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ADVOCACIA

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA ____ VARA CÍVEL


DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CIDADE – SEÇÃO JUDICIÁRIA DE ESTADO

EMPRESA, QUALIFICAÇÃO COMPLETA, vem respeitosamente à


presença de Vossa Excelência, através de seus procuradores
abaixo/eletronicamente assinados (cujo instrumento procuratório segue anexo),
ajuizar, observando o artigo 282 do Código de Processo Civil, a presente

AÇÃO ORDINÁRIA c/c REPETIÇÃO DE INDÉBITO


com pedido de antecipação dos efeitos da tutela

em face da UNIÃO FEDERAL, pessoa jurídica de direito


público, podendo ser citada em endereço, o que faz de acordo com as razões de
fato e argumentos de Direito adiante expostas em minúcias.

1 – SÍNTESE FÁTICA

Na consecução de seus objetivos sociais, a empresa


requerente emprega várias pessoas, cumprindo, regularmente, suas obrigações
trabalhistas, previdenciárias e tributárias provenientes das atividades exercidas
e das relações empregatícias mantidas com seus colaboradores.

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Destarte, a pessoa jurídica autora se sujeita a uma elevada
gama de tributos, dentre os quais se inclui a obrigatoriedade de recolhimento, à
alíquota de 10%, da Contribuição Social incidente sobre os montantes
depositados a título de FGTS, acrescido das remunerações aplicáveis às contas
vinculadas, nos casos de despedida sem justa causa de seus empregados, nos
estritos moldes do art. 1º da LC 110/011.

Todavia, conforme será adiante demonstrado, este tributo em


específico foi, quando de sua efetiva criação, idealizado para uma finalidade – a
viabilização do pagamento da correta atualização monetária das contas
vinculadas de FGTS que sofreram expurgos por ocasião do Plano Verão, em
janeiro de 1989, e do Plano Collor, em abril de 1990 – que não mais subsiste, de
forma que as receitas advindas de sua cobrança deixaram de ser destinadas ao
objetivo inicial de “tampar o rombo” do Fundo de Garantia (problema já
corrigido) e, atualmente, são destinadas a políticas públicas de infraestrutura e
moradia, conforme se denota de comunicações oficiais (anexas).

Assim, é a presente ação para que seja declarada a


inconstitucionalidade da cobrança da contribuição instituída pelo artigo 1º da Lei
Complementar n° 110/2001, por ter sido exaurida a finalidade de sua cobrança.
Ato contínuo, requer seja deferido o direito de reaver o que foi pago
indevidamente desde a constatação da inconstitucionalidade até a data do
último pagamento realizado a este título.

2 – PRELIMINARMENTE – JUNTADA DE DOCUMENTOS E ANÁLISE DO


QUANTUM A SOFRER REPETIÇÃO DE INDÉBITO APENAS EM LIQUIDAÇÃO
DE SENTENÇA

Antes de adentrarmos na análise das questões de mérito da


demanda, imperioso se faz destacar que a presente ação versa sobre a
declaração judicial de um direito a ser reconhecido ao postulante (o de que a
cobrança da contribuição prevista no artigo 1° da Lei Complementar n°

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Art. 1° Fica instituída contribuição social devida pelos empregadores em caso de despedida de empregado sem justa causa, à alíquota de dez por
cento sobre o montante de todos os depósitos devidos, referentes ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, durante a vigência do contrato
de trabalho, acrescido das remunerações aplicáveis às contas vinculadas.
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110/2001 é inconstitucional, conforme será mais bem analisado nos próximos
pontos).

O que está em jogo, Excelência, é o reconhecimento ou não


do direito que a parte autora sustenta possuir, no sentido de lhe ser deferido ou
indeferido o pleito de ver extinta a cobrança da contribuição social de um
adicional de 10% incidente sobre os montantes depositados a título de FGTS em
caso de despedidas sem justa causa e, apenas em um segundo momento, o de
ver devolvidos os pagamentos indevidamente realizados. Por óbvio, a
discussão acerca do direito independe da juntada de extratos e
comprovantes para apuração do valor a ser corrigido em caso de
provimento da ação: sendo o quantum apurado em R$ 100,00, R$
1.000,00, R$ 5.000,00, ou R$ 50.000,00, o direito pleiteado é o mesmo
em qualquer caso.

Por este motivo, não se faz necessário perder tempo, neste


momento processual, com a discussão e impugnação de cálculos realizados
unilateralmente pelo autor: até mesmo por celeridade processual, é imperativo
a concentração dos atos judiciais no sentido de declarar a possibilidade ou
impossibilidade do direito pleiteado, de maneira que, apenas posteriormente – já
em sede de liquidação de sentença – caberia a análise quanto os valores a
serem reclamados em repetição de indébito em caso de procedência.

Sobre a possibilidade de restringir a discussão da lide à


questão de direito com a posterior juntada de extratos e comprovantes em sede
de cumprimento do julgado, tem decidido pacificamente toda a jurisprudência
pátria em casos semelhantes, in verbis:

APELAÇÃO CÍVEL - EXPURGOS DA INFLAÇÃO - PRELIMINARES E


PREJUDICIAL DE MÉRITO ARGUIDAS EM CONTRARRAZÕES
AFASTADAS - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA TITULARIDADE DA
CONTA-POUPANÇA À ÉPOCA DA IMPLANTAÇÃO DOS PLANOS
ECONÔMICOS DE GOVERNO - POSSIBILIDADE DE INVERSÃO DO
ÔNUS DA PROVA - EXISTÊNCIA DA POUPANÇA COMPROVADA -
JUNTADA DE EXTRATOS EM LIQUIDAÇÃO - RECURSO PROVIDO.
(TJ-MS - AC: 403 MS 2010.000403-0, Relator: Des. Júlio Roberto
Siqueira Cardoso, Data de Julgamento: 29/04/2010, 5ª Turma Cível,
Data de Publicação: 07/05/2010)

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AÇÃO DE COBRANÇA. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. JUNTADA DOS
EXTRATOS. FASE DE LIQUIDAÇÃO. A juntada dos extratos não
é necessária ao reconhecimento do direito do poupador aos
expurgos inflacionários, mas, tão somente, à apuração das
diferenças reclamadas e devidas. E, os valores certos e líquidos
decorrentes dos expurgos inflacionários desconsiderados pela
Instituição Financeira poderão ser apurados em sede de
liquidação de sentença, sendo despicienda a juntada dos
extratos ou comprovantes até tal fase. (TJ-MG
104330721757410011 MG 1.0433.07.217574-1/001(1), Relator:
MARCOS LINCOLN, Data de Julgamento: 27/01/2010, Data de
Publicação: 22/02/2010)

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. POUPANÇA.


JUNTADA DOS EXTRATOS ANALÍTICOS. MOMENTO
PROCESSUAL. DISPENSABILIDADE. FASE DE LIQUIDAÇÃO.
MULTA IMPOSTA. AFASTAMENTO. DECISÃO REFORMADA. RECURSO
PREJUDICADO. 1 - Cuida-se de agravo de instrumento interposto
pela Caixa Econômica Federal - CEF, com requerimento de efeito
suspensivo, contra decisão interlocutória proferida pelo Juízo da 4a
Vara Federal Cível de Vitória, na ação de rito ordinário, em face de
Ivan de Oliveira. 2 - A decisão agravada determinou que a agravante
apresentasse, no prazo de 15 (quinze) dias, os extratos das contas
de poupança de titularidade do autor, sob pena de multa diária
correspondente a R$ 100,00 (cem reais). 3 - Considerando o ofício nº
ES-OFI-2010/02119, de 23/09/2010, remetido pelo Juízo da 4a Vara
Federal Cível de Vitória, Seção Judiciária do Estado do Espírito Santo,
verifica-se que a decisão agravada foi revogada. O referido ofício foi
recebido por este Relator quando já incluído o processo na pauta de
julgamento. 4 - A questão abordada através do presente recurso
encontra-se superada, ficando o mesmo prejudicado pela perda de
objeto. 5 - Agravo de instrumento prejudicado. (TRF-2 - AG:
201002010066021 RJ 2010.02.01.006602-1, Relator:
Desembargador Federal GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA,
Data de Julgamento: 27/09/2010, SEXTA TURMA ESPECIALIZADA,
Data de Publicação: E-DJF2R - Data::11/10/2010 - Página::332/333)

APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE COBRANÇA. CONTRATO DE ABERTURA


DE CRÉDITO EM CONTA CORRENTE. CHEQUE ESPECIAL. PRELIMINAR
DE INÉPCIA DA INICIAL. AUSÊNCIA DOS EXTRATOS DE TODO O
PERÍODO DE CONTRATUALIDADE. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE
DOCUMENTO INDISPENSÁVEL À PROPOSITURA DA AÇÃO.
DISCUSSÃO QUE CINGE-SE ÀS CLÁUSULAS CONTRATUAIS.
POSSIBILIDADE DE JUNTADA ULTERIOR, NO MOMENTO DA
LIQUIDAÇÃO DO DÉBITO. PRELIMINAR INACOLHIDA. RELAÇÃO
DE CONSUMO. CONTRATO DE ADESÃO. APLICABILIDADE DA LEI N.
8.078/90. SÚMULA 297 DO STJ. MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO PACTA
SUNT SERVANDA. REVISÃO CONTRATUAL. POSSIBILIDADE.
INTELIGÊNCIA DO ART. 6º DO CDC. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA.
EXIGÊNCIA PERMITIDA TÃO SÓ NOS CONTRATOS EM QUE HOUVER
EXPLÍCITA CONVENÇÃO LIMITADA À TAXA DE JUROS
REMUNERATÓRIOS LEGAL FIXADA NO AJUSTE, VEDADA, CONTUDO, A
CUMULAÇÃO COM A CORREÇÃO MONETÁRIA. MATÉRIA AFETADA NA
FORMA DE RECURSO REPETITIVO. ATENÇÃO AO PRECEDENTE DE
RECURSO ESPECIAL N. 1058114 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE
JUSTIÇA. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. DECLARAÇÃO DA
INCONSTITUCIONALIDADE, POR ESTA CORTE, DA MP N. 1.963-
17/2000, REEDITADA PELA MP N. 2.170-36/2001. CÔMPUTO
EXPONENCIAL NÃO PERMITIDO NA FORMA MENSAL. JUROS
REMUNERATÓRIOS EM 12% AO ANO. INAPLICABILIDADE DO ART. 192,
§ 3º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. EXEGESE DA SÚMULA

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VINCULANTE 7 DO STF. LIMITAÇÃO PELA TAXA MÉDIA DE MERCADO.
OBSERVÂNCIA DO ENUNCIADO I DO GRUPO DE CÂMARAS DE
DIREITO COMERCIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PEDIDO DE
REDUÇÃO. REJEIÇÃO. VALOR ESTIPULADO EM CONFORMIDADE COM
OS PADRÕES ÍNSITOS AO ART. 20, § 3º, DO CPC. SENTENÇA
PARCIALMENTE REFORMADA. RECURSO DO AUTOR CONHECIDO E
PARCIALMENTE PROVIDO. RECURSO DO RÉU CONHECIDO E
DESPROVIDO. O Superior Tribunal de Justiça, em recurso repetitivo
(REsp. n. 1058114), reafirmou o entendimento jurisprudencial de
que é válida a cláusula que prevê a cobrança da comissão de
permanência para o período de inadimplência, assim entendida
como juros remuneratórios à taxa média de mercado, respeitada a
fixada no ajuste, acrescidos de juros de mora e multa contratual,
vedada a exigência concomitante, contudo, com correção monetária
(Súmula 30 do STJ). "Nos contratos bancários, com exceção das
cédulas e notas de crédito rural, comercial e industrial, não é
abusiva a taxa de juros remuneratórios superior a 12 % (doze por
cento) ao ano, desde que não ultrapassada a taxa média de
mercado à época do pacto, divulgada pelo Banco Central do Brasil."
(Enunciado n. I do Grupo de Câmaras de Direito Comercial do TJSC).
(TJ-SC - AC: 170105 SC 2008.017010-5, Relator: Altamiro de Oliveira,
Data de Julgamento: 14/06/2011, Quarta Câmara de Direito
Comercial, Data de Publicação: Apelação Cível n. , de Pomerode)

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. CORREÇÃO MONETÁRIA.


CADERNETA DE POUPANÇA. PROVA DA TITULARIDADE DA CONTA.
INEXISTÊNCIA DE DOCUMENTO INDISPENSÁVEL À
PROPOSITURA DA AÇÃO. PRELIMINAR DE PRESSUPOSTO
PROCESSUAL ACOLHIDA. DEMAIS PRELIMINARES E MÉRITO
PREJUDICADOS. EXTINÇÃO DO FEITO SEM EXAME DO MÉRITO. ART.
267, IV E VI, DO CPC. - A jurisprudência pátria, capitaneada
pelo e. STJ, vem entendendo ser dispensável, à época da
propositura da demanda, a juntada aos autos dos extratos
das contas de poupança, sendo necessário, apenas, a prova
da titularidade da conta no período requerido. - A teor do art.
333, I, do CPC, é da parte autora o ônus da prova quanto ao fato
constitutivo do seu direito. E, mesmo que se considere como sendo
de consumo a relação em discussão, a ser amparada pelo Código de
Defesa do Consumidor, o fato é que a inversão do ônus da prova em
benefício do consumidor somente deve ser determinada, quando, a
critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele - o
consumidor - hipossuficiente (art. 6º, VIII do CDC). - Inexistência de
qualquer documento apto a provar a titularidade de conta poupança
pela parte autora ou que a sua situação financeira tenha impedido o
fornecimento pela instituição financeira de algum indício de prova
material. - Situação que impõe a extinção do feito sem apreciação
do mérito por falta de pressuposto processual - comprovação da
existência de relação contratual entre as partes (titularidade de
conta) - e, também, por ausência de uma das condições da ação,
qual seja, o interesse de agir, nos moldes do art. 267, IV e VI, do
CPC. - Exame das demais preliminares e do mérito prejudicado. -
Deixa-se de condenar a parte autora em custas e honorários
advocatícios por ser beneficiária da justiça gratuita. Preliminar de
ausência de pressuposto processual acolhida. Apelação provida.
Extinção do feito sem exame do mérito. (TRF-5 - AC: 438184 PE
2007.83.00.008583-8, Relator: Desembargador Federal José Maria
Lucena, Data de Julgamento: 15/05/2008, Primeira Turma, Data de
Publicação: Fonte: Diário da Justiça - Data: 18/08/2008 - Página: 747
- Nº: 158 - Ano: 2008)

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Desta maneira, em sendo evidente o interesse de agir da
empresa autora – já que eventual declaração de inconstitucionalidade a recair
sobre a contribuição social impugnada nestes autos poderá gerar reflexos
econômicos imediatos e futuros – e, ainda, restando cabalmente comprovada a
existência de relações empregatícias entre a postulante e seus colaboradores
(conforme documentação anexa), requer seja processada a presente ação sem
os extratos demonstrativos dos valores já pagos em tangência aos 10% devidos
em caso de despedida sem justa causa, declarando-se a inconstitucionalidade
pleiteada para, apenas na sequência, na fase de execução da sentença,
determinar a juntada dos documentos cabíveis de maneira a possibilitar os
cálculos, que serão realizados oportunamente em liquidação.

3 – DO MÉRITO

3.1 – Da criação da contribuição social prevista no art. 1° da LC


110/2001

A contribuição social objeto de discussão foi instituída para


fazer frente à necessidade de o FGTS recompor os expurgos inflacionários das
contas vinculadas nos períodos do Plano Verão (janeiro de 1989) e Plano Collor
(abril de 1990), decorrentes da decisão proferida em sessão plenária do
Supremo Tribunal Federal no julgamento dos Recursos Extraordinários
248.188/SC e 226.855/RS. Referida informação é incontestável diante da
exposição de motivos do projeto da então Lei Complementar, conforme pode ser
visto abaixo (e em anexo):

Temos a honra de submeter à elevada consideração de Vossa


Excelência a anexa minuta do Projeto de Lei Complementar que
autoriza o crédito, nas contas vinculadas do Fundo de Garantia do
Tempo de Serviço - FGTS, dos complementos de atualização
monetária decorrentes de decisão do Supremo Tribunal Federal, sob
condição da aprovação da contribuição social de 10% (dez por
cento) dos depósitos do FGTS, devida nos casos de despedida sem
justa causa, e da contribuição social do 0,5% (cinco décimos par
cento), incidente sabre a folha de pagamento, ora propostas. (...)

O reconhecimento por parte do Poder Judiciário de que os saldos das


contas vinculadas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço foram
corrigidos a menor na implementação dos Planos Verão e Collor I,
teve o efeito de aumentar o passivo do FGTS sem o correspondente
aumento do ativo necessário para evitar um desequilíbrio
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patrimonial no Fundo. Diante dessa decisão da Justiça, e devido à
possibilidade de que um número excessivamente elevado de
trabalhadores ajuizasse demandas para correção dos saldos na
mesma proporção, o que teria o efeito de paralisar o processo
judiciário no País, Vossa Excelência decidiu estender a todos os
trabalhadores a correção automática de seus saldos,
independentemente de decisão judicial. Isto criou uma necessidade
de geração do patrimônio no FGTS da ordem de R$ 42 bilhões.

(...) Foi exatamente para evitar tais desdobramentos que Vossa


Excelência decidiu que a conta não poderia ser paga exclusivamente
pelo Tesouro Nacional e promoveu, com as centrais sindicais e
confederações patronais que participam do Conselho Curador do
FGTS, um processo de negociação que viabilizasse a pagamento do
montante devido aos trabalhadores.
No processo de negociações várias propostas foram apresentadas e
discutidas pelas partes envolvidas. A proposta daí resultante pode
ser resumida da seguinte forma:

- contribuição social devida nos casos do despedida sem justa


causa, destinada ao FGT, de 10% dos depósitos referentes ao Fundo;
- criação de uma contribuição social de 0,5% sobre a folha de
salários das empresas não participantes do Simples, destinada ao
FGTS (não abrangendo pessoas físicas empregadores de
empregados domésticos e de empregados rurais);
- utilização de parte das disponibilidades hoje existentes no FGTS;
- deságio de 10% a 15%, concedido pelos trabalhadores com
complementos de atualização monetária cujos valores estejam
acima de R$1.000,00;
- contrapartida do Tesouro Nacional correspondente a R$ 6 bilhões.
(...)

A contribuição social devida nos casos de despedida sem justa


causa, além de representar um importante instrumento de geração
de recursos para cobrir o passivo de corrente da decisão judicial,
terá como objetivo induzir a redução da rotatividade no mercado de
trabalho brasileiro.

(...) A urgência solicitada se deve a necessidade de que os recursos


das contribuições que ora se propõe criar sejam coletados pelo FGTS
no mais breve período de tempo, a fim de que os trabalhadores
possam receber a complementação de atualização monetária nos
prazos propostos na anexa minuta de Projeto de Lei Complementar.

Vê-se, portanto, que o propósito dessa majoração era o de


cobrir o grande déficit (42 bilhões de reais) causado pela atualização monetária
insuficiente ocorrida nas contas vinculadas ao FGTS no período de 1989 até
1991, época da edição dos denominados "Plano Verão" e "Plano Collor".
Falamos, então, de uma espécie de “ajuda temporária” aos cofres do FGTS, cujo
patrimônio se encontrava seriamente desfalcado.

É importante delimitar desde já que este adicional de 10%


não é revertido para o trabalhador, que continua percebendo apenas os 40% de

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multa rescisória sobre o montante dos depósitos realizados durante seu contrato
de trabalho (art. 18, §1° da Lei nº 8.036/1990). No entanto, em decorrência
direta da contribuição instituída pela LC nº 110/2001 em seu artigo 1°, a
demissão sem justa causa passou a ser onerada com uma alíquota total de 50%
a título de contribuições ao FGTS, sendo 40% destinados à indenização para o
trabalhador e 10% a título de receita para saldar o supra referido déficit do
Fundo de Garantia.

Excelência: muito embora inexista na literalidade da lei um


termo final bem definido para o fim da contribuição social, a finalidade do
tributo é estabelecida de forma cristalina: o objetivo único de sua criação
era tangente ao financiamento do pagamento do acordo relativo aos
expurgos inflacionários do FGTS, conforme consta inclusive da leitura
conjunta do art. 3°, §1° e art. 4° da Lei Complementar n° 110/2001.

3.2 – Natureza jurídica do tributo sob análise – Contribuição Social


Geral – Art. 149 da CF/88

O dispositivo de lei hostilizado (art. 1° da LC n° 110/2001)


inequivocamente criou um tributo, ou seja, (a) uma prestação pecuniária
obrigatória, (b) em moeda, (c) que não constitui sanção de ato ilícito, (d)
instituída em lei e (e) cobrada mediante atividade administrativa plenamente
vinculada, amoldando-se ao conceito exposto no art. 3º do Código Tributário
Nacional.

O Ministro Carlos Velloso, no RExt nº138.284-CE, após


apresentar uma classificação quadripartite dos tributos (impostos, taxas,
contribuições e empréstimos compulsórios) dividiu as contribuições em (a) de
melhoria, (b) sociais e (c) especiais, sendo que as sociais estariam subdivididas
em: a) de seguridade social (art. 195, I, II e III); b) outras de seguridade social
(art. 195, § 4º) e c) gerais (FGTS, salário-educação, SESI, SENAI, SENAC).

É possível, outrossim, a classificação dos tributos previstos na


Constituição em cinco espécies, a saber: a) impostos, b) taxas, c) contribuições

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de melhoria, d) contribuições especiais e e) empréstimos compulsórios. Neste
sentido, Hugo de Brito Machado (Curso de Direito Tributário, 16ºed., São
Paulo:Malheiros, 2000, p. 54.), Ives Gandra da Silva Martins (Curso de Direito
Financeiro e de Direito Tributário, São Paulo:Saraiva, 1995, p. 145), Celso Ribeiro
Bastos (REX 146.733-9/SP) e o Ministro Moreira Alves (Voto na ADI 2.556-DF).

Cada uma dessas espécies tributárias possui


características e requisitos próprios, de forma que a verificação da
constitucionalidade ou ilegalidade de uma nova exação exige que,
primeiro, se identifique a qual espécie pertence, para, depois, analisar
a regularidade de sua instituição.

Podemos imediatamente afastar a hipótese de


enquadramento das contribuições sociais ao FGTS como taxa, pois, segundo o
art. 77 do Código Tributário Nacional, esta tem como fato gerador “o exercício
regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço
público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua
disposição”. Da mesma forma, promovemos automaticamente a exclusão do
enquadramento como contribuição de melhoria, que se destina a “fazer face ao
custo de obras públicas de que decorra valorização imobiliária” (art. 81 do
Código Tributário) e também como empréstimo compulsório, já que este pode
ser instituído para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de
calamidade pública, de guerra externa e de investimento público de caráter
urgente e de relevante interesse nacional (art. 148 da Constituição Federal).

Finalmente, demonstra-se a inviabilidade do enquadramento


do tributo previsto no art. 1° da LC 110/2001 à natureza jurídica de imposto,
haja vista que o produto da arrecadação não integra a receita pública: assim
que ocorre o recolhimento dos 10% pela Caixa Econômica Federal, os recursos
são creditados nas contas vinculadas dos empregados a título de complemento
de atualização monetária, cumprindo a finalidade para qual foram essas
exações criadas (art. 4° da LC 110/2001).

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Portanto, a natureza jurídica da exação sob discussão
amolda-se à espécie tributária de “contribuição”. Com efeito, o art. 149 da
Constituição Federal estabelece que compete exclusivamente à União instituir
(a) contribuições sociais, (b) de intervenção no domínio econômico e (c) de
interesse das categorias profissionais ou econômicas. O Supremo Tribunal
Federal, nesse ponto, já esclareceu:

Nesse diapasão, uma vez delimitada a natureza jurídica do


tributo sob discussão, podemos passar com segurança ao exame de sua
(in)constitucionalidade. Para tanto, primeiramente, devemos estabelecer o
desvio de finalidade da referida contribuição – o que será realizado de forma
incontestável nestes autos por utilizar como fundamentação basilar documentos
públicos e oficiais que envolvem a Caixa Econômica Federal e a própria União
Federal.

3.3 – Do cumprimento da finalidade da contribuição atacada – Tentativa


de perpetuação das receitas para utilização em ações estratégicas de
infraestrutura e investimentos em programas sociais do Governo
Federal

Em rápida recapitulação, já restou delimitado alhures que a


finalidade da exação sob questionamento era a de gerar receitas para suportar
o déficit advindo do reconhecimento de correção monetária a menor nos planos
Verão e Collor (art. 4° da LC n° 110/2001). Em outras palavras: o tributo foi
criado excepcionalmente para o “pagamento de uma conta”, sendo possível
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afirmar que se o débito originado dos expurgos inflacionários não
existisse também a contribuição social não seria trazida ao mundo dos
fatos.

Ocorre, Excelência, que o débito em questão já foi


quitado.

Existem, pelo menos, duas provas de que o passivo advindo


da atualização monetária das contas afetadas já foi suficientemente honrado.
Vejamos:

3.3.1 – Quitação do déficit em 01 de janeiro de 2007

Conforme indicado no Relatório de Administração do FGTS de


2006 (em anexo), a provisão constituída para o pagamento dos expurgos já
incluía todos aqueles que pleitearam ou podem pleitear os expurgos, tenham ou
não aderido ao acordo firmado à época.

O total da provisão (de estimativa do próprio gestor do FGTS)


do montante necessário para pagar os expurgos de quem o pleiteou ou ainda
poderia pleitear, tendo ou não aderido ao acordo, era, em 31/12/2006, de R$
14,633 bilhões. O patrimônio líquido do FGTS (que é o valor que excede ao
necessário para cumprir com todas as obrigações do fundo, inclusive o
pagamento das contas vinculadas), era, na mesma data, de R$ 21,376 bilhões.
No documento em anexo verificamos estas informações na página 4, cujo trecho
é abaixo colacionado para facilitar a visualização de Vossa Excelência:

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Ou seja, se no dia 2 de janeiro de 2007 todos os
trabalhadores optassem por sacar a integralidade de suas contas do FGTS, ainda
sobrariam R$ 21,376 bilhões (patrimônio líquido) para fazer frente ao expurgo
de quem ainda não havia recebido esses valores; considerando que a estimativa
dos valores de expurgos em aberto foi realizada pela própria CEF e apontava um
débito de R$ 14,633 bilhões, comprovado resta que, uma vez pagos todos
os correntistas credores, remanesceria um patrimônio líquido de R$
6,743 bilhões.

Destarte, os documentos oficiais demonstram que a


finalidade da exação criada pelo artigo 1° da Lei Complementar n° 110/2001
fora cumprida, com sobras, na competência 2006/2007.

3.3.2 – Quitação do déficit em julho de 2012

Caso este juízo considere que, apesar de existir capital


suficiente, a quitação dos débitos oriundos da correção monetária dos planos
Verão e Collor não ocorreu em 2006/2007 simplesmente em razão dos créditos
não terem sido realizados efetivamente (muito embora houvesse saldo para
tanto), deverá admitir que o mencionado pagamento ocorreu integralmente em
julho de 2012. Isso porque, na Ata da 128ª reunião ordinária do Conselho
Curador do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, realizada em 15 de maio de
2012 (em anexo), o Conselheiro Titular da CEF, Sr. Fábio Ferreira Cleto, informou
o seguinte (fl. 15):

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Os dados repassados pelo Conselheiro Titular da CEF em


relação à declaração do Presidente da Caixa Econômica Federal, Sr. Jorge Fontes
Hereda, remontam à audiência pública realizada na Subcomissão Temporária do
FGTS (CASFGTS) do Senado Federal, em 29 de março de 2012, quando este
afirmou originalmente que os recursos do FGTS estariam recompostos em julho
de 2012. Como confirmação disto, veja-se a Demonstração Contábil do FGTS
para o exercício de 2012, que aponta um saldo excedente do FGTS (patrimônio
líquido) de R$ 55,3 bilhões (fl. 03):

Em reforço, a própria análise feita no Relatório de


Administração - Exercício 2012 do FGTS (fl. 01):

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Não há, portanto, razão para a contribuição social continuar a


ser cobrada quando os valores já amealhados são mais do que suficientes para
a quitação dos débitos outrora existentes – principalmente considerando que o
próprio gestor do patrimônio afirmou categoricamente que os pagamentos
ocorreriam (ou teriam seu valor garantido) até julho de 2012.

3.3.3 – Do desvirtuamento dos créditos percebidos com a


contribuição social – FI-FGTS

Reconhecendo o exaurimento da finalidade da contribuição


social estabelecida pela Lei Complementar n° 110/2001 e verificando a
crescente necessidade de se reduzirem os encargos incidentes na folha de
pagamentos dos empregadores, em 03/07/2013, a Câmara dos Deputados
aprovou o Projeto de Lei Complementar n° 200/12, visando fixar o dia 1° de
junho de 2013 como data-limite para a cobrança dos 10%. No entanto, em
25/07/2013, a Presidente da República optou por vetar o texto. Segue abaixo (e
em anexo) sua justificativa:

Como se vê, a Presidente da República declarou


expressamente que a contribuição social idealizada pelo artigo 1° da Lei

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ADVOCACIA
Complementar n° 110/2001 não poderia ser extinta, não por prejudicar o
pagamento dos expurgos inflacionários, mas sim por, “particularmente,
impactar fortemente o desenvolvimento do Programa Minha Casa, Minha Vida”,
bem como outras ações estratégicas de infraestrutura. É difícil, neste ponto,
saber com segurança a partir de qual momento os recursos da contribuição
social começaram a ser alocados em programas sociais e de infraestrutura; no
entanto, tudo leva a crer que o desvio de finalidade dos recursos ocorreu a partir
da época da criação do FI-FGTS (Lei 11.491, em 2007).

Destarte, seja em 2006, 2007 ou 2012, existem fatos mais do


que suficientes para auxiliar o convencimento de Vossa Excelência no sentido de
que os valores percebidos através das contribuições sociais originadas da Lei
Complementar n° 110/2001 já cumpriram a sua finalidade e são, já há algum
tempo, desviados para campos completamente estranhos ao objetivo inicial de
quitação dos expurgos inflacionários dos planos Verão e Collor.

Outrossim, sem prejuízo do que foi exposto acima, é possível


defender a tese de que a contribuição social é inconstitucional desde dezembro
de 2001, como veremos a seguir.

3.4 – Da inconstitucionalidade superveniente – Leitura do art. 1° da LC


n° 110/2001 conjugada com a Emenda Constitucional n° 33/2001

Por mais importante que seja a discussão tangente à perda


(ou desvio) da finalidade da contribuição social instaurada pela Lei
Complementar n° 110/2001, é possível que o debate se torne inócuo caso o
juízo entenda pela configuração da inconstitucionalidade superveniente do texto
do artigo 1° da mencionada Lei Complementar após a vigência da EC 33/2001.
Esta, que alterou o artigo 149 da Constituição Federal, assim dispôs:

Art. 1º O Art. 149 da Constituição Federal passa a vigorar acrescido


dos seguintes parágrafos, renumerando-se o atual parágrafo único
para § 1º:
"Art. 149........................................
§ 1º...............................................
§ 2º As contribuições sociais e de intervenção no domínio
econômico de que trata o caput deste artigo:

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ADVOCACIA
I - não incidirão sobre as receitas decorrentes de exportação;
II - poderão incidir sobre a importação de petróleo e seus derivados,
gás natural e seus derivados e álcool combustível;
III - poderão ter alíquotas:
a) ad valorem, tendo por base o faturamento, a receita bruta
ou o valor da operação e, no caso de importação, o valor
aduaneiro;
b) específica, tendo por base a unidade de medida adotada.
§ 3º A pessoa natural destinatária das operações de importação
poderá ser equiparada a pessoa jurídica, na forma da lei.
§ 4º A lei definirá as hipóteses em que as contribuições incidirão
uma única vez. (NR)

Considerando que as regras previstas na CF atinentes à


outorga de competência tributária são sempre de observância obrigatória, resta
estabelecido que as contribuições sociais poderão ter suas alíquotas definidas
apenas por duas formas: (1) alíquota específica, tendo por base uma unidade de
medida legalmente escolhida, e (2) alíquota ad valorem (do latim “conforme o
valor”) que tome por base (2.1) o faturamento, (2.2) a receita bruta (2.3) ou o
valor da operação, restando ainda (2.4) o valor aduaneiro em caso de
importação.

No entanto, nobre julgador, no caso em tela apresentamos a


Vossa Excelência uma situação onde a contribuição estabelecida pelo art. 1º da
LC nº 110/2001 é calculada com alíquota “ad valorem” com base de cálculo
fixada no saldo da conta de FGTS do empregado despedido sem causa justa.
Referida metodologia não se adéqua a nenhuma das previsões constitucionais
constantes do artigo 149, cuja nova redação fora acima transcrita. Há de se
reconhecer, então, o conflito entre o regramento imposto por uma lei
complementar anterior e o regramento imposto por uma emenda constitucional
posterior.

A espécie de conflito legal tratada no parágrafo acima já foi


analisada e decidida pelo Supremo Tribunal Federal. Veja-se:

Ação direta de inconstitucionalidade: descabimento, segundo o


entendimento do STF, se a norma questionada e anterior a da
Constituição padrão.
1. Não há inconstitucionalidade formal superveniente.
2. Quanto a inconstitucionalidade material, firmou-se a maioria do
Tribunal (ADIn 2, Brossard, 6.2.92) - contra três votos, entre eles do
relator desta -, em que a antinomia da norma antiga com a

16
ADVOCACIA
Constituição superveniente se resolve na mera revogação da
primeira, a cuja declaração não se presta a ação direta.
3. Fundamentos da opinião vencida do relator (anexo), que, não
obstante, com ressalva de sua posição pessoal, se rende a
orientação da Corte. (ADI 438, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA
PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado em 07/02/1992, DJ 27-03-1992
PP-03800 EMENT VOL-01655-01 PP-00081 RTJ VOL-00140-02 PP-
00407)

Este entendimento, nada obstante haver sido firmado há


décadas, continua norteando a jurisprudência pelos Tribunais do país, conforme
se verifica de breve passagem da decisão proferida em 22/11/2013 pelo
Ministro Gilmar Mendes, quando da apreciação do Agravo em Recurso
Extraordinário nº 734233/MS:

“É por esta singelíssima razão que as leis anteriores à Constituição


não podem ser inconstitucionais em relação a ela, que veio a ter
existência mais tarde. Se entre ambas houver
inconciliabilidade, ocorrerá revogação, dado que, por outro
princípio elementar, a lei posterior revoga a lei anterior com ela
incompatível e a lei constitucional, como lei que é, revoga as
leis anteriores que se lhe oponham.”

Caracterizado resta, de forma suficiente, que o art. 1° da LC


110/2001 é materialmente inconstitucional, já que, levando em consideração o
rol taxativo das possibilidades de base de cálculo para contribuições com
alíquotas ad valorem, conforme expresso na alínea “a” do inciso III do §2° da
nova redação dada ao artigo 149 da Constituição Federal pela Emenda
Constitucional n° 33/2001, é perfeitamente possível visualizar que a adoção do
saldo da conta de FGTS do empregado despedido sem causa justa como base de
cálculo para a discutida contribuição geral não encontra respaldo na Carta
Magna.

À luz destes argumentos, concluímos tratar-se de revogação


tácita (por não recepção) da norma jurídica pelo novo texto da Lei Maior, em
razão da incompatibilidade entre suas disposições confrontadas.

3.5 – Da ilegalidade da contribuição diante da perda / desvio de


finalidade

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ADVOCACIA
O valor acrescido ao patrimônio do FGTS pela contribuição
adicional não foi idealizado pela Lei Complementar nº 110/2001 para servir de
fomento a projetos sociais ou de infraestrutura: a contribuição social (e o valor
arrecadado a este título) foi instituída para restabelecer o equilíbrio das contas
do Fundo, afetadas pelas ações judiciais de atualização monetária dos planos
econômicos. É fundamental que não se perca de vista a razão pela qual a
contribuição foi instituída, pois ela está intimamente ligada à continuidade da
cobrança e não se confunde com os fundamentos e utilização do patrimônio do
FGTS. Como já mencionado: se não existisse a necessidade de aumento de
ativos diante do passivo originado pelos expurgos, a contribuição de 10% sequer
existiria.

Um ótimo exemplo acerca da importância da finalidade


objetivada com a criação de certos tributos vem da própria Constituição Federal:
ao estudamos o imposto extraordinário de guerra, previsto no artigo 154, II,
podemos verificar que, cessadas as causas de sua criação, o tributo é suprimido
gradativamente. Mesmo sendo de espécie tributária diversa à da
contribuição sob enfoque nestes autos, o legislador constituinte
termina por demonstrar a relevância com que a finalidade pretendida
com a criação de certos tributos (cuja razão de ser passa pelo
cumprimento de um objetivo em específico) é tratada.

Excelência: exaurido o intento que ensejou sua criação, não


persiste razão para a perpetuação da cobrança da exação em análise! Alterar a
finalidade de uma contribuição instituída é equivalente a criar uma contribuição
completamente nova, a qual deveria se sujeitar a um novo exame de
compatibilidade constitucional e, especialmente, à alteração ou instituição de
novo texto legal.

Em outras palavras: as contribuições sociais são


constitucionalmente marcadas pela destinação ou finalidade específica. Mais do
que isso, segundo o Sistema Tributário Constitucional vigente, o que distinguem
as contribuições uma das outras é a sua destinação ou finalidade: a partir desta
informação é que se identifica sua natureza jurídica, assim como a identidade de

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ADVOCACIA
cada uma delas. O próprio STF já adotou este critério para classificar as
contribuições sociais (no RExt nº 148.754) entre as de custeio da seguridade
social, as especiais e as gerais.

A finalidade inerente à contribuição social e a destinação da


arrecadação, portanto, são elementos condicionantes à própria instituição e
manutenção válida da exação tributária. Nesse sentido, colacionamos
importante doutrina de Misabel Abreu Machado Derzi (BALEEIRO, Alimor.
Limitações constitucionais ao poder de tributar. Rio de Janeiro: 1997, p.
598/599):

“A Constituição de 1988, pela primeira vez, cria tributos


finalisticamente afetados, que são as contribuições e
empréstimos compulsórios, dando a destinação que lhes é
própria relevância não apenas do ponto de vista do Direito
Financeiro ou Administrativo, mas igualmente do Direito
Tributário.
(...)
A afetação do produto a certas despesas ou serviços é
requisito necessário para o exercício da competência fiscal, no
que tange às contribuições e aos empréstimos compulsórios.
Assim, a destinação assume relevância não só tributária
como constitucional e legitimadora da contribuição que
não esteja afetada aos fins constitucionalmente admitidos;
igualmente poderá reclamar a repetição do tributo pago, se,
apesar da lei, houver desvio quanto à aplicação dos recursos
arrecadados.
(...) Inexistente o gasto ou desviado o produto
arrecadado para outras finalidades não autorizadas na
Constituição, cai a competência do ente tributante
para legislar e arrecadar”

Especificamente quanto ao desvio da arrecadação de uma


contribuição para finalidade diversa à originalmente idealizada, temos a lição de
Leandro Paulsen (Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da
doutrina e jurisprudência. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2009, p. 126):

Desvio do produto da arrecadação como causa de


inconstitucionalidade superveniente da contribuição. Se a
própria legislação (atos normativos de qualquer nível) passa a
atribuir destinação diversa da que dá suporte à sua
instituição, restará evidenciada a falta de
correspondência da sua cobrança à finalidade que a
justifica, ensejando o reconhecimento da
inconstitucionalidade total ou parcial superveniente.
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ADVOCACIA
Juristas que comungam desta visão costumeiramente citam a
“teoria dos motivos determinantes”, hoje corrente na prática Administrativa. A
propósito dessa teoria, o Prof. Francisco Campos assim se manifesta: “Quando
um ato administrativo se funda em motivos ou pressupostos de fato, sem a
consideração dos quais, da sua existência, da sua procedência, da sua
veracidade ou autenticidade, não seria o mesmo praticado, parece-me de boa
razão que, uma vez verificada a inexistência dos fatos ou a improcedência dos
motivos, deva deixar de subsistir o ato que neles se fundava" (in Direito
Administrativo Brasileiro, 17.ª edição, p. 182).

A teoria dos motivos determinantes está relacionada à prática


de atos administrativos e impõe que, uma vez declarado o motivo do ato, este
deve ser respeitado.Esta teoria vincula o administrador ao motivo declarado.
Vale dizer, a teoria dos motivos determinantes não condiciona a existência do
ato, mas sim sua validade.

É o que ocorre de maneira clara no presente caso: o


legislador, ao instituir a contribuição social no artigo 1° da LC 110/2001, declina
a sua finalidade (art. 3° §1° e art. 4° da mesma legislação) e, assim, vincula a
continuidade de sua cobrança a referido desígnio.

Pelas razões acima expostas, deve ser declarada a


inconstitucionalidade da cobrança da contribuição atacada nestes autos por
afronta às disposições do artigo 149 da Carta Maior, sob pena de perpetuar o
inafastável desvio de finalidade que comprovadamente recai sobre a
arrecadação deste tributo, devendo ser declarado, ainda, o direito da parte
autora ser ressarcida dos valores indevidamente pagos, na forma do item a
seguir.

3.6 – Da repetição de indébito – Declaração da possibilidade de


ressarcimento dos valores indevidamente pagos

20
ADVOCACIA
Por ter recolhido a Contribuição Social prevista pelo artigo 1º
da Lei Complementar nº 110/2001 após o esgotamento da finalidade para a qual
fora instituída, certo é que a parte autora – e qualquer empresa em situação
análoga – efetuou pagamentos indevidos de tributos. Mesmo que a pessoa
jurídica não tenha realizado pagamentos a este título até a presente data,
subsiste o interesse de deixar de pagar o tributo eventualmente, no futuro.

Resta, tão somente, definir o termo inicial da configuração da


ilegalidade / inconstitucionalidade da exigência das contribuições: dezembro de
2001 (com a EC n° 33), dezembro de 2006 (com a verificação de que o
patrimônio líquido do Fundo de Garantia já era superior aos débitos existentes a
título de pagamento de expurgos inflacionários), junho de 2007 (com a sanção
da Lei n° 11.491, que instituiu o Fundo de Investimento do Fundo de Garantia do
Tempo de Serviço - FI-FGTS, custeado, mesmo que parcialmente, com os
recursos da contribuição social da LC n° 110/2001, conforme declaração
assinada pela própria Presidente da República) ou, ainda, julho de 2012 (com
declaração expressa do gestor do Fundo no sentido de que o pagamento das
diferenças relativas aos planos Verão e Collor terminaria nesta época).

Em casos como o presente, dispõe o Código Tributário


Nacional:

Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de


prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for
a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no § 4º do
artigo 162, nos seguintes casos:
I - cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior
que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da
natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente
ocorrido; (...)

O artigo 168 do mesmo diploma complementa:

Art. 168. O direito de pleitear a restituição extingue-se com o


decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contados:
I - nas hipótese dos incisos I e II do artigo 165, da data da extinção
do crédito tributário; (Vide art 3 da LCp nº 118, de 2005)
II - na hipótese do inciso III do artigo 165, da data em que se tornar
definitiva a decisão administrativa ou passar em julgado a decisão
judicial que tenha reformado, anulado, revogado ou rescindido a
decisão condenatória.

21
ADVOCACIA
Assim, requer a parte autora seja deferido seu pleito pela
restituição total dos pagamentos realizados nos 5 (cinco) anos anteriores ao
protocolo da presente ação, bem como e eventualmente dos pagamentos
realizados durante o curso da lide até o julgamento final, todos regularmente
corrigidos e complementados com juros de mora, na forma da legislação
aplicável à espécie. O valor da condenação em específico, conforme
mencionado no item II desta petição exordial, deverá ser apurado apenas em
liquidação de sentença, através da oportuna juntada dos documentos
necessários.

4 – DO PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA

Com fulcro no artigo 273 do Código de Processo Civil 2 e


observando a possibilidade conferida pelo artigo 151, V do Código Tributário
Nacional3, vem a parte autora requerer a este juízo que, em decisão
antecipatória dos efeitos da tutela pretendida, venha a determinar a suspensão
da exigibilidade do crédito tributário referente à contribuição em tela (art. 1° da
LC 110/2001), determinando à ré que disponibilize meios para que os valores a
este título sejam depositados em conta judicial vinculada, sem prejuízo à multa
de 40% sobre o saldo do FGTS – devida regularmente ao trabalhador despedido
sem justa causa.

A verossimilhança das alegações, como requisito apto a


justificar o pedido, é facilmente verificável da exposição acima realizada – com
esteio em doutrina e baseada na melhor jurisprudência dos Tribunais Superiores.

Já o fundado receio de dano de difícil reparação pode ser


justificado pelo cenário econômico atualmente existente no Brasil: com uma
carga tributária das mais elevadas do mundo e índices que nos aproximam da
recessão, é questão de sobrevivência para muitas pessoas jurídicas – como a
que promove esta ação – buscar a competitividade no mercado, de forma que a

2
Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que,
existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:
I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou
II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.
3
Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário:
(...) V – a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras espécies de ação judicial;
22
ADVOCACIA
diminuição de custos significa importante instrumento de planejamento
financeiro. Além disso, caso os pagamentos não sejam paralisados por força de
ordem judicial, a requerida continuará a efetuar o lançamento e cobrança da
contribuição social em enfoque (atividade obrigatória da Administração Pública),
de forma que ao autor restará, quando muito, a esperança de receber estes
valores (possivelmente em precatórios) após o trânsito em julgado do processo,
o qual poderá demorar vários anos – o suficiente para que algumas pessoas
jurídicas, inclusive, se desestruturem e fiquem insolventes.

Por isso, caracterizados os requisitos autorizadores da medida


pleiteada, requer seja deferido o pedido de antecipação de tutela nos moldes
acima.

5 – DOS PEDIDOS

A parte autora, diante de todas as razões fáticas e


fundamentos de direito acima alinhavadas, requer a este eminente juízo:

1- Com fulcro no texto expresso do artigo 273 do Código de Processo Civil, a


Antecipação dos Efeitos da Tutela para suspender, nos termos do artigo 151
inciso V do Código Tributário Nacional, a exigibilidade do crédito tributário
referente à contribuição social com alíquota de 10% incidente sobre os
montantes depositados a título de FGTS nos casos de despedida sem justa
causa de seus empregados, criada e presente no artigo 1° da Lei Complementar
110/2001;

2 - Seja a parte demandada regularmente citada para, querendo, apresentar


Contestação no prazo legal, sob pena de revelia;

3 - Quanto ao mérito, sejam reconhecidos os argumentos supra-alinhavados


para declarar, (1) a inconstitucionalidade material do art. 1° da LC 110/2001
superveniente à vigência da EC 33/2001, (2) a inexigibilidade da contribuição
social objeto de controvérsia em decorrência do cumprimento de sua finalidade,
definindo-se o término do objetivo da exação em uma das datas e conforme os

23
ADVOCACIA
motivos apontados alhures (dezembro de 2001, dezembro de 2006, junho de
2007, ou, ainda, julho de 2012), (3) a inexigibilidade da contribuição social
objeto de controvérsia em decorrência do desvio de sua finalidade, sendo
inequívoca a utilização da arrecadação para aplicação em obras sociais e de
infraestrutura, notadamente o programa federal “Minha Casa Minha Vida”,
conforme informações prestadas no veto presidencial à Lei Complementar n°
200/12;

4 - Seja a parte demandada condenada à repetição do indébito, em favor da


parte demandante, de todos os pagamentos realizados indevidamente,
observando-se para tanto o prazo quinquenal imediatamente anterior ao
protocolo da presente ação, sem prejuízo da aplicação de correção monetária e
juros cabíveis na atualização do montante;

5 - Seja a parte demandada condenada em custas e honorários advocatícios de


sucumbência, fixados por Vossa Excelência de forma equitativa conforme
legislação aplicável.

6 - Protesta pelo julgamento antecipado da demanda, à luz do disposto no artigo


330, I do Código de Processo Civil, já que a situação exposta não carece de
produção de provas em audiência.

Dá à causa o valor de R$ 1.000,00 (mil reais) para fins fiscais.

Termos em que pede deferimento


Cidade, Data

Advogado OAB

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