodologia de pesquisa


mais tradicional e a abordagem pós-modernista. Mas a crítica dos pós-modernistas e dos pós-
estruturalistas é que a história escrita é composta pelo pesquisador de forma inconsciente,
desconstruindo o sujeito.

A autora sugere outra opção, a grounded theory construtivista, que celebra o


conhecimento inédito de mundos empíricos, sendo um meio termo entre as perspectivas pós-
modernistas e positivistas e oferecendo métodos acessíveis para a pesquisa qualitativa. A
perspectiva construtivista cria e mantém mundos de significados através de processos
dialéticos de conferir significados às suas realidades e de atuar nessas realidades. Essa
abordagem não busca a verdade, mas busca ser mais realista porque se veste através das
realidades humanas, assumindo a existência de mundos reais. Aquilo que é tomado como real
pelos pesquisadores, baseia-se na perspectiva deles. Ela também promove uma
autoconsciência sobe aquilo que é atribuído aos sujeitos e como, quando e por que os
pesquisadores retrataram essas definições como reais.

A grounded theory construtivista reconhece que o observador cria dados e faz a


análise a partir da interação com aquilo que é observado. Essa descoberta de realidades ocorre
em um processo interativo e seus contextos temporais, estruturais e culturais. O observador é
parte daquilo que está sendo observado. Nesse contexto, a casualidade é incompleta,
indeterminante e sugestiva. Uma abordagem construtivista implica em procurar pro
significados (tanto dos respondentes quanto dos pesquisadores). Deve-se olhar visões e
valores tão bem quanto os fatos e ações; deve-se olhar as crenças e ideologias tão bem quanto
as situações e estruturas. Necessita de uma relação com os respondentes de modo que eles
tragam as histórias em seus próprios termos e condições.

Muitos estudos de grounded theory refletem uma abordagem mais objetiva, próxima
da abordagem positivista. Seguir um conjunto sistemático de métodos leva à descoberta da
realidade e à construção de uma verdade provisória, testável e teórica disso. Alguns pontos: a
aplicação sistemática das estratégias da grounded theory responde aos pedidos dos positivistas
por validade e confiabilidade, além de permitir a reprodução; testar hipóteses leva à
confirmação ou não da teoria; seus métodos permitem exercer controle, para então fazer
possíveis mudanças na realidade de estudo. Assume a perspectiva positivista que o mundo
externo pode ser descrito, analisado, explicado e previsto. Pode ser modificável conforme as
condições mudam. Assume que diferentes observadores irão descobrir e descrever um mundo
de formas similares. Seus estudos podem oferecer uma rica descrição do mundo analisado,
mas a experiência pode ser deixada de lado; categorias e termos tomam um espaço central e
podem distanciar o leitor da experiência.

De qualquer forma, a análise dos dados não termina quando o pesquisador da


grounded theory desenvolve o modelo teórico; tal fase é seguida pela etapa escrita. Isso
significa tomar o lugar do leitor e tentar imaginar o seu humor através de estilos linguísticos e
exposições narrativas. Essa estratégia deixa de lado o formato científico mais tradicional, que
não transforma o produto final em drama, ficção ou poesia. Revisar o manuscrito também é
fundamental, pois pode resultar em uma mudança de estilo de escrita.

Importante: o futuro da grounded theory se alimenta das duas visões, a objetiva e a


construtivista. Os métodos da grounded theory evoluíram em diferentes formas, dependendo
da perspectiva e da propensão de seus aderentes. Tensões entre a grounded theory pós-
modernista e a construtivista podem ser resolvidas quando se usam as abordagens antigas para
guiar e ampliar as recentes...
Textos:

DENZIN, Norman K.; LINCOLN, Yvonna. Performance Ethnography: A Brief story


and some advice. In: Handbook of qualitative research (2 ed). Sage Publications, Inc.,
London, 2000.

SALGADO, Ricardo S. A performance da etnografia como método da antropologia.


ANTGROPOlógicas. N. 13, 2015, pp. 27-28.

FINO, Carlos Nogueira. A etnografia enquanto método: um modo de entender as


culturas (escolares) locais. Universidade de Madeira, Paper Interno, 2006, pp. 1-10.

Capítulo escrito por Michal M. McCall. De modo geral, o texto usa a metáfora da peça
teatral aplicada à etnografia. Assim como um diretor escolhe o elenco, dirige a peça e atua nos
bastidores, o pesquisador que está liderando uma pesquisa deve fazer o mesmo com os demais
pesquisadores que estão lhe auxiliando no processo de pesquisa. A parte teatral serve para
passar conhecimento, como se fosse uma etapa do estudo etnográfico.

O termo performance entrou na arte crítica e nos discursos acadêmicos em 1970, para
dar nome a uma nova forma de arte visual e para distinguir scripts dramáticos de produções
particulares. Termos similares eram acontecimentos, eventos, artes corporais e teatro
experimental. As raízes desses termos estão alocadas em movimentos como dadaísmo,
futurismo e surrealismo.

A arte corporal era um conjunto de práticas de performance que usavam as relações de


paixão e convulsão para mexer com o público, muitas vezes com apelo sexual. Já as
performances de teatro experimental estimularam uma nova concepção de teatro, a qual ia
muito além do predominante teatro da literatura [‘você não deve pensar na história porque não
existe história; as palavras não significam nada; deve-se aproveitar o cenário, a música, a
arquitetura, os sentimentos que tudo isso evoca].

No final da década de 80 e início da década de 90, profissionais da sociologia


começaram a transformar os apontamentos do campo da etnografia em performances, e
artistas de teatro e acadêmicos em estudos de performance começaram a produzir ou adaptar a
etnografia, para então colocá-la em prática. No século XX, a performance da etnografia feita
por esses profissionais era alimentada pela ‘performance da arte’ e pelo ‘teatro experimental’.

As performances etnográficas dos artistas de teatro e dos acadêmicos em estudos de


performance são mais teatrais quando comparadas às dos profissionais da sociologia e se
parecem mais com performance da arte. Eles combinam textos e elementos visuais. São
citados exemplos de adaptações de um texto da sociologia, de Emilie Beck, e de uma história
oral, de Della Pollock. O capítulo menciona também um estudo etnográfico com mulheres que
praticavam ou defendiam a agricultura sustentável.

Algumas dicas: A performance etnográfica requer que o pesquisador envolvido


escreva um script e então passe pela performance desse script (considerando vestimentas,
adereços, movimentos, etc). Escrever um script é a tarefa mais fácil para o profissional da
sociologia ou etnografia, pois eles transformam as anotações das atividades de campo e as
transcrições das entrevistas em textos escritos (narrativas temáticas). Escrever essas notas, de
modo a criar cenas na página e descobrir os significados dos participantes. Escrever uma
história centrada nessas notas. De modo geral, escritos de scripts devem ler e reler as
anotações de campo para criar e elaborar temas de análise e organizar alguns deles em uma
história coerente. Em um exemplo mencionado no texto, o pesquisador deixou um
profissional da sociologia fazer os pontos analíticos e os comentários.

A autora do capítulo aprendeu o que sabe sobre elenco ao participar de uma


observação participante em uma comunidade de teatro. Na condição de esposa de um diretor
de peças de teatro, ela participou de diversas fases do processo de produção de uma peça
teatral. A autora, então, participou da escolha dos profissionais que conduziram um estudo.
Ao fazer essa escolha, ela comenta que tentou se certificar que cada ‘ator’ (no caso,
pesquisador) fosse simpatizar bem com o ‘personagem’ que deveria assumir na condução do
estudo.

Quanto à direção e performance, a autora diz que tentou fazer um script claro e fácil de
ser lido, com pouco trabalho interpretativo. Os pesquisadores não estão atuando, mas sim
lendo em voz alta os aspectos de uma conversa que está acontecendo entre eles e seus
entrevistados. Deve-se transcrever depois o som das palavras, as pausas nas conversas, a
música do discurso..

O diretor de uma peça ou performance também deve estar nos bastidores do evento,
controlando cena a cena. Essa etapa requer escolhas interpretativas, mas a autora não pode
dizer como as mesmas devem ser feitas porque atuou pouco nos bastidores; são citadas visões
de outras profissionais sobre essas escolhas interpretativas. A performance etnográfica é
relativamente nova e talvez, com o tempo, pessoas que são treinadas no teatro poderão dar
dicas aos diretores de teatro.

Salgado (2015) traz a etnografia como modo de ação e como modo de expressão. As
mudanças socioculturais podem emergir das práticas que os dados etnográficos trazem e das
experiências registradas pelo pesquisador. É dessa perspectiva que se produz conhecimento
antropológico.

Etnografia como ação: os papeis e qualidade da participação

A etnografia abrange métodos que envolvem o contato social direto com o grupo
estudado, implicando um sentido de estar presente. Essa técnica requer participação, processo
onde os dados e informações são extraídos. A participação produz informação. Várias
informações e interpretações são registradas.

A observação participante é uma forma de estar e ser presente com o outro, para
compreender melhor o seu ambiente. É importante refletir o tipo de participação que se coloca
na etapa da observação. Existe a participação em que o pesquisador está na posição de
público, como ator da realidade social que está sendo observada; e existe a participação que
coloca o pesquisador como co-participante, condição em que ele irá induzir diferentes modos
de se envolver na comunidade, ou seja, diferentes formas de se produzir informação. Em certo
sentido, a dimensão de investigador é ofuscada, fica encoberta por outros papéis que o
investigador promove.

Etnografia enquanto modo de expressão

O etnógrafo tem que ler/interpretar uma determinada cultura e vivê-la em uma inte-
ração participativa. Nesse contexto, destaque para a importância do modo como o antropólogo
lê esse “texto performativo da cultura”. Os dados de campo consistem em notas (que podem
ser escritas, fotografadas, filmadas, representadas teatralmente), além da própria experiência
incorporada pelo investigador. Um determinado material etnográfico contribui
consideravelmente para o tópico que está sendo estudado.

Quanto às partes textuais, é a escrita e a composição da monografia propriamente dita


que dão coerência ao processo vivido pelo antropólogo/pesquisador e que buscam traduzir as
extensões produzidas por ele durante o período em que esteve convivendo com um indivíduo
ou grupo de pessoas. Os encontros, os momentos particulares e toda a experiência vivida são
apresentados sob o formato de texto, estabelecendo conexões e relações necessárias para
compreender uma determina cultura. A etnografia não é politicamente inocente.
Responsabiliza-se o etnógrafo pela qualidade do seu testemunho sobre um determinado
indivíduo ou grupo.

Fino (2006), por sua vez, traz a definição de Spradley (1979), que diz que a etnografia
deve ser entendida como a descrição de uma cultura, de modo que o pesquisador compreenda
o modo de viver a partir do ponto de vista dos nativos da cultura que está sendo estudada.

Docentes do Departamento de Ciências da Educação (DCE) da Universidade de


Madeira, que possui um curso de mestrado em educação na área de inovação pedagógica,
participam de uma atividade que busca o desenvolvimento de uma investigação etnográfica
no campo da educação. A inovação pedagógica está relacionada com as mudanças práticas
pedagógicas, envolvendo um posicionamento crítico das mesmas em relação às práticas mais
tradicionais. Nesse contexto, a etnografia surge como opção para estudar as práticas
pedagógicas, para posteriormente se decidir se elas serão inovadoras.

O autor também destaca a questão da interpretação. A etnografia deve ir além da sua


finalidade descritiva. Aplicando ao caso da etnografia da educação, deve-se manter a
dependência descritiva, mas com base nessa descrição deve-se interpretar!

Para Genzuk, são três os princípios metodológicos que constituem o rationale do


método etnográfico: naturalismo (contato direto com a população em estudo no seu ambiente
natural, e não em ambientes experimentais/artificiais), compreensão (compreender as
perspectivas culturais em que as ações humanas ocorrem e interpretar os significados) e
descoberta (a investigação é um processo indutivo baseado na descoberta). Na etnografia, os
dados são coletados através de técnicas com observação e entrevista, de forma não-
estruturada. O foco não é estudar um grupo muito grande de pessoas.

ROCCA, Antonella; MANDELLI, Andreina; SNEHOTA, Ivan. Netnography


approach as a tool for marketing research: the case of Dash-P&G/TTV. Management
Decision. Vol. 52, n. 4, 2014, pp. 689-704.

A netnografia surgiu a partir da aplicação da etnografia para a observação e o estudo


das comunidades online. Kozinets foi o primeiro a introduzir a moção de netnografia. Desde o
final da década 90, a netnografia passou a ser aceita como uma forma de pesquisa em
marketing. As interações que acontecem que acontecem nas mídias sociais entre os próprios
usuários e entre os usuários e as marcas não podem ser ignoradas, pois nesse contexto
também podem ser observados comportamentos de consumo e de compra. Tais canais
permitem uma comunicação efetiva e com baixo custo. Além de usar esses canais para a troca
de informações e para o compartilhamento de ideias e opiniões, os consumidores também
fazem uso das mídias sociais para redefinir o significado que um produto possui em suas
vidas.

Apesar dos estudos já existentes, caracterizados principalmente pelo rigor


metodológico dos procedimentos, pouco foi publicado sobre as implicações gerenciais e
organizacionais dessa abordagem aplicada à pesquisa de mercado. A literatura acadêmica
sobre netnografia está aumentando, mas o potencial dessa abordagem ainda foi pouco
explorado. O objetivo do artigo, então, consiste em explorar os aspectos organizacionais de
um projeto de pesquisa em netnografia no contexto de negócios.

Quanto ao case, o projeto visava posicionar a Dash como uma marca próxima ao
mundo das mães italianas e construir um relacionamento mais profundo com elas através dos
canais online. A Dash é uma das principais marcas da P&G na Itália e, desde 1987, a Dash
esteve envolvida com projetos de responsabilidade social; atualmente, a empresa está
comprometida com as mães italianas.

Uma agência de RP foi envolvida desde o início para facilitar o processo de decisão e
o desenvolvimento de uma proposta sólida, além de fazer toda a comunicação offline do
projeto. A TTV decidiu envolver também pesquisadores acadêmicos no campo da
comunicação digital e de pesquisa de marketing (os autores do artigo). Em uma discussão
entre a TTV e os pesquisadores, chegou-se a conclusão que a netnografia seria a abordagem
mais útil. A P&G considerou a proposta inovadora e em linha com o interesse geral em
experimentar novos métodos para obter informações de marketing.

O objetivo do projeto de pesquisa foi explorar em profundidade as necessidades e


sentimentos relacionados ao apoio à maternidade/paternidade e trazer à luz todos os serviços
sem fins lucrativos e ideias de projetos que os pais e as mães podem desenvolver para apoiar
uns aos outros. O projeto foi desenvolvido em quatro etapas.
Na primeira fase, a TTV mapeou as mídias sociais através de técnicas de
monitoramento, para identificar as conversas e os tópicos mais relevantes, e observação
participante em comunidades online de mães. Os objetivos eram acompanhar as conversas
online e interagir com os membros da comunidade para identificar as principais necessidades,
entender como as principais questões estão relacionadas à mídia, descrever os
comportamentos e experiências emocionais das pessoas, identificar as tendências, entre outros
aspectos.

Na segunda fase, o objetivo era aprofundar e investigar as ideias da primeira fase.


Foram feitas entrevistas em profundidade. Simultaneamente, as redes sociais continuavam a
ser monitoradas. A fase final do projeto foi a análise do material coletado, a elaboração do
relatório, sua apresentação à P&G.

O uso da netnografia não pode ser separado da estratégia que o negócio do cliente
segue em relação à sua marca e à comunicação nas mídias sociais. As capacidades
específicas de cada canal também devem ser consideradas.

O case também traz quatro aspectos da aplicação da netnografia como ferramenta de


pesquisa de marketing: 1) deve-se participar da vida da comunidade estudada (imersão), e não
apenas observar/monitorar à distância. Ganhar o status de membro confiável em uma
comunidade exige engajamento contínuo e leva tempo, algo que não pode ser obtido dentro
do prazo de um projeto de pesquisa; 2) uso de órgãos de mediação, como a TTV, que passam
a ter status de membro da comunidade; 3) necessidade de ir além de observar/monitorar
atividades online e incluir atividades offline, para entender bem a cultura comunitária; 4)
surgimento de uma organização formada em rede devido à necessidade de implantar uma
variedade de técnicas que exigem habilidades específicas.

Algumas implicações importantes:

1) É necessário desenvolver habilidades diversas para realizar e coordenar projetos que


envolvam a netnografia (monitorar, analisar, participar dos diálogos na comunidade...).
Desenvolver tais habilidades leva tempo. Essas habilidades podem ser internas para a
organização do cliente, mas outra parte será sempre externa por causa da necessidade de
envolver outras pessoas, que são os das comunidades online.

2) Sobre reunir as habilidades necessárias: deve-se relacionar um conjunto de atores


que possuem as habilidades necessárias para o projeto e envolvê-los em relacionamentos
colaborativos. Cada participante do projeto é um potencial facilitador do processo feito por
todo o grupo; deve-se reunir a combinação certa de pessoas.

GOULDING, Christina. Grounded theory, ethnography and phenomenology.


European Journal of Marketing. Vol. 39, n. 3/4, 2005, p. 294-308.

O artigo apresenta, conceitua e define três técnicas de pesquisa qualitativas que


apresentaram um notório crescimento quando aos seus respectivos usos dentro da área do
marketing. Cada uma delas possui seus próprios procedimentos paracoleta de dados,
interpretação e para o desenvolvimento da teoria.

Grounded theory

Essa técnica tem sua origem na sociologia. Ela reflete uma teoria que é fundamentada
em palavras e ações dos indivíduos que estão sendo estudados. Assim que uma área de
pesquisa for identificada, o pesquisador deve entrar em campo o quanto antes. Para o
desenvolvimento dessa nova teoria, o pesquisador apropria a literatura e as teorias existentes
que possuem relevância para o conceito que estão emergindo. O pesquisador não deve entrar
em campo totalmente ignorante, ou seja, sem o conhecimento de teorias e literaturas
relacionadas ao fenômeno estudado, esperando que essa teoria surja dos dados coletados.

A grounded theory também difere em alguns aspectos em relação a outros métodos


qualitativos, particularmente no que diz respeito a amostra. A amostra começa com os
informantes que são mais propensos a fornecer alguma informação, a qual é analisada de
modo a identificar conceitos provisórios e para direcionar teoricamente o pesquisador de
modo que amostras, dados e lugares sejam identificados. O pesquisador não deve deixar o
campo até que a saturação de informações seja atingida. Entrevistas em profundidade,
observação e memorandos com situações podem ser utilizados.

Existem alguns princípios específicos para analisar e abstrair a informação, os quais


incluem o método da comparação constante. As entrevistas feitas são comparadas para
verificar consistência entre as informações ou casos negativos. O passo seguinte consiste em
pesquisar por links que identifiquem conceitos que ofereçam uma explicação para o fenômeno
que está sendo estudado. O estágio final desse processo de desenvolvimento de teoria é a
construção de uma cateogira central que reúne todos os conceitos de modo a oferecer uma
explicação para o fenômeno.

O rigor dessa abordagem faz com que pesquisador olhe além do superficial, para
aplicar interpretações possíveis antes de desenvolver o conceito finail e para demonstrar esses
conceitos através de explicações e de dados baseados em evidências.

Etnografia

As raízes da etnografia estão na antropologia. Os pesquisadores devem olhar além


daquilo que as pessoas dizem para compreender o sistema compartilhado de significados que
nós chamamos de cultura. Essa técnica tem seus procedimentos distintos para a coleta de
dados, mas também está altamente preocupada com o contexto cultural. Desse modo, explica
os caminhos pelos quais a cultura é construída e se é construída pelos comportamentos e
experiências de seus membros.

A etnografia pode ser uma descrição completa ou parcial de um grupo, para identificar
aspectos comuns, como religião, as relações sociais ou o estilo de gestão. Existem poucas
limitações para o contexto cultural, que pode ser classificado de acordo com as dimensões
geográficas e especiais, língua, território, entre outros aspectos. O pesquisador é parte do
mundo que está sendo estudado e, consequentemente, é afetado por ele.
Essa técnica envolve o contato direto e prolongado do pesquisador com os membros
de um determinado grupo num esforço para olhar ao redor, sendo o trabalho de campo o seu
elemento central, de modo a trabalhar com as pessoas em seu ambiente natural. As vozes dos
participantes são fontes importantes de informações. Para a coleta de dados, a etnografia
permite utilizar diversos métodos (survey, observação, fotos, vídeos e gravações).

As visões de dentro e de fora são combinadas para fornecer insights mais profundos do
que se poderia conseguir através de um morador ‘nativo’ sozinho, de modo que essas duas
visões produzem uma terceira dimensão, a qual é uma explicação teórica para o fenômeno que
está sendo estudado. A análise de dados envolve a pesquisa por padrões e que expliquem
esses padrões, algo que se pode conseguir através da análise de conteúdo.

Fenomenologia

A ideia por trás é que as pessoas possuem experiências que estão inter-relacionadas e
que possuem significado. O pesquisador possui apenas uma fonte de dados legítima, que são
as visões e experiências dos próprios participantes. A visão do participante é tomada como um
fato. Mas os participantes são selecionados apenas se eles vivenciaram a experiência que está
sendo estudada. O objetivo da fenomenologia é, então, ampliar e aprofundar o entendimento
do alcance das experiências imediatas.

A linguagem é o meio central para transmitir significado e para fornecer uma


orientação metodológica de uma fenomenologia da vida social que está preocupada com a
relação entre o uso da linguagem e os objetos da experiência. O significado de uma palavra é
tomado de acordo com aquilo que ela se refere no mundo real, com base na premissa que a
tarefa central da linguagem é descrever a realidade.

Textos:

VELUDO-DE-OLIVEIRA, Tânia M.; IKEDA, Ana A. Laddering em pesquisa de


marketing. Cadernos EBAPE-BR. Vol. VI, n. 1, março 2008, 1-13.

ZAMAN, Bieke; GEURDEN, Kristof; DE COCK, Rozane; DE SCHUTTER, Bob;


ABELLE, Vero V. Motivation profiles of online Poker players and the role of interface
preferences: a laddering study among amateur and (semi-) professionals. Computer in
Human Behavior. N. 39, 2014, pp. 154-164.

O artigo de Veludo-de-Oliveira & Ikeda (2008) apresenta a metodologia do laddering


como um instrumento de pesquisa em marketing. Essa técnica tem sua origem na psicologia,
tendo posteriormente migrado para o marketing, sendo aplicado principalmente quando se
trata de comportamento do consumidor. Seu uso exige alguns cuidados; por isos, devem ser
considerados a adequação dessa técnica ao problema encontrado e a preparação do
pesquisador para entrevistar e analisar dados.
Com base no modelo de cadeias meios-fins, essa ferramenta de pesquisa é capaz de
revelar os sistemas de significados pessoais dos indivíduos. A teoria meios-fins é baseada no
encadeamento A-C-V, estabelecendo uma associação entre os atributos do produto (A), as
consequências comportamentais (C) e os valores pessoais (V). A descoberta desses aspectos
ocorre de forma mais estruturada e aprofundada em relação às outras técnicas qualitativas.

Os ‘meios’ são as atividades nas quais as pessoas estão envolvidas - A ou C - e os fins


são os valores. O encadeamento A-C-V mostra que os meios levam aos fins (consequências
reveladas a partir dos atributos, e os valores a partir das consequências). Segundo Olson e
Reynolds (1983), os atributos podem ser abstratos ou concretos, as consequências podem ser
psicológicas ou funcionais e os valores podem ser terminais ou instrumentais.

Na técnica de laddering, o pesquisador não está a procura da raiz do problema, mas


sim à procura das razões mais profundas para o consumidor comprar um determinado tipo de
produto.

Para a coleta de dados, faz-se entrevista, pedindo-se para que o entrevistado reflita
sobre características capazes de diferir marcas e produtos entre si, de modo que a pessoa traga
as características mais marcantes do produto. A entrevista laddering depende das respostas
dos entrevistados para seguir adiante. Com base nos atributos mencionados, começa-se a
construir a hierarquia de valor. Os menos importantes são isolados, e o foco passa a ser os
mais importantes.

A análise de dados ocorre em 4 etapas: 1) análise de conteúdo, 2) desenvolvimento da


matriz de implicação, 3) construção do mapa hierárquico de valor e 4) determinação das
orientações de percepção dominantes.

Na etapa 1, partes das entrevistas que possuem um sentido semelhante são alocadas
em uma mesma oração. Devem ser selecionadas as orações mais pertinentes à pesquisa. Na
etapa 2, constrói-se uma tabela numérica para representar as interações entre os elementos;
recomenda-se o uso do Laddermap para reduzir as chances de erros. Na etapa 3, o mapa
hierárquico de valor fornece uma visão geral do ‘raciocínio’ do cliente ao comprar um
produto, sendo feito em formato de árvore para simbolizar o conjunto de respostas das fases
anteriores; como nem sempre é possível colocar todas as orações no desenho, faz-se um ponto
de corte, deixando apenas as relações mais importantes; após, faz-se a análise. A etapa 4 trata
das relações que mais contribuem para o resultado do mapa, devendo ser levadas em
consideração em uma decisão de marketing.

Buscando complementar o primeiro artigo e fornecer uma aplicação prática da técnica


do laddering, Zaman et al (2014) analisam as motivações dos jogadores de Poker online
(amadores, semi e profissionais) de acordo com as preferências dos mesmos em relação às
características do design dos websites desses jogos. A revisão teórica do texto também aborda
a teoria meio-fim.
Foram selecionados 6 jogadores de cada categoria, totalizando 18 participantes. Foram
selecionados também 2 jogos de poker online distintos. Esse foi o foco da etapa de entrevista,
pois cada pessoa falou das suas motivações para preferir um dos dois tipos de poker. O artigo
descreve todo o processo metodológico realizado, passando pelas etapas de coleta e de análise
de dados mencionadas no artigo anterior. Os autores trazem diferentes mapas hierárquicos de
valor, um para cada tipo de jogador.

O estudo laddering mostrou que as características de desing dos websites de poker


criam experiências especificas nos jogadores, e isso difere de um site pro outro. Tais
características possuem relação com as crenças psico-sociais dos jogadores. Todos os
participantes preferiram um website em detrimento do outro por inúmeras razões.

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