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entrevista

entrevista Por Leonard Berry

Em busca da boa
reputação
Sem um comprometimento firme com a qualidade dos produtos e
serviços que oferecem, o destino das empresas será incerto. Pelo
menos é nisso que acredita Leonard Berry, um dos maiores
especialistas da atualidade em satisfação do cliente. Ele diz, em
entrevista exclusiva a HSM Management, que, além de contar com
excelência operacional –ponto de partida inevitável–, as
empresas necessitam de líderes que saibam motivar seus
funcionários para que estes criem valor com seu desempenho.
A liderança é fundamental no marketing, segundo Berry: lidar com
os clientes no dia-a-dia é um trabalho cansativo, e os que tiverem
contato direto com eles devem estar constantemente motivados.
E não se trata de um problema que afeta somente as empresas
HSM Management/ “concretas”; as “virtuais” enfrentam um desafio ainda maior: o
Ano 4 /Número 20/ cliente deve confiar em que elas cumprirão suas promessas. Com
Maio - Junho 2000 idéias diferenciadas, como a de que a generosidade é um fator de
sucesso, Berry cita várias empresas, entre elas a Charles Schwab
e a Barnes & Noble. A entrevista é de Graciela Biondo.

Qual é o panorama geral dos serviços prestados pelas empresas? Nos últimos anos a
qualidade melhorou ou piorou?
Em minha opinião e de acordo com as pesquisas realizadas, a qualidade dos serviços
piorou tanto nos Estados Unidos como em outros países do mundo. Em todos os setores,
entretanto, há empresas que prestam serviços de excelente qualidade, com resultados
muito bons em rentabilidade. Em meu livro mais recente, Discovering the Soul of Service,
revelo as lições que podem ser aprendidas com 14 empresas muito diferentes, em setores
também diferentes, que conseguiram lucros sustentáveis com a prestação de um serviço de
ótimo nível.

O sr. poderia mencionar algumas?


A Charles Schwab, que trabalha no ramo de intermediação financeira; a cadeia de hotéis
Bergstrom; a Enterprise Rent-A-Car, que aluga automóveis; a Miller SQA, fabricante de
móveis para escritórios; a USAA, de seguros e serviços financeiros. Essas companhias, e
as outras nove nas quais concentrei minha pesquisa, têm-se mantido rentáveis ao longo de
toda sua vida. Nenhuma tem menos de cinco anos, e algumas têm mais de 60.

Mas, como o sr. já disse, elas não são a norma em matéria de serviços. O sr. pode identifi-
car as causas que deram origem à deterioração nesse setor?
Uma das mais básicas é a falta de liderança. Quem presta os serviços são seres
humanos, e servir o cliente diariamente é um trabalho muito difícil e cansativo. Sendo
assim, essas pessoas precisam ser constantemente motivadas. E quem deve motivá-las?
Os líderes, sem a menor dúvida. Mas muitas companhias não têm líderes capazes de
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entrevista Por Leonard Berry

“As inspirar os funcionários; não têm pessoas capazes de criar o tipo de ambiente necessário
empresas para que os funcionários trabalhem com gosto, alcancem suas metas e cresçam
profissionalmente.
cujos líderes
crêem Nas empresas de serviço propriamente ditas, os líderes devem possuir qualidades
apaixonada- especiais?
mente na Devem ter as qualidades que caracterizam os bons líderes de qualquer organização, mas
além disso devem ser defensores ardorosos da excelência do serviço. Devem pregar por
importância
meio de exemplos e não de discursos. Se alguém não estiver decidido a prestar um serviço
da qualidade excelente, isso será visível em suas atitudes e os funcionários não darão ouvidos ao que
do serviço, essa pessoa disser. Outra qualidade importante é a integridade, porque ninguém está
independen- disposto a seguir uma pessoa desonesta. A verdadeira definição de líder é uma pessoa que
temente de tem seguidores, independentemente do título ou do cargo.
seu setor, Consequentemente, em meu livro incluí a integridade como um dos valores essenciais
da alta administração de uma empresa de serviços. Esse valor e mais um enfoque
terão uma
estratégico preciso, excelência operacional, cuidado com a reputação da marca,
vantagem relacionamentos baseados na confiança, generosidade, controle do destino da companhia,
competitiva investimento no desenvolvimento profissional dos funcionários e a obrigação de agir com
no novo o espírito empreendedor de uma empresa pequena e jovem, seja de que tamanho for, são os
mundo” nove fatores que levam ao sucesso.

A que o sr. se refere, concretamente, quando fala em controlar o destino?


Refiro-me a uma atitude de independência que tem origem na coragem e na convicção.
As companhias que têm sucesso na criação de valor por meio dos serviços prestados
evitam concentrar-se demais naquilo que os concorrentes fazem e mantêm os olhos postos
naquilo que os clientes querem. Atribuem a mais alta prioridade à excelência, acima do
crescimento, e concorrem com elas mesmas procurando superar seus níveis de
desempenho com o objetivo de fazer as coisas cada vez melhor.

Outro fator de sucesso identificado pelo sr. é a generosidade. Por quê?


Tradicionalmente a generosidade é vista como um resultado. Uma companhia tem
sucesso, tem lucros e é generosa porque tudo isso é compartilhado com a comunidade.
Mas, depois de ter feito minha pesquisa, descobri que existe um ponto de vista
completamente diferente: as pessoas incumbidas de prestar o serviço são as que realmente
criam valor para os clientes, e podem fazê-lo porque são inspiradas por ações generosas.
Com a generosidade inspira-se o funcionário, o cliente e a comunidade. Essa é a razão por
que descrevo a generosidade como um insumo necessário para o sucesso, e não como um
resultado.

Durante muito tempo o setor de serviços precisou recorrer a atributos tangíveis para
assinalar seus benefícios intangíveis. Mas, na atual “economia da experiência”, todos os
produtos estão vinculados a algum tipo de serviço. O sr. acredita que as empresas de
serviços tenham uma vantagem competitiva nesse novo ambiente?
As empresas cujos líderes crêem apaixonadamente na importância da qualidade do
serviço, independentemente do setor em que operam, terão uma vantagem competitiva no
novo mundo. Portanto, a resposta é que nem todas as empresas de serviços poderão
aproveitá-la, mas somente aquelas que prestarem serviços realmente excelentes.
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entrevista Por Leonard Berry

Nos últimos anos, as empresas com base na Internet, ou virtuais, foram agressivamente
acrescentadas ao cenário das empresas existentes. Qual é o papel da liderança nessas
empresas, como fator que impulsiona a qualidade do serviço prestado a seus
clientes?
Prestar um serviço de primeira classe é um desafio maior para uma empresa virtual
porque o cliente precisa acreditar que a empresa cumprirá o prometido. As companhias
baseadas na Internet não têm um logradouro ao qual o cliente poderá ir para fazer uma
reclamação ou devolver um produto com o qual não esteja satisfeito. Consequentemente
são obrigadas a criar confiança no cliente sendo honestas e cumprindo suas promessas. O
único ativo real de que dispõem é sua reputação e, evidentemente, seus líderes são as
pessoas que devem cuidar dessa reputação.

Se a reputação constitui o ativo principal das empresas virtuais, elas dependem muito
mais das pessoas que trabalham para elas.
Sim, porque, embora o cliente interaja com o computador, na empresa há pessoas que
projetaram o site, as políticas de distribuição, os preços e a assistência técnica ao cliente. É
vital que essas pessoas tenham uma atitude claramente voltada para o serviço porque,
caso contrário, a empresa virtual não terá êxito a longo prazo.

Os fatores de sucesso que o sr. identificou nas companhias concretas podem ser aplicados
também às virtuais?
Os nove fatores são aplicáveis a qualquer tipo de empresa. Vejamos, por exemplo, a
excelência operacional. Suponhamos que você seja a gerente de uma empresa que vende
produtos farmacêuticos pela Internet e que alguém esteja usando esse meio pela primeira
vez para comprar um remédio. Você comete o engano de enviar o produto errado ou não
cumpre a data de entrega ou perde o pedido de compra e não pode mandar o produto. Essa
pessoa teve problemas em sua primeira experiência de compra on-line. Tentará novamente?
Provavelmente não. O mais lógico seria que voltasse a comprar seus remédios em uma
farmácia tradicional ou, se quisesse fazê-lo on-line, tentaria outra empresa, porque a
experiência que teve com sua empresa foi ruim. A excelência operacional significa prestar
um serviço adequado desde a primeira vez. Se examinarmos os demais fatores,
descobriremos que todos são aplicáveis às empresas que operam eletronicamente.

A marca de uma empresa virtual é outro ativo-chave igualmente vinculado à reputação?


Sim. A marca é a reputação de uma empresa; é aquilo que a representa; é a promessa
feita ao cliente. Considerando que pode ser muito longo o tempo para que uma empresa
virtual recupere o investimento e comece a dar lucro, é preciso concentrar a atenção na
maneira de criar um sucesso sustentável. O melhor exemplo é a <amazon.com>. Essa
empresa ainda não é rentável porque o que faz é muito caro no mundo virtual, apesar de
seu crescimento e da quantidade de clientes que possui.

Mas a teoria incipiente das empresas virtuais indica que a <amazon.com> criou um novo
modelo de empresa para vender livros; e, portanto, é uma empresa de sucesso, apesar de
não gerar lucros. Basta observar sua capitalização no mercado…
Não concordo. É muito cedo para considerá-la uma empresa de sucesso, apesar de sua
elevada capitalização no mercado. A companhia ainda precisa demonstrar que pode obter
um bom retorno do investimento durante um período sustentável. Podemos dizer que se
trata de uma companhia com um futuro promissor, que é uma companhia inovadora e até
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entrevista Por Leonard Berry

mesmo que é uma companhia rica; mas é arriscado dizer que é uma empresa de sucesso
enquanto não demonstrar que é capaz de gerar receitas maiores que os recursos
financeiros investidos. Essa diferença é o assim chamado valor econômico agregado (EVA,
na sigla em inglês) e a empresa ainda precisa demonstrar que merece a confiança de seus
clientes e acionistas. Já vimos como as ações das empresas da Internet caíram há alguns
meses. Não sei o que acontecerá no futuro, mas o certo é que os investidores devem
começar a avaliar as empresas eletrônicas usando o mesmo conjunto de critérios utilizados
para medir o êxito de uma companhia concreta.

Isso nos leva de volta ao conceito de valor. Embora atualmente haja pessoas especulando
com o preço das ações, a longo prazo o importante será o valor que as companhias pude-
rem gerar para os clientes. Em sua opinião, o valor migrará para que tipo de empresa?
Para aquelas que disserem ao cliente atual e potencial que pode escolher a forma de
interação que preferir: “Venha a nosso escritório, telefone para nós, entre em contato
conosco pela Internet, mande-nos um fax ou escolha o que deseja em nosso catálogo;
trabalharemos da maneira que o sr. preferir”. Penso que no setor do varejo veremos
companhias com localizações físicas e sites na Internet e a chave do sucesso passará pela
sinergia entre o mundo físico e o virtual. Por exemplo, o cliente poderá comprar livros no
site <barnesandnoble.com>, fazer o pagamento com seu cartão de crédito e depois retirá-
los na loja da Barnes & Noble mais próxima de sua casa, sem perder tempo, porque o
pacote já estará pronto.

Em relação tanto às empresas que precisam comprar matéria-prima como às necessida-


des do consumidor final, quais são as grandes vantagens oferecidas pelas empresas na
Internet em comparação com as tradicionais?
Por um lado, a grande variedade de mercadorias disponíveis, mas principalmente o
acirramento da concorrência pelo preço. O cliente poderá comparar preços on-line e
escolher o melhor com toda facilidade. Todas essas mudanças no mundo virtual fazem com
que a concorrência se torne cada dia mais complexa e desafiadora para o mundo físico. Não
tenho dúvida a esse respeito; este é o período mais competitivo de toda a minha vida
profissional, em todos os setores.

Já que o sr. mencionou a questão dos preços, a influência da Internet está produzindo
mudanças na estrutura tradicional e na maneira de fixá-los?
Há pelo menos duas tendências em evolução. Uma delas é que o cliente tem acesso fácil
ao preço mais baixo e a outra é que o cliente fixa o preço que está disposto a pagar.
Empresas como a <priceline.com>, por exemplo, permitem que o cliente ofereça o preço que
deseja pagar por um quarto de hotel em determinada cidade e a empresa procura o hotel
disposto a aceitar esse preço. Não creio que esse tipo de estratégia seja estendido a todas
as atividades comerciais, mas é uma tendência que vem crescendo. A concorrência pelo
preço, que já era intensa, está cada vez mais acirrada devido à influência da Internet. Estou
certo de que no mundo virtual veremos dentro em breve muita inovação em matéria de
estratégia de preços.

O fato de haver muitos produtos e serviços oferecidos gratuitamente na Internet poderia


levar as empresas tradicionais a reconsiderar sua política de preços? Se alguém puder
obter um atendimento gratuito pós-venda, por exemplo, o que acontecerá com as compa-
nhias que hoje cobram por esse atendimento?
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Cada vez que alguém dá de presente um produto ou serviço, será muito difícil atribuir
um preço a esse produto ou serviço mais tarde. Os varejistas precisam ter muito cuidado
ao dar alguma coisa de presente, porque, depois que uma pessoa se acostuma a obter
coisas de graça, será muito difícil exigir pagamentos pelas mesmas coisas. Um dos grandes
efeitos da Internet foi dar poder ao consumidor, uma vez que, usando seu computador, ele
poderá mudar rapidamente de um site para outro. Isso é muito mais fácil e cômodo do que
ir a várias lojas para comparar preços. Além disso, na Internet é possível achar um agente
inteligente que se preste a procurar o preço mais baixo. As empresas não ignoram que a
política de preços se encontra em turbulência. Essa é uma das áreas mais afetadas pela
influência crescente da Internet.

O sr. disse em seu último livro que todas as empresas são empresas de serviços. Poderia
explicar por quê?
Por definição, uma companhia de serviços cria valor com seu desempenho. Entretanto,
em muitas empresas acontece uma conjunção: elas criam valor para o cliente com seu
desempenho e também com produtos tangíveis. Portanto, desde uma companhia de
aviação até uma que fabrica móveis para escritório, todas são empresas de serviços e
nenhuma terá muito futuro se ignorar a importância da qualidade do serviço.

Tendo como certa a qualidade do produto, qualquer empresa será obrigada a fazer alguma
coisa a mais, caso contrário não terá nenhuma possibilidade de diferenciar-se. Não é
isso?
Estou perfeitamente de acordo.
entrevista
entrevista Por Leonard Berry

Saiba mais sobre Leonard Berry


Autoridade em satisfação do cliente,
Leonard Berry é professor de marketing e
diretor do Centro de Estudos de Varejo da
A&M University, do Texas, EUA. É autor
dos livros Serviços de Satisfação Máxima
(ed. Campus) e Serviços de Marketing
(ed. Maltese), entre outros.

DE QUE SE QUEIXAM OS CLIENTES?


1. Mentiras óbvias. A desonestidade 7. Sofrer em silêncio. Funcionários que
evidente daqueles que vendem serviços não se dão ao trabalho de atender
desnecessários ou fazem cotações os clientes ansiosos por saber como
acima do aceitável. solucionar um problema.
2. Alerta vermelho. Fornecedores de 8. “Não pergunte.” Funcionários que
serviços que pensam que os clientes não estão dispostos a fazer um esforço
são idiotas e tratam-nos mal ou extra para ajudar os clientes ou dão
os desrespeitam. a impressão de que os pedidos de ajuda
3. Quebra de promessas. Fornecedores incomodam.
de serviços que não cumprem o 9. Cabeça oca. Funcionários que não
prometido. Um serviço desleixado sabem (ou seja, não dedicam o tempo
e propenso a erros. necessário para aprender) quais as
4. “Não estou nem aí para isso.” respostas que devem ser dadas às
Funcionários sem disposição para perguntas feitas mais frequentemente
resolver os problemas básicos do pelos clientes.
serviço ao cliente. 10. Prioridades maldefinidas.
5. A longa espera. É preciso esperar Funcionários que conversam entre
muito tempo numa fila porque os caixas si ou executam tarefas pessoais
estão congestionados ou fechados. enquanto o cliente espera. Aqueles que
6. Piloto automático. Serviço impessoal se negam a ajudar um cliente porque
que não transmite a sensação de calor sua jornada de trabalho terminou ou
humano. porque estão no horário de descanso.
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entrevista Por Leonard Berry

FATORES DE SUCESSO NAS EMPRESAS DE SERVIÇO

Possuem
um enfoque
estratégico
São generosas
claro Visam à
e têm
consciência excelência
social operacional

Valores que
estimulam seus líderes:
Integridade
Excelência
Cultivam a Controlam
reputação de Inovação
o destino da
suas marcas Gosto pelo trabalho companhia
Trabalho em equipe
Respeito pelas outras pessoas
Responsabilidade social

Mantêm Criam
o espírito relacionamentos
jovem e baseados na
empreendedor confiança
Investem no
crescimento
operacional
de seus
funcionários

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