A idéia que se tem sobre o concreto de alto desempenho (CAD) é a de que se trata de um material
nobre, que demanda alto controle tecnológico e, por isso mesmo, é mais caro, o que faz com que seu
uso seja indicado apenas em estruturas especiais e em grandes empreendimentos. Outra idéia
comumente associada ao CAD é a de proporcionar estruturas mais leves, afinal, a maior resistência
conseqüente da menor relação água/cimento, típica desses materiais, permite a construção de
elementos mais esbeltos para suportar a mesma carga.
Essas premissas são verdadeiras, mas apenas em parte. De fato, se comparado a um concreto
comum, o custo inicial do m³ do concreto de alto desempenho é mais elevado, cerca de 30 a 40%,
dependendo da negociação, segundo alguns construtores. O que não significa, porém, que a solução
como um todo seja mais custosa. Ao contrário. Quando ela parte de uma especificação adequada
durante as fases de projeto, aumentar a resistência do concreto pode trazer ganhos técnicos e
econômicos.
Um dos efeitos imediatos diz respeito à redução das armaduras, item que tem peso considerável no
orçamento das construtoras. O projetista de estruturas Francisco Graziano faz uma conta que ajuda a
evidenciar essa vantagem. Segundo ele, em uma situação de um pilar de 40 x 40 cm, uma mudança
de fck de 25 para 35 pode gerar uma redução de armaduras de até 45% sem qualquer alteração de
seção. Além disso, em algumas situações, o acréscimo de resistência pode se mostrar interessante
para diminuir o consumo de cimento.
Os pilares são os elementos estruturais mais beneficiados pelo aumento da resistência do concreto,
uma vez que estão mais sujeitos a esforços de compressão. Assim, os ganhos são maiores nos
pilares mais robustos do que em pilares esbeltos. "Pelo mesmo motivo - a resistência à compressão -
o aumento do fck se mostra adequado em estruturas protendidas", garante o projetista estrutural
Mario Franco. "A protensão nada mais é do que a introdução de grandes esforços na estrutura que
visam compensar os esforços externos. Isso significa que o concreto recebe tensões muito mais altas
do que se não tivesse a protensão. Daí a importância de o concreto ter bom desempenho", diz. Lajes
e vigas de concreto armado também podem proporcionar vantagens quando confeccionadas em
concreto de maior resistência. "Nesses casos, contudo, os ganhos ocorrem mais em função da
deformabilidade e à resistência à força cortante", comenta Graziano.
Elevar o fck do concreto é viável principalmente em grandes estruturas. Na foto, obra da UniFMU que
ganhou espaço interno com redução dos pilares
Ganho de espaço
Assim como a maior capacidade de suportar cargas com menor massa, elevar o fck do concreto pode
agregar, ainda, outras vantagens, como o melhor aproveitamento da área útil. Isso tem feito com que,
mesmo diante do custo inicial maior, concretos de resistência superiores a 40 MPa estejam sendo
aproveitados principalmente nos primeiros pavimentos e no subsolo de edificações altas. A intenção,
geralmente, é evitar o aumento das seções dos pilares nos andares mais exigidos, de forma a
garantir melhor distribuição das cagas na garagem e nas áreas comuns dos edifícios instaladas no
térreo e que demandam amplos vãos livres. "Contribui para o uso desse tipo de solução o fato de o
mercado ter exigido cada vez mais que os projetos potencializem os espaços internos", explica Paulo
Suzano, diretor da Matec Engenharia.
Conforme um cálculo meramente ilustrativo realizado pelo projetista Francisco Graziano, dobrar o
número de pavimentos de um edifício de 20 para 40, partindo de um mesmo concreto de fck 20, por
exemplo, pode significar uma perda de 0,7 m de espaçamento entre os pilares. "Se aumentarmos
ainda mais as cargas, podemos chegar à absurda situação de eliminarmos o espaçamento entre os
pilares", diz. "Por isso, a partir de um determinado ponto, é preciso pensar em materiais mais
eficientes visando a economia da seção de concreto", recomenda.
Na construção do Continental Square Faria Lima, torre de 16 andares de uso comercial na capital
paulista, a aplicação de concreto de 50 MPa trouxe como resultado ganho de espaço nas garagens
de cerca de 5%. Na ocasião, conforme dados da Inpar, responsável pela obra, a escolha por concreto
de alta resistência à compressão permitiu a eliminação do contrapiso e ainda reduziu em 13% o
consumo de armadura. De acordo com a construtora, esses benefícios, somados ao aumento da
produtividade, possibilitaram a redução de cerca de 1,5% no custo global do empreendimento.
"Em edifícios altos pode ser muito econômico planejar concretos de resistência decrescente dos
andares inferiores para os superiores, tentando com isso manter o mesmo jogo de fôrmas e
geometria", comenta Mario Franco, que revela, ainda, como prática interessante, a adoção de
concreto de alta resistência nos pilares e, nos demais elementos estruturais, concreto até 40% menos
resistente que o usado nos pilares. Essa solução está presente na concepção estrutural da Torre
Norte do Cenu (Centro Empresarial Nações Unidas), projetada por Mario Franco e construída pela
Método Engenharia, também em São Paulo. No local, enquanto os pilares foram fabricados com
concreto de 50 MPa, a matéria-prima de lajes e vigas foi o concreto de 35 MPa.
Algumas construtoras já descobriram que, além do ganho de área útil, a redução de armaduras e o
melhor aproveitamento das fôrmas, a introdução do CAD pode influenciar, também, a velocidade de
execução da estrutura. Isso porque, enquanto um concreto de 20 MPa pode atingir 40% de
resistência ao final do terceiro dia, em situações normais, um CAD de fck 50 pode apresentar 70% de
sua resistência no mesmo período. "Como o CAD normalmente apresenta cura mais veloz, o que
permite uma desenforma antecipada, é possível reduzir o tempo de locação de cimbramentos e
liberar outras frentes de serviço", revela Paulo Suzano. "Mas isso, porém, depende de um rigoroso
planejamento. Não adianta apenas substituir um concreto por outro", salienta.
O edifício e-Tower utilizou concreto de 125 MPa nas estruturas mais carregadas. Resultado: os
pilares do subsolo foram reduzidos e a garagem ganhou mais 16 vagas
Nem sempre, entretanto, o concreto de alto desempenho é escolhido para uma obra devido às
motivações econômicas. Durante a construção recente de um residencial de alto padrão, por
exemplo, concreto de fck 50 foi adotado em cinco pilares da fachada. Caso contrário, para suportar
as cargas necessárias e manter o concreto de 30 MPa utilizado no restante da obra, esses elementos
deveriam ter suas seções aumentadas. "Nesse caso, o uso de um fck maior se justificou por uma
necessidade arquitetônica, pois aumentar a espessura dos pilares da fachada implicaria comprometer
toda a proporcionalidade planejada pelo arquiteto", diz Graziano.
Viabilidade
Em geral, os motivos que tornam inviável o aumento da resistência do concreto são muito mais de
ordem financeira do que técnica. "Em obras de porte muito pequeno e em ambientes pouco
agressivos, o uso dessa solução pode não ser necessário", afirma Mário Franco. "O mesmo vale para
quando não for possível garantir a qualidade do concreto, por limitações regionais ou de produção",
acrescenta Francisco Graziano. Ainda segundo o calculista, outro fator que precisa ser considerado
na conta custo versus economia é o efeito parasitário da instabilidade que cresce à medida que os
elementos apresentam seções menores.
Mais carga
A Matec Engenharia está erguendo, na zona Sul de São Paulo, um novo campus para a UniFMU
(Faculdades Metropolitanas Unidas FMU). Com dois blocos, um com cinco pavimentos e dois
subsolos, e outro com sete pavimentos e três subsolos, o prédio terá, ao todo, 20 mil m² de área
construída e cerca de 300 vagas de garagem. Segundo o engenheiro Paulo Suzano, diretor da
Matec, depois de iniciada a obra, o cliente percebeu a necessidade de aumentar o número de
pavimentos. "Isso fez com que a estrutura passasse a receber 20% mais carga", conta. Além disso,
todo o projeto estrutural partia do pressuposto de embutir os pilares nas paredes, de forma a evitar
obstáculos dentro das salas de aula - o que poderia prejudicar a visibilidade dos alunos - e garantir
melhor fluxo entre os corredores. Diante dessas condições, a solução encontrada foi elevar o fck dos
pilares para 45 MPa, de forma que pudessem ser mantidas as modulações e seções iniciais.
Redução de armaduras
A primeira obra a adotar o concreto de alto desempenho no Paraná foi a do Evolution Towers,
complexo multifuncional de três edifícios - de uso comercial, um hotel e um residencial com lofts -
concluído em 2004, em Curitiba. No empreendimento, que buscava leveza estrutural, vãos livres e o
melhor aproveitamento das áreas úteis, foi empregado concreto de 60 MPa aditivado com
superplastificantes e estabilizantes nas zonas de maior concentração de cargas. Com isso, foi
possível concentrar as cargas em um número menor de pilares e reduzir o aço da estrutura entre 20 e
30%. "Outra conseqüência positiva foi o aumento da área dos pavimentos, da garagem e das áreas
comuns no térreo", explica o coordenador de obras do Grupo Thá, Nilton Antonietto, segundo o qual,
a redução da área da seção dos pilares ficou em torno de 40%.
Arquitetura: Baggio Pereira Schiavon e Alfred Willer
Construção: Grupo Thá
Projeto estrutural: Tesc Consultoria e Projetos Estruturais
Concreto: Concrebras
Cimento: Itambé
O recorde brasileiro de resistência de concreto foi obtido em cinco pilares do edifício comercial e-
Tower, erguido em São Paulo pela Tecnum. Na obra de 42 pavimentos, utilizou-se concreto colorido
com resistência média à compressão de 125 MPa em quatro subsolos e nos três pavimentos
inferiores.
Uma das conseqüências da escolha foi a redução da seção dos pilares do subsolo, o que
proporcionou ganho de 16 vagas. Além disso, com as peças estruturais de menor dimensão, reduziu-
se 52% do volume de concreto empregado nos pilares. As informações são dos engenheiros Carina
Hartmann e Paulo Helene, este último presidente do Ibracon (Instituto Brasileiro do Concreto) e
responsável pelo estudo do traço do concreto dessa obra. Ao todo, foram consumidos 17.732 m³ de
concreto, sendo 126 m³ de alto desempenho.
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